Meu Malvado Favorito escrita por mulleriana, Nina Guglielmelli


Capítulo 13
Como se eu já não tivesse problemas o suficiente




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Freud, certa vez – e por agora me escapa em qual exato momento de sua vida –, após diversas publicações acerca do desejo sexual, destacou a importância do amor ligado a tal instinto. Ele afirmou que o prazer amoroso só é alcançado através de satisfação psíquica e física, e que estas duas condições, em algum momento, precisam se unir. Em outras palavras, seu pensamento nos levava a compreender que, mais cedo ou mais tarde, somente o prazer sexual não seria suficiente; mesmo que isso seja completamente natural, todo ser humano está condenado a buscar uma pessoa com quem realmente possa se relacionar além disso e, em certo ponto, uma relação que não passe de física se tornará insuficiente.

Creio que ele provavelmente se encontrou dividido diante de sua própria afirmação; de um lado, o psicólogo e seus estudos sobre a mente humana; de outro, o homem apaixonado. Você deve pensar, então, qual teria sido minha opinião sobre isso na época.

Tive muito tempo livre na cadeia para ler sobre diversos assuntos, mas nenhum do qual teria me interessado se não fosse por Bella (ainda chegaremos neste ponto da história, pouco antes de onde comecei a lhes contar tudo). Antes disso, no período de minha vida que estou narrando a vocês, seria difícil citar o nome de um único titulo que sequer segurei nas mãos.

Olhando para trás, não posso deixar de analisar. Eu estava perfeitamente bem com o estilo de vida que levava, até... Ali. É. Foi mais ou menos aí que as coisas começaram a mudar. Eu definitivamente não era do tipo que vivia em busca do amor, ou que sequer cogitava encontrá-lo. Mas ele estava prestes a me atingir em cheio.

Naquela noite, após o trágico encontro no parque de diversões, liguei para Tanya. Já estávamos “saindo” havia algum tempo, e eu não achei que teria qualquer problema em convidá-la para ficarmos em minha casa. Estavam todos dormindo, de qualquer forma (eu obrigara Emmett a passar a noite no sofá, sob algumas ameaças).

Seria o mesmo esquema de “sexo sem compromisso” de sempre; não tinha erro.

Mas teve. O pior que poderia acontecer.

Minha mente não estava ali. Porque... Não era ali que eu queria que meu corpo estivesse. Eu me recusava a sequer pensar na palavra inevitável: Apaixonado. Perdurou por horas; eu queria bater a cabeça contra a parede para ver se a imagem de Bella saia dali. Tanya já dormia ao meu lado há muito tempo, e eu continuava acordado, encarando o teto. Pensando nela, em seu sorriso, seu cheiro, até o jeito que arrumava os óculos ridículos no rosto e tropeçava em seus próprios pés. E, apesar da imagem que passava, havia uma personalidade forte por trás de tudo aquilo que me enlouquecia. Droga, ela era tão adorável.

Eu sabia que era errado o que estava fazendo, queria parar, mas na maior parte do tempo aquelas cenas repetitivas eram até confortantes. A noite passou (pelo menos, as horas dela em que eu deveria ter dormido) e o Sol começou a nascer e inundar o quarto. Ouvi alguns barulhos na cozinha, indicando que alguém já estava acordado. Eu permaneci ali; os braços embaixo da cabeça, os olhos grudados no teto, o mesmo rosto preenchendo minha mente.

Uma mão tocou meu peito, e eu estremeci por um segundo, pensando que meus devaneios haviam se tornado reais. Mas é claro que não.

- Bom dia. – Tanya sorriu, arrumando o corpo mais perto do meu.

Obriguei-me a voltar para a realidade. Forcei um sorriso fraco, virando o rosto o mínimo possível para encará-la.

- Bom dia... – Respondi num tom muito baixo.

Ela franziu a testa, deitada ao meu lado. - O que foi? Parece desanimado... – Ela fez um bico infantil.

- Só não dormi muito bem. – Admiti.

Ela riu, virando quase de barriga pra cima ao apoiar a cabeça em meu ombro.

- Pois eu tive uma noite ótima! – Respondeu ainda mais alto do que costumava falar.

Eu estava pretendendo ignorar tudo o que dissesse; era insuportável como Tanya só tagarelava coisas sem sentido. Não era nada parecida com Bella... Eu estava começando a voltar tristemente para aqueles pensamentos, quando fui surpreendido com um beijo eufórico.

