Meu Malvado Favorito escrita por mulleriana, Nina Guglielmelli


Capítulo 22
Heroína x Vilão (2ª fase)




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- Papai! – Carlie chamou baixinho, sem querer acordar Emmett e Alice em suas camas.

Nós dois estávamos no chão, um colchão inflável ao lado do outro, mas ela estava cada vez mais grudada em mim, o que tornava o segundo colchão quase desnecessário. A luz do lado de fora da casa entrava por pequenas frestas da janela fechada.

- Papai, eu tive um pesadelo! – Sussurrou, dando alguns tapinhas em minhas costas.

Eu murmurei qualquer coisa contra o travesseiro, abraçando-o mais ao me ajeitar de bruços. Ela me chamou outra vez, quase deitada em cima das minhas costas

- Tudo bem... – Murmurei, virando de barriga para cima e puxando-a para meu peito. – Deite aqui e me conte. – Bocejei, sem abrir os olhos.

- Você virou um zumbi! – Ela sussurrou.

- Parece mesmo horrível...

- Um zumbi imortal!

Eu ri, sonolento, olhando-a pela primeira vez. - Isso seria estranhamente impossível. – Respondi.

- Parecia muito real pra mim! – Ela choramingou.

- Foi só um sonho, Carlie. Não tem nada demais. Durma. – Franzi a testa e fechei os olhos.

Ela deitou ainda mais pra cima, apoiando os braços no meu peito. Quando o silêncio perdurou por tempo demais, eu soube que havia algo errado. Abri os olhos outra vez e vi os dela me encarando bem de perto, com certa raiva.

- Não vou conseguir dormir agora. – Disse.

Eu gemi, passando uma mão preguiçosamente pelo meu rosto.

- Tá legal, o que você quer, então? – Perguntei ainda num tom baixo, ficando sentado no colchão.

Ela deitou ao meu lado e sorriu, segurando os próprios pés.

- Posso ir no porão? – Pediu com um bico.

- Ah, não, mesmo! Eu não quero aquela doida reclamando comigo depois!

- Mas paaaaai! – Ela sentou, segurando meus ombros para me olhar de perto. – É uma central de comando do FBI! Do FBI! – Ela enfatizou como se falasse de sua banda favorita, mas eu sabia que não entendia nada do assunto. - Quando eu vou ter essa oportunidade de novo?

- Não é “não”, Carlie. Aquilo não é lugar pra brincar.

- A Bella vai deixar! – Ela mostrou a língua.

- Ah, é? – Eu ri. – Da próxima vez que estiver com fome, então, vá chorar pra Bella!

- Ela cozinha bem melhor do que você, mesmo! – Ela riu de volta, afundando o rosto no travesseiro por um longo tempo em seguida. – Estou com sede.

- Você acha que eu sou idiota, Carlie? – Perguntei, divertido. – Eu vou até a cozinha e você escapa correndo para o porão.

- Não, papai! – Ela ficou de joelhos de repente, cruzando os dedos indicadores e os beijando. – Eu juro juradinho que vou ficar bem quietinha aqui!

- E em silêncio. – Respondi, sinalizando os dois na cama.

Ela selou os lábios um no outro e assentiu, deitando outra vez em seu colchão. Eu levantei com um suspiro e saí do quarto. A luz atingiu meus olhos com força, e eu os cerrei, incomodado. Devia ter dormido mais do que o necessário; pensei que acordaríamos para o almoço, mas o Sol já estava baixo no céu.

Desci as escadas e me apressei em direção a cozinha, mas, ainda na sala, vi Renée sentada a mesa do almoço, lendo. Ela não deixaria todo aquele equipamento sozinho para relaxar assim – deduzi que Bella estava lá embaixo, então, em seu lugar. Sem ser visto, voltei alguns passos e desci.

Ela não demorou muito para notar minha presença, apesar de estar muito atenta aos números que rodavam numa das telas. De seu notebook, ligado perto da escada, saia uma música muito baixa que não reconheci.

- Aposto que não acordou por vontade própria. – Ela comentou sem me olhar, mantendo os braços cruzados no peito.

Eu ri e me coloquei ao seu lado, relaxando as mãos nos bolsos e encarando a mesma tela, sem entender nada do que lia.

- Carlie pode ser muito persuasiva quando quer. – Respondi.

Ela não respondeu e tampouco me olhou. Eu franzi a testa e encarei seu rosto.

