Coração Satélite escrita por Ayelee


Capítulo 29
Capítulo 28


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoal, tudo bem?
Primeiro de tudo, quero me desculpar por mais outro período longo sem postar. Dessa vez a coisa foi mais séria, minha vida virou de cabeça para baixo nos últimos dois meses. Perdi minhas cadelinhas, uma delas era minha paixão, estava na família a mais de 17 anos. A outra tive que mandar sacrificar por que ela estava com um câncer muito agressivo e sofrendo muito. No dia seguinte à morte dela, meu pai também faleceu. Deus sabe o quanto sofri e ainda estou sofrendo com essas perdas. Mas estou tentando seguir em frente.
Todos esses anos que venho escrevendo CS, a saúde do meu pai tem estado instável, e por isso meus lapsos nas postagens. É difícil ter a mente fresca para escrever, com tantas preocupações na cabeça.
Enfim, só gostaria de justificar esse tempo de ausência e agradecer muito a paciência, carinho, apoio e dedicação de vocês!
Muito obrigada,
Grande beijo, Feliz Natal!

* Obs: Este cap está bem longo, por isso estou adiantando uma parte dele agora, o restante posto no máximo amanhã. Prometo!
Espero que gostem do capítulo.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/96962/chapter/29

Ally PDV

Acordei estranhamente revigorada, talvez por que dormi além do que deveria e estava atrasada para o café da manhã. Quando cheguei ao restaurante do hotel, Sarah, Larry e Dave já estavam acomodados em suas cadeiras, em uma mesa afastada do Buffet. Roger não estava lá. Eu já esperava por isso, ele provavelmente pediu o café na suíte, para não ter que se expor à quantidade enorme de pessoas reunidas no restaurante do hotel àquela hora. Era sexta feira, o volume de hóspedes havia aumentado consideravelmente.

Cumprimentei todos da mesa, desculpando-me pelo atraso, peguei meu prato e fui me servir no buffet. Quando voltei, estavam todos descontraídos, exceto Larry, que ficou um pouco sem graça. Eu fingi não perceber e conversei com todos normalmente. Sarah estava extraordinariamente relaxada, aparentemente, sua antipatia comigo havia evaporado. Talvez Roger tivesse razão, ela estava apenas fazendo o trabalho dela. Com excessiva dedicação, devo dizer. Fiquei aliviada ao ver que ela estava mudando o modo como falava comigo, não estava mais ríspida e mandona. Ela nem ao menos reclamou do meu atraso esta manhã!

– E então, Alicia, o que achou da festa ontem? Você teve sorte que a maioria dos convidados da festa falava inglês, assim teve a noite praticamente livre para se divertir um pouco. – Sarah comentou, puxando conversa.

– Achei muito agradável, decoração belíssima, música boa, os anfitriões muito gentis. Mas para falar a verdade, fiquei meio perdida, preferia ter feito meu trabalho, assim não me sentiria tão fora do meu habitat. – Sorri timidamente.

Por um segundo pensei que pudesse estar sendo presunçosa, bancando a profissional dedicada. Mas eu estava sendo sincera, ninguém poderia me condenar por isso.

– Entendo... – Sarah respondeu pensativa. – Mas seu trabalho é estar à disposição quando precisamos de você, então tecnicamente você cumpriu sua obrigação. Se isso lhe faz sentir melhor.

– Hum, faz sentido. Obrigada. – Sorri e dei um gole em meu café com leite.

Terminamos o café da manhã quase na mesma hora. Não costumo comer muito quando acordo. Uma xícara de café com leite e um croissant com queijo branco são suficientes para mim. Parecia comida de passarinho perto do banquete gorduroso de bacon com ovos e salsicha dos americanos.

Na saída do restaurante, Larry me puxou delicadamente pelo braço, pedindo para conversar comigo. Ele ainda estava constrangido, desviando o olhar, sem coragem de me encarar.

– Ally, eu queria te pedir desculpas por ontem. Fui um idiota grosseiro com você.