Eu retribuí automaticamente, sem a menor vontade. Ela pareceu perceber, e só insistiu. Ficou por cima de mim, agarrando-se em meu cabelo e deixando o lençol aos poucos se esquivar de nossos corpos. Foi quando a porta abriu com violência.

- Tio Emmett não me deixa... – Carlie berrou as palavras manhosas enquanto eu nos cobria o mais rápido que pude.

Respirei fundo e sentei na cama a tempo de ver o olhar confuso da menina. Ela abraçou sua boneca junto ao peito e disparou pelo corredor.

- Edward... – Tanya começou a perguntar, segurando o lençol para lhe cobrir o busto. – Por que tem uma criança aqui?

Despertei como se um balde de água fria tivesse sido jogado em minha cabeça.

- O que? – Perguntei, levantando e vestindo a calça por cima da cueca. – Ah! Ela... É minha... Sobrinha.

- PAPAI, ELE NÃO QUER DAR O MEU CEREAL! – A pentelha gritou da cozinha.

Tanya ergueu as sobrancelhas e ficou em pé no mesmo segundo. Tentei desmentir tudo, mas ela logo estava trocada, saindo do quarto. Segui-a ainda sem camisa.

- Não acredito que mentiu pra mim! – Começou a discutir com a porta já aberta. – Por quanto tempo planejava esconder que tinha uma filha?

- Eu não estava escondendo. Só... Omitindo.

Fechei os olhos com o barulho do tapa que levei no rosto e, quando reabri, ela já atravessava a rua. Virei de costas para a porta e vi Carlie parada, me encarando tranquilamente. Desviei o olhar outra vez para a rua e, quando voltei, ela estava na mesma posição.

- Vamos ter uma conversinha. Sim? – Ela levou uma mão a boca e sorriu.

Fechei a porta antes de me sentar ao lado dela no sofá. A menina ajeitou a boneca sentada em seu colo, e ambas começaram a prestar total atenção em mim. – Certo. Carlie... Eu sou seu pai... Para todos os efeitos. Mas não deve me chamar assim. Meu nome é Edward. Ok?

Ela assentiu freneticamente, mas fiquei em duvida se realmente captara a mensagem.

- Ótimo. – Completei. – Quando ao... Ao... Que você viu. Aquela é Tanya. E nós... – Eu não podia acreditar que estávamos tendo “a” conversa. – Veja bem, quando... Dois adultos se amam muito, eles...

- Eu sei. – Ela cortou o que eu dizia, franzindo a testa. – Eles fazem sexo. – Completou como se fosse totalmente óbvio.

Fiquei parado, em uma espécie de choque. Ela percebeu que eu não pretendia dizer mais nada e se virou um pouco, ajeitando a boneca no colo como se fosse dormir.

- Mas você não deveria fazer isso com Tanya. Vocês não se amam. – Ela deu os ombros, falando no tom mais inocente que já ouvi sair de sua boca. - Você ama Bella.

- O que? – Quase gritei, franzindo a testa num nervosismo desnecessário. – De onde você tira essas idéias malucas?

Ela tentou contestar, da mesma maneira calma e segura, mas eu me levantei e cortei qualquer argumento que estivesse prestes a dizer. - Eu já estou cheio dessas coisas, sabia, Carlie? Eu não sei de onde vem essas suas idéias, mas saiba que está errada! E é bom você parar com essas asneiras se não quiser ficar de castigo!

Ela não fez a mesma expressão triste de quando levava uma bronca. Pelo contrário; acho que vi um sorriso no canto de seus lábios. Aquela monstrinha sabia muito bem do que falava. E o pior era que eu sabia muito bem do que estava ouvindo.

- Não está cedo demais para brigas? – Rosalie se aproximou, ainda usando uma camisola comprida. Ela cruzou os braços, olhando do meu rosto para o de Carlie. – Já tomou café, pequenina? – A loira sorriu, abaixando um pouco.

- Já, sim. – Carlie se colocou de pé e abraçou a boneca junto ao peito. – Tudo bem se eu levá-la para dar uma volta no parque? – Perguntou, erguendo a boneca para mostrar a quem se referia. – Ela disse que está com saudades de Bella...

- Não tem problema, querida. – Rosalie respondeu. Então, me olhou. – Tem?

