Mestre e Comandante escrita por americangods


Capítulo 9
Capítulo 8 - Fantasma


Notas iniciais do capítulo

Queridos, revisão foi rápida então perdoem-me por qualquer atrocidade.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/209394/chapter/9

Fantasma

Você derrubou um mech Atlas. Sozinho. Shepard, minutos atrás. Sim, a resposta de John. O caminho não foi difícil, mesmo considerando o robô gigante. A Comandante disse que da próxima vez era para ele só tirar o soldado lá de dentro, talvez pudessem usar o Atlas para alguma coisa.

Deixaria que ela fizesse isso. A cabine do piloto não pareceu grande o bastante para ele. Foram muitos corredores e salas. Encontraram alguns reféns pelo caminho, liberaram-nos e mandaram que ficassem escondidos. James estava contando o número de abates. Shepard se dizia impressionada com a capacidade de combate de um bêbado como ele. Ele dizia não estar mais bêbado.

John gostou de agir em equipe. Foram muitos anos lutando sozinho, só ele e Cortana. Ainda era difícil deixar ela para trás. A IA ficou na nave trabalhando com EDI, tentando consertar o dróide que acharam em Marte.

Lembrou do Planeta Vermelho. Era muito diferente de Marte da sua realidade, que virara uma das colônias humanas mais prósperas. Até perdera boa parte daquela sua cor avermelhada, mantida na Marte de Shepard. Era assim que ele chamava aquela realidade. Influência de Cortana, ela brincou que como a ruiva parecia ser a pessoa mais importante daquela realidade, o verdadeiro centro daquela galáxia, nada mais justo do que batizar aquele mundo como o Mundo de Shepard.

Ainda não entende como veio parar ali, naquele lugar, durante uma guerra de proporções talvez maiores que a contra o Covenant e o Flood. Cortana e EDI, novamente elas, diziam estar investigando. Nenhuma das duas tinha respostas concretas, apenas teorias envolvendo coisas como espaço-tempo e transição de dimensões. Ah outras suposições se quisermos trabalhar com conceitos feéricos de destino e predestinação, disse EDI.

Uma voz masculina range nos alto-falantes dizendo-se da Cerberus, falando que não fariam nada contra as pessoas da estação e que bastava que eles se entregassem pacificamente. Não acreditava naquilo, obviamente. Shepard contou sua história com a Cerberus, contou sobre as ações deles nesse mundo. Não havia como simpatizar com aquilo. Por mais que sua vida inteira tenha sido lutar contra aliens – lá em sua realidade –, aqui, nessa, aliens não eram o maior problema. Bom, eram. Os Reapers eram aliens e certamente eram um problema, mas não era como no seu mundo, em que todos os seres diferentes de humanos eram ameaças. Nos últimos momentos da guerra uma aliança entre humanos e Elites acabou surgindo, mas Chief não sabe se ela ainda se mantém.

Lá, em seu mundo.

– O que são isso? – James Vega, assustado.

As figuras que pularam do andar de cima em frente a eles. Uma emboscada. Eram todas mulheres aparentemente, armadura branca e preta, o capacete escuro e quatro olhos vermelhos e brilhantes nele. Todas elas carregavam espadas.

– São Fantasmas! – Kahlee Sanders grita pelo rádio – cuidado, comandante!

A primeira avançou em direção à Vega. Um brilho azulado, hexágonos em um campo de energia cobrindo o homem de armadura azul completamente. Já o tinha visto usar antes. Barreira, explicou James. O homem descarregou o rifle na Fantasma, repelindo o escudo dela. A mulher desfere um golpe que faz a barreira de James piscar.

Shepard usa energia biótica para puxar a mulher de cima dele e trazê-la para si. A espingarda encosta no abdome da fantasma e abre um buraco ali. O grito que a mulher dá é assustador. A Comandante parece não se importar. O vermelho das cicatrizes em seu rosto parece maior que o dos olhos das inimigas.

Libera uma onda de choque que joga o corpo em cima de outra das ninjas fantasmas. Uma delas se esgueira pelas costas da ruiva de armadura vermelha, prepara sua espada para atacar... e John avança sobre a inimiga. Seu corpo desmaterializa, é envolto de energia biótica ou mesmo vira energia biótica, tudo a sua volta parece mais lento. Atinge a ninja em milésimos, embora a viagem tenha parecido durar segundos. Quando seu corpo volta ao normal, energia escura ao seu redor, ele chuta a inimiga enquanto à fuzila. Mais um daqueles gritos.