– Ok, desculpas aceitas. Não quero ser chata, mas você realmente passou dos limites. Não sei o que lhe fez achar que eu estava lhe dando cabimento. A menos que você considere ser educada e atenciosa como sinal verde.

– Foi isso mesmo que o Roger disse. Ele me passou o maior sermão hoje de manhã. Lembra que eu te disse que ele era esquisito? O cara ficou mais magoado que você! Me chamou até de misógino, seja lá o que isso for. – Ele bufou, com um sorriso nervoso.

– E você acha que ele não tinha razão? Quer saber, Larry? Não vamos mais falar sobre isso. Vamos acabar nos desentendendo, e não quero trabalhar com um clima chato entre nós, certo?

– Tudo bem, desculpa. Você é uma profissional muito comprometida. Agora entendo por que Roger escolheu você pessoalmente.

Procurei traços de sarcasmo no que falou, mas ele parecia estar sendo sincero. Percebi que, no fundo, Larry tinha um pouco de inveja de Roger. O problema é que as coisas que ele aspirava ter na vida eram justamente o lado ruim da fama, que Roger tanto desprezava. Por isso Larry vivia inconformado com as atitudes de Roger.

Mesmo assim não consegui evitar sentir um pouco de pânico ao descobrir que ele sabia nosso segredo. Na verdade, era mais um segredo de Roger do que meu. Ele não gostava de misturar sua vida pessoal com a profissional, e ter nosso envolvimento exposto ao público definitivamente não traria nenhum benefício a sua carreira. E nem à frágil relação, ainda indefinida, que existia entre nós.

A única certeza que eu tinha era que eu queria ficar o máximo possível com ele. E, por mais improvável que fosse, eu acreditava que Roger desejava o mesmo. Eu só não tinha a menor ideia de como fazer isso dar certo. Como construir uma ponte entre nossos mundos, quando tudo parecia conspirar contra nós. Estilo de vida, trabalho, condição financeira, diferenças culturais e, principalmente, a distância. A única coisa que nos mantinha conectados era o que sentíamos um pelo outro. Mas esse sentimento que ainda estava desabrochando seria suficiente para superar todos esses obstáculos?

Sempre tive dificuldade de lidar com incertezas. A sensação de instabilidade é algo que me incomoda profundamente; não saber em que terreno estou pisando, se o que é hoje permanecerá amanhã. Estabilidade é uma palavra chave na minha vida e é algo que busco diariamente com meu trabalho, com minhas escolhas e também em meus relacionamentos. E, por mais paradoxal que pareça, quando estou com Roger, me sinto segura, sinto que aquele é meu lar, bem entre seus braços, e em nenhum outro lugar do mundo eu conseguiria sentir a paz do amor calmo, mesmo com o coração a mil. Seus olhos eram os lagos tranquilos e constantes que sempre sonhei. Pouco a pouco Roger me convencia que ele era meu Soneto 116 do Shakespeare.

“(...)

Oh, não, o amor é marca mais constante

Que enfrenta a tempestade e não balança,

É a estrela-guia dos barcos errantes,

Cujo valor lá no alto não se alcança.

(...)”

Meu celular vibrou com uma mensagem no whatsapp. Era de Roger:

Peter:

Bom dia, princesa! Tive um sonho maravilhoso esta noite. Eu estava em um elevador e beijava a garota mais linda que já vi. Foi tão real!

Decidi ignorar minha preocupação sobre Larry descobrir meu envolvimento com Roger e seguir com minhas atividades normalmente. No fundo eu não acreditava que ele fosse capaz de fazer algo que prejudicasse Roger, ele era apenas imaturo e superficial.

Respondi imediatamente a mensagem de Roger, com um sorriso bobo no rosto. Por que ele tinha que ser tão irresistível?

Alicia Curtis:

Que coincidência! Sonhei que estava beijando o cara mais maravilhoso que já vi, em um elevador. Foi tão bom que quase perdi a hora do café da manhã hoje.

Peter:

Nossa, esse cara do sonho mexeu tanto assim com você?

Eu podia imaginar seu sorriso convencido ao escrever isso. E eu adorava provocá-lo de vez em quando.

