Angela olhava para a lua cheia enquanto sentia a luz fria da lua tocando sua pele. Ela estava num lugar que parecia um jardim numa parte externa de um prédio. Onde havia apenas duas saídas. Tudo estava muito quieto. A única coisa que se ouvia era o barulho dos grilos. Ela se sentia relaxada a luz da lua.

Angela então ouve a porta atrás dela abrir. Ao se virar ela vê um garotinho de uns 9 anos de cabelos castanhos escuros e olhos castanhos. Ela estava muito feliz em vê-lo, se levantou e foi se aproximando dele. Mas ao ver o que ele carregava na mão, sua felicidade se desfez. O medo foi tomando conta dela ao ver o cano de aço que ele carregava e a expressão de raiva que ele tinha. Angela começou a recuar enquanto todo o lugar mudava e o garoto chegava mais perto.

Rachaduras começavam a aparecer nas paredes, as plantas ficavam mais cheias de ervas daninhas, água começava a subir dos ralos como se o sistema de drenagem não conseguisse escoar a água. As plantas começavam a crescer na estrutura e no lugar das portas agora tinham dois buracos escuros com escombros pelo chão. A cada segundo, Angela ficava mais encurralada. Ela poderia fugir facilmente, mas algo nos olhos do garoto a imobilizava. Era sempre assim, aqueles olhos sempre a reduziam a uma garota indefesa. Sandro sempre tivera esse efeito sobre ela.

Ela então notou uma sombra que aproximava do garoto. A sombra foi dando lugar a uma forma humana. Era um garoto de cabelos pretos e olhos igualmente escuros. Porém assim que o braço dele tocou a luz da lua tentando agarrar o o garotinho, se transformou em um braço de um monstro. Era algo grotesco, era um braço com uma pele um pouco amarronzada como se já estivesse em processo de decomposição. E tinha alguns poucos pelos espalhados e garras amareladas. Quando viu que ele estava tentando alcançar Sandro, Angela se enfureceu e se transformou indo com tudo para cima do garoto desconhecido. A ação repentina assustou Sandro que largou o cano e saiu andando de quarto até um canto do lugar. Angela agora estava em cima do garoto rosnando para ele. Os 2 agora estavam na sombra mas o braço dele continuava com a mesma aparência. O garoto a olhava sem medo nos olhos e com um sorriso cínico.

“ Continua violenta como sempre, e ainda se deixa levar pela raiva. Olha só o estado do garoto que você tentou proteger.” Ao ouvir isso, Angela se virou rapidamente para Sandro. O garoto, que estava no chão, aproveitou a oportunidade para acertá-la com o braço transformado e fugir por um dos buracos. Angela então se virou para o garotinho que estava encolhido num canto, agora bem longe do cano.

Ela se aproximava bem devagar, com receio de assustar o garoto. Quanto mais a distancia entre eles diminuía mais percebia o quanto ele estava tremendo. Ela sabia que ele estava com medo isso lhe partia o coração. Sandro era a ultima pessoa que ela queria ver com medo dela. Ela então não aguentou mais ver aquela cena e desistiu de chegar mais perto. Se virou e começou a andar em direção a um dos buracos que havia na parede.

“ Você mentiu. Disse que nunca atacaria ninguém...” Finalmente Sandro conseguiu falar alguma coisa porém, porque ele tinha que lembrá-la logo daquela promessa infantil que tinha feito com ele, mesmo sabendo que um dia não conseguiria cumprir? Não havia mais volta agora, ela sabia disso. O que ela podia fazer agora era se proteger.

“Você deveria saber melhor que ninguém que eu nunca iria manter uma promessa dessas.” ela então continuou a se afastar dele e entrou no corredor escuro sem olhar para trás.

Nada mais importava,se dependesse dela agora nunca gostaria de sentir mais nada.

Angela então acordou ela estava deitada sobre um monte de cobertores velhos. Ela ainda estava na sua forma de loba. Nessa forma seu pelo tinha vários tons castanhos com algumas partes em preto como as patas, a cauda, parte das costas e focinho. Ela olhou ao redor mas não viu Tulio. O quarto onde ela estava era pequeno, parte do telhado estava quebrado deixando um pouco da luz da lua entrar, as paredes estavam descascadas algumas partes com os tijolos e outras com buracos que davam para a rua.

“Já tava na hora de você acordar” ela virou rapidamente e viu Tulio na forma humana parado na porta do quarto. Era incrível como ele conseguia aparecer do nada na frente dela só pensar nele. Ela então se levantou e mudou para a forma humana.

“Não enche, já faz dias que eu não durmo direito e você não é o melhor travesseiro do mundo.” Angela agora se espreguiçava, havia dormido o dia inteiro. A ultima coisa que lembrava era de ter dormido apoiada em Tulio. Ele devia ter trazido ela para aquele quarto quando o dia clareou.

“Feriu meus sentimentos agora, to com o ombro doendo até agora ,cê pesa bastante, baixinha. Mas pelo menos você voltou ao normal, tava estranhando muito o jeito que você tava calma” Tulio fingiu uma cara triste mas logo voltou ao normal, irritar Angela era uma das diversões dele, e ele sabia que a melhor hora para isso era quando ela acordava.

“Esse não é meu normal, eu sou uma pessoa calma é você que sisma em me irritar.”