Foi treinado para ignorar isso, mas era difícil. Não era como matar floods ou covenants. Aquelas eram seres humanos cheias de dor. O movimento delas parecia dor pura. Era ágil, quase imperceptível as vezes, mas quando elas param naqueles milésimos que você vê os movimentos delas, percebe que aquilo são apenas carcaças ambulantes de dor, que muito provavelmente já estavam mortas e só não sabiam.

Ou lhes era negado isso. A mulher foi parar numa parede, bateu, seu corpo caiu no chão. O capacete dilacerado pela pancada e os tiros. Era uma oriental muito pálida. Os olhos com grandes cicatrizes verticais, parecendo cortá-los, um brilho azul se apagando.

Eram como os soldados que encontraram em Marte. Experimentos. Talvez nem soubessem porque ou quem atacavam. Suas frases eram sempre concisas, pequenas, monossilábicas, um repertório muito básico e pobre de comandos e ordens. Era a única comunicação que pareciam ter entre si.

Shepard avança sobre duas ninjas. O corpo sumindo, virando uma coisa incorpórea e azul, aparecendo e explodindo na frente das mulheres. A barreira que as protegia se dissipando. Um tiro em cada uma bastaria. Shepard não faz isso. Ela salta para frente, em direção as mulheres e soca o chão ao cair. Uma nova onda de energia se expande e arremessa as ninjas para longe. Elas não se mexem mais.

As cicatrizes vermelhas quando Shepard olha para os lados, mais calma, certificando-se que não haviam mais inimigos o fazem lembrar das Fantasmas e sua dor.

Era uma mulher incrível. Ninguém lutava assim. Ninguém tinha esse fogo dentro de si, a coisa inesgotável que se libera toda vez que ela entra em batalha. Mesmo nos momentos em que a Comandante está visivelmente abatida, como quando a asari Liara quase perdeu sua vida, ou quando ela era só dor e ódio, aquela chama dentro da ruiva não se apagava, continuava lá, adormecida. Apenas esperando um motivo para ser liberada.

E estranho era pensar que apenas dor e ódio de uma mulher é que mantinham a esperança de bilhões de seres vivos.


O peso de todas as responsabilidades parece queimar n a Comandante durante as batalhas. É um caminho que John não se agrada de vê-la tomar, porque é um caminho que ele conhece muito bem. Sabe que as vezes não há volta.

Mesmo pessoas extraordinárias como Andromeda Shepard podiam se perder ali e não voltar nunca mais, porque era uma estrada que você tinha de trilhar sozinho, e Shepard era alguém que precisava de outros ao seu lado. Ela precisava comandar, ordenar, ter alguém de quem cuidar e com quem se preocupar. Era o que a mantinha viva.

Gritos. Civis, pensa ele. Não eram Cerberus. Os três combatentes correm para a próxima sala. O que John vê lá faz seu sangue gelar.

O rosto da mulher que viram não estava coberto por um capacete, apesar de usar a armadura das ninjas. Ela era clara – mais do que ele lembrava –, com tatuagens e o cabelo preso num rabo de cavalo, mas raspado nos lados.

Crianças com barreiras bióticas lutando por suas vidas, tentando segurar o máximo que podem as espadadas e explosões de energia que a mulher soltava neles.

Os olhos de Jack com um brilho azul fantasmagórico.

                                                                                         

– – –

Alguém se aproximando. Não é sua prioridade. Os alvos que o são. Que são eles? Será que isso importa? Segura sua espada com as duas mãos, enfia ela na barreira biótica com toda a sua força. Seus músculos dos braços queimam. A dor que não parava. Só aliviava quando a liberava. Dor. Era a única maneira de parar. Liberar à dor nos alvos. A espada fura a barreira biótica. O horror no rosto dos alvos.

Ela força a espada para baixo, aumentando o rasgo da barreira. Deixa a arma cair, leva as duas mãos ao rasgo e tenta aumentá-lo. Os alvos gritam coisas que ela não entende. Parece outra língua. Ela os conhece?

Isso importa?

Alguém se aproxima. Alguém chega ao seu lado. Não, suas costas. Alguém a segura, puxando para trás, afastando-a de seus alvos. A dor aumentando. Precisa se livrar dela. Ela faz isso, jogando o alguém para trás.

Olha para alguém. Ela tem cabelos vermelhos, cicatrizes e olhos da mesma cor, só que num tom diferente. Um tom que brilha, e que... aflige a ela? É isso que ela sente? Medo? A dor aumenta com o medo. Olhar para aquele alguém aumenta sua dor. Os lábios de alguém mexem, pronunciam palavras que ela não escuta.

