Mestre e Comandante escrita por americangods


Capítulo 8
Capítulo 7 - Academia Grissom




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Academia Grissom

                 

É só o que ela lembra de estar fazendo nas últimas horas. Ver Liara dormindo, ver Liara sendo transferida, os médicos correndo com ela numa maca magnética, entrando na sala de cirurgia e a porta fechando na sua cara. A janela aberta, porque ela não pode entrar ainda por causa do risco de infecção. Conseguiram estabilizar ela. Não tinha mais perigo de vida. A cirurgiã asari disse que foi um milagre das deusas. Tiveram que submetê-la a uma rápida operação, mas rápida para os médicos significava uma eternidade para ela.

Alenko ficou lá com ela, minutos sem falar nada, dando, sei lá, uma mensagem de que estava tudo bem entre eles, que já tinha esquecido e que não se importava nem um pouco de estar com Shepard ali, uma pessoa que talvez ele tenha amado, enquanto velava a recuperação de outra mulher, a que Shepard escolheu no lugar dele. Depois ele saiu. Sem falar uma palavra, um tchau ou volto logo. Andromeda também ficou quieta. Vega fez uma chamada de vídeo para ela, provavelmente bêbado dizendo que tudo vai ficar bem e cantando um reggae jamaicano de cem anos atrás, falando para ela dar uma chegada no Purgatory porque tinha uma asari gostosona procurando por ela. James apontou de longe a câmera para a asari. Aria T’loak.

A Comandante fez questão de franzir as sobrancelhas para ele, mas não durou muito tempo e cedeu um sorriso. Não dava para odiar Vega, por mais que parecesse que ele se esforçasse para que você fizesse isso. Mas ela ainda não se sentia pronta para sair dali. Não seria Aria que a tiraria de lá. Nem Hackett conseguiu fazer isso.

Ouve passos atrás de si. Passos característicos, que a faziam lembrar de alguém. Era assim que o assassino andava na escuridão. Ele ensinou a Shepard como ouvir esses passos, esse som bem específico dele. Ouvir esse tipo de som inaudível poderia salvar a vida dela caso ele não estivesse ali para isso. Demorou dias para aprender. Meditou com ele durante esse tempo todo, o barulho do motor da Normandy dificultando a tarefa. Que motor, Comandante? Eu não ouço nada. Ela teve que aprender a ignorar aquele som para ouvir os outros. O assassino disse que ela devia entender a escuridão para poder ouvi-los. Feche os olhos.

Haviam muitas sombras na vida dela. Não havia lugar para luz. Talvez tenha sido por isso que mesmo em meio a todo o barulho do Hospital Huerta ela conseguiu ouvir o drell. Afinal, para quem treinou com aquele motor barulhento, lamúrias e choros de parentes desesperados não era nada.

– Thane?

– Siha – o drell aparece ao seu lado. O rosto verde um pouco mais pálido do que da última vez que o vira. As guelras também não tão vermelhas.

Thane. Hospital. Ele está morrendo, lembra ela. Como pode esquecer disso? Fora uma das primeiras coisas que falou ao se encontrar com ela em Illium. O cartão de visita dele, o anúncio que morreria em breve. Queria ter certeza se Shepard o consideraria útil mesmo nessas condições. Ela agradece muito por ter feito a escolha certa. O drell não só era um aliado importante, como também um amigo.

– Os médicos daqui são bons, siha. Deixe-a por um tempo. Eu cuido dela por você – sorriso drell.

Sorriso de quem sabe que vai morrer. Ele está nos seus últimos dias, percebe ela. Semanas, se tiver sorte. Tem pouco tempo para se preparar para a morte e lá está ele, cedendo o pouco que tem de vida para que Shepard pudesse não enlouquecer de preocupação pela sua asari.

– Nós precisamos conversar – diz ela.

– Precisamos. Mas não agora, siha – ele pega na mão dela. – Você tem uma galáxia para salvar.

Porque os que você mais vai sentir falta são os primeiros a morrer?

– – –

O caminho de volta à Normandy foi tortuoso e cheio de súbitas vontades de voltar para o hospital. Estava praticamente sozinha na nave, apenas o pessoal da manutenção trabalhando nela e se certificando que não faltava nada, dada as condições que eles saíram da Terra: fugindo. Pode estar faltando um parafuso, senhora, disse um mecânico batendo continência. Claro que não falta um parafuso, se faltasse nós teríamos explodido durante a viagem.

