Signatum escrita por MilaBravomila


Capítulo 32
Capítulo 31 - Uma proposta, uma escolha e um pacto


Notas iniciais do capítulo

>> o nome original do cap é: Uma proposta, uma escolha e um pacto de sangue. >> não coube no numero de caracteres...rs
Boa leitura!



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- Melanie, seja muito bem vinda ao meu humilde lar.

Lúcifer deixou sua voz gutural ressoar por todo o salão. Era uma bela voz, grave e agradável. Ele se colocou de pé e com um gesto mínimo, fez menção para que eu adentrasse o recinto. Devagar, retirei o capuz que cobria minha cabeça e vi como os olhos dele brilharam ao me ver. Ao seu lado, Lucius ficou inquieto.

De fato, eu não estava nervosa. Não estava arrependida ou com medo do que pudesse me acontecer. Não que eu pudesse enfrenta-los, nem mesmo com os poderes dos arcanjos que corria em meu corpo temporariamente, mas de algum jeito, eu sabia que era exatamente ali onde eu deveria estar. Respirei fundo e deixei o escudo que camuflava meus poderes cair, já não havia necessidade de mantê-lo. No mesmo instante, os cinco Príncipes ficaram agitados e todos, ao mesmo tempo, se voltaram em minha direção. Mas na mesma hora, Lúcifer levantou uma das mãos, como num gesto quase imperceptível, e os cinco, pararam imediatamente, ficando imóveis em suas posições.

- Fiquem calmos, meus fiéis guerreiros, Melanie e eu vamos apenas conversar. Não há necessidade de sangue. Venha minha jovem, não tema.

Eu o encarei decidia. Não o temia, ou a qualquer um. Caminhei em sua direção, passando pelo corredor feito das grandes tochas de fogo frio e dos corpos fortes dos guerreiros do Inferno, que apenas me acompanhavam com olhares famintos. Somente o som de meus passos contra o mármore negro podia ser ouvido.

De perto, Lúcifer era ainda mais impressionante. Era alto, de corpo esguio e perfeitamente vestido. No rosto de um homem de trinta anos de idade, ele era a perfeição, totalmente comparável à beleza infinita dos Arcanjos, mas com algo a mais. Ele esticou a mão e com um toque suave, acariciou meu rosto rapidamente.

- É especial, sem dúvida.

Suas palavras saíram baixas e eu apostaria dizer que foram apenas para si mesmo. Não me afetaram em nada.

- Diga-me, Melanie, a que devo a honra de tê-la em meu reino?

Meu olhar não conseguia desviar dele, era impossível, mesmo com Lucius tão perto de mim.

- Vim para fechar o portal que está permitindo a entrada de seus espectros no Reino da Terra.

Ele permaneceu calado, pensativo.

- Entendo... então, arriscou sua imortalidade para salvá-los?

- Sim. – respondi ainda encarando-o com firmeza.

- Melanie, eu devo dizer que admiro muito sua coragem e seu amor pelos humanos. – Lúcifer falou dando um passo para longe do trono e mais perto de mim – Embora, sinceramente, eu não consiga enxergar o motivo pra tanto.

Ele se virou e começou a andar lentamente na direção leste, onde havia um imenso vitral que dava uma visão magnânima do mundo fora das paredes de mármore.

- Você jamais entenderia. – falei simplesmente.

Ele riu e se virou em minha direção.

- Provavelmente. – ele disse, e depois de uma breve pausa, continuou – Mas infelizmente, sua missão, assim como seu sacrifício, foi em vão, querida Melanie.

Franzi o cenho e esperei por mais.

- Sei que vocês descobriram as palavras de Enoque e imaginaram que nós tivéssemos aberto o nosso lado... mas como pode ver, não o fizemos.

Dizendo isso, Lúcifer fez um gesto amplo com o braço, apontando para além do trono em que estava sentado. Atrás, no fundo do salão, havia uma estrutura diferente, grande, como um artefato antigo. A primeira vista, a impressão que tive era que fosse uma das pilastras do castelo, mas quebrada. Até que reparei no imenso triângulo invertido esculpido na pedra enegrecida. Era como a metade do símbolo que encontramos em Qumran, a metade de baixo, que representava o Submundo, a metade do portal para entrar no plano físico.

Sem nem reparar, eu parei de respirar. O objeto estava intacto.

