_ Não pode ser verdade - murmurei, quando mamãe terminou de falar.

_ Pode e é - meus pais disseram juntos.

_ É impossível! - Sally gritou. Assenti com a cabeça e falei baixinho:
_ Pela primeira vez na vida eu concordo com ela.

_ Fred - perguntou meu pai - lembra -se do Grover ?

_ Claro! - respondi. Grover Underwood era o melhor amigo do meu pai. Desde antes de nascermos (pra ser mais exato, quando mamãe e papai se casaram) ele vai lá em casa com todo fim de semana. Quando eu nasci, dizem que ele ficou tão feliz que até conseguiu tocar bem sua flauta. ( Papai nos contou que ele sempre foi muito ruim.). E com Sally aconteceu a mesma coisa.

_ Então - papai falou como se estivesse em um teatro - ele é o pai do Tom.

_ Quer dizer que ele também é um sátiro ? - perguntou Sally antes que eu sequer pudesse processar o que meu pai acabara de dizer.

_ Sim. - confirmou papai sorrindo.

_ E Tom é seu protetor, assim como Grover era de mim, de Luke, de Thalia e do seu pai. - falou mamãe, como se lembranças de seu passado tivessem vindo para sua mente.

[ Cale a boca, Sally.]

Minha querida irmãzinha está dizendo que estou parecendo um ator boiola de teatro, só porque falei

"como se lembranças de seu passado tivessem vindo para sua mente." Acabei de dar um soco bem forte no braço dela.

[ Era pra doer mesmo, Sally!]

Continuando a história:

_ Espere, mas o tal de Luke não estava morto ? - perguntei, lembrando da história do filho de Hermes.

Sally revirou os olhos e mamãe explicou:

_ Ele está morto, sim. Eu só disse de quem Grover era protetor.

Então papai interrompeu:
_ Sabidinha, acho melhor levarmos eles logo pro Acampamento. - ele disse.

Eu sei, Sabidinha é um apelido muito bobo. Essa é outra das únicas coisas que eu e Sally concordamos. Também é bem estranho o apelido que mamãe usa com papai: Cabeça de Alga. Mas eu e a pirralha nunca falamos isso pra eles.

_ Tudo bem, Cabeça de Alga. - Viu ? Mamãe usa muito esse apelido.

_ Não preferem que eu leve ? - perguntou Tom. _ Sei o caminho desde que nasci. Afinal, é a minha casa.

_ Não precisa, Tom, estou curioso pra ver como andam as coisas por lá. - papai sorriu. - Mas você pode ir no meu carro também.

_ Obrigado! - dessa vez foi Tom quem sorriu.

_ Certo, então vamos! - falou papai, animado.

_ Esperem - eu lembrei de uma coisa importante. - Ainda não fiz a prova de História.

_ Ninguém liga, Wikipédia! - Sally berrou. Odeio quando ela me chama assim. O projetinho de gente me arrastou até o carro de nossos pais, uma Mercedes de 80 mil dólares. Tom, papai e mamãe a seguiram. Papai ligou o carro, e Sally pulou no banco da frente.

_ Ei! -protestei. - Hoje é sexta - feira. É o meu dia de ir na frente!

Mas ela mostrou o dedo do meio pra mim e jogou um donut com cobertura de pimenta ( a pior arma que ela usa em nossas brigas) na minha boca. Vomitei o doce do Hades (nossos pais quase sempre falam com termos de mitologia grega, e eu me acostumei a falar assim também) e me sentei no banco de trás com Tom e mamãe.

Meu pai deu a partida.

_ Para aonde vamos ? - perguntei, mas meu pai não ouviu porque estava buzindo que nem um louco no engarrafamento.

É, esse é o trânsito de Nova York.

_ Long Island - respondeu mamãe por ele.

_ Mas... - eu comecei a perguntar, quando de repente mamãe assumiu uma expressão de alerta e gritou: - Percy! Monstros!

_ Tom - comandou meu pai, respirando fundo. _ Leve as crianças para fora do carro. Eu e Annabeth cuidamos deles.

Abaixei os vidros do carro e olhei para fora. Uma matilha de cães infernais vinha na nossa direção, comendo o teto dos carros e latindo, furiosos.

_ Nós queremos ajudar! - eu e Sally gritamos em uníssono.

_ Pra fora do carro, AGORA! - berrou meu pai. Puxei Sally pela mão e pulei pela janela do carro. Tom já corria, trotando por entre os carros e usando a magia da flauta para retardar os cães infernais com era venenosa.