- Você deveria relaxar um pouco, de vez em quando.

- Eu não tenho tempo pra isso. – Ela rebateu.

Abri a boca para retrucar, mas ela logo cortou. - Você é que deveria prestar mais atenção às coisas a sua volta. – Disse. – É tão tapado que não sei como sobreviveu tanto tempo como criminoso.

Eu ri alto, inclinando um pouco a cabeça para trás. Antes que eu pensasse em uma resposta a altura, ela fez um movimento rápido em minha direção, e minhas costas estavam no chão. Arregalei os olhos e respirei fundo com a dor da batida. Ela riu, segurando meus braços presos nas laterais do meu corpo.

- Golpe baixo. – Murmurei.

- O básico de um bom herói: Conhecer todos os truques do vilão. – Bella respondeu, estendendo a mão e me ajudando a levantar.

Com outra risada baixa, ela se afastou um pouco de mim e se aproximou de um pequeno painel, digitando um código no teclado. A imagem acima mudou para a vista aérea de uma rua ao vivo (portanto, anoitecia, e era realmente lindo de se ver), e eu a reconheci como sendo de Seattle.

Eu gastei muito tempo observando a garota enquanto voltava ao trabalho; Bella sempre mantinha o foco no que fazia, e por isso eu não ficava impressionado em ver que era tão boa em tudo. Eu já nem percebia mais a música em meus ouvidos, mas tive que voltar a prestar atenção quando reconheci a nova melodia.

( Billy Joel – Vienna http://www.youtube.com/watch?v=x-JxaxjZAc0 )

Ela continuou parada, analisando as imagens. Eu me aproximei devagar e desci alguns dedos delicadamente por seu braço, até sua mão. Ela virou o rosto, confusa, e eu sorri.

- Relaxar. Lembra-se? – Perguntei, virando seu corpo e a puxando para mim.

Ergui nossas mãos quase na altura de nossos ombros, e a outra foi apoiada na curva de sua cintura. Ela colocou a mão livre em meu ombro a contragosto, e relutou um pouco quando comecei a guiar o ritmo de nossa dança, tão lentamente quanto a música.

Ela encarava meus olhos com uma seriedade estranha; eu, por outro lado, sorria de um jeito quase zombeteiro, vendo o quão desconfortável ela estava. Não que fosse uma má dançarina – ela só não aceitava a ideia de estar se distraindo quando havia tanto por fazer.

Afastei-me e ergui sua mão, fazendo com que girasse. Isso arrancou um sorriso dela. Quando seu corpo voltou para o meu, ela começou a me acompanhar, então. Nós girávamos pelo local completamente inapropriado para isso num ritmo até mais rápido do que a música exigia. Após outro giro, eu deixei que seu corpo caísse para trás e a segurei até que quase atingisse o chão. Bella tombou a cabeça para trás e riu, voltando devagar para perto de mim.

Seus braços envolveram meu pescoço e ela apoiou o rosto em meu ombro. Diminuímos o ritmo da dança, quase parando. Ela suspirou, e então voltou a me olhar, séria novamente.

- Você sabe a resposta. – Disse.

Eu franzi a testa numa pergunta muda, envolvendo sua cintura com meus braços.

- Você sabe porque eu fiz isso. – Completou devagar. – Sabe porque estive o tempo todo na cadeia com você, porque cuidei de Carlie, porque o alertei sobre o orfanato e porque o ajudei a fugir.

Nós paramos a dança numa sincronia silenciosa, sustentando o olhar um do outro como se não houvesse mais nada a nossa volta.

- Eu fiz tudo isso porque eu... Porque... Porque a minha vida toda foi dedicada ao meu trabalho. Prender e atirar em bandidos, achando que estava fazendo justiça. Mas você... – Ela franziu a testa, acariciando meu cabelo quase em minha testa. – Você não é só isso. O que você fez por essa menina! Você tem um coração, Edward, e eu não podia perdê-lo, independente das consequências disso.

Eu fiquei em silêncio, prestando atenção as suas palavras com um sorriso anestesiado em meu rosto. Meu coração pulava dentro de mim.

- Eu... – Ela começou a dizer em um murmúrio.

- Eu sei. – Cortei, e sorrimos juntos.