Alicia Curtis:

Você não faz ideia!

Acho melhor você parar de sonhar com elevadores e descer, ou vai perder seu compromisso.

Peter:

Eu não consigo levantar da cama! Você vai ter que vir aqui me ajudar. É por um bem maior! Você não iria querer ver seu chefinho em maus lençóis, não é?

O trocadilho não me passou despercebido. Respondi com um emoticon dando língua e segui para o saguão, onde Sarah e Dave aguardavam Roger. Os outros intérpretes, Daniela e André foram dispensados por hoje, o que significava que eu provavelmente faria o trabalho deles além do meu. Segundo o cronograma que Sarah me passou na reunião de apresentação, o dia será preenchido com uma sessão de fotos para o catálogo da Karmic e o comercial para TV, com direito a um clipe com entrevista de making of com Roger, a modelo que irá contracenar com ele, diretor, fotógrafo e produtores.

Eu estava particularmente animada para acompanhar esse processo. Acho que toda garota que se interessa o mínimo por moda tem um pouco de curiosidade de como funciona esse mundo e o que acontece nos bastidores, saber se a vida das modelos é tão glamourosa quanto elas fazem parecer.

Até onde eu havia presenciado, não havia muito glamour além dos equipamentos, roupas e maquiagem de primeira qualidade. As pessoas pareciam sempre muito ocupadas, mas eu percebi que algumas delas só tentavam parecer ocupadas, como se aquilo lhes atribuísse um ar de importância.

Roger lidava com todos com uma paciência e graciosidade adoráveis. Eu às vezes esquecia qual era minha função ali e simplesmente parava para admirá-lo de longe, e naqueles momentos denunciava completamente meus sentimentos por ele. Mas cheguei à conclusão que, por mais que eu quisesse parecer muito profissional, nenhum ser humano normal conseguia ficar totalmente imune aos charmes do Roger por que ele realmente era uma pessoa adorável.

Fui surpreendida por uma assistente de figurino que me flagrou no momento em que eu estava escondida atrás de um biombo espiando Roger sendo fotografado. Gelei da cabeça aos pés, por um instante pensei que fosse Sarah. Por mais que hoje ela estivesse agindo mais amistosa comigo, trabalho é trabalho, ela certamente faria insinuações sobre mim e Roger.

– Ele é uma verdadeira obra de arte viva, não é? – Comentou a garota de óculos e sorriso aberto. Ela estava coberta com peças de roupas femininas, que pendiam dos seus braços, ombros e pescoço.

Eu apenas acenei com a cabeça concordando e franzindo ligeiramente a testa em seguida, quando tornei a observar Roger e percebi que ele agora fotografava ao lado de uma modelo brasileira com o típico bronzeado “da cor do verão”, cabelos propositadamente desalinhados, cintura fina e traseiro avantajado.

– Ela também é linda, mas é muito “estrela”, se é que me entende. – A garota comentou novamente. E continuou: - Você está vendo como ela está se insinuando descaradamente para o Roger? Pelo que estou vendo, ele não está interessado. Ha! Bem feito. Ele parece ser gentil demais para dispensar ela. O que você acha?

– Eu? Hum, não sei... é, ele é mesmo muito gentil. – Respondi envergonhada, a garota parecia que tinha lido meus pensamentos. – Desculpa, como é seu nome?

– Patrícia! – Ela respondeu animada por eu finalmente lhe dar a atenção que ela esperava. – Sou assistente de figurino. Dei uma escapadinha para conferir como está a sessão de fotos. Me colocaram para trabalhar com a chatinha – ops – a Lorena Petrelli, essa aí que está posando com o Roger. E você é...?

– Alicia Curtis. Ally. Sou intérprete do Roger.

– Que sortuda! E por que está escondida aqui espiando a sessão de fotos, hein danadinha?

Me endireitei e dei um sorriso amarelo de quem foi pega no flagra.

– Bom, ele não está precisando de mim agora. Não vejo mal em dar uma olhada, nunca presenciei uma sessão de fotos, estava curiosa.

