Sonho Renascido escrita por Janus


Capítulo 5
Capítulo 5




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 Não entendia o que estava fazendo de errado agora. Uma hora atrás tinha feito um clone perfeito, mas os seguintes não o foram. Estava começando a imaginar porque poucos ninjas utilizavam aquela técnica com freqüência. Parou de treinar quando ouviu um som de batidas de madeira. Quando se virou para a origem do som viu suas amigas finalmente retornando.

 - O que houve com vocês duas? – perguntou olhando-as com as mãos cheias de galhos pequenos e com suas roupas sujas de terra.

 - Graças a Deus você ficou aqui – disse Haruka ofegante – se tivesse ido nos procurar estaríamos todos reprovados agora.

 Ambas jogaram a madeira que trouxeram no chão e ele viu surpreso que era uma quantidade muito grande. Bem mais do que o necessário para assar um mero coelho.

 - Não acham que pegaram muito?

 - Não quero voltar tão cedo para a floresta – disse Ayame massageando os pulsos. Foi quando Minato reparou que eles estavam esfolados – mas vamos ter que fazer isso para termos comida mais tarde, precisamos planejar direito uma estratégia.

 Minato coçou a cabeça tentando entender o que estava acontecendo. Ambas estavam sujas de terra, e vendo Haruka, notou que ela também tinha marcas nos pulsos.

 - O que houve? – perguntou com mais urgência.

 - O sensei nos atacou de surpresa – disse Haruka que tinha ficado de costas para ele enquanto tirava a camisa preta e a batia com as mãos tentando deixá-la mais limpa – nos deixou amarradas no meio do mato. Não foi fácil nos soltarmos, mesmo rastejando para perto da outra.

 - Acabei com minhas unhas desfiando as cordas – completou Ayame que fazia a mesma coisa, mas não ficou de costas para ele pois usava um sutiã. Seu corpo estava um pouco melhor desenvolvido que o da amiga – não tinha como soltar os nós. E ele fez o favor de pegar nossas bolsas e as pendurar numa árvore para não alcançarmos as kunais ou shurikens.

 - Estavam presas nessas duas horas? – comentou ele as observando.

 As duas ficaram quietas por algum tempo. Haruka já tinha começado a vestir sua camisa quando respondeu.

 - Duas horas? Nossa... não é a toa que nossas mãos estavam dormentes.

 - Haruka-chan, pode acender o fogo? – pediu Ayame pegando um pedaço bem fino de madeira e indo onde a carcaça preparada estava.

 Haruka pegou alguns dos galhos e os colocou formando uma pequena pilha a uma distancia segura do equipamento e do local que montaram acampamento. Colocou algumas folhas secas bem posicionadas entre a madeira e pegando um isqueiro da sua mochila as acendeu e ficou soprando enquanto protegia tudo com as mãos. Minato tinha pego dois outros gravetos e com sua kunai e fez um chanfro em cada um destes, fincando um de cada lado do monte de madeira começando a queimar. Ayame completou o trabalho colocando o coelho devidamente espetado entre os galhos com chanfros.

 - Eu pego o tempero – disse Haruka se afastando rumo a sua mochila. Ayame e Minato sentaram-se perto do fogo.

 - Consegui fazer um clone enquanto estavam fora – disse ele -  o segredo é não imaginá-lo como uma cópia, mas como parte de você quando está fazendo o jutsu.

 - Bom saber  - disse ela – mas porque não o mandou nos procurar?

 - Eu mandei – respondeu cruzando os braços sobre os joelhos – mas ele sumiu assim que saiu de minha vista – sentiu-se envergonhado depois de dizer isto.

 - Sensei... – disse ela fazendo uma boca torta.

 - O curioso é que quando ele sumiu eu fiquei sabendo. E também fiquei sabendo onde ele estava, como se tivesse visto com os seus olhos. Só tinha dado uns dez passos entre as árvores.

 - O sensei está de tocaia nos esperando – disse ela – acho que usar os clones pode ser a nossa única saída. Pelo menos para distraí-lo. Acha que pode fazer mais um destes?

 - Depois daquele os outros não ficaram muito bons – ele fez uma cara fechada.

 - Hum... já esta cheirando bem – disse Haruka se juntando a eles com um prato com algumas ervas que tinha pegado da mochila – bem, o que vamos fazer depois de comer?

 - Temos cinco dias ainda – começou Ayame virando o galho em que o coelho estava espetado para cozinhar do outro lado – e temos bolachas guardadas nas mochilas para esta noite. Acho melhor treinarmos aqueles jutsus de ontem. Se você e Minato-kun dominarem o clone das sombras, vai ser mais fácil procurarmos comida amanhã. E acho que também consigo dominar aquele kinobori ainda hoje, ou ficar bem perto disto. Ai podemos inverter o treino.

 Haruka apenas maneou a cabeça concordando. Estava sentindo seu estomago roncar devido a ter comido pouco no dia anterior.

