Signatum escrita por MilaBravomila


Capítulo 27
Capítulo 26 - A noite beduína - nas dunas do deser


Notas iniciais do capítulo

Gente, desculpem a confusão. Só hj reparei que eu pulei um cap na postagem. este é o verdadeiro cap 26, antes das Mil e uma noites. É que posto em dois lugares doferentes e achei q tivesse postado aqui, mas me confundi... espero que agora as coisas não fiquem tão desconexas.. rs
bju



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De repente, como num piscar de olhos, nós já não estávamos em Israel num luxuoso quarto de hotel. Estava sol e muito quente e tudo a nossa volta era areia e vento. Mal senti a areia sob meus pés quando ouvi a voz de Miguel atrás de mim.

- Já pode soltar.

Foi então que reparei que as palavras dele não foram para mim, mas para Gabriel que, sorrindo ironicamente, me libertou de seu aperto.

Estávamos a céu aberto, sob uma duna de areia e no meio de um deserto quente. O vento soprava grãos que incomodavam a visão.

- Onde estamos? – perguntei, percebendo que todos estavam bem.

- Bom, estamos a mais ou menos sete milhas de Dudael. – Miguel respondeu batendo o excesso de areia de sua roupa – não pudemos nos aproximar mais porque os seres inferiores sentiriam nossa presença.

- A partir daqui, teremos de andar até lá. – Rafael complementou olhando para o horizonte ao norte.

- Eu posso entender porque aqui é a porta do inferno, esse calor é absurdo! – Harper falou.

Eu ri baixinho com sua observação e me aproximei de Miguel. Tanto ele quanto os seus irmãos estavam com roupas pesadas, como calças e casacos, mas não pareciam se importar com o clima. Eu, Harper e Jules é que sentíamos o calor descomunal da região.

- Bom, é hora de dizer adeus aos poderes de Arcanjo então. – Gabriel falou em tom debochado.

- Como assim? – perguntei a Miguel.

- Nós vamos ter que nos camuflar, esconder nossa identidade para podermos nos aproximar ao máximo de Dudael sem sermos reconhecidos pelas sentinelas que guardam a entrada do lugar. – ele esclareceu.

Então os três fecharam os olhos e se concentraram por alguns segundos. Quando Miguel voltou a me encarar, eu soltei uma pequena exclamação de surpresa. Seus olhos antes dourados, estavam verdes, tão verdes e lindos que me fizeram arfar. Era como se ele fosse um anjo comum, ou até mesmo um humano, era incrível.

Ele sorriu levemente em minha direção e eu me recompus. Rafael e Gabriel também estavam diferentes. Os olhos de Rafael eram castanhos profundos e os de Gabriel azuis tão claros que beiravam ao branco, igualmente belos.

- Incrível! Eu... quase não percebo mais a presença de vocês. – Harper falou boquiaberta.

- Bom, essa era a intenção. – Gabriel soltou, irônico – Agora, por favor, temos que nos apressar e achar um abrigo antes que anoiteça. Vocês não vão querer saber como é a noite do deserto.

Dizendo isso, Gabriel rumou para o norte e todos nós fizemos o mesmo. Sete milhas era um bom pedaço para percorremos e eu não fazia idéia do que esperar.

A caminhada foi difícil. Nós subíamos e descíamos pelas dunas intermináveis de areia. O suor e o cansaço pesavam em nossos corpos humanos, especialmente no de Harper, que apesar das dificuldades, se manteve firme.

- O que nos aguarda em Dudael? – perguntei a Miguel, que caminhava ao meu lado.

- Bom, normalmente, existem muitos expectros sentinelas nas entradas de Dudael que apenas avisam sobre a aproximação de seres da luz na região, mas com essa situação, eu não sei o que podemos esperar. Provavelmente, teremos companhia.

Ele respondeu e esticou a mão para mim. Com sua ajuda, escalei uma das dunas mais altas que encaramos. Lá de cima, pudemos ver uma pequena vila por perto, que ficava em nosso caminho. Haviam tendas  e muitos animais grandes e pequenos e várias pessoas realizando inúmeras atividades. Era uma comunidade simples e pequena, bem no meio do deserto.