- Não, tá, tá, vai logo... – Respondi, fechando os olhos e apertando minhas têmporas.

 A menina disparou para a porta, gritando uma despedida rápida para mim. Quando olhei para Rosalie, percebi que me encarava, parecendo curiosa.

- Bella não é a sua garota? – Perguntou.

- Não. Ela é uma garota, e não a minha garota. – Respondi dando ênfase na palavra.

- Pensei ter ouvido Emmett dizer que vocês estavam saindo...

- Você e Emmett não tem nada a fazer? – Perguntei num tom pouco amigável, indo direto para o quarto e vestindo a camisa da noite passada, amarrotada no chão. – Parecem duas velhas fofoqueiras!

- Eu teria mais o que fazer se pudesse sair por aí quando bem entendesse. Ele está fora agora, e eu tive que ficar aqui. – Ela deu os ombros, parando na porta do meu quarto e encostando no batente.

Eu a olhei de relance, calçando meus tênis preferidos.

- Você poderia “sair quando bem entendesse” – imitei uma vozinha ridícula ao falar – se o seu rostinho lindo não estivesse começando a aparecer em notícias demais. – Expliquei.

- Eu sei, Edward! – Rebateu, soltando um longo suspiro quando passei por ela. Percebi que estava me seguindo de volta para a sala. – É que ás vezes é um pouco entediante ficar aqui...

- Você reclama como se não tivesse nenhuma louça pra lavar, né?

Eu estava entrando na cozinha ao final da frase. Alice estava sentada a mesa, e soltou uma risada irônica com minha pergunta, lambendo a colher que usava para comer seu cereal com leite.

- A princesinha, botando a mão na massa? Essa eu queria ver. – Sorriu. Talvez fosse minha imaginação, mas ela parecia ter um piercing novo no nariz...

- Eu não tenho vocação pra dono de hotel. – Reclamei, pegando uma tigela e jogando um pouco de cereal nela. A caixa vazia foi para o lixo com uma mira perfeita.

- Hotel? Esse lugar está um nojo! – Rosalie gritou, parada a porta da cozinha.

Eu apoiei a tigela (ou quase joguei, como preferir) na mesa e virei pra ela. - Então trate de fazer alguma coisa você mesma, porque ninguém aqui tem tempo pra essas besteiras. Seria bom mesmo que você tivesse alguma utilidade nessa casa!

Minha voz provavelmente estava alta demais, porque Jacob latiu em algum lugar. Eu joguei meu corpo para que me sentasse a frente de Alice, começando a comer também.

- Cadê a porra da Carlie pra dar um jeito nesse vira-lata? – Perguntei de boca cheia.

- Ela saiu, ué. – Rosalie explicou, dando os ombros e voltando pra sala.

Ouvi a televisão ser ligada enquanto quase cuspia minha comida.

- Saiu? Pra onde diabos uma menina de cinco anos foi sozinha? – Gritei, olhando para a porta vazia.

- Ao parque. Ela tem oito anos. E você deixou. – A loira respondeu calmamente da sala.

- Ah... É... – A lembrança me veio de repente. Suspirei, voltando a me concentrar em meu cereal.

A risada de Alice me fez erguer a cabeça e encará-la, sério.

- Por que está tão irritado hoje, chefinho? – Perguntou, zombeteira.

- Não estou irritado. – Rebati, enfiando cada vez mais comida na boca.

- É claro que não. Então... Já fazem quase três meses... A quantas anda a aposta sobre a nerd? – Ela cruzou os braços e encostou na cadeira, fazendo a mesma ir um pouco para trás.

- Bella. – Corrigi.

- Agora ela tem nome? – Riu, tombando cada vez mais a cadeira.

- Ela sempre teve nome, Alice. - Rosnei; estava comendo como um animal apressado, quase colocando o rosto dentro da tigela. A colher que usava era certamente dispensável.

Fez-se um pequeno silêncio até que eu terminasse meu café. Percebi Alice me encarando, então, e parecia estar fazendo aquilo há muito tempo. Eu já conhecia aquela expressão.

- Quem diria! Edward Masen, o senhor “se eu te quisesse na minha cama você já estaria lá faz tempo”! – Ela tentou imitar minha voz, rindo alto em seguida. – Apaixonado! E por quem? Ai meu Deus, a Madre Tereza! Não é irônico?