– Relaxa, pode admitir que estava admirando seu chefinho! – Ela me cutucou com o cotovelo, como se fosse minha amiga há anos.

Por que ela tem que ser tão intrometida?

­– Claro, ele é um cara muito legal e...

– E sexy, né minha filha! Me conta, como ele é pessoalmente? Ele te trata bem? Ele é metido?

Fiquei tensa, a curiosidade dessa menina estava começando a me irritar. Eu não me sentia confortável para falar o que eu realmente sentia e pensava sobre o Roger, muito menos com estranhos. Morria de medo de deixar escapar alguma informação que pudesse prejudicá-lo. Pensei rapidamente em uma resposta que pudesse ser satisfatória, e cheguei à conclusão que afirmar o óbvio era a melhor saída.

– Ele não é nada metido. Ao contrário, ele é simples, atencioso e sim, é muito lindo.

Não pude conter um suspiro de alívio quando ouvi uma voz irritada gritando “Onde está a Patrícia quando eu preciso dela?”. Patrícia fez uma cara de pânico e saiu apressadamente desculpando-se, deixando cair algumas das peças que estavam penduradas nos seus braços.

O restante do dia decorreu sem maiores incidentes. Senti-me mais uma vez um pouco inútil por não poder exercer minha função de intérprete. Como todos os dispositivos eletrônicos eram confiscados no escritório do estúdio para não correr o risco de alguém fotografar ou filmar os bastidores e vazar na internet, eu não tinha nada para me distrair e ajudar a passar o tempo. Nem meu e-reader escapou do confisco!

Quando eu pensava que iria morrer de tédio, minha salvação veio de quem eu menos esperava. Sarah me pediu que a ajudasse em algumas tarefas bobas, mas que me mantiveram ocupadas pelo restante do dia. Eu estava tão ansiosa para fazer algo de útil, que não me importei em desempenhar tarefas que não faziam parte das minhas obrigações. Fiquei feliz em ajudá-la, e mais feliz ainda ao vê-la satisfeita com minha solicitude e empenho.

Eu estava terminando de fazer uma reserva em um restaurante para o sábado à noite quando Sarah aproximou-se e aguardou silenciosamente que eu finalizasse a ligação. O lado ruim de ter me proposto a ajudá-la foi que tive que sair do estúdio para poder usar o telefone na recepção do prédio.

– Alicia, posso chamá-la de Ally, como já ouvi Roger chamar? – Sarah perguntou educadamente, me fitando com seus grandes olhos azuis. A cada dia que passava, minha má impressão sobre ela diminuía.

– Sim, claro. É como todos me chamam.

– Obrigada. – Pela primeira vez eu a vi demonstrar um pouco de insegurança. Era uma postura mais amável comparada a seu modus operandi de mulher de negócios. – Eu queria agradecer sua cooperação e... e me desculpar por não ter sido muito legal com você algumas vezes. Independente de qualquer envolvimento que você tenha com o Roger, e eu não quero falar sobre isso, você é uma excelente profissional e parece ser uma boa garota.

Oh wow! Por essa eu não esperava!

– Não tem do que se desculpar. Você está fazendo seu trabalho, está cuidando dos interesses do Roger. Eu respeito isso.

Sarah apertou levemente meu ombro e anunciou antes de voltar para o estúdio:

– Ah, se você quiser aproveitar um pouco o Rio, amanhã pela manhã você está liberada. Pelo visto as atividades hoje se estenderão até tarde da noite. Adiei os compromissos do Roger para o sábado à tarde, para que ele possa descansar um pouco.

– Tudo bem, obrigada! – Fiquei surpresa com a mudança de planos, mas pelo que havia presenciado até agora, entendi completamente quando ela disse que Roger precisaria descansar. – Mesmo assim, se precisar de mim, estou à disposição.

Sarah piscou e adentrou no estúdio.