- Mas... como é possível? – perguntei incrédula. Se não era a metade do Inferno que tinha sido rompida, então...

- Isso mesmo, Melanie, seus pensamentos estão certos. – Lúcifer falou alto, voltando a caminhar em minha direção e completando minha linha de pensamento – Não é a nossa metade que está aberta e sim a da Moradia Celestial.

- Mas... isso é impossível! – falei sem ar, sem querer acreditar nos fatos.

- Bom, felizmente, algum de vocês descobriu o pequeno segredo de Enoque e abriu a passagem de lá. Por isso meus espectros estão conseguindo ter acesso ao mundo dos humanos, mas, como vê, não é o nosso lado.

Eu estava em estado de choque. Se alguém no Paraíso estava mantendo a passagem aberta, então tudo tinha sido em vão... A única coisa que eles precisavam agora era de um sensitivo alfa para abrir esta passagem inferior e juntar os dois pontos. Assim, o portal estaria totalmente aberto, permitindo a invasão de todos os seres infernais para o mundo dos humanos. Tudo o que eles precisavam era de alguém capaz de abrir a outra metade e eu tinha acabado de entregar a eles de bandeja. Minha presença.

- Como vê, Melanie, sua presença aqui é bastante oportuna. – Lúcifer falou em tom sóbrio, e abrindo um sorriso profundo.

Senti um vazio no peito. Como aquilo podia estar acontecendo? Alguém no Paraíso tinha compactuado com os seres do Submundo? A troco de quê um ser Celestial abriria a porta superior? Minha mente estava um caos, eu estava perdida. Minha visita ao Inferno foi totalmente errada e, sem dúvida, planejada por eles, por Lucius, por Lúcifer. Eles sabiam que eu viria e sabiam que poderiam me usar para abrir a metade que falta. Tudo estaria perdido.

Então, eu ouvi mais uma vez a voz grave de Lúcifer cruzar o ar.

- Senhores, poderiam nos deixar a sós?

Todos o encararam. Os Príncipes do Inferno imediatamente acataram a decisão e saíram enfileirados. Nessa hora, encarei Lucius pela primeira vez, de verdade.

Ele ainda tinha os olhos lindos, que me enfeitiçavam, ainda tinha o corpo perfeito, que me chamava, ainda tinha sobre mim um poder imenso, mas pela primeira vez, eu consegui pensar por mim mesma. Consegui fazer meus sentimentos se acalmarem e fazer com que a atração inevitável que sentia por ele, não subisse a cabeça e não controlasse meu corpo. Eu consegui isso porque pensei em Miguel e senti dentro de mim a força de sua essência. Eu amava Miguel com todo meu coração e por esse amor, eu não deixaria Lucius me controlar novamente.

- Vejo que você mudou desde a última vez. – ele falou pra mim, com a mesma expressão de quando me raptou dos meus amigos e me usou naquele quarto de hotel. – Você não é mais a mesma, Melanie... está mais forte e muito mais encantadora.

As palavras dele me faziam tremer e relembrar tudo o que ele fez comigo.

- É que não estou só. Você não vai mais me controlar, Lucius. – respondi firmemente, com todo o controle que consegui ter.

Ele sorriu.

- Eu sei, sei que tem Miguel em você... ele está em você de muitas formas, Melanie e isso só torna tudo muito melhor.

Senti raiva. Uma raiva que vinha de dentro da alma. Pela primeira vez, eu senti vontade de matar alguém. Nossos olhares se mantiveram firmes até que Lúcifer nos interromper.

- Ah! Mais que falta de educação a minha, deixe-me apresentar minha família. – ele caminhou até mim e finalmente cortei contato visual com seu filho – Lucius, meu filho, que você já teve o prazer de conhecer, e sua mãe, Lilith, minha Rainha.

Dizendo isso, Lúcifer estendeu a mão na direção da mulher de vestido negro que ainda estava perfeitamente parada ao lado do trono. Era muito mais perfeita do que qualquer outra mulher que eu já tenha conhecido, anjo ou não. Ela sorriu rapidamente e inclinou a cabeça em uma pequena reverência a mim.

- É um prazer conhece-la, Melanie, Lucius me falou muito a seu respeito. Estou honrada.

Antes que eu dissesse qualquer coisa, Lúcifer voltou a tomar a palavra.

- Bom, o que você acha que vai acontecer agora, Melanie?