- Cala a boca, Alice. – Adverti, encarando minha tigela vazia.

Ela não gostou nada do meu tom; o sorriso escapou de seu rosto no mesmo segundo. - Tá gostando mesmo da virgenzinha, não é? – Voltou a sentar corretamente, tentando encarar meu rosto cabisbaixo.

Eu demorei um pouco para me mexer, analisando os flashs que passaram por minha mente. Finalmente, fiquei em pé num salto, levando a tigela para a pia já um pouco cheia. Alice continuou sentada, me olhando perplexa.

- Não. – Respondi quase para mim mesmo, ainda que firme. Virei e encarei seus olhos com certa dificuldade. - Eu não estou “apaixonado” ou qualquer outra palavra que você queira usar. – Ao final da frase, fiquei novamente de frente para a pia, jogando água nas louças sujas ali dentro. - Agora, se puder me fazer o favor, eu tenho algumas coisas para resolver e gostaria muito que você trouxesse minha filha para casa antes que ela se meta em alguma confusão.

O jeito que me referi a Carlie, ainda que num contexto nada amoroso, chamou minha atenção. Eu paralisei, deixando a água corrente continuar molhando minhas mãos e as peças abaixo delas. Eu tinha certeza de que aquilo também afetara Alice, e tive medo de conferir.



                                                                (...)



- Sim. Sim, eu entendo. – Expliquei devagar a Caius, segurando o celular com uma mão e acariciando minha testa com a outra. – Estou fazendo tudo o que posso!

 “Pois então faça mais.” Foram suas últimas palavras antes de desligar bem na minha cara.
Fechei os olhos e afastei o telefone da orelha lentamente, com um longo suspiro. Parecia que tudo estava dando errado naquele maldito dia.

Coloquei meu celular de volta no bolso, andando pela sala sem ter realmente um objetivo. A única coisa que eu queria era uma ligação de Bella mas, ao mesmo tempo, não estava em condições de falar com ela. Precisava me acalmar; entender o que estava se passando comigo, principalmente em relação à nós dois.

Como se estivesse em harmonia com meus pensamentos, meus olhos bateram na mesinha de centro da sala, direto na foto que tiramos na noite anterior. Sorri sozinho e a peguei. Meu rosto mostrava claramente que eu não estava me divertindo tanto assim. Já Carlie e Bella...

Por um lado, me senti como se estivesse estragando a harmonia entre elas. Por outro, nós três ali formávamos uma cena encantadora. Eu adorava quando podia ver um sorriso tão grande no rosto de minha... Filha. Meu polegar acariciou seu rosto na fotografia; eu estava em uma espécie de transe, observando a imagem.

- Papai! Papai!

A voz vinda da porta me fez esconder a foto atrás de mim, como se estivesse fazendo algo errado. Virei de frente para Carlie e abri um sorriso amarelo, totalmente culpado.

- Oi... Olá! Ei, por que demoraram tanto? – Franzi a testa, encarando Alice que vinha logo depois da menina, carregando algumas sacolas. – Já passou muito da hora do almoço!

- Saímos para uma tarde de garotas... – Ela respondeu. Droga, eu conhecia aquele sorriso.

Meu olhar voou direto para Carlie, procurando o resultado de algum plano maluco da garota. Ela estava bem a minha frente, agarrando minhas pernas como se sua vida dependesse disso. Eu coloquei a foto na mesa de centro discretamente e empurrei a menina um pouco para trás, analisando-a. Carlie abriu um grande sorriso em resposta a minha reação; não fiz nada além de franzir a testa diante do que vi.

O cabelo comprido estava preso, seu rosto estava maquiado (com muito exagero, percebi, mesmo para um leigo no assunto) e suas roupas tinham mais preto do que uma criança normal de 8 anos escolheria usar. Uma Alice em miniatura.

- Mas o que...? – Comecei a perguntar.

- Olha, papai, eu tenho um piercing! – Carlie anunciou, erguendo a camiseta para mostrar o umbigo perfurado.

Meus olhos pareciam que iam sair das órbitas.

Precisei de um tempo para reagir, principalmente porque o ar sumira. Olhei para trás e a vi já na porta da cozinha, acendendo um cigarro. Mesmo com minha expressão desesperada, ela tragou pacientemente antes de se defender.

- Relaxa, malvadão. É de mentira. – Deu os ombros.

