Segundo o velho e preto relógio pendurado na parede a minha frente, já se passara duas horas desde que eu chegara ali.

      Eric tinha ido embora, agora Scott e Elliot se revezavam para me cuidar. Falar com Scott era a mesma coisa que se eu tentasse falar com a parede, ele simplesmente não respondia, olhava para o outro lado como se eu nem estivesse ali.

      - Vou buscar alguma coisa para comer. – Elliot anunciou em quanto se espreguiçava.

      - OK, eu cuido dela.

      - É melhor não tentar nada, garoto.

      - Não vou.

    Com um olhar de pura desconfiança, Elliot saiu pelo corredor. Quando ouvi a porta bater, me virei para Scott, ele continuava com sua máscara fria.

     - Scott, me solta, você vem comigo... Eles não vão te pegar.

    Silêncio...

     - Scott! Por favor! Por que você está fazendo isso?!

    Nada, ele continuava a olhar para outro canto da sala.

     - Scott! Eu sei o que você é, eu sei o que a Talitha é...

     - E daí?! E nada disso te impediu de ficar com aquele anjo! – Me assustei com o tom de sua voz, eu teria a mesma sensação se ele tivesse me dado um tapa.

      Scott agora andava com as mãos dentro dos bolsos da calça, ainda não me olhava.

     - Por favor...

     - Você podia ter ficado comigo, sabe, não ia deixar nada acontecer com você, muito menos te trair.

     - Como você soube? – Minha voz saiu como num sussurro, ele agora puxava uma cadeira para sentar mais próximo de mim, olhava para o chão.

     - Vee não te achava, ligou para Talitha... Sabia que tinham pegado você, por isso me ofereci para ajudar.

     - Então porque você não me solta?

     - Por que você não vai aprender a lição! Você sairia viva daqui se só desse um fora naquele anjo, ele voltaria para o céu e pronto.

     - Sabe que eu não posso fazer isso.

     - Você o ama, e blá blá blá.

     - Me solta, Scott.

     - Para quê? Você voltar para ele? Nora... você não está entendendo. Se você não terminar com ele, você vai morrer.

     - Eu sei.

     - Ele vale mesmo tudo isso? Eu acho que não. Um traidor, só liga para ele mesmo. Nem deve estar te procurando.

    Quando abri a boca para responder, Scott já gritava:

     - Enquanto eu, o idiota me ofereci para vir aqui só para te ajudar! Só para ver se colocava alguma coisa nessa sua cabeça, mas já vi que não vai funcionar.

     - Já que não ia me ajudar, por que veio então?! – Berrei, e pela primeira vez ele me olhou nos olhos. Eu tinha certeza que estava horrível, suja, suada e meus cachos agora deviam estar parecendo mais uma juba, mas ele me olhou como se me admirasse.

     - Porque eu te amo, Nora. Ainda não percebeu isso?

    Minha boca se abriu, mas eu a fechei de novo. Como aquilo foi acontecer? Eu sempre tive impressão de que ele me odiava, desde pequenos, e agora ele dizia que me amava. Isso não podia estar acontecendo. E o pior, eu não tinha resposta para aquilo, eu sabia que sentia alguma coisa por Scott, mas não podia confirmar que era amor.

     - É, não precisa responder. – Ele olhou para mim, me estudando, eu continuava perdida em pensamentos. Por que diabos eu tinha que viver tudo aquilo? Poderia ter uma vida normal, mas não.

     Permanecemos em silêncio pelo o que pareceu uma eternidade, o único barulho era o de uma coruja e o relógio.

     Eu tinha a cabeça baixa, estava quase dormindo quando senti alguém pegar em minha mão. Virei-me assustada e me deparei com Scott ajoelhado, estava tirando as cordas de minha mão.

      - Decidiu me soltar? – E mesmo nessas situações eu tinha senso de humor.

      - Cala a boca, e tira as cordas das suas pernas. Elliot já deve estar voltando.

   Minhas mãos estavam num tom de roxo pela falta de sangue, mas sem me importar, soltei as cordas de minhas pernas. Quando consegui me livrar delas, permaneci sentada, me sentia tonta e enjoada.

      - Vamos.

      - Não sei se consigo andar. – Fui sincera ao dizer aquilo, minhas pernas estavam quase pretas onde a corda apertou, e eu mal conseguia me erguer da cadeira.

      - Droga. Se nos pegarem estamos ferrados. – Sem dar o menos aviso, ele passou um braço por de baixo de minhas coxas, e outra em minhas costas, me levantou fácil e eu imaginei se eu era realmente tão leve assim, pois Scott e Patch me levantavam como se eu fosse uma mochila.

      - Obrigada.

      - Vai ficar me devendo essa, olha que eu vou cobrar mais tarde.

   Ri baixinho, já passávamos da porta de entrada, com uma mão ele abriu a porta do carro e me colocou lá dentro, correu pela frente do carro para chegar ao banco de motorista.  

      - Coloque o cinto. – Scott praticamente mandou, quando ele mesmo não usava. Coloquei-o e apertei minhas mãos na lateral do banco.

      Surpreendi-me pela rapidez com que Scott dirigia, seu carro não era grande coisa, mas por um momento cheguei a pensar que conseguiríamos mesmo sair dali. Minha opinião mudou quando o que pareceu um raio, ou o que pareceu um raio caiu a nossa frente.

       - Scott! – Eu gritei, e segurei seu braço com força para que ele parece, mas o mesmo parecia decidido a atropelar aquela coisa pela velocidade que ia.

       A claridade, que agora tinha o estranho formato de uma pessoa, continuou em frente, até que estendeu uma mão em direção ao carro e pareceu que o que aconteceu em seguida, se passou em câmera lenta.

       Scott largou do volante ao mesmo tempo em que o carro em que estávamos praticamente voou para o lado e capotou varias vezes, agora eu apertava com força a mão do garoto a meu lado. E quando o carro parou, de cabeça para baixo, antes de apagar completamente, vi a luz sumir da estrada.

        Sentia alguém me cutucar e gritar meu nome, mas num momento eu perdi os sentidos e fui fechando os olhos lentamente, agora, sem ouvir mais nada.