O que eu poderia fazer na minha manhã livre? Algumas ideias passaram pela minha cabeça. Nos meus sonhos mais loucos, eu gostaria de passear com o Roger pelo Jardim Botânico ou caminhar no aterro do Flamengo. Mas a realidade me obrigava a me conformar em passear sozinha. Isso se eu não dormisse até tarde, já que eu provavelmente chegaria ao hotel completamente esgotada esta noite.

Ao final da tarde, finalmente tive oportunidade de passar alguns minutos com Roger, quando a equipe de produção decidiu dar um intervalo de trinta minutos para ele fazer um lanche e relaxar um pouco.

Eu estava tomando um capuccino na cantina do estúdio, quando Roger passou pelo corredor e, ao me ver, voltou atrás e entrou na cantina para falar comigo. Quando ele adentrou a cantina, ouvi a moça do balcão dar um suspiro e quando a olhei de relance, ela estava com os olhos arregalados, fixos no Roger.

– Ei, como você está? Senti sua falta. Você sumiu do estúdio, estava ocupada com alguma coisa?

Roger estendeu a mão e ficou brincando com uma mecha do meu cabelo entre seus dedos. Senti um frio na barriga com aquela atitude inesperada, não apenas pela proximidade dos nossos corpos, mas a consciência de que alguém poderia testemunhar nosso pequeno momento de intimidade.

Recuei instintivamente e pude ver uma pequena expressão de mágoa em seu rosto, o que me deixou um pouco arrependida, mas eu não estava tão acostumada a atrair atenção de terceiros como ele estava, não apenas por ser famoso, mas por sua inquestionável beleza. Falar com Roger na frente de desconhecidos era algo que me deixava extremamente desconfortável e eu precisava me acostumar com isso ou acabaria causando problemas para nós dois.

– Ally, por que você fez isso? – Roger questionou em um tom de voz mais baixo.

– Desculpa, não foi de propósito. Tem gente aqui, Roger, podem perceber alguma coisa.

Ele agora parecia aborrecido. Ops.

– Só estou vendo uma atendente no balcão, que está muito concentrada organizando biscoitos em uma prateleira para se importar com duas pessoas conversando.

– Duas pessoas, sim, sendo que uma delas é Roger Peterson. Pequeno detalhe. Você acha que ela está indiferente à sua presença aqui?

– Ah, então é isso? Em algum momento você vai ter que se acostumar com esse tipo de coisa, sabia? - Acho que ele andou lendo meus pensamentos. - E sim, acho que ela não dá a mínima para quem eu sou. Ela deve estar acostumada a ver pessoas famosas circulando por aqui.

– Já que você não está se sentindo à vontade aqui, vamos para meu camarim.

Roger se levantou e estendeu a mão para que eu o acompanhasse, me lançando um olhar de zombaria, me desafiando a fazer tamanho gesto de intimidade. Eu sorri, peguei sua mão e me levantei.

Quando seguíamos para a porta, a atendente acenou me chamando, com uma cara mortificada de vergonha.

– Pois não?

– Moça, me desculpa incomodar, mas você poderia pedir um autógrafo ao Roger Peterson para mim? Por favor? Ele é muito lindo!

Eu sorri em solidariedade à sua aflição, lembrando da primeira vez que nos vimos em Londres. Como eu fiquei nervosa e como em seguida a emoção passou de nervosismo para decepção e raiva, quando ele me ignorou completamente em sua fuga desesperada. E sorri ainda mais por que eu estava certa, a garota não estava em nenhum momento indiferente à nossa presença.

– Claro, você tem uma caneta aí?

Enquanto a garota se atrapalhava toda procurando a caneta, fui chamar o Roger para falar com ela. Não pude conter o sorriso vitorioso ao comunicar-lhe que a garota queria um autógrafo.

– Sr. Peterson, você poderia me acompanhar, essa moça gostaria de pegar um autógrafo seu. – Dei uma piscadela e ele me retribuiu com um sorriso amarelo.

– Claro, senhorita Curtis. Você poderia, por favor, intermediar nossa conversa?

– Com todo prazer!