Eu encarei Carlie. Ela percebeu que deveria me provar antes que eu tivesse um ataque cardíaco. Desceu a mão até a barriga e retirou o brinco de pressão, imitando o gesto da tia. Caí de joelhos, descendo a mão livre pelo rosto. A outra foi para ombro de Carlie.

- Tudo bem... – Respirei fundo, mantendo os olhos fechados por alguns segundos antes de encarar os da menina. – Eu não gosto que suma por tanto tempo, mesmo que esteja com alguém conhecido. Entendeu? – Ergui as sobrancelhas num gesto automático.

- Mas foi divertido, papai! Nós almoçamos com Bella... E depois encontramos a tia Rosalie, e aí...

- ROSALIE? – Fiquei em pé, outra vez, olhando em volta da sala. – Eu não vi ela saindo!

Alice encontrou meu olhar e deu os ombros, nem um pouco preocupada.

- E você... Almoçou com Bella? – Perguntei a ela quase num grito. - Será que tudo por aqui acontece sem eu saber?

- Ah, ela é realmente uma criaturinha muito simpática! – Alice sorriu; acho que foi a primeira vez que a vi se referir a alguém de maneira tão doce.

- Você não percebe o que isso significa? – Franzi a testa, resgatando meu celular do bolso e discando rapidamente para Rosalie. Nada. Tentei novamente, falando com Alice enquanto segurava o celular junto a orelha. – Se alguém a reconhecer, vão levá-la a polícia, e aí estaremos fodidos! Completamente fodidos! – Desliguei o celular, que não obteve resposta. – E CADÊ A PORRA DO EMMETT?

- Disse que ia fazer trilha. – Ela respondeu, muito mais calma do que deveria estar.

- Trilha? – Franzi a testa, sem acreditar. – O Caius quase comendo meu cu, e o filho de uma puta foi fazer TRILHA?

Ela andou sem pressa até a mesa de centro e apagou seu cigarro no cinzeiro.

- Ele gosta. – Respondeu, um pouco antes de prender os olhos na foto que eu jogara ali um pouco antes. Prendi a respiração. – Mas o que...

- Nada! – Eu já estava muito bravo aquela altura, o que fez a frase sair entre meus dentes quando puxei a foto com força de suas mãos magrelas.

Lancei um olhar irritado para Alice antes de virar; Carlie estava ali, séria, erguendo a latinha do palavrão para mim.

- Você deve 2,50. – Ela disse como um robozinho.

Analisei a cena por alguns segundos, para então me mexer e procurar tal quantia nos bolsos da calça. Joguei dentro da latinha, passando reto pela menina até a porta.

- Eu vou atrás dela. – Disse a Alice, que assentiu.

- Ah, eu quero ir também! – Carlie gritou, colocando a lata na mesa de centro e correndo até mim. Eu parei com a mão na maçaneta e suspirei; ela abraçou minhas pernas e começou a pular. – Por favor, papai, por favor!

- Tá, tá, vai logo... – Abri a porta e fechei os olhos, sentindo uma brisa passar por mim quando Carlie disparou.

Eu saí logo em seguida e, quando estava quase fechando a porta atrás de mim, alguma coisa peluda foi mais rápida, batendo em minha perna.

- Vem, Jake! – Carlie gritou, toda feliz. Eu quase rosnei, batendo a porta atrás de mim.

(...)

Segundo os relatos animados de Carlie sobre seu passeio, Rosalie estava fazendo compras, não muito longe do parque. E era lá que iríamos começar a procurar. Ora, quem estava tentando enganar? Mesmo que a garota tivesse ido parar do outro lado do país, eu não perderia a chance de falar com Bella.

Atravessamos a rua (Carlie e Jacob correndo a minha frente, é claro) direto para a entrada do parque. Algumas árvores os tiraram de meu campo de visão, o que me obrigou a correr também e quase esbarrar em um casal sentado no chão. Quando encontrei Carlie novamente, ela já estava perto da barraca de flores, falando com Bella. E... Rosalie...

- Venha logo, papai! – Carlie chamou enquanto eu atravessava o gramado até elas.

Jacob rosnou baixinho com minha aproximação. As duas outras estavam conversando, por isso Bella ainda não percebera minha presença; eu ajeitei as mãos nos bolsos da calça e me aproximei, me perguntando por um segundo como estaria minha aparência.