- São beduínos. – Miguel me explicou – É um povo simples e resistente que vive no deserto e tenho certeza de que nos acolherão esta noite.

Eu o encarei e sorri. Era impossível não fazê-lo com aquele verde tão lindo me encarando. A mão dele ainda segurava a minha e senti os dedos dele se entrelaçarem aos meus. Meu coração acelerou com esse gesto. Sem deixar de encará-lo percebi que os outros seguiram duna abaixo, na direção do pequeno povoado e, instantes depois, Miguel e eu fizemos o mesmo.

...

Nossa chegada ao pequeno acampamento foi um acontecimento. Várias pessoas se aproximaram e falaram ao mesmo tempo. As crianças e as mulheres nos analisavam e tocavam, testando nossas roupas e admirando nossos cabelos. No geral, eram gente bem simples, com roupas e tendas feitas de peles de animais. Os homens tomavam mais distância e todos falavam ao mesmo tempo uma língua que eu não conhecia, mas que com certeza os Arcanjos estavam entendendo.

Rafael e Miguel tomaram a frente e logos começaram a conversar com os homens da tribo. Melanie, Jules e eu ficamos mais pra trás e Gabriel, como sempre, estava alheio às coisas, com uma cara de tédio.

- Eles vão nos acolher esta noite. Poderemos comer e descansar aqui antes de terminarmos a viajem para Dudael. – Miguel falou olhando para nós.

Nessa hora, muitas crianças correram até nós e pegaram em minhas mãos, puxando a mim e a Melanie para perto dos animais. Olhei de relance para Jules que sorriu e me deu um tchauzinho... não é que o miserável estava achando graça daquilo!

- O que eles estão fazendo? Perguntei assustada à Melanie, que parecia estar se divertindo.

- Fica tranquila. Eles querem apenas nos presentear. – ela falou sorrindo.

Então as crianças nos colocaram sentadas em pequenos bancos rústicos, dentro de uma tenda enorme feita de peles costuradas de animais.

- Você está entendendo o que eles estão falando? – perguntei a ela, incrédula.

- É claro! Anjos sempre compreendem os humanos, não importa o idioma que falem. Como acha que aprendi sua língua?

OK, se ela não fosse Melanie, acharia que o tom que ela usou foi de zoação com a minha cara. Mas peralá, como eu ía saber que anjos falam qualquer língua humana?

Bom, nem tive tempo para pensar nisso, pois três mulheres já estavam em cima de mim, trabalhando em meus cabelos e roupas. As crianças cantavam e dançavam a nossa volta, na enorme tenda, enquanto eu e Melanie servíamos de bonequinhas de enfeite. Fala sério, o mundo acabando lá fora e eu aqui servindo de brinquedo de enfeite para crianças beduínas, só podia ser sacanagem.

Ficamos bastante tempo lá dentro e eu posso dizer até que comecei a achar as crianças engraçadinhas. Eu e Melanie estávamos repletas de adornos no pescoço e enfeites nos cabelos, além de pinturas nos olhos, braços e boca. Então uma senhora veio até nós e todas as crianças e moças se afastaram, em reverência à velha. Ela parecia tipo a matriarca do local. Caiu silêncio sobre a antes agitada tenda e só então eu pude ouvir um barulho vindo lá de fora. Eram como tambores.

Ela nos olhou firme dentro dos olhos. Sua pele trazia muitas rugas e marcas de expressão e seu caminhar era lento e doloroso. Mas sem dúvida, essa mulher era muito forte. Eu podia sentir a força de seu espírito vindo até mim e era muito mais forte em seus olhos negros como a noite. Ela tinha o rosto duro, mas sua aura era pacífica.

Ela esticou o braço, quando estava bem perto de mim, e alisou meu rosto. Despois fez o mesmo com Melanie. Então a velha começou a falar aquele idioma estranho e curioso, bem arrastado, e Melanie a traduzia pra mim. Todos prestavam a maior atenção em suas palavras sábias.