Ela se aproximou ainda mais e colou os lábios nos meus, subindo uma das mãos por meu cabelo. Aquele foi nosso beijo mais calmo, até tal momento. Ouso dizer que deveria ter sido o primeiro. Não sei quanto tempo durou, e eu realmente não estava preocupado com isso. Mas... É claro.

- Ei! – A voz infantil me fez sorrir, mas não a soltei. – É que você veio buscar água?

Bella riu, virando o rosto para encarar Carlie. Eu fiz o mesmo; ela ficava linda brava, com os braços cruzados no peito e seu cão de guarda sentado ao seu lado.

- Eu não disse para ficar quietinha lá em cima? – Perguntei, divertido.

- Mas eu estava com muita sede! – Enfatizou, dobrando os joelhos.

Eu soltei Bella delicadamente e me aproximei de minha filha, apoiando as mãos nos joelhos para encarar seu rosto bem de perto. Quando ela menos esperava, eu a ergui, colocando-a de ponta cabeça em meu ombro.

- Vamos beber água, então! – Disse.

Ela gritou e segurou em meu quadril, gargalhando durante todo o caminho até a cozinha.

(...)

O tempo que Bella tirou para relaxar foi mais longo do que podíamos esperar, já que ela não resistia aos pedidos de Carlie. A casa de Renée tinha uma enorme piscina no quintal dos fundos (nós gastamos um bom tempo limpando tudo, pois há muito tempo não era usada) e a menina enlouqueceu assim que se deu conta disso. Já era noite, mas todos – com exceção de Bella e sua mãe – haviam dormido o dia todo. Mesmo porque, numa casa onde há uma criança pilhada, ela é quem comanda os horários de sono de todos. Eu me perguntava como Bella ainda não havia desmaiado em sua cama; Carlie devia estar deixando-a exausta.

Alice estava com elas, brincando na água. Ela era boa com crianças quando queria. Emmett estava dentro da casa, recebendo um telefonema de Rosalie, e Renée voltara para o porão. Eu pretendia entrar na água, também, mas a cadeira que encontrei próxima dali me pareceu mais convidativa. Jacob concordou, deitando aos meus pés. Eu observava, sorrindo, as três dentro da piscina. Carlie estava tão feliz.

- Vocês estão com fome? – A voz de Renée me tirou de meus devaneios, bem ao meu lado.
Processei a pergunta durante alguns segundos, e então ri, indicando que não com a cabeça.

- Carlie teria reclamado. – Eu disse.

- Esses monstrinhos só reclamam quando param de brincar, acredite. – Ela respondeu, sentando na grama ao meu lado e olhando para a piscina também.

Após algum tempo, suspirou, acariciando a cabeça de Jacob.

- Acho que é disso que essa casa estava precisando. – Ela me olhou de canto, sorrindo. – Eu fico o tempo todo lá embaixo, trabalhando... É sempre muito silencioso por aqui.

- Você fica sempre sozinha? Nunca pensou em se casar de novo? – Perguntei, interessado.

Achei que ela me julgaria intrometido, mas continuou o assunto tranquilamente.

- Para o meu trabalho, é necessário ser sozinha, Edward. – Ela riu baixinho. – Não é tão ruim. Eu me orgulho do que faço. E eu já fiz minha parte com Bella.

Eu a analisei de longe, e sabia que Renée estava fazendo o mesmo.

- Não preciso de mais nenhum marido ou filhos. – Completou. – E agora, pelo jeito arrumei uma neta.

Nós rimos juntos (eu fiquei um pouco desconfortável, sem saber se ela estava ciente do que acontecera há pouco tempo), e ela deu os ombros em seguida, suspirando.

- É bom para ela... Foi muito difícil quando... Você sabe.

Franzi a testa, não entendendo onde ela queria chegar.

- Desculpe. O que? – Perguntei.

- Ah, ela com certeza já contou a você. A gravidez e tudo o mais.

Eu paralisei, mas ela não percebeu a gafe que havia cometido.

- Eu não me lembro dela ter mencionado nenhuma... Gravidez. – Murmurei.

- Ah, já faz alguns anos. – Ela começou a contar, como se falasse sobre o tempo. – Ela namorava um traste, colega de trabalho. James. Ela engravidou, e ele terminou com ela. Mas ela estava tão feliz... Sempre foi o sonho dela, sabe? Uma família. Mas, então, quando ela perdeu o bebê, descobrimos... Vai ser muito difícil ela ir até o fim com uma gravidez. Seu corpo simplesmente não aguenta! Pobre menina...