Parei em silêncio, abaixando um pouco a cabeça e soltando um pigarro. Meus olhos continuavam altos, diretamente em seu rosto, atentos a tudo. Eu estava agindo estranhamente perto de Bella já havia algum tempo – mas naquela época, é claro, negava até a morte.

Ainda com um sorriso lindo no rosto por conta da conversa com Rosalie, ela virou o rosto e encontrou meu olhar. Abri um sorriso torto em resposta, um pouco tímido, e o dela só aumentou.

- Edward! – Exclamou, dando alguns passos curtos até a minha frente.

- Oi, você. – Ri baixinho, envolvendo sua cintura para um abraço. Ela o retribuiu.

Demoramos um pouco mais do que o necessário. Eu não me importei, mas ela pareceu perceber. Afastou-se rapidamente e arrumou os óculos, sem jeito.

- Perguntei por você durante nosso almoço. – Bella disse enquanto Carlie corria e abraçava suas pernas. Elas realmente se adoravam. – Disseram que você estava trabalhando, então...

- É. Eu tive problemas com algumas... Entregas. – Lancei um olhar sério para Rosalie, que se encolheu ao entender. – Mas elas já já serão mandadas para seus devidos lugares. – Meu olhar encontrou o de Bella novamente, e ambos sorrimos.

- E eu não lembro de você ter nos apresentado! – Bella apoiou as mãos nos ombros de Carlie, olhando de canto para Rosalie para mostrar a quem se referia. – Mesmo porque... O rosto dela não me é estranho... – Ela franziu a testa, pensativa.

- É, é, ela está conosco há pouco tempo... Costumávamos ser próximos, mas perdemos o contato depois que minha esposa morreu. – Dei os ombros, tentando parecer triste com a lembrança.

- Rosalie? – Bella perguntou em voz baixa.

- Sim, ela é Rosalie. – Sorri um pouco, amigável.

- Não... O nome de sua esposa não era Rosalie? – Ela franziu o cenho, confusa.

A loira, atrás dela, deu um tapa em sua testa, percebendo a confusão que eu criara.

- Ela... Era, sim. E nossa amiga aí também. – Ri, nervoso, mostrando-a com um gesto de cabeça. – Uma coincidência engraçada, só... – Forcei outra risada.

- É claro... – A florista desviou o olhar, pensativa.

Eu queria me enfiar em um buraco no chão. Burro, burro, burro! Estava prestes a puxar outro assunto, gesticulando na direção de Bella, quando um furacãozinho passou por nós. Carlie disparou pelo gramado, gritando palavras indistinguíveis, e só parou a alguns metros dali, abraçando a cintura de uma mulher que eu não conhecia.

- Quem é ela? – Bella perguntou educadamente.

Eu continuei a analisar a cena, boquiaberto e confuso. Era uma ótima pergunta. A menina demorou um pouco, já que sua “amiga” estava acompanhada de um homem, a qual lhe foi apresentado. Logo ela voltava correndo, puxando ambos pelas mãos.

- Pai, essa é Esme! – Ela gritou, olhando para a mulher com um sorriso enorme.

O casal sorriu, amigáveis. A mulher não era muito alta; tinha um rosto em formato de coração e olhos verdes um tanto pequenos demais. O homem parecia só alguns anos mais velho do que ela – o cabelo loiro disfarçava os poucos fios brancos. Seus trajes brancos deixavam sua profissão muito óbvia.

- Ah, sim! Esme! – Eu quase gritei, exagerando em minha atuação. – Esme foi babá de Carlie por algum tempo. – Expliquei a Bella enquanto chacoalhava a mão da mulher. – Olá, Esme! – Sorri, dando um pequeno passo para o lado, a fim de ficar a frente do homem. – E você...?

- Esse é Carlisle, meu marido. – Esme explicou delicadamente.

- Carlisle, sim! – Joguei os braços para o alto e o abracei, dando alguns tapinhas em suas costas. – É um prazer vê-los aqui!

- É uma ótima coincidência, na verdade. Carlisle aceitou um emprego no hospital de Forks não faz muito tempo. Ainda estamos nos adaptando. E, ah, eu estava com saudades, meu amor! – Esme abaixou um pouco, falando com Carlie.

- Eu já ouvi muito sobre você, pequenina. – O médico disse a minha filha. Ele era o tipo de pessoa em que você sabe que pode confiar logo de cara.