Talvez isso tenha acontecido. Talvez ela tenha explodido mesmo durante a viagem e tudo o que aconteceu desde então foi um lapso milisecundal de sua mente projetando um futuro do que seria ante a morte que estava vindo. Ela para no meio da sala de reuniões, onde antes fora o laboratório de Mordin Solus. Aonde está você, Mordin? Conta até, dez, talvez? Aquele universo não acaba. Ela não explodira no espaço mesmo. Disso estava certa.

A mensagem que recebeu daquele Volus de Noveria falava de uma coisa parecida. Ele adquirira estresse pós traumático após deixar uma companheira para morrer e salvar a própria vida. Mandara email algumas vezes para Shepard, que diz ele, ajudou um pouco a diminuir a culpa que sentia. Ela continua andando, passa pela Sala de Guerra vazia, o computador central que mostrava todas as forças que a Aliança tinha para retomar a Terra.

Quase nada.


Contavam com ela para aumentar aquele número, aquela probabilidade de vitória impossível. Nunca achou que pensaria dessa maneira. Mesmo com toda a dificuldade que foram as missões contra Saren e depois contra os Coletores, mesmo tendo ela vencido a morte, não conseguia manter muitas esperanças depois de ver o que os Reapers fizeram com Vancouver em questão de minutos. Uma das megalópoles da Terra caíra em minutos.

Cortana tentou tranquilizá-la quanto a isso. Disse que era assim mesmo, mas que a esperança não morria com a queda das grandes cidades. A esperança nascia na forma como as pequenas cidades, os pequenos grupos de pessoas conseguiam segurar a barra. A sobrevivência de uma civilização não dependia das grandes coisas, mas das pequenas.

Ela chega na holoroom. Toca no dispositivo central e a imagem e voz de Hackett não tardam a aparecer. O almirante lia algum relatório e demorou para dar atenção à comandante. Verdade seja dita, ela merecia isso. Deixou-o esperando por mais de duas horas.

Não vai falar nada. Espera que ele se pronuncie.

– Comandante, você está péssima.

– Obrigada, senhor.

Não quis ser sarcástica. Espera que ele não tenha entendido dessa maneira.

– Eu li o relatório sobre Marte, Shepard – relatório esse que não fora ela que produzira, mas Traynor, com a ajuda de Kaidan e John. Ela só colocou o polegar na tela, teve sua digital lida e o documento foi assinado – nós estamos analisando o conteúdo ainda, mas parece que a doutora T’soni estava certa. Há uma esperança.

Se você me quer focada nisso, não mencione Liara ou eu voltarei para lá.

Sua mente já está la, imaginando Thane gastando o que lhe resta de vida velando a mulher de sua amiga.

– Sinto muito pelo que aconteceu, Comandante. Mas fico feliz que a doutora esteja bem – diz ele, adivinhando no que ela pensava.

– Obrigada, senhor.

– Temos notícias de Anderson – os olhos dela brilham – ele diz que os focos de resistência estão se organizando mais rápido e melhor do que ele pensava. Ainda temos muitas pessoas lá, Shepard. Isso nos dá tempo.

Tempo para o quê?

– Você precisa falar com o Conselho. Eles estão a par de nossa situação, mas não vão se mobilizar a não ser que tenham um bom motivo para isso.

Seria eu metendo bala na cabeça de um deles? Porque eu deveria fazer isso.

– O que eu posso fazer, almirante? – Ela mesma se surpreende com o tom cansado que sua voz assumiu naquelas palavras.

Anderson pediu que ela fizesse isso. Ela prometeu a ele que falaria com o Conselho, que se faria ouvir. E que voltaria com a maior armada que a galáxia já viu.

Shepard sabe, agora, que isso é impossível.

– O que você sabe fazer melhor, Shepard.

– Matar? Desculpe senhor, por mais que eu queira não sei se matar um conselheiro vai ajudar.

Hackett solta uma risada muito alta. Ela não tinha ideia que tinha falado algo tão engraçado assim. Talvez ele tenha rido porque secretamente é o que achava que tinha que acontecer. Por mais que Shepard tenha salvo o Conselho anteriormente eles ainda pouco ligavam para a humanidade. Anderson quase sempre era voto vencido durante as decisões.