Quando voltamos ao balcão, a garota esperava ansiosa com caneta em punho. Eu me perguntava se alguma vez olhei para Roger com aquela expressão de adoração ridícula, como se ele fosse uma espécie de deus vivo.

– O que ele disse? – A atendente perguntou.

– Ele disse que é um prazer. Como é seu nome?

– Marcela.

Roger estendeu a mão para cumprimentá-la, a abraçou e pegou um pedaço de papel onde escreveu uma dedicatória e autografou. Marcela agradeceu profusamente, eu já estava ficando com vergonha alheia, mas o episódio serviu para provar meu ponto ao Roger.

– Você pode perguntar a ele se posso lhe dar um abraço? – Marcela pediu envergonhada.

– Hum, claro. – Sorri e me dirigi ao Roger: - Ela quer te dar um abraço, tudo bem?

A cena estava ficando cada vez mais hilária, eu mal podia esperar para estar a sós com Roger para comentar sobre esse encontro inusitado. A expressão que Roger fez quando traduzi o pedido de Marcela não teve preço.

– Ela quer me abraçar? Por quê?

– Talvez para ter certeza que você é real? – Provoquei.

Roger pareceu não perceber minha provocação, e concordou ainda confuso.

– Tudo bem, eu acho.

E então estendeu os braços para Marcela, que não hesitou e o abraçou como se o conhecesse há anos.

Na saída da cantina, Marcela agradeceu repetidamente e continuou falando que Roger era incrível, que aquele tinha sido o melhor dia de sua vida, que eu tinha muita sorte em poder acompanhá-lo...

Quanto a isso eu realmente não podia discordar.

Mal entramos em seu camarim, Roger começou a tagarelar antes mesmo de fechar a porta atrás de si.

– O que foi aquilo? Inacreditável! Ela pediu para me abraçar, que estranho...

– Eu não a culpo. – Eu disse, aproximando-me da penteadeira e espiando os produtos ali espalhados. – Entendo perfeitamente o que ela estava sentindo.

– Não seja boba. – Roger aproximou-se por trás de mim, entrelaçando seus dedos nos meus. – Você não sabe como é difícil saber que as pessoas lhe enxergam como uma espécie de ‘ser superior’, mas no fundo você não é nada disse. É assustador carregar o peso das expectativas alheias.

Eu estava plenamente consciente da proximidade entre nós, podia sentir o calor de seu corpo emanando em minha direção. Eu também estava consciente de que Roger havia deixado a porta do camarim aberta.

– Roger, por favor... a porta está aberta. Mesmo depois do que acabou de acontecer você ainda não tomou jeito! – Eu o repreendi suavemente, afastando-me dele, contrariada.

– Ah, claro, você tinha que jogar isso na minha cara, né.

Roger caminhou até a porta e a trancou com chave, virando-se para mim em seguida. Um sorriso irônico brotou no canto de sua boca e senti dificuldade para permanecer séria.

– Só estou tentando provar meu ponto. Preocupo-me com as consequências desses descuidos. Isso pode repercutir na sua carreira, eu não me perdoaria por isso.

– Bem, você não deveria. Já tem pessoas suficientes preocupadas com isso e são pagas para resolver essas questões. Agora vem cá. – Ele caminhou em minha direção, me encurralando contra a parede, com uma mão segurou meu rosto delicadamente e enlaçou a outra em torno da minha cintura.

Eu não tinha mais desculpas para inventar. Nem ao menos sei por que colocava tantos empecilhos entre nós. No fundo, tudo se resumia a medo. Um medo profundo de prejudicá-lo, de me magoar, de magoá-lo... de perdê-lo. Se é que algum dia o possuí de verdade. Era como se eu tivesse medo de ser feliz.

Para sermos felizes precisamos aceitar alguns riscos, calcular o custo-benefício de cada passo que damos na vida, sabendo que estamos caminhando para algo fenomenal ou desastroso. De um jeito ou de outro inesquecível, que vai ficar escrito no livro da nossa história e que inevitavelmente se tornará experiência de vida, mesmo que o resultado não seja o esperado.