- Ela diz que nós somos enviados do Senhor dos Tempos. – Melanie falou ao meu lado, prestando atenção nas palavras roucas – Eles sabem que o mundo está em perigo, o vento os avisa a cada instante, eles leem nas nuvens. O mal está forte e cada vez mais presente entre nós. Eles sabem que somos diferentes. Ela diz... que vão rezar por nossa vitória.

Caramba, eu tenho que admitir que fiquei arrepiada com as palavras da senhora. No fim, ela se retirou e outra senhora, não tão velha, se aproximou.

- Eles estão nos convidando para o banquete de agradecimento. – Melanie traduziu a senhora, que estendia o braço para a saída da tenda.

- Bom... diz a ela obrigada por mim. – falei, levantando e seguindo as outras mulheres que faziam uma fila indiana para sair do lugar.

Melanie e eu entramos na fila e nos misturamos às demais mulheres e crianças. Assim que saímos de lá, pude ver uma enorme fogueira, bem no centro do acampamento. A noite estava começando a cair e a temperatura já não era tão horrível, pelo contrário. O céu enorme já mostrava seu cortejo de estrelas, mesmo sem o dia ter chegado totalmente ao fim. Os homens estavam sentados, rodeando a fogueira na qual estava sendo assado um enorme animal.

Reconheci imediatamente Jules e os Arcanjos, que estavam ao lado dos chefes beduínos, sentados no tronco principal. Jules sorriu pra mim e eu anotei mentalmente que se ele fizesse alguma piadinha sobre minha aparência, ele ía me pagar, sendo anjo ou não.

Os tambores começaram um ritmo mais frenético e as pessoas dançaram. Mesmo sem entender nada do que era dito e cantado, eu sentia alegria vinda daquelas pessoas simples do deserto. Eu sentia que eles viam em nós, esperança. Por um momento, eu me deixei levar por aquele sentimento e dancei junto com eles.

...

Ela estava linda. As beduínas tinham feito tranças e mechas em seu cabelo longo e ondulado e pintado seu rosto, mas tudo isso só serviu pra deixa-la mais perfeita. O sorriso no rosto de Melanie acendia em mim algo tão forte que era quase tangível.

Então, o chefe dos beduínos, com o qual havíamos passado as últimas horas, deu o sinal que todos esperavam e a música se tronou mais agitada. As mulheres e crianças dançavam ao redor da fogueira e agradeciam com seu canto ao Pai por ter nos enviado. Os povos do deserto sempre foram muito sábios e perspicazes, mesmo sem a tecnologia e instrumentos das cidades. Eles sentiam a natureza e sabiam quando algo de importante acontecia no mundo. Eles também nos sentiam, mesmo que eu e meus irmãos estivéssemos camuflando nossas auras.

Aos poucos, os demais iniciaram a refeição e alguns dos mais velhos se juntaram a dança. Harper e Melanie vieram até nós.

- Estão lindas. – falei sorrindo para as duas.

- Muito engraçado. – respondeu Harper, se virando e indo até Jules.

- Obrigada. –Melanie agradeceu.

Antes que eu pudesse dizer qualquer outra coisa, um garotinho veio e puxou a mão de Melanie, que, sorrindo, se deixou levar por ele. Eles dançaram bastante e ela sorria lindamente, aprendendo os passos que ele a transmitia. Vendo aquela cena entre eles eu senti tanta urgência... senti urgência em acabar com tudo o que estava acontecendo, em afastar todo o mal da vida das pessoas, da vida dela. Eles não podiam vencer... eu não deixaria que eles levassem embora essa alegria e inocência.

Senti Gabriel se aproximar e só então percebi que mantinha os punhos cerrados. Afrouxei meu aperto.

- Está com ciúmes do garoto também, irmãozinho? – ele perguntou encarando a mesma cena que eu.

- Você não consegue sentir nada quando olha pra isso, Gabriel? – eu perguntei encarando-o – Você não se sensibiliza com nenhuma dessas coisas?

Ele suspirou e me retornou em seu habitual tom sarcástico.

- Se eu não o fizesse, não estaria aqui, não é?

- Mas você não veio por eles... veio porque sentiu que era obrigação.

- E não dá no mesmo? – ele me perguntou, sorrindo debochado, como sempre.