“Tá que seja,ah antes que eu esqueça toma, seu jantar já que dormiu o dia todo.” Tulio jogou um saco de plastico para Angela, que depois de abrir olhou para Tulio com uma cara irritada.

“3 ratos?” Os andarilhos já estavam acostumados a comerem coisas que pessoas normais considerariam nojentas. Para Angela, ratos eram como carne de frango ou boi e ela preferia muito mais eles do que restos do lixo.

“Ei foi o que eu consegui achar ou você preferia um gato ou restos do lixo?humanos estão fora de questão depois de você ter comido aquele cara vivo.” Tulio disse a ultima frase um pouco enjoado. Há pouco tempo atras, ele era um humano normal. Por isso ainda não estava acostumado matar ou devorar pessoas. Sem contar que, embora tenha sido Angela que tivesse matado, Tulio também levou uma bronca por não tê-la parado a tempo.

Angela não tinha o menor problema de matar os outros. Porém ela não saia matando indiscriminadamente. Ela só matava aqueles que ela achava que mereciam. Não que esse fosse um critério muito justo, ela também não via problema nenhum em comer humanos. Talvez porque nunca tivesse sido uma.

“Ele foi tentar estuprar a garota errada e além disso não tinha comido nada a dias. Mas não estou reclamando de serem ratos, mas porque só 3?” Ela falava num tom indiferente. Realmente, não se importava com humanos. Ela estava muito mais preocupada com a comida, de um tom indiferente a voz dela foi para um de uma criança mimada irritada . Ela agora segurava um dos ratos pelo rabo tentando ver se olhando de outro jeito ele pareceria maior.

“Você não comeu quase nada ontem, achei que ainda estava sem fome.” Tulio falava como se essa fosse a coisa mais lógica do mundo, o senso de lógica dele não era um dos melhores.

“Pela lógica do bom senso, era para você achar exatamente ao contrario. Quando alguém não come nada no dia anterior provavelmente vai estar com mais fome.” Angela agora estava se controlando,

aturar a “lógica infalível” de Tulio, era mais do que ela podia suportar.

“Ah mas pô pelo seu tamanho nem parece que você come muito.” Tulio agora gesticulava colocando a mão na altura da cintura, mostrando o quão alta Angela era para ele. Essa não era a altura real de Angela. Ela batia nos ombros dele. Ela estava na média de altura, mas Tulio nunca perdia a oportunidade de irritá-la.

“Fale da minha altura de novo e você irá entender a teoria na pratica, mas ficando uma semana sem comida” Angela desviou o olhar do rato e olhou para Tulio. Ele desistiu na mesma hora. Quando Angela o ameaçava sabia que era hora de parar. Ela conseguia ser assustadora quando o ameaçava.

“Tá parei. Mas tudo te irrita.” Tulio agora fazia uma cara de uma criança que tentava não contrariar os pais para não apanhar.

“Já te falei, eu sou uma pessoa calma você que sisma em me irritar.” Angela tinha se transformado e estava comendo um dos ratos e respondia sem desviar o olhar da comida.

“As vezes me pergunto porque eu te salvei.”

“Porque você é uma boa pessoa.” Tulio falou sem pensar muito, ele realmente achava isso. Mesmo Angela podendo ser cruel quando ela queria, no fundo ele realmente achava que ela era uma boa pessoa.

“Você não tem ideia do que está falando.” Ela parou de comer e virou para ele. Ela estava olhando para ele com uma expressão cruel porém triste.

Antes que Tulio pudesse falar algo, um garoto de uns 25 anos apareceu na porta. Ele era considerado o vice líder da alcateia. Se Lúcio era rígido demais, era ele que deixava as punições mais leves. Porém isso não acontecia sempre. Então o melhor era não quebrar as regras. Ele era um garoto loiro, com um olho completamente branco e outro um castanho claro.

“O que foi Lugos?” Angela disse quando terminou de devorar o ultimo rato.

“Lúcio mandou avisar para vocês se encontrarem com ele daqui a uma meia hora no galpão.”

“Sabe porque Lugos?” Tulio disse um pouco curioso.

“Missão de batedor.” Dizendo isso, Lugos saiu. Deixando os dois sozinhos de novo. Tulio agora observava as rachaduras da parede como se não tivesse nada mais interessante pra fazer.

“Pergunte logo o que você quer.” Angela disse num tom um pouco impaciente. Voltando a forma humana na hora.

“han? Como?” Tulio olhou um pouco surpreso.

“Eu sei que quer perguntar algo mas não sabe como. Você sempre fica assim olhando pro nada quando quer.” Angela falava de um jeito calmo e como se fosse a coisa mais obvia do mundo. Depois de tanto tempo juntos, Angela sabia o que quase todas as atitudes de Tulio significavam porém não se podia dizer o mesmo do inverso. Tulio sabia pouquíssima coisa de Angela e suas atitudes repentinas sempre o pegavam desprevenido.

“Bem, eu ainda to boiando no que seria uma Peeira.” ele falava a ultima palavra com cuidado, depois do efeito que essa palavra teve em Angela ele não sabe se era bom pronunciá-la de novo.

“Não precisa ficar tão preocupado em me perguntar isso. Eu...Já estou melhor. Além disso, é seu direito saber. Porém explicar o que é uma é difícil com palavras é mais fácil contar a história que nos fez presos a elas , acho que com isso você vai conseguir entender”

“Tá, fale do jeito que achar melhor.”