E, naquele momento, mesmo ciente de que a qualquer instante alguém poderia bater na porta à procura de Roger e estourar nossa bolha em um breve momento de intimidade, eu me deixei levar pelo desejo de tocá-lo e sentir que ele era real, provar para mim mesma que aquilo estava acontecendo de verdade. De escrever no livro da minha história que ali, naquele camarim, entre uma sessão de fotos e uma filmagem, eu estava beijando Roger loucamente e que, naqueles minutos preciosos ele foi meu, somente meu.

Quando paramos para respirar, Roger me encarou, um pouco ofegante, e falou com a voz rouca, traçando os contornos do meu rosto com a ponta dos dedos.

– Não consigo pensar em outra coisa além de beijar você, desde ontem à noite no elevador. Eu quero mais.

– Eu também. – Respondi, referindo-me às duas coisas.

Roger então se inclinou novamente para me beijar, envolvendo minha cintura em um abraço forte, colando nossos corpos de uma forma que me fazia sentir como se fôssemos um só. Eu me permiti acariciar seus cabelos, algo que desejava fazer a muito tempo, sentir aqueles fios de seda deslizando por entre meus dedos. O ruído que Roger fazia na garganta quando eu tocava seus cabelos era uma confirmação de que ele também adorava o carinho.

Nota mental: experimentar fazer cafuné no Roger quando tiver oportunidade.

As mãos hábeis do Roger acariciavam minhas costas, às vezes tocando a pele por baixo da minha camisa, e era como se cada pedaço de pele que ele tocava ganhasse vida e ficasse mais sensível, enviando impulsos elétricos até meu cérebro que causavam uma sensação maravilhosa de contentamento e excitação. Fiquei tão inebriada nessa overdose de sensações que nem percebi as mãos hábeis descendo, passando por meus quadris e seguindo até minhas coxas.

Roger agarrou minhas coxas com firmeza, me erguendo contra a parede, dando apoio para eu envolver seus quadris com as pernas. As coisas estavam esquentando rápido demais e eu não sabia se estava pronta para o próximo passo. Nós basicamente nos beijamos duas vezes até então. Aquilo tudo parecia absurdo e eu não sabia como parar, por que eu tinha que lutar contra minha própria vontade, contra meu corpo, que exigia mais e mais. Mas uma coisa me preocupava: e se Roger ficasse chateado com minha recusa? Eu não queria contrariá-lo, mas ao mesmo tempo tinha que respeitar a mim mesma. Não havia nada a fazer senão confiar que ele compreenderia meus motivos e não pensaria que eu estava fazendo joguinho com ele.

Interrompi o beijo e encarei Roger, ainda ofegante, criando coragem para abrir meu coração e iniciar essa conversa desagradável, mas fui salva por batidas na porta e uma voz suave chamando por Roger.

– Sr. Peterson? Você está aí?

Era a voz de Patrícia. Roger me encarou visivelmente frustrado, beijou de leve meus lábios e sussurrou em meu ouvido:

– Não paramos por aqui, certo?

Não consegui responder por que fui tomada por um ataque de pânico. Ser flagrada aos beijos com Roger Peterson no camarim seria um escândalo daqueles!

– Ai meu Deus, o que vamos fazer? – Murmurei, rezando para que Roger tivesse uma ideia brilhante de como me esconder naquela sala minúscula, quase sem mobília. Seria muito patético se eu me encolhesse atrás do sofá?

– Um minuto, por favor. – Roger respondeu à voz que chamava do lado de fora do camarim.

– Ally, relaxa, vai para o banheiro e tranca a porta. Deixa o resto comigo, certo?

Acenei com a cabeça concordando e caminhei rapidamente até a porta do banheiro, que até então eu não havia percebido a existência. O que é perfeitamente compreensível, considerando as circunstâncias em que eu me encontrava, que não me permitiam pensar claramente.

Roger tirou a camisa, e foi abrir a porta com a maior cara de que nada havia acontecido. Precisei lembrar para mim mesma que ele era um ator, afinal de contas. Ele lançou um olhar em minha direção para checar se eu já havia fechado a porta, e piscou para mim antes de virar-se para a porta de saída.