- Não. A obrigação da batalha não é a melhor arma, Gabriel. Você precisa proteger aquilo que você ama e acredita, essa é a razão pela qual luto.

Ele deu de ombros. Gabriel sempre foi um mistério para todos nós. Ele nunca parecia se importar com nada de verdade. Era certo que amava e seguia os ensinamentos de nosso Pai acima de tudo e quando tinha uma missão a cumprir, era determinado e eficiente, mas eu nunca vi em seus olhos o calor e a entrega de uma verdadeira luta.

Então Melanie se aproximou, com seu pequeno parceiro de dança, que não soltava a mão dela por nada.

- Bom, eu não sei o porquê, mas ele insiste em falar com vocês. – ela disse, sorrindo e intrigada com o pequeno.

Eu me abaixei e encarei o menino. Ele era magro e franzino, mas tinha as feições de quem já batalhou muito na vida. No auge de seus dez anos, ele já tinha enfrentado desafios de gente grande nesse acampamento. O pequeno beduíno se dirigiu a mim e a Gabriel, que estava de pé ao nosso lado.

- Diga, pequeno, o que quer nos dizer? – perguntei, também curioso.

O menino inflou o peito e disse em sua voz infantil e determinada:

- Quero desafiar vocês pela mão de minha princesa.

Melanie também se ajoelhou e eu fiquei sem reação, apenas sorri. Era tradição da tribo os homens desafiarem seus concorrentes para um duelo para conseguirem suas esposas e como Melanie tinha vindo acompanhada por nós, ele pensava que ela era nossa.

O garotinho se manteve firme, me encarando nos olhos. Estava certo do que queria. Melanie, não compreendeu direito suas intenções.

- Desafio vocês pela mão de minha princesa, vocês aceitam, forasteiros? – ele voltou a desafiar a mim e Gabriel, que olhou para baixo para encará-lo.

- Você está nos desafiando, pequeno? – meu irmão perguntou.

- Sim, estou. – o menino respondeu.

Gabriel se manteve sério, mas o garoto persistiu e se pôs a frente de Melanie para defender o que era dele.

- Bom, infelizmente, minha amiga não pode casar com você, jovem guerreiro. Ela está em uma missão importante e nós partiremos pela manhã. – eu falei antes que Gabriel espantasse o jovem.

Ele continuou me encarando, mas vi uma tristeza vaga em seus pequenos olhos. Melanie finalmente pareceu entender que o pequeno a queria ao seu lado. Ela chegou perto dele e lhe deu um beijo na bochecha, que paralisou o menino.

- Quando eu terminar minha missão, volto para te visitar. – ela disse.

- E casa comigo? – ele perguntou, olhando-a firmemente.

- Só se você puder vencê-lo. – ela disse me olhando rapidamente e eu sorri.

O garoto inflou o peito e me encarou com vigor.

- Então prepare-se guerreiro, quando retornar com minha princesa, eu o estarei esperando para um duelo.

Dizendo isso ele se retirou, pisando firme no chão. Melanie me olhou ruborizada e eu devolvi-lhe o sorriso.

- Acho que vou ter de enfrentar um grande guerreiro quando tudo isso acabar... – eu disse enquanto me colocava de pé.

Ela fez o mesmo e sorriu ruborizada. Antes de sair ela fitou Gabriel que estava impassível observando toda a cena.

- Seria mais fácil se ele desafiasse você, aí ele teria alguma chance. – ela disse para meu irmão, antes de sair.

Eu arregalei os olhos e Gabriel fez o mesmo. Jamais alguém tinha dito tais coisas a meu irmão. Achei sinceramente que ele fosse atrás dela para tirar satisfações e fiquei em alerta, mas ao invés disso, ele fez uma coisa que me surpreendeu. Gabriel riu, verdadeiramente.

Por todas as incontáveis eras que estive ao seu lado, nunca tinha visto Gabriel sorrir sem sarcasmo e ironia, era a primeira vez que ele sorria de verdade.

- É por isso que luto, meu irmão. – eu disse a ele, que ainda tinha um sorriso sincero na direção em que Melanie se foi.


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