– Não, Comandante. Falo de fazer as pessoas acreditarem em você. Sabe porque a resistência na Terra está tão forte? Porque eles acham que essa é a parte deles. Que é esse o seu papel. Segurar as pontas até você chegar. E eu acho que eles estão certos, Comandante. Se tem alguém que pode fazer isso é você. A Terra ainda está de pé por sua causa. E vai se reerguer por sua causa.

– Almirante – ela leva a mão ao rosto, fecha os olhos, silêncio... – Você não tem ideia do peso que eu estou carregando. Ninguém... tem ideia – os olhos verdes ressurgindo, talvez mais brilhantes. Pessoas que ela nunca viu nem nunca vai ver morrendo e se arriscando porque sabem, não, tem certeza que ela vai voltar e salvar a todos. Isso deve ter dado um brilho todo especial às duas jades, mas que por dentro continuavam desesperançosas e mortas. – Eu vou falar com o Conselho. Eu vou cobrar favores. Há muitas pessoas nessa galáxia me devendo uma.

– Tenho certeza que sim, Comandante. Mais uma coisa. 12 horas atrás perdemos contato com a Academia Grissom.

– A Academia de Bióticos? – Lembra que foi para lá que enviou David Archer, mais uma vítima da Cerberus.

– Exato. Kahlee Sanders é a diretora lá. É uma grande amiga minha e de Anderson. A última coisa que captamos de lá foi o alarme geral disparando. Depois disso tudo ficou mudo. Não conseguimos mais contata-los.

– Reapers? – Ela não poderia fazer nada se fossem eles. A Academia era uma estação espacial pequena, talvez alguns poucos quilômetros de comprimento. Um só Reaper destruiria aquilo em minutos.

– Não os detectamos naquele sistema. Ainda. Pode ser qualquer coisa. De mal funcionamento à piratas. Ou pior.

Pior que piratas e menos pior do que Reapers só podia significar uma coisa.

– Cerberus?

– É possível – respondeu o almirante. – E Comandante. Um dos membros da sua Missão Suicida foi realocado para lá e está trabalhando na instrução de alunos com potencial biótico.

– Quem?

Samara, talvez? Ou Miranda, mas duvida que ela se aproximasse tão rápido assim da Aliança.

– O nome dela é Jack.

Jovenzinha rebelde, tatuada e psicótica. A biótica mais poderosa da galáxia. Dando aula para crianças. A própria Terra e o Universo poderiam esperar. Shepard precisava ver isso com os próprios olhos.

– Falo com o Conselho na volta, Almirante.

Não pareceu muito, mas ela estava preocupada. Quando o Almirante sumiu no holograma a expressão no rosto de Shepard morreu. Se era a Cerberus mesmo que tinha atacado, Jack ia começar uma carnificina. Isso não era bom para ela nem para as tais crianças que cuidava.

Mandou terminarem a manutenção e iniciarem os procedimentos primários da Normandy. Estaria pronta para decolar em meia hora. Tinha tempo para fazer mais uma coisa na Cidadela.

– – –

Voltou ao hospital quando a visita já estava liberada. Se não fosse a situação estranha na Academia ela teria ficado mais tempo com Liara. Comprou rosas vermelhas na recepção, deixou num vasinho próximo da cama dela, exatamente do lado em que ela estava dormindo. Seria a primeira coisa que veria quando acordasse. Dezenas de pétalas vermelhas.

Quando foi que ela ficou tão sentimental assim?

Beijou a asari no rosto duas vezes antes de sair. Thane à levou até a porta enquanto ela explicava a situação. Disse que adoraria acompanhá-la, como também rever Jack. Riu ao saber que ela tinha virado instrutora de crianças. Falou também que a conversa deles poderia esperar, e prometeu que continuaria cuidando de Liara.

Os olhos da ruiva pesaram, mas só isso e nada mais, quando viu as portas do elevador fecharem e o rosto do drell sumir.

Ainda no elevador fez um chamado geral para toda a tripulação da Normandy. Joker foi o primeiro a chegar. Não saí de perto dela nem por um minuto. Depois um pessoal mais novo batendo continência quase em fila indiana. Vega, Cortez e Master Chief carregando Traynour.