Fiquei em pé com o rosto colado na porta tentando ouvir o diálogo que se seguiu. Estava tão concentrada que às vezes me esquecia de respirar.

– Pois não? – Roger falou gentilmente, após abrir a porta. Posso jurar que ouvi um suspiro antes de Patrícia começar a falar. Então lembrei que Roger estava sem camisa e tive que abafar um risinho bobo de pena da pobre garota. Entendo perfeitamente o efeito Peterson nas mulheres, especialmente a Patrícia, que estava prestes a se jogar contra ele durante a sessão de fotos.

– Er, senhor Peterson, desculpa incomodar, me pediram para avisar que as gravações serão iniciadas em dez minutos.

– Ah sim, claro. Não tem por que se desculpar. Eu já estava saindo do banho. Estarei no estúdio antes disso. Obrigado.

– Senhor, você por acaso viu a Alicia? Não consigo encontrá-la e a Srta. Sarah a está procurando por toda parte.

– Vi sim, lanchamos juntos alguns minutos antes de eu vir tomar banho. Não sei para onde ela foi, sinto muito.

– Sem problemas, vou continuar procurando. Obrigada!

Alguns segundos depois de ouvir a porta do camarim fechando, três batidas na porta do banheiro me confirmaram que Roger estava sozinho novamente, mas não abri a porta enquanto ele não me garantiu que a Patrícia havia realmente saído.

– Relaxa, estamos a sós novamente. – Roger me abraçou pela cintura e eu envolvi os braços em torno de seu pescoço. – É uma pena, preciso ir. Vamos ter que continuar onde paramos mais tarde no hotel.

Eu não tinha certeza se ele estava pensando o mesmo que eu, mas eu tinha que aproveitar o momento para deixar claro que não pretendia levar aqueles amassos até as últimas consequências. Respirei fundo, reuni toda coragem que tinha e comecei a falar, encarando seu queixo.

– Eu queria falar sobre isso com você...

– Sobre o quê? – Roger questionou, beijando meu pescoço, tornando ainda mais difícil para mim abordar o assunto.

– Sobre isso... isso que você acabou de dizer. Roger, eu não pretendo dar continuação ao... ao que estávamos fazendo aqui antes. Não hoje.

Roger parou de beijar meu pescoço, hesitou um pouco, depois me encarou sério. Prendi a respiração observando atentamente seu rosto à procura de sinais de aborrecimento. Por mais que ele tentasse conter, eu vi em seus olhos que estava sim aborrecido. Isso me deixou um pouco surpresa, pois apesar de saber que era possível ele reagir dessa maneira, no fundo eu esperava que fosse compreensivo, como sempre tem sido comigo.

– Como assim não pretende? O que lhe fez mudar de ideia? Você parecia bem entusiasmada pouco tempo atrás. – Insinuou.

– Eu sei, eu estava mesmo. Mas eu já estava pensando que não era o momento certo...

– E quando será o momento certo, Ally? Nós só temos mais dois dias! – Roger me interrompeu, sem se preocupar mais em controlar a raiva. – Esse tempo todo eu tenho sido paciente com você, mas você insiste em fazer esses seus joguinhos. Eu não sou de ferro, poxa!

Meu lábio começou a tremer e tive que respirar fundo para não começar a chorar ali na frente dele, mas meus olhos me denunciaram e deixei escapar uma lágrima. Enxuguei rapidamente com o braço e voltei a encará-lo, incrédula do que acabara de ouvir.

– Desculpa se passei a impressão errada, eu me deixei levar pelo calor das emoções, não estava pensando claramente no momento.

– E como! – Roger respondeu, virando as costas para mim. Pegou a camisa pendurada no cabide, se vestiu, apontou para a porta e disse em um tom mais suave: – Estou atrasado e estão procurando por você, é melhor irmos.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Calma gente, daqui para amanhã posto o restante desse capítulo. Só adiantei a metade para aliviar um pouco a ansiedade!
Beijos e não esqueçam de comentar!