Pela primeira vez, a menina não tagarelou. Acho que estava encantada demais em rever “a melhor pessoa que já conheceu”. Esme ficou ereta outra vez, sorrindo gentilmente para nós três. - E quem são essas, Edward? – Fiquei aliviado por ela já saber meu nome; Carlie provavelmente já dissera assim que os viu. Eu não saberia como explicar aquilo a Bella se a mulher perguntasse.

- Essa é... Rosalie... – Estiquei a mão para a loira, que se aproximou timidamente.

 “Droga, sua desgraçada, se eles te reconhecerem você volta direto para o porão!”

Esperei, praticamente sem respirar, enquanto ela os cumprimentava. O olhar de Esme alcançou Bella, ao meu lado, e abriu um imenso sorriso.

- E essa? É sua mulher? – Perguntou.

Eu e Bella nos encaramos e então desviamos o olhar ao mesmo tempo, corando. Carlisle repreendeu um riso ao perceber nosso típico desconforto.

- Não, ela é só uma amiga, também... – Murmurei.

- Eu trabalho aqui. – Apontou para a banca de flores ao lado, sorrindo um pouco.

- Ah, mas que coisa mais linda! – Esme suspirou, olhando os arranjos. – Eu adoro flores!

Ela se aproximou da banca, e seu marido a seguiu. Bella ficou por perto, e eu aproveitei para puxar Rosalie de canto, novamente irritado. - Você não entende o quão perigoso é isso, não é? – Cuspi as palavras apressadamente, aproximando nossos rostos. Não deixei que ela respondesse. – Vá pra casa. Agora!

Ela bufou como uma criança mimada, e então obedeceu, desaparecendo pelas arvores em direção a saída.

- Você não acha, Edward? – Ouvi Esme perguntar.

Virei rapidamente, sem ter noção de qual era o assunto. A mulher sorria, carregando um vaso pequeno nas mãos. - Com certeza... – Respondi, sorrindo de volta.

- Então vamos levar. Vão ficar ótimas na janela da cozinha! Eu aposto que sua casa é cheia de flores, não é? – Ela perguntou a Bella, animada.

- Se pudéssemos, ela transformaria nossa casa inteira num jardim. – Carlisle completou com uma risada, e eu mais uma vez fui me distanciando do assunto.

Foi Carlie quem me despertou, parada a minha frente com um semblante sério e os braços cruzados.

- Precisa contar a ela. – Disse.

Estávamos um pouco longe da banca; o suficiente para conversarmos.

- O que? Contar o que? – Franzi a testa.

- Que você gosta dela! – A menina bateu os pés, irritada.

- Carlie, eu já disse que deve parar com isso! – Abaixei um pouco, quase encostando nossas testas. Parecia uma competição de quem fazia uma cara mais carrancuda.

- Mas você ama ela. – Insistiu.

- E o que você sabe sobre isso? – Perguntei com certo desdém, ficando ereto outra vez. – Eu não quero ouvir você insistindo nessas maluquices. Você sempre enxerga cabelo em ovo.

- Quê? – Ela fez uma careta, confusa.

- Cabelo em ovo. Significa... Ver coisas onde não tem. Coisas que não existem. – Expliquei.

- E realmente não existem! Onde já se viu, ovos terem cabelo? – Ela colocou as mãozinhas na cintura, ainda mais irritada.

Eu não pude deixar de sorrir, encantado com a cena que via. Abaixei novamente e ergui as sobrancelhas, bastante atento a seus olhos. - Chega. – Disse simplesmente, antes de me afastar para perto da banca.

Ela me seguiu, é claro, saltitante.

- Carlie, o que acha de darmos uma volta pelo parque, e então você me conta todas as novidades? – Esme perguntou, vindo a nosso encontro, também.

- E o papai pode ficar por aqui, conversando com a Bella... – A menina deu os ombros, totalmente discreta. Revirei os olhos, e Esme riu.

- É claro. – Respondeu, pegando a mão da menina. Carlisle as seguiu, carregando o vaso que compraram. Jacob logo correu para perto de sua dona. – Ela já já estará de volta! – Esme prometeu, acenando por cima do ombro.

Eu e Bella acenamos em resposta, lado a lado. Ela me olhou de cima a baixo, e então suspirou ao começar a mexer em algumas flores, fingindo irritação. - Vou ter que te agüentar aqui outra vez, então? – Perguntou.