O que ela está tentando dizer? Não consegue compreender ou discernir aqueles sons emitidos por alguém. Mas reconhece a voz. Mais dor. Ela tem que gritar.

Eu vou destruir você. Eu vou te partir.

É isso que fala? Porque é isso que pensa. São os ecos de palavras em sua mente, diluindo na dor em todos os lugares. Mas não é isso que quer pensar. Só que o que ela não quer pensar não importa. Pega sua espada e avança em direção à alguém.

Ela não revida. Assim como os alvos. Porquê ninguém revida?

Cortes horizontais, verticais, libera sua energia para saltar mais alto, aterrissa atrás de alguém, enfia sua espada. Erra. Alguém acerta um soco de energia. Também estava com dor? Alguém também precisava liberar essa dor para sentir um momentâneo alívio? Aquela coisa que a mantinha viva também mantinha a vermelha alguém? Os segundos de alívio.

– Jack!

Esse nome. Essa voz. Onde os ouviu antes?

– Jack, me escute!

Alguém é uma mulher, como ela. Como 24601. Não importa. Suas duas mãos juntas, liberando a dor com o máximo que seu ser permite. Os olhos arregalados da mulher vermelha antes de ser atingida pela onda de dor.

Tudo fica escuro por um momento. Os sons à sua volta parecem se fazer ouvir. Não lembrava deles antes. Pequenas vozes, muito fracas, que ativam também pequenas lembranças em sua mente dolorida. Não sabe do que se tratam essas lembranças. Mas está tentando entendê-las, porque parece que isso também possa aliviar a dor.

Pedaços de chão, parede, lustres e objetos revirados à sua volta. Os alvos todos caídos, mas ainda se protegendo. Um deles de pé. O rosto do alvo trás mais lembranças. É alguém poderoso, assim como a mulher vermelha. Onde está ela?

Continua na sua frente. O chão destruído em volta dela, exceto no pequeno ponto onde ela se mantinha de pé. Outro alguém está com ela. É verde, grande. A dor volta a ser insuportável. Ela precisa se livrar dela, de novo.

Ela o faz, o alguém verde agora na sua frente, protegendo a vermelha. Junta suas mãos de novo, soca o ar diversas vezes, indo em direção aos dois. Ondas de dor liberadas a cada movimento que fazia. O alguém verde tem uma arma. Joga-a no chão. Abre os braços, se aproxima com cuidado.

– Jack!

Essa voz. O alguém verde. Já ouvira antes. Mas quando?

– O que aconteceu com você, Jack? Por favor Jack, você também não!

A mulher vermelha.

24601 soca o ar de novo, liberando a dor. O homem verde segura os seus punhos. Ele não se importa com a dor dela o atingindo. Os seus braços e pernas tremendo, seus joelhos de encontro ao chão. O que estava acontecendo? Porque não conseguia mais liberar a dor?

O alguém verde tira o seu rosto. Há outro rosto embaixo. Não é verde, mas pálido. Os olhos não são vermelhos como o da alguém vermelha, mas castanhos, como os dela.

Dela? Quem é ela? Quem tem olhos dessa cor também?

– Essa não é você – consegue ouvir a voz do homem castanho em sua plenitude. Lembrar dela dói. Mas também parece trazer um alívio. Dor e alívio, como isso é possível? Será que havia outra maneira de buscar o alívio do que simplesmente liberar a dor?

Se há... ela quer fazer isso.

Ela prefere isso à pura e simples dor liberada. Prefere não liberar a dor, mas apenas ouvir aquilo que a alivia.

– Jack – a voz novamente.

– Jack – ela ouve uma voz nova, não é do verde nem da vermelha. Coincide com seus lábios se movimentando, suas cordas vocais produzindo sons. Era essa a sua voz?

A voz de 24601?

– Não! – ela grita. O que é aquilo em seus olhos que brilham e liberam dor? Uma coisa quente que desce pelo seu rosto mas não dói nada. Ela não quer se livrar daquilo. Quer se permitir mais. Aquilo é bom, deslizando pelo seu rosto.

– Quem é você? – pergunta o homem de olhos castanhos.

24601, responde, incerta. Talvez não fosse essa pessoa, esse número.

– Quem é você?

J. Algo com essa letra. Jacqueli...ne? Talvez. Mas há outro nome, mais curto que esse.

– Jack – ela responde. Algo é repelido fortemente de sua mente. A dor. Ela vai diminuindo, sendo expulsa. Tudo a sua volta começa a escurecer.

O alguém à segura, impedindo que desabasse no chão. Aqueles olhos... eles pertencem a uma pessoa. Essa pessoa tem um nome. A mulher vermelha se aproxima. Ela também tem um nome.