– Eu não vou perguntar, não quero saber e vocês não vão me contar. Estejam prontos em uma hora. Estamos indo para a Academia Grissom.

Deixaram Traynor no segundo andar e Shepard delegou um cara que passava na hora para cuidar de Samantha. A Comandante acompanhou os rapazes até o arsenal. Vega tentou contar sobre tudo que aconteceu durante a lenta descida do elevador.

Quando chegaram ela tinha um resumo de 30 segundos da tarde deles. John bebeu água. Vega repetiu isso algumas vezes, consumindo 5 dos segundos com isso. Ela imagina que o spartan tenha bebido muita água.

– Você luta bem quando está bêbado?

– Melhor do que sóbrio.

– Ótimo. Vamos ver como você se sai, Tenente. E depois temos que falar sobre aquela loucura que fez em Marte.

– Que loucura?

– Tentar se matar.

– Quando?

Não ia discutir com um bêbado.

– Apronte-se. Agora.

Ela vai até o outro lado do arsenal. Cortez cambaleava um pouco até o Kodiak e checava se faltava alguma manutenção a ser feita. Não faltava. Ele terminou todos os procedimentos antes e refez mais alguns só para ter certeza. Shepard gostou de vê-lo assim, apesar do andar de bêbado. Pelo menos tirava um pouco da cabeça aquela coisa toda de ter perdido o marido.

As vezes encher a cara ajuda um pouco nesses casos. Nem que seja por alguns minutos ou horas. Chief já estava vestindo sua armadura. Vai até ele. As duas proteções nas pernas já estavam colocadas.

– Você está bem? – Perguntou ela.

– Estou, senhora.

– Se continuar a me chamar de senhora eu vou chamá-lo de Master Chief.

– Eu não me importo de ser chamado assim, senhora – ele falou sério, não foi uma piada. Se fosse James isso teria sido uma piada.

– Mas você pediu que o chamasse de John meses atrás.

                                                 

– Se for possível.

– É possível. Mas só se você parar de me chamar de senhora.

O homem olha para ela um pouco sério, não entendendo muito o sentido daquilo. Nem ela entendia, acha.

– Tudo bem, Comandante.

– Isso – não precisa forçar muito o sorriso, até que gostou daquela conversinha boba – você vem comigo e o James. Espero que esteja 100%.

– Eu sempre estou, senh... – ele se corrige, – comandante.

– É que quando eu falei Academia Grissom achei que... você tivesse esboçado algum tipo de emoção nessa sua cara fechada, sabe – e isso foi verdade. Percebeu mesmo essa reação nele.

Ela sorriu querendo dizer que aquilo parcialmente foi uma brincadeira. Ele continuou sério.

– Jack está lá.

– Como você sabe?

– Ela foi falar comigo faz um mês. Em Vancouver.

Expressão boba no rosto da Comandante, e então vontade de rir e por fim ela não conseguindo acreditar nisso.

– Jack, visitando alguém? Se importando com alguém?

– É o que parece.

Ela deu um tapinha no braço dele e saiu. Subiu o elevador rindo. Jack, ensinando crianças e visitando pessoas. O mundo realmente está acabando. James Vega a alcançando no elevador, completamente vestido – provavelmente mal vestido, já que aquela armadura não era fácil de colocar.

– Comandante – cheiro de bebida. Ele está com o punho fechado, braço levemente estendido na frente dela.

– James? O que foi?

– Asaris – diz ele, olha para o seu punho e depois para a mão direita dela – Você é das minhas, Comandante!

Aquilo foi inesperado.

– E você é a alegria da minha vida, James – ela bate de leve o punho no dele com o seu, rindo.

– – –

Kaidan se voluntariou para a missão, mas ela preferiu deixá-lo na nave. Vega está bêbado, Shepard, disse o major. Vega obedece minhas ordens. Ela esquece que se não fosse por Alenko administrando medigel em Liara provavelmente a asari não estaria mais ali. Mas ele desobedeceu ordens dela lá em Marte, e se mostrou mais de uma vez desconfiado sobre as alianças dela. Não podia levá-lo para o campo de batalha de novo sem se acertarem definitivamente.