- É o que parece. Uma pena...

- Só tente não quebrar nada. – Disse com seriedade, mas logo sorriu.

- Se eu conseguir, posso levá-la pra jantar mais tarde? – Perguntei, sorrindo torto.

Ela riu, trocando dois vasos de lugar. Não precisou me olhar para responder.

- Você é muito sutil. – Comentou, irônica.

- E você adora isso. – Rebati. Ela tentou não sorrir.

Eu me coloquei em um lugar onde não atrapalharia seu trabalho. Cruzei os braços e paralisei ali, em silêncio. Ela atendeu algumas pessoas enquanto eu observava Carlie do outro lado do parque, sentada na grama com Esme e Carlisle. Demorei um pouco para perceber que Bella havia se aproximado, fazendo o mesmo.

- Você deve ter muito orgulho dela. – Disse, sorrindo um pouco.

Eu virei o rosto para encará-la por alguns segundos; ela não desviou o olhar da cena.

- É... – Respondi. – É uma ótima menina.

- E se parece com você.

- Você acha? – Franzi a testa, olhando outra vez para seu rosto.

- Menos os olhos. – Ela me encarou, aumentando seu sorriso. – Ela deve ter os olhos da mãe.

Demorei um pouco para responder, analisando o tom de chocolate que me encarava por trás dos óculos redondos.

- Sim. – Murmurei, fascinado por cada detalhe de seu rosto. – Sim, ela tem.

O peito de Bella subiu e desceu quando ela respirou fundo, diminuindo seu sorriso. Eu engoli em seco, finalmente descruzando meus braços.

É engraçado esse momento que antecipa um beijo - quando existe o medo de uma provável rejeição. Esse sentimento não era comum para mim. Eu não sei se teria conseguido suportar, caso acontecesse, justamente por ser ela.

Mas, antes que vocês comecem a se remexer em seus assentos, vou logo avisando para não criarem nenhuma expectativa. Particularmente, não acredito que muitos leitores estejam torcendo por minha felicidade – mesmo porque, nesta altura da historia que lhes conto, eu ainda era teimoso o suficiente para não admitir o que sentia.

Foi simples, rápido e clichê. Foi frustrante. Eu estava ali, e estava pronto para correr o risco. No fundo, não entendia nem mesmo o que estava acontecendo comigo – eu não hesitava, nem sequer pensava. Se eu queria uma garota, ela logo seria minha. A aposta começara assim. Mas Bella era, de fato, uma exceção a todas as regras.

Ela paralisou, sustentando meu olhar. Eu não sabia o que fazer primeiro – queria puxar seu corpo para perto do meu, mas e se ela recusasse? Arrisquei; apoiei as mãos nas curvas de sua cintura. Ela segurou delicadamente meus braços, e eu não tinha mais nada a fazer além de levar meus lábios em direção aos dela. Fechamos os olhos ao mesmo tempo.

- Com licença? – Alguém chamou atrás de mim. Bella recuou como se meu toque lhe tivesse causado um choque elétrico. – Você trabalha aqui?

Respirei fundo antes de virar; o homem sequer me notou ao falar diretamente com ela.

- Sim, eu... – Ela tentou responder, desnorteada. – Sim.

Pensei que fosse passar diretamente por mim até seu cliente, mas ela parou por um segundo, ficando na ponta dos pés para falar ao meu ouvido. “Na minha casa. Oito e meia.”


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Notas finais do capítulo

Carol aqui! Decidi postar dessa vez, primeiro porque já fazia algum tempo que a Nina estava encarregada disso, e também porque acho que devo algumas desculpas pela demora! A explicação é muito simples: Eu estou completamente apaixonada por Doctor Who. Com-ple-ta-men-te. Eu não consigo fazer mais nada além de assistir essa série. É, é só isso. Mas finalmente tomei coragem e deixei o Doctor um pouquinho de lado pra terminar esse capítulo pra vocês! E agora que voltei ao mundo real, prometo dar uma controlada no meu vício HUAHUAHUA
Ah, e um aviso rapidinho: A fic está chegando ao clímax, e as mudanças na história serão radicais. Ainda tem muuuuita coisa pra acontecer, portanto, MMF terá uma segunda fase!
Espero que todos achem essa uma boa notícia AHUAHUAHU Beijos!