– Shepard? – ela lembra, essa é a mulher. Falta o outro – John?

– Estamos aqui, Jack – não sabe qual dos dois diz isso.

Escurece por completo. A dor acaba.

– – –

Comandante Andromeda Shepard segue atirando contra hordas de soldados. Os alunos de Jack atuando como artilharia biótica. Esferas de energia biótica sendo jogada nos Cerberus. Os estudantes eram melhores que muitos adeptos e vanguardas que Shepard vira por aí. Sanders disse que as crianças eram especiais, mas o estilo de luta deles e vontade com que batalhavam era uma coisa que não podia ser aprendida inatamente. Alguém tinha que ensiná-los.

E ela estava desacordada, sendo carregada por James Vega. Chief a entregou ao tenente e foi ajudar Andromeda na batalha. Atirava com um Black Widow com uma facilidade incrível. Talvez fosse capaz até de manejar uma Eviscerator moldada para krogans. O espartano era muito forte, mesmo. Segurara os ataques bióticos de Jack como nem ela própria conseguiria.

– Temos que tirar as crianças daqui, Comandante.

– Eu sei, Chief. Mas as coisas não são tão simples assim – diz ela, olhando para dois Atlas que surgiam no campo de batalha.

A ruiva e o espartano se abaixam ao ver dois mísseis sendo atirados contra eles. Pedaços de concreto e destroços voam por cima dos soldados. Os Atlas seriam um problema. Aquele que Chief destruiu não possuía lança-mísseis, mas esses estavam mais preparados para enfrentar alguém no nível de Shepard e Master Chief.

– Para que lado é a saída? – Pergunta ela.

– Adivinhe.

Droga, pensa. A saída estava além dos mechs.

A saída sempre estava depois das coisas mais complicadas de morrer.

– Chief. Eu tenho uma ideia.

– Sou todo ouvidos.

– Eu pego o da direita. Você pega o da esquerda.

Ouve um heh, aquela risada bem básica e rápida, que existe, mas quase não existe ao mesmo tempo. Pelo menos ele achou engraçado.

Quando foi que ela começou a fazer piadinhas ante a própria morte?


Talvez depois de você morrer e voltar a vida as coisas, todas elas, fiquem um pouco mais engraçadas e irônicas.

– Acho que é uma péssima ideia, Comandante – James Vega, ouvindo a conversa deles pelo rádio.

– Tem alguma sugestão, James?

– Não. Mas se insistem, permitam-me ajudá-los – várias granadas são arremessadas em direção aos mechs, James atirando-as do local que mandaram os estudantes ficarem.

Era no andar superior, mais protegido do que o térreo onde estavam Chief e ela. As granadas começam a soltar uma fumaça muito forte e escura. Shepard olha para aquilo e pensa na sua estratégia louca indo pelo ralo.

– James, agora não vemos nada!

– Comandante – Chief aponta para o próprio capacete – ative a visão avançada. Vai conseguir enxergar.

Sério que tem isso na armadura?

Ela coloca o capacete, fala baixinho visão avançada e uma espécie de onda de sonar amarelado é projetado pelo capacete, tomando toda a área do salão oval. Consegue ver os mechs se movimentando em meio à fumaça.

– Continuamos com o plano?

– Eu direita. Você esquerda – diz ela, se levantando – pronto?

– Depois de você – fala John. Shepard brilhando azulada, tornando-se incorpórea e desaparecendo. O espectro dela em direção ao Atlas que escolhera. Chief faz o mesmo.

Primeiro a explosão biótica gerada pelo ataque da ruiva, depois o dele. Os mechs momentaneamente incapacitados. Não tinham muito tempo. Shepard subindo no robô, atirando com sua espingarda no vidro do cockpit, depois no piloto que é jogado para fora.

Chief a vê tomando controle do robô assim que desativa o seu, realizando procedimento semelhante ao dela. Só que deixando uma granada ao invés de tentar tomar o mech.

– Atrás de mim, Chief – diz a mulher.

– – –

Lutar ao lado de Shepard deveria ser uma honra para ele. Só que essa honra estava escondida em algum lugar bem inacessível, talvez invisível, que ele não sabe como chegar nem onde tem de ir para encontrá-lo. Shepard é um exemplo para ele, como também para toda a Aliança. Droga, quem sabe até para a galáxia toda.