Agradeci por Renée não estar me olhando enquanto narrava tudo aquilo, porque minha expressão não era das melhores.

- Depois disso, ela ficou realmente frustrada. E sua dedicação se tornou toda para o seu trabalho e para o FBI. Ganharam uma ótima agente, é claro, mas...

Ela continuou tagarelando por algum tempo, mas eu não ouvia mais. Era como se uma lâmpada tivesse se acendido em minha cabeça. Toda a explicação estava aí. Havia uma outra Bella por trás dessa, mais doce e mais tranquila, e eu adoraria conhecê-la.

- Acho que Carlie iria gostar se eu assasse alguns biscoitos para o jantar. – Renée falou quase consigo mesma, levantando e se afastando para dentro da casa.

Eu continuei paralisado, observando Bella de longe enquanto minha cabeça formava mil imagens diferentes; eu me senti mal por ela ao imaginar como deveria ter sido frustrante ter seu maior sonho interrompido dessa maneira. Mas agora ela tinha Carlie... E eu.

Foi naquele momento que, como qualquer homem apaixonado, jurei dar a ela tudo o que ela quisesse.

Contando-lhes essa história agora, sou só um velho que se emociona fácil demais. Mas, quando se trata de Bella, essa cabeça ainda lembra de todos os detalhes. Eu fiz tal promessa como tantas outras que os jovens e tolos fazem; essa, em especial, eu cumpri. Enquanto pude, pelo menos.

Eu compreendo o que vocês realmente querem saber. Também ficaria bastante curioso ao acompanhar a história de um casal tão complicado; quando finalmente acabamos por ficar juntos? Acredito que “juntos” nós sempre estivemos. Conectados. Desde a primeira vez que eu encontrei seus olhos e ela logo percebeu as segundas intenções por trás da minha aproximação.

Naquela mesma noite na casa de Renée, Carlie demorou a dormir. Nós a acompanhamos, é claro. E realmente tivemos biscoitos para o jantar. Eu receava um pouco tanta insanidade da parte dela perto de minha filha mas, se não fosse por isso, eu nunca teria descoberto aquele segredo de Bella, e nunca teria tido tanta certeza do que queria.

Já quase amanhecia quando a menina finalmente desmaiou em sua cama, entre Alice e Emmett. Renée, que descansara por algumas horas, assumiria o posto no porão enquanto voltávamos a dormir mais um pouco. Bella pegou minha mão e me puxou para seu quarto casualmente, como se já fizéssemos isso todas as noites.

Ela fechou a porta e me beijou, tão calma quanto antes. Eu retribuí apenas esperando o momento em que, novamente, ela me puxaria desesperadamente. Pelo contrário; nós não tínhamos porque ter pressa. Despimos-nos já conhecendo o caminho por onde nossas mãos passavam, e eu a carreguei para a cama, me entregando as sensações familiares que só ela conseguia provocar em mim.

Foi um dos sentimentos mais estranhamente satisfatórios que já senti. Era como se já estivéssemos acostumados a fazer isso milhares de vezes, e não só pela segunda. E, ao mesmo tempo, parecia a primeira. Porque, de fato, foi completamente diferente. Não havia mais disfarces. Nós nos amávamos, sem mais mentiras; deixamos cair as máscaras e nos apaixonamos por quem realmente éramos – a heroína e o vilão.


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Notas finais do capítulo

Finalmeeeeente o capítulo tá online! Tenho que pedir desculpa pela demora (como sempre), mas não tá fácil, quando eu quero escrever não tenho tempo, quanto tenho tempo fico sem inspiração... Mas de pouco em pouco a história sempre continua, e não se preocupem que nós nunca abandonaríamos nossa fic! Sobre a o/s que eu tava devendo, eu comecei a escrever, mas ficou tão tão legal que ela não tá mais com tamanho de o/s HUAHUAHUAHAU Eu e a Nina estamos pensando nisso, se a gente transforma numa short fic ou sei lá... Aguardem. E, ah, vocês devem ter reparado na capa nova, né? Desde o começo eu queria uma foto assim, que representasse um desenho da Carlie, mas nunca tinha achado uma muito legal... É claro que essa não se compara ao que eu imaginei no "Mas que diabos está acontecendo comigo?", mas passa o sentimento infantil que eu queria. Enfim, espero que tenham gostado e aprovado a reconciliação do Edward e da Bella! Beijos ^^