Eu olhei diretamente para ele. Eu sabia o que viria a seguir. Minha alma seria usada para abrir finalmente o portal.

- Me diz você. – respondi sem desviar os olhos. Lúcifer gostou da resposta.

- Bom, então eu digo. Você tem uma escolha a fazer, Melanie. Eu tenho uma proposta irrecusável a lhe oferecer.

- Não quero nada de sua parte. Suas propostas são ilusórias, eu não quero compactuar com os seres do Submundo.

- Apenas escute. – ele disse no mesmo tom, como se eu não tivesse falada nada – Eu não quero sacrificar sua alma pura para abrir o portal, como eu sei que está pensando.

Eu me sobressaltei, mas me mantive no lugar, eu sabia que tinha algo por trás disso. Então ele continuou, andando calmamente de um lado para outro enquanto dizia sua proposta indecente.

- Almas perdidas vêm pra mim a todo o instante, Melanie, e me fortalecem. Eu sei que você pensa que invadir o mundo dos homens e corrompê-los para que caiam no Inferno é o meu maior desejo, mas você está enganada. O mundo dos homens já está corrompido, eles o fizeram sozinhos. Cada ano que passa, mais e mais almas caem em desgraça e acelerar este processo inevitável, não faz parte dos meus planos. Eu tenho toda a eternidade para ver a humanidade se autoliquidar e se eu o fizer de forma rápida, não vou ter muito o que fazer depois, você não acha?

Não respondi, apenas continuei ouvindo suas baboseiras camufladas.

- A verdade, é que Lucius quer você e eu estou disposto a dar.

- Como assim? – perguntei-o diretamente. Nesse momento, a presença de Lilith e Lucius eram irrisórias, eu apenas tinha olhos e ouvidos para o Demônio.

- Eu não vou me aproveitar de sua ilustre presença para abrir meu lado do portal se...

- Se o que, Lúcifer? – perguntei sem demora.

- Se você aceitar ser dele por completo.

Não respondi, não respirei. Eu não fazia idéia do que fazer. Foi com muito custo que consegui falar.

- Você está dizendo que não vai abrir o portal, que vai poupar os humanos se eu aceitar ser... ser de Lucius?

Escolhi as palavras cuidadosamente. Eu sabia que com o Lúcifer tudo tinha que ser muito claro. O Demônio sabe ludibriar.

- Sim. – ele respondeu firmemente, me encarando – Aceite Lucius como seu amo e senhor por toda a eternidade e me conceda um pouco da pureza de seu sangue. Com ele, vou poder liberar apenas meus cinco Príncipes para o mundo dos humanos, ao invés de toda minha legião. É isso o que proponho para manter o portal fechado.

Minha respiração estava acelerada. Ao meu lado, senti a euforia de Lucius. Lilith permanecia parada como uma estátua perfeita.

- Por que você quer libertar seus príncipes? – perguntei, lembrando da história que ouvi de Miguel sobre o poder desses guerreiros.

- Bom, eles me foram leais por eras e foram aprisionados pelos Arcanjos junto a mim. Então, eu acho justo permitir a eles uma revanche. Além disso, estarei libertando apenas cinco demônios no mundo dos humanos, apesar de ter a chance de libertar todos eles... você não acha uma preço baixo a pagar?

Eu não sabia o que pensar. Lúcifer tinha a chance de me usar para abrir o portal que deixaria todos os demônios com livre acesso aos humanos, mas estava jogando isso fora, apenas pedindo em troca a liberação dos cinco príncipes e de minha eterna subserviência a Lucius. Eu não entendia o jogo dele. Sabia que, no fundo, Lúcifer não estava perdendo, pelo contrário. Os cinco guerreiros eram o que ele tinha de mais poderoso, sozinhos, poderiam acabar com a humanidade, mas ainda havia os Arcanjos que estavam na Terra. Os três poderiam enfrenta-los, mais uma vez, e teríamos uma chance. Em troca, eu apenas teria que me sacrificar e aceitar Lucius pra sempre.

Escolhas... tudo dependia de minha palavra. Céus...

Senti lágrimas quentes escorrerem por meu rosto gelado do clima infernal. Eu não tinha escolha. Se recusasse, Lúcifer poderia abrir o portal agora mesmo e, de um jeito ou de outro, todos estariam condenados. Se eu me entregasse a Lucius e apenas os cinco príncipes saíssem, os humanos ainda teriam uma chance de salvação.