Mas porque James Vega não consegue simplesmente admirar aquela mulher? Tudo bem, ela acabou de roubar um Atlas e está trazendo o inferno na Terra contra a Cerberus. Ela se pôs na frente de uma Fantasma, que por acaso era sua amiga – ele viria logo a aprender que o acaso ama Shepard –, arriscando a própria vida para tentar trazer a mulher de volta. E conseguindo. Shepard roubava propriedade da Cerberus e destruía a Cerberus. Shepard conseguiu desfazer uma... como chamam  aquilo mesmo? Doutrinação que consumia sua amiga ninja.

Ela até deixou que ele saísse com a tripulação para espairecer um pouco na Cidadela. Na volta, brincou com ela, falou aquela coisa de que jogavam no mesmo time, o time das asaris. Nenhum outro oficial superior foi tão aberta assim quanto ela. Primeiro dia de ofício e já tinha liberado o pessoal para encher a cara. Não deixou que ninguém se abatesse pelos horrores da Terra.

Ainda assim, não havia honra em lutar ao lado dela. Por quê?

A mulher ainda era uma incógnita. As histórias que rolavam por aí é que ela era quase que uma santa, fazendo milagres e voltando da morte. Outras, que ela era uma diaba, matando quem quer atravessasse seu caminho e impedisse seus objetivos. Não sabe qual das versões é a verdadeira.

Ela estava, agora, matando as pessoas que a impediam de atingir seu objetivo. Isso queria dizer que ela não era tão sacra assim como diziam. No entanto, de novo, ela se arriscou por uma amiga, quase foi perfurada duas vezes pela espada dela e atingida por uma explosão de área biótica que fez um buraco gigantesco em tudo a sua volta. Então ela também não era tão má, porque se ela fosse, simplesmente teria metido bala na ninja e dado as costas.

As coisas se acalmam, não há mais barulho de tiros. Só os passos do Atlas que faziam o chão tremer. Não demora muito e a comandante deixa ele para trás, junto a uma granada. O mech explode ao fundo enquanto ele, a incógnita, Chief e os estudantes se movem por uma academia já não tão mais ocupada pela Cerberus.

A ninja convertida, que ele teve muito receio de carregar minutos atrás, agora de volta nos braços de Chief. Os alunos dela ainda estavam assustados, apenas dois se aproximaram e tentaram acordá-la. Os outros ainda tinham medo.


Segundo o mapa de Sanders estavam quase chegando à shuttle novamente. Espera que Steve Cortez ainda esteja lá. O amigo sabia se cuidar, mas não era um soldado como James e os outros. Deixá-lo sozinho muito preocupou o tenente.

Shepard para subitamente, faz sinal para que eles façam o mesmo. Caminha até uma porta entreaberta. Faz sinal para ele ir até ela, e para Chief ficar onde está. Caminha em silêncio até ela. Os dois se abaixam e protegidos por uma mesa cruzam até o outro lado da sala. No fim dela haviam dois Cerberus conversando com alguns estudantes que ergueram um escudo de energia.

A Comandante saca o seu rifle e manda ele fazer o mesmo, indicando o inimigo da direita. Os dois se preparam, respiram fundo e apertam os gatilhos quase que ao mesmo tempo. Sinergia, pensa ele. A cabeça do atingido por Shepard some e James se pergunta se aquilo foi realmente necessário. O seu alvo simplesmente desabou no chão, dois pequenos buracos na nuca.

– A raiz quadrada de 906.1 é igual à... – diz um dos estudantes, alheio ao que aconteceu. Estava abaixado, diferente dos outros dois de pé e assustados.

O rapaz tem o cabelo raspado, uma cara sofrida. Os outros dois tinham cara de que não sabiam em quem acreditar.

– A raiz quadrada de 906.1 é igual à... – ele ainda não tem resposta.

– Eu sou a Comandante Shepard da Aliança – diz a ruiva, se aproximando dos alunos.

– Os outros dois ali também eram. Eu não acreditei neles e não vou acreditar em você – a jovem parece desesperada, nervosa.

– A raiz quadrada de 906.1 é igual à...

Silêncio. A expressão de Shepard muda. Uma espécie de sorriso surge ali.

– ...30.1 – diz Shepard. A voz dela com dificuldades para sair. Aquilo era emoção que ela sentia? A diaba, emotiva?

– Comandante – o jovem se levanta, um sorriso sincero no rosto dele – que bom revê-la.

– Você também, David – então a menina resolve baixar o escudo. O rapaz vem com um andar desajeitado, travado, mas não havia ferimento nenhum nele. Lembrou de um menino em Fehl Prime que andava parecido e era autista. Ele abraça a comandante, surpreendendo-a.


Ela retorna o gesto. Diaba assassina nenhuma faria isso.