Tinham as cicatrizes de Virmire e o relacionamento deles, ainda. Talvez elas fossem que nem as de seu rosto, as coisas vermelhas que vinham e voltavam sem o menor controle dela. Havia a possibilidade de que eles nunca se acertassem. Shepard se arrepende muito de ter dado abertura para ele logo nas semanas iniciais que se conheceram quando ela se tornou oficial executiva da Normandy, estando apenas abaixo de Anderson na linha de comando.

Aí ela virou uma Spectre, a hierarquia militar entre eles simplesmente sumiu. Não tem mais regras proibindo a confraternização entre nós, Alenko. E então eles foram para Therum e encontraram Liara.

Aquele era o século XXII, as pessoas eram mais livres, mas ela não deixava de pensar que durante aqueles dois meses da caçada à Saren ela meio que enganou Alenko e Liara.

Chega, Shepard.

– São mesmo naves da Cerberus, Comandante – diz Steve Cortez do seu assento de piloto.

Ela se aproxima do piloto, desviando das cadeiras e esgueirando-se pelo espaço apertado do pequeno veículo. Haviam várias pequenas espaçonaves patrulhando a academia e um grande cruzador rente a ela. Ainda bem que deixaram a Normandy longe ou teria sido um alvo fácil.

A academia era uma grande estação espacial em forma de cruz. Ao centro dela, uma esfera, provavelmente a área de treinos. Uma torre brotava de um dos braços da cruz, que se Shepard lembra bem das informações que lera sobre a Academia, é onde ficava os apartamentos, centro do comando e direção.

Uma estática surge no rádio.

– É a Aliança? Aqui é Kahlee Sanders! A Cerberus está atacando a academia! Eles querem os meus estudantes!

– Sanders, aqui é a S.S.V. Normandy, a Aliança nos enviou para checar a situação. Não tínhamos certeza da presença da Cerberus até agora.

– Normandy? Você é Shepard?

– Sim senhora.

– As defesas da estação foram hackeadas, Comandante! Vocês não podem se aproximar com uma fragata!

– Nós sabemos, senhora. Estamos em uma shuttle – EDI detectara o sistema de defesa hostil e sugeriu a aproximação com a pequena nave de transporte – há alguma entrada alternativa para aportarmos?

– Sem alertar os caças e as torretas? Não. A não ser que... Comandante, eu posso desativar as torretas de defesa por alguns segundos. A sua shuttle poderia se aproximar nessa janela de tempo e aportar no deque leste. Mas os caças e o cruzador da Cerberus ainda seriam um problema.

– Desative as torretas em 30 segundos, senhora. Nós temos uma distração e vamos entrar.

Vega e Cortez olharam para ela.

– Nós temos uma distração?

– Joker – diz ela pelo rádio – você ouviu a diretora Sanders. Precisamos de uma distração.

– Alguma sugestão ou posso improvisar, Shepard?

– Como quiser, Joker.

A Normandy mergulhando na frente deles em direção à Academia. As torretas chegam a atirar algumas vezes, mas logo travam, resultado das ações de Sanders. Os caças da Cerberus partem em perseguição da nave da Aliança. Joker falando alguma coisa engraçada pelo rádio, adorando a situação em que se meteu.

– Isso é taticamente errado – diz Chief, vendo pela janela as manobras do piloto da Normandy.

– – –

O caminho até o ponto de encontro foi tranquilo. Não havia presença inimiga naquele lado da estação. Chegaram a um grande corredor com portas para todos os lados. Na frente de uma delas vários corpos de soldados. Estava entreaberta, buracos de bala por toda a sua superfície.

– Sanders? Somos nós! – Diz Shepard.

Chief e Vega estão ao seu lado. A porta abre e uma mulher com alguns ferimentos surge de trás de uma mesa virada. Era loira, cabelo até o ombro e os olhos muito claros, quase brancos. Devia estar nos seus 50 anos e a espingarda em suas mãos não parecia pesar nada.

– Comandante, eu sou a diretora Sanders – aperta a mão de Shepard com dificuldade.

– Qual é a situação?

– Estamos com pouco pessoal. Após a notícia do ataque dos Reapers a maioria dos alunos e corpo docente foram enviados para casa. Há uma dúzia de... vivos na estação. Estão escondidos e seguros, exceto por um grupo de estudantes e uma instrutora.

