Senti minha vida toda rebobinando em minha mente: Eu era uma garotinha levada brincando com um cachorro feroz, eu era uma garota sem graça chorando depois do primeiro fora, eu era uma adolescente bonita atônita descobrindo que sua mãe tinha câncer... Eu era uma mulher caindo de um barranco, indo direito ao encontro da morte.

Eu nunca pensei exatamente em como eu poderia morrer. Não me passava pela cabeça isso, mas morrer junto com o amor da sua vida parece um jeito ótimo e romântico de se partir para o próximo mundo.

Bill estava totalmente pálido e eu agarrava loucamente seu pescoço.

A água estava muito perto agora.

-Aconteça o que acontecer,não se solte de mim. – Bill gritou.

Foi a última coisa que eu ouvi antes de mergulhar naquela água totalmente gelada.

O rio era profundo e eu fui rapidamente de encontro ao seu chão.A água invadia minha garganta e parecia queimar ali.

Meu braço se soltou do pescoço do Bill,tentei alcançá-lo,mas a correnteza era incrivelmente forte.

Comecei a me desesperar, não via nada, a água era turva. Não via Bill,não via pedras.Pra falar a verdade,eu mal via meu próprio pé.

Eu lutava,mas em vez de subir,eu só descia mais e mais.O ar estava acabando e eu me debatia furiosamente,formando pequenas turbulências em volta de mim.

Consegui subir.A luz invadiu meu olhos e a cada golfada de ar era como se mil pedrinhas estivessem em meu pulmão,arranhando ele e minha garganta.

A correnteza me arrastou e me levou de encontro a sua borda.

Quando cheguei na beirada,depositei meu corpo exausto ali mesmo,na pedra quente misturada com mato e terra.

Minhas forças tinham se esgotado.Eu queria procurar Bill.Me levantei cambaleante e andei alguns metros,até tropeçar em uma pedrinha.Cai de cara no chão e comecei a chorar.As lágrimas escorriam e ardiam em meu rosto pálido.Eu fiquei ali,deitada e chorando.

Noite do mesmo dia

(narrado pelo Bill)

Abri meus olhos lentamente. Onde eu estava?

Me sentei e uma tontura,junto com uma forte dor de cabeça,me atingiram e me obrigaram a deitar novamente.

Fui lembrando de tudo que tinha acontecido:Eu tinha entrado em uma perseguição com aqueles maldito Listing. Aquele cara me incomodava já fazia anos.Porque voltou agora e porque queria Faye?

Eu tenho que admitir,tenho medo de seu chefe.Ele nunca mediria esforços para conseguir o que quer.

A pior parte disso tudo é que ninguém conhece realmente o rosto do “poderoso”.Então eu nem saberia como encontrá-lo e matá-lo.

Eu perdi tudo por causa de Faye,tudo. Mas eu realmente não me importava.

Aos poucos me lembrei porque eu estava aqui na terra:Por que eu tinha me apaixonado por Faye.E enquanto eu não a achava,arrumei uma namorada na internet.Nunca pensei que eu poderia fazer isso,mas é realmente bom poder experimentar sensações e atividades humanas.É muito interessante.

Levantei-me e fui em busca dela.

Tenho certeza que andei por não mais que uma hora, até que a encontrei:Ela estava deitada de bruços na terra,seus cabelos escuros bagunçados e espalhados.Seu casaco antigamente branco,estava agora encardido e rasgado nas duas mangas e bordas.

Me aproximei dela e a virei. Seu rosto estava levemente arroxeado,devia ser o frio.

Peguei ela em meus braços e a levei até aquele rio que outrora quase nos matou. Ou melhor:Quase matou ela.Afinal,eu não morro.

Me sentei com ela à sua margem,colocando sua cabeça cuidadosamente em meu colo.Molhei a mão na água,que agora estava calma.

Era até bonito de se ver,a lua grande e cheia refletia,juntamente com as estrelas,na sua superfície escura. As árvores ao redor formavam uma clareira e alguns grilos e corujas faziam seus típicos barulhos noturnos.

Passei a mão molhada por sua testa e bochechas,limpando seu rosto. Manobrei seu corpo inerte e tirei seu casaco frio e molhado.Tirei a minha jaqueta,que agora já estava seca,e a embrulhei.

Fiquei um tempo assim,até que escutei um fraco murmurinho vindo de seus lábios inchados:

-Bill... – Ela disse com dificuldade.

-Eu estou aqui querida.

-Com o que você trabalha?

-Nós quase morremos e você ainda está com isso na cabeça? – Perguntei incrédulo.

Ela tinha um sorriso fraco e maroto no rosto.

-Sim,estou muito curiosa.

Fiquei sério.Me calei durante alguns instantes e por fim disse:

-E se eu te disser que não sou humano,você acreditaria em mim? – Perguntei tenso,temeroso de que ela achasse que eu pirei.

-Eu acredito em espíritos e vampiros.

Olhei para ela,quase rindo:

-Eu não estou morto! – Exclamei com um tom divertido

-Então,o que você é?

Ela se aconchegou no meu peito. Eu sentia como se ela fosse uma criança frágil e eu nunca fosse poder soltar ela.

Fiquei calado por mais alguns instantes e olhei fixamente em seus olhos:

-Eu sou seu anjo. – Disse por fim.