– Eles estão te tratando bem aqui?

– Sim – vira para os seus amigos – A Comandante me resgatou do projeto Overlord. Se não fosse por ela eu não estaria aqui.

– Comandante, perdoe-me... é que... – começa a menina.

– Tudo bem. Estamos levando um grupo de estudantes para fora da estação. Quero que vocês venham conosco.

Os jovens se olham por alguns instantes até decidirem acompanhá-los. David demora a largá-la, mas eventualmente o faz. A comandante sorrindo.

A incógnita que era aquela mulher.

– – –

Jack murmurava algumas palavras durante o sono. A boca as vezes se retorcia, os olhos fechavam com mais força. Ela sonhava com alguma coisa. John não podia fazer nada quanto a isso, só continuar carregando-a. As três crianças que se juntaram a eles mantiveram-se mais em silêncio do que as outras, que ainda deixavam escapar comentários assustados sobre sua instrutora. Um rapaz, identificando-se como Prangley, veio checá-la duas vezes. Parecia genuinamente preocupado. Você não pode nos deixar, Jack, disse o rapaz.

Seu coração acelerara quando a vira daquela maneira lá atrás, completamente descontrolada e sem pensamentos próprios, obedecendo uma diretriz infeliz que implantaram em sua mente. Tinham feridas em volta das partes mais abertas da armadura, como se tivesse sido pressionada contra a pele da mulher. Os antebraços parcialmente descobertos, deixando só as tatuagens à mostra. Um leve sangramento em volta das armaduras dos braços. Estava mais pálida que o normal.

Duas pessoas surgem na frente do grupo. Roupas de civis, não são soldados. Mas carregavam os mesmos emblemas que esses. O símbolo amarelo-dourado da Cerberus. Um homem e uma mulher, ambos parecendo estar em seus 60 anos.

– Comandante Shepard – diz o homem, de longe – somos cientistas do mais alto escalão da Cerberus enviados para o experimento nessa academia. Peço salvo-conduto em troca de informações cruciais da organização.

A ruiva parece não ouvir. Faz sinal com que parem e vai sozinha até lá. O andar dela é pesado e determinado, parecendo querer simplesmente passar por cima dos dois cientistas. Ela fica frente a frente com o homem e o soca. Shepard também tinha implantes desde que seu corpo foi reconstruído. Aquilo realmente deve ter doído.

Ele grita de dor ao atingir o chão. A mulher, que já estava assustada, parece perder ainda mais o controle. Não sabe o que fazer, se vai ajudar o companheiro ou se continua em pé, as mãos levantadas em sinal de rendição.

– Vocês estavam doutrinando os alunos? – Pergunta seca a Comandante.

– Eventualmente – o homem parece não ter medo dela – nosso primeiro objetivo era a Subject Zero – diz enquanto olha para a tal. Não há remorso naquele olhar.

– O que vocês fizeram com ela?

– Eu já disse, doutrinação. O mesmo que em todos os outros. Só que Zero é... especial, Comandante.

– Eu sei. Vocês a fizeram assim em Pragia. Eu estive lá, vi as imagens, ouvi o que ela tinha a me falar. Nós colocamos uma bomba lá dentro. Acabamos com o monumento macabro do seu projeto.

– Não mudou nada, Comandante. Os experimentos continuaram muito depois de Zero fugir. No entanto, nunca podemos replicá-los em outra pessoa com o mesmo sucesso.

– Porque ela é única, eu sei.

– Chame isso de seleção natural, sobrevivência do mais apto – ele levanta, ajudado pela mulher Cerberus – Zero foi exposta a uma grande quantidade de energia escura ainda no ventre de sua mãe. A maioria das crianças morre ou nasce defeituosa nessas condições.

– Eu sei. Sou uma das que sobreviveram. Mas talvez eu tenha vindo um pouco estragada, sabe?

– Sorte a sua, Comandante – ironia – mas algumas das que sobrevivem desenvolvem habilidades bióticas. Dentre essas, um número muito pequeno mostra um potencial maior que os outros. Há poucos desses na galáxia. Muitos deles já são nossos – o homem continuava provocando a comandante – Zero está ainda num nível acima deles. Ela, por si só e quando pequena, desenvolveu um poder similar à uma Comando Asari centenária. Imagine, comandante, centenas de anos de treinamento biótico e aquela menina consegue em apenas... seis? Oito?

– Vocês potencializaram isso. Ela é mais poderosa que uma matriarca. Já lutei com uma, e outra se aliou a mim. Jack poderia vencer as duas. Mas tudo isso eu já sei... doutor...?