– Jack?

– Ela mesma. Vocês a conhecem?

– Sim.

– Você é o espartano? – Sanders olhou para Chief – Anderson falou de você, ele... – a preocupação subitamente estampada em seu rosto – onde ele está, Comandante?

– Na Terra. Mas ele está bem, eu posso garantir para a senhora.

– Você pode? – O tom de voz não é esperançoso, quase uma desconfiança é percebida naquela dúvida – Eu... acredito em você, Comandante. Anderson também.

– Eu sei – ela tenta um sorriso para amenizar seja lá quais sentimentos ruins estivessem sobre a mulher – nós vamos atrás de Jack e dos estudantes. Pode nos mostrar o caminho?

– Há uma grande concentração de energia sendo direcionada para a área Sul. Vou enviar o mapa para vocês.

– – –

Memórias de Pragia. Seu corpo sendo estendido em uma mesa de laboratório, os implantes sendo inseridos e tirados quase que semanalmente, alguns membros de seu corpo nunca deixando de doer pelas operações. Seu corpo sempre sendo atualizado com novos protótipos de condutores de energia biótica. Ela era única, diziam as vozes durante a operação. As vezes ela lutava tanto contra aquilo que apesar do seu corpo ceder, a sua mente se mantinha acordada durante as operações e... durante coisas piores. Violência física e mental contra uma menininha indefesa.

Subject Zero é única. Ela era zero. Nought, seu atual sobrenome, caso aparecesse alguém que ela julgasse digno de saber. Seu nome verdadeiro? Não sabe. Alguma coisa com J, apenas. Daí que nasceu Jack e Jacqueline.

Nunca devíamos tê-la perdido em Pragia. Que voz é essa?

Isso são gritos de seus estudantes, ali, ao fundo? Não! Deixem eles em paz! Não podia permitir que eles fossem submetidos ao mesmo horror que ela. Mas estava tudo escuro a sua volta. O que poderia fazer? Como sairia dali?

Experimento Zero.

Ela é a biótica mais poderosa da galáxia. Mais do que qualquer matriarca asari. Essa voz, de novo.

Experimento Zero saberia o que fazer. Simplesmente explodiria em energia biótica até iluminar toda aquela escuridão e achar um caminho para sair dali. Mas ela não era mais Zero. Ela é Jack. Que seguiu Shepard em uma missão para a morte e voltou mais viva do que jamais esteve. A instrutora da Aliança. Ela tinha crianças agora com que se preocupar. Não estava mais sozinha, nem poderia se permitir a solidão.

Isso não vai aumentar o poder dela? Outra voz. Mulher.

Vai. Não podemos mensurar mais o poder dela. Não agora. Mas podemos controlar. Traga as cobaias.

Mas os seus alunos... Se aqueles gritos são mesmo deles, então ela tem que agir. Jack não pode fazer nada, não tem forças para isso. Jack impôs limites a si mesma, limites que não machucariam mais ninguém. Para salvar os seus alunos ela tinha que se livrar desse limites.

Zero saberia o que fazer.

Você agora é o Experimento 24601.

Uma dor muito forte no pescoço. Estão injetando alguma coisa nela. Os músculos enrijecem, o líquido queimando tudo por dentro dela. As coisas dissolvendo, tomando outras formas. Tudo dentro de si sumindo, dando lugar a algo novo.

Phantom. Você é uma Fantasma. E vai nos obedecer, como todas as outras.

Não. Nem Jack nem Zero saberiam o que fazer. Shepard saberia.

– Eu vou... – diz ela, para o dono da voz – partir você!

– Engraçado. Eu estava pensando em fazer o mesmo com você, querida – a voz responde. Pode ouvi-la melhor agora.

Ela abre os olhos. Mesa de operações. Pragia? Não. Pragia é passado. E o passado explodiu e queimou meses atrás. Aquilo era o presente. Um espelho na sua frente. Seu reflexo monstruoso.

Aqueles seus grandes olhos castanhos sumiram. Um azul aterrorizante brilhando no lugar deles. Um homem rindo, apreciando o momento.

Ela grita muito, muito alto.

Jack e Shepard não podem fazer mais nada. E nem Zero.

24601.

– – –


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