Caminhos para o Inferno escrita por Nynna Days


Capítulo 5
Capítulo 5




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Capítulo 4

Eu nunca tinha visto minha mãe tão acabada na minha vida. Ela estava pálida, mais do que o normal. Estava com olheiras profundas e parte do seu cabelo estava grudado em sua testa por causa do suor. Se não fosse pelos olhos cinzas e os cabelos pretos, eu nunca a reconheceria.

Assim que minha mãe nos viu passando pela porta, um sorriso tão familiar iluminou o seu rosto, que, no momento, estava sombrio. Mas antes que ela pudesse dizer alguma coisa, Koren já tinha aberto o berreiro. Cara, eu tinha dito pra ele ser forte na frente da mamãe, mas tava vendo que era a mesma coisa de dizer para mim parar de usar preto.

“Venham aqui , crianças.”, minha mãe nos chamou.

O doutor Silveira tinha apenas nos deixado na porta e voltado para dar apoio moral a minha avó. Se não estivesse preocupada com minha mãe na beira da morte, poderia duvidar um pouco desse apoio moral.

Koren ficou de um lado da cama e eu fiquei do outro. Minha mãe não parecia a mesma de hoje de manhã. Ela perecia tão fraca e indefesa, mas de manhã estava tão forte e independente, ainda sendo feminina. Eu estava me segurando para ser forte , mas assim que a vi daquele jeito, não sabia se conseguiria segurar as lágrimas por muito tempo.

“Pare de chorar , meu amor.”, minha mãe ainda conseguia falar, mesmo que por um sussurro, com aquela mesma voz doce de sempre. Ela colocou sua mão no rosto de Koren e limpou algumas lágrimas que estavam na bochecha dele. “Vai ficar tudo bem.”

Era incrível que, mesmo em um leito de hospital, minha mãe ainda tenha que consolar o chorão do Koren. Era o cúmulo. Vi Koren tremer quando a mão de minha mãe encostou em seu rosto. Não havia entendido o porque, apenas quando ela me olhou e tocou a minha mão que estava mais perto. Sua mão estava gelada.

“Emi, você tem que ser forte.”, ela me disse. “Cuide do seu irmão e o proteja.”, sua voz parecia cada vez mais distante. “No meu quarto, primeira gaveta da cômoda.”, senti algo mais quente do que a minha mãe na palma da minha mão. Pelo formato, parecia um tipo de chave, mas nem dei muita atenção, apenas a coloquei no bolso sem prestar atenção na chave.

Porque, na minha frente, minha mãe estava morrendo.

“Eu amo muito vocês dois. Nunca se esqueçam disso.”, ela disse, enquanto eu olhava para as máquinas que contavam os batimentos cardíacos. Se o curso que minha mãe me colocou quando eu tinha 15 anos, realmente era bom, os batimentos cardíacos de minha mãe estavam diminuindo.

“Eu também te amo, mãe.”, eu respondi voltando minha atenção a ela, enquanto Koren continuava chorando na barriga de nossa mãe.

Os batimentos cardíacos estavam cada vez mais lentos e parando. Não conseguia acreditar que minha mãe estava morrendo na minha frente e eu não conseguia derramar nenhuma lágrima.

Não que não me importasse com ela, era que eu estava sendo obrigada a ser forte. Pelo Koren, principalmente. Eu era a irmã mais velha e ele tinha que ter um ombro para chorar, então tinha que estar inteira.

Depois que disse que nos amava, minha mãe não disse mais nada. Apenas ficou encarando o teto. Encarando o nada para ser mais exata. Então para a minha maior surpresa , minha mãe me encarou sonhadora apesar das circunstancias que se encontrava e disse:

“Eu e seu pai nos amávamos , sabia?”

Por um minuto eu fiquei espantada com ela. Era a primeira vez que ela falava do meu pai. Mas tinha que ser no seu leito de morte? Não me importava. Se fosse para saber do meu pai naquela hora, que fosse assim. Apenas sacudi a cabeça , negando. Como eu poderia saber o que eles sentiam um pelo outro se ninguém nunca tocava no nome do meu pai? Nem, ao menos, sabia o nome dele.

Mesmo que fôssemos diferentes, ainda nos amávamos.”, ela continuou dizendo com um sorriso de uma adolescente sonhadora no rosto. “E , principalmente, ele te amava muito. Ou melhor, ainda te ama.”

Essa era a primeira vez que minha mãe falava do meu pai, mas era a única que eu não queria ouvir. Os batimentos cardíacos estavam cada vez mais lentos. Eu poderia chamar os médicos , mas o que eles fariam? Tinha algo em mim , me dizendo que as coisas são assim mesmo. Nós nascemos, vivemos e morremos.

“Quando eu estava grávida de você, seu pai não me deixava sozinha nem um segundo.”, minha mãe riu um pouco, mas uma forte tosse a pegou e a fez parar.

Eu queria dizer para ela parar, mas a curiosidade de saber quem era realmente meu pai era maior ainda. Tinha passado 17 anos da minha vida fazendo especulações sobre como ele seria e como seria o relacionamento dele com minha mãe antes de eu nascer.

“Seus olhos são idênticos aos do seu pai. Verde esmeralda.”, ela continuava a me olhar sonhadoramente e seu sorriso nunca desaparecia.

Depois ela tirou a mão de cima da minha e colocou no rosto de Koren , tentando levantá-lo. Koren entendeu no mesmo instante e fitou minha mãe com os olhos vermelhos de tanto chorar. Ugh, tinha meleca também.

“Meu amor.”, minha mãe disse para Koren. “Você e sua irmã foram as minhas maiores alegrias. E seu pai...”, ela parou e balançou a cabeça ainda sorrindo com alguma lembrança de época.

“Ele me amava mesmo sabendo que meu coração pertencia a outro. Nunca me arrependi de ter me casado com ele e de termos concebido você.”, então ela me olhou e continuou. “Nem a você”. E como se fosse a badalada final, o monitor cardíaco de minha mãe parou de apitar. As mãos dela caíram do rosto de Koren e seus olhos já estavam fechados com se ela estivesse dormindo.

Koren começou a chorar dolosamente e os médicos entraram um atrás do outro na sala. Eles tentavam fazer o coração dela voltar a bater, mas eu sabia que ela já havia partido.

Fiquei ali, parada, olhando o corpo da pessoa que mais amava perder a vida na minha frente. Me sentia paralisada, sem vida também, mas quando senti o corpo quente de Koren me abraçando , buscando abrigo, eu sabia que não poderia ficar mais parada, mesmo que minha mãe estivesse morta.

“Ela morreu, Emi. Nossa mãe morreu.”, ele dizia sem parar.

Tudo o que eu pude fazer foi, abraçá-lo de volta. Se eu não estivesse em estado de choque por ter visto minha mãe falecer na minha frente, poderia entrar em estado de choque por Koren ter dito meu nome pela primeira vez sem pronunciar a palavra esquisita ou estranha ou gótica.

Eu não iria mentir para Koren, ainda mais em um momento desse.

Não poderia dizer que ficaria tudo bem, não ficaria mesmo, não naquele momento. Então apenas disse:

“Calma, eu estou aqui.”

E durante esse tempo todo, eu não havia derramado nenhuma lágrima por minha mãe.


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