– Vostok. Ivan Vostok. Minha esposa é Irina Vostoka – a mulher não mexe um músculo. – Comandante, eu estou lhe contando tudo isso para provar que falo sério e  porque almejo salvo-conduto para nós dois. Espero que entenda onde estou querendo chegar.

– Doutor Vostok, eu não sou idiota. Você terá seu salvo-conduto. Mas não antes de me contar tudo o que fizeram aqui. E só então eu vou julgar se merecem ou não minha proteção – Shepard parece tranquila, embora Chief ache que há alguma coisa enterrada querendo muito sair dela. Raiva. A mesma raiva que Jack demonstrava há pouco – o que vocês fizeram com a Jack? O poder dela foi aumentado. Eu posso sentir isso. Ela só não me matou porque deve ter me reconhecido, ou estava atordoada demais ainda, não sei.

O homem pondera por algum tempo, em silêncio. A mulher fala alguma coisa para ele, numa língua que Chief não entende. Parece russo. Estranho poder entender alienígenas com o tradutor que recebeu, mas não outras línguas humanas.

– Engenharia reversa. Temos estudado a doutrinação dos Reapers há muito tempo. Nós usamos isso para liberar ainda mais o corpo dos Experimentos. Nós temos um limite biológico para o uso de toda essa tecnologia e poderes, comandante. Nossa mente sabe disso. Quando atingimos esse limite, ela trata de nos proteger. Desmaios, parada cardíaca involuntária e semelhantes. A doutrinação impede que a mente funcione plenamente. Não há mais limite para o corpo humano dos experimentos.

– Como eles não morrem com isso?

– Eles morrem. O corpo se consome, esgota mais rápido do que um corpo saudável. Os experimentos vivem menos, cogitamos de um a dois anos, no máximo. Mas nesse meio tempo eles são uma força indestrutível e que não pode ser parada.

– E quanto à Jack?

– Ela certamente era uma força sem precedentes já sem a doutrinação. Com ela, o potencial de Zero saltou para limites incalculáveis. Esperávamos o resultado dos primeiros testes para ter alguma base científica.

– Você viu o que ela pode fazer.

– Mas ainda não quantificamos o resultado. O corpo de Zero pode sobreviver à esse esforço limítrofe por muito mais tempo que nossas Fantasmas habituais. Comandante, os dados que eu tenho sobre a doutrinação podem mudar o rumo da guerra – sorriso quase confiante, mas que na verdade se mostra malicioso – vejo agora que a Aliança é a organização certa para deter esse poder – ele tem algo na mão. Parece um hard drive. Entrega para Shepard.

São os dados da pesquisa, talvez?

– Então vocês realmente são valiosos – diz a comandante.

Shepard dá as costas para os dois e olha para Chief.

– Chief, Vega, a saída é logo à frente. Tire Jack e as crianças daqui. Eu vou negociar a rendição dos cientistas – ela então deve prever a desconfiança que ele estava começando agora a sentir – ... sozinha, John.

Ele sabe o que vai acontecer. Não quer que Shepard faça isso, mas não é sua escolha. Não pode fazer a cabeça dela. Master Chief simplesmente atende o pedido – porque foi isso, um pedido, e não uma ordem – da Comandante e lidera os estudantes até a extração. Kahlee Sanders aparece em seguida, já nas docas, preocupada com seus jovens. Eles tranquilizam a diretora e sobem no veículo.

Steve pergunta onde está a comandante, e depois, quem é aquela mulher nos braços de John.

– Uma amiga – responde ele – A comandante já está vindo. Prepare a decolagem. O piloto faz isso e o som das turbinas aumenta.

Um tiro, seguido de um grito rouco de homem. E enfim outro disparo.

A nave já estava preparada para decolar, faltando apenas a última integrante. John espera que não tenham ouvido o mesmo que ele. Os estudantes agora se aproximavam de Jack, ainda dormente, apoiada nos braços de Kahlee. Uma das meninas pega na mão da professora e chora.

– Você vai voltar, não vai? – Suplica ela.

Shepard caminhando em direção à John. A cabeça dela está baixa. Não sabe se é tristeza ou vergonha. Ela para em frente à shuttle, já alguns centímetros no ar. John estende a mão para ajudá-la a subir.

– Ninguém pode controlar aquilo. Ninguém pode ter aquilo – diz ela. Uma justificativa para seus atos, talvez.

Ela senta em um banco afastado. O capacete em seu colo, face esgotada e recostada na janela. Olhos verdes e cansados. Por vezes a impressão que um brilho vermelho emana deles, bem ali, no reflexo da janela.