- Eu aceito. – respondi – Aceito seus termos. Eu me comprometo a servir Lucius por toda a eternidade e apenas seus cinco príncipes são libertados. O portal permanece fechado e tudo se resolve entre os Arcanjos e seus guerreiros, que terão mais uma chance de batalha.

Vi o brilho nos olhos do demônio e eram superados apenas pela alegria quase palpável de Lucius. Eu não tive escolha.

- Muito bem – Lúcifer falou – estenda sua mão.

Eu o fiz e reparei que tremia levemente. Lucius ficou de frente pra mim e a segurou firme. Com um gesto que me pegou de surpresa, ele se curvou e a beijou delicadamente, como se estivesse realmente feliz em me ter.

Olhando pra cima, seus olhos claros brilhavam de alegria. Eu engoli o nó na garganta.

Lúcifer, então, materializou uma pequena adaga negra, muito fina e bonita. Pronunciando palavras em uma língua que eu já não reconhecia mais, ele pegou minha outra mão, a que não segurava a de Lucius, e fez um longo e dolorido corte na palma. Vi o sangue brotar em uma linha vermelho-vivo e o corte doía imensamente. Ainda pronunciando as palavras antigas, ele voltou a encostar a adaga no corte. O sangue em minha palma começou a ser sugado misticamente pela adaga e vi sua cor mudar do negro ao rubro lentamente, como se estivesse sendo preenchida com meu sangue... e estava.

No fim. Lúcifer sorriu e guardou o objeto maligno e Lucius soltou minha mão.

- Agora, o compromisso. – Lúcifer falou.

- Me dê sua mão, Melanie... – Lucius falou alegremente.

Eu voltei a estender a mão pra ele, mas Lucius sacudiu a cabeça em negação.

- Não essa... a outra.

Ele se referia a mão cortada, que ainda sangrava e doía. Eu o fiz e Lucius retirou sua própria adaga das vestes. Com ela, fez um corte em sua própria palma. Então, uniu-a a minha. Ele pronunciou algumas palavras e senti um vento gélido nos rodear. Era um pacto de sangue, do qual eu não poderia sair jamais.

- A partir de agora, você me pertence. – ele falou com um orgulho desmedido na voz e nos olhos.

Meu coração doía tanto, que eu inconscientemente não me permiti pensar em Miguel. Eu não queria sequer pensar na dor que causaria a ele. Não consegui pensar na dor que era ter que me afastar de seu amor.

Senti um formigamento forte no dedo anelar e vi uma mancha se formar, queimando minha pele. Quando terminou, Lucius soltou minha mão. Não havia mais sangue, nem na mão dele, nem na minha. Em meu dedo anelar, havia uma tatuagem finíssima, que se parecia com um anel escarlate. Era a marca de meu compromisso eterno com Lucius. Estava acabado.

Um silêncio caiu no salão e pra mim, era como se minha vida estivesse chegando ao fim.

- O que acontece agora? – perguntei sem esperanças, encarando o chão de mármore.

- Você volta pra Terra. – Lúcifer respondeu – Avise do ocorrido aos Arcanjos. Daqui a três dias, quando o tempo for propício, vou abrir o portal e permitir a passagem dos Príncipes para o plano terrestre. Seus amigos devem estar preparados, pois meus guerreiros querem sua revanche. Você poderá batalhar ao lado deles, se quiser, mesmo não sendo mais imortal. No final da batalha, ou em qualquer momento que Lucius requisitar, independente de qual lado saia vencedor, você vem cumprir o outro lado da promessa e vem servir a ele por toda a eternidade.

Respirei fundo, tentando conter minha aflição. Eu tinha que voltar, dizer à Miguel e aos outros para se prepararem para a batalha contra os príncipes. E depois... depois eu voltaria ao Inferno para viver com Lucius pra sempre. Essa foi minha escolha.

Acenei com a cabeça e encarei Lucius sem dizer nada. Ele tinha conseguido o que queria, afinal. Virei as costas e comecei a caminhada de volta. Eu tinha que voltar para o portal, para a realidade que me aguardava na Terra.


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Notas finais do capítulo

Bom, como prometido, começarei o projeto de bonificação. Pra este cap, quem deixar um review com sua opinião eu tenho um bônus extra, que deixarei por MP.
:D
Reviews??