– – –

Ele olha para seu planeta em chamas. Palaven estava caindo. E o que restava de sua família ainda estava lá. Não tem notícias deles há horas. Os Reapers destruíram todas as redes de comunicações assim que aterrissaram. Estava agora em um dos lugares mais seguros daquele sistema, a lua de Menae. Não por muito tempo, pensa ele. Logo os Reapers atacariam a lua, última linha de defesa contra os inimigos.

Encostou em uma parede de pedra e ali ficou. Não havia o que fazer, apenas rezar que sua família estivesse a salvo, que por algum milagre tinha conseguido pegar uma das shuttles de evacuação e saltado para a Cidadela. Lá ficariam seguros, mais do que ele. Mas por quanto tempo?

Quanto tempo passaria até os Reapers destruírem tudo?

Quanto tempo até Shepard aparecer e salvar o dia?

Se a humana estivesse ali as coisas começariam a dar certo. A maré mudaria para o lado dos turians, o seu povo. Não sabe como isso aconteceria, ou o que a ruiva faria para mudar a própria realidade, mas sabe que ela conseguiria. Ela sempre conseguia.

Perseguiu e achou Saren, salvou a Cidadela do reaper Soberania, voltou da morte, liderou Garrus e mais um grupo de desajustados para a morte certa – e trouxe todos vivos.

– Senhor! – Alguém o chamando pelo rádio – perdemos contato com o Primarch Fedorian. A nave e que ele estava foi abatida! O que faremos? – Perguntou a mesma voz.

– Ache o próximo da linha de sucessão e avise-o que é o novo chefe de estado do nosso povo – responde Garrus. Não sabia porque ainda perguntavam e pediam tanto a sua opinião. Sua experiência na luta contra os Reapers é de suma importância para nós, Vakarian. Alguém lhe respondera isso. Não lembra quem foi. A voz áspera, mas feminina. Uma oficial turian.

Até que era bonita. Talvez esteja morta agora. Não podia fazer nada por ela. Nem pelo resto de seu povo. Alguém, no entanto, poderia.

Mas e se mesmo ela não conseguisse?

Não importava, concluiu o turian. Só queria Shepard ao seu lado. A morte seria mais gloriosa e com algum sentido.

Shepard, ao seu lado, para salvar a todos ou morrer juntos. Uma risada na sua voz, que a ruiva dizia ser tão comandativa, eu quase aceitaria suas ordens, Vakarian. Brincou ela uma vez. Foi depois da missão suicida, num bar na Cidadela.

Enquanto ele lembra daquela única humana que ele já achou bonita, ele percebe outra alternativa surgir: morrer juntos e salvando a todos. Ele gosta disso. Esse seria o seu objetivo.

Levanta. Em algum momento deixara-se deslizar pela parede e desabar no chão. O seu rifle de precisão volta para o lugar onde pertencia: suas mãos.

Uma turian, não aquela possível morta, mas outra, se aproxima. Ela bate continência trêmula, mas não de medo, porque havia um pequeno resquício de esperança em seus olhos pequenos. Ela gagueja. Esperança faz isso com as pessoas, as vezes. Você fica embasbacado e inerte frente a ela.

Ele quase sabe o que a fêmea de sua espécie vai falar.

– Senhor, a Aliança respondeu o nosso chamado. Disse que vão enviar ajuda!

– Major – e é estranho ele dizer isso. A mulher facilmente o superaria em hierarquia militar, mas lá estava ela, ansiosa como uma cadete pela resposta dele – ordene que seus homens fiquem vivos. A maré acaba de mudar.

– Sim senhor – ela dá as costas e corre para longe, mas então para e volta para Garrus – senhor, acha que a armada humana é capaz de nos ajudar? Eles não... estão em guerra também?

– Quem disse que eles vão enviar uma armada, major? O melhor que eles tem está concentrado em uma só nave, comandada por uma só mulher.

Os olhos dela arregalando. Nunca reparara nesse tipo de reação em seu povo, o quão sutil ela era comparado aos humanos, com aqueles seus grandes olhos de diversas cores, sempre tão expressivos e fáceis de ler.

– Shepard está vindo? A Matadora de Reapers?

Nunca tinha ouvido esse apelido. Era novo para Garrus. Quando ela chegar vai fazer questão de provocá-la com isso.

– Como o senhor sabe? – continua a major.

– Essas coisas, major... – ele coloca o rifle nas costas e volta a olhar para seu planeta – essas coisas você simplesmente sabe. Você tem que acreditar.

Acreditar, naquela situação, era difícil. Mas bastava.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Mestre e Comandante" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.