 - Acho que é uma boa idéia – concordou Minato – mas isso apenas resolve o assunto para os próximos dias. Como vai ser quando ele atacar?

 As duas ficaram arrepiadas com o pensamento, e ele também ficou preocupado quando as percebeu assim.

 - Podemos esconder a bandeira – disse Haruka.

 - Ele está com certeza nos vigiando agora. Vai saber se fizermos isso – disse Ayame.

 Minato fez um bico enquanto pensava. O sensei deles era um jounin. Não iam ter nenhuma chance o enfrentando diretamente. Foi quando olhou para Haruka-chan e teve uma idéia. Mas para dar certo ia ter de manter isso escondido de suas amigas.

 

-x-

 

 Suas pernas tremiam na mesma proporção que o solo vibrava com as pisadas que se aproximavam dele. Já tinha visto javalis em cercados antes e sempre achou que eram um tipo de porco com dentes grandes. E ele estava na verdade certo, mas diferente dos porcos, ele sabia usar aqueles dentes, e era rápido também.

 Bem mais rápido do que gostaria, na verdade.

 Ele tentou se manter fiel ao plano, mas não conseguiu. Quando o javali estava próximo demais ele saiu correndo. Pior, saiu correndo em uma direção que deixava o javali longe demais para seus colegas pularem por cima dele.

 Já gritava por socorro conforme corria desesperado com o animal furioso atrás dele, e a cada vez que olhava por sobre o pescoço, mais e mais aquelas presas se aproximavam. Em sua corrida para escapar não percebia que se afastava de seus companheiros, e estes não eram rápidos para segui-lo pelas arvores.

 Ele contornou uma árvore e estacou em pânico ao ver que o javali não o seguiu, mas o cercou pelo outro lado. Não tinha sido algo planejado, ele apenas não percebeu que estava muito distante ainda e que o javali apenas ia pela direita da arvore ao passo que ele foi pela esquerda. Seus pés escorregaram no solo macio e úmido mas conseguiu firmeza suficiente para dar alguns passos para trás e escapar por pouco daquelas presas. Por sorte o javali não conseguia fazer curvas fechadas.

 Ouviu seus companheiros chamando por ele e correu naquela direção com o javali já atrás dele novamente. Desta vez ia seguir o plano – mesmo porque se não o fizesse, nem queria imaginar o que ia ocorrer – levou o javali para a arvore onde eles estavam e rezou para eles não errarem.

 Eles não erraram, mas ele devia ter rezado também para conseguirem se segurar firme. Os dois caíram nas costas do javali, mas devido a queda ter sido de apenas meio metro, o peso de ambos não quebrou os ossos do animal como tinham planejado, apenas lhe deu uma bela dor na espinha, deixando-o mais furioso ainda. E para piorar eles não conseguiram se segurar nas costas dele, que era o plano principal. Se o tivessem feito, seria fácil usar uma kunai em seu pescoço.

 Ringo apenas abriu a boca de pavor e continuou correndo, mais rápido que antes. Mas logo viu que o javali não o seguia. Jiro tinha agarrado o rabo dele e o puxado com força, atraindo sua atenção. Agora era ele quem corria desesperado com o javali atrás. Pelo menos deu uma folga a Ringo para recuperar o fôlego.

 Outro som do javali e ele viu que Yoshi tinha feito o mesmo que o colega, tinha agarrado o rabo da fera. Observando isso ficou pensando... porque não?

 Correu em direção ao amigo que corria para o seu lado. Contornou algumas arvores para não ser visto e quando teve a oportunidade agarrou o rabo do animal e o puxou também. Logo em seguida correu se afastando mas reparou que desta vez ele não o perseguiu.

 Ele parou de correr e o observou com o olhar assassino, mas preferiu seguir a presa anterior. Yoshi também percebeu e continuou correndo, mas não reparou que estava indo em direção ao riacho até ser tarde demais. Distraído olhando para trás ele tropeçou nas pedras soltas sob as águas e caiu no chão. O javali mesmo escorregando nas mesmas pedras tinha quatro patas para dar apoio, e continuou avançando.

 Yoshi levantava-se e caia toda hora, desesperado demais para coordenar seus movimentos, e mais e mais aquelas presas se aproximavam. Quando pensou que era o fim uma grande figura branca e peluda pousou na água atrás dele e agarrou sua gola com poderosas mandíbulas. Logo em seguida ele estava em cima de uma arvore com Akamaru ao seu lado, que tinha ficado observando os genins para o caso de precisar ajudá-los.

 Não vendo mais sua presa, o javali se voltou para Ringo que escorregou no solo enquanto tentava mudar de direção. Uma kunai acertou a cabeça do javali neste momento, apenas fazendo uma ferida entre os olhos. Como o sensei tinha dito, uma kunai atirada faria pouca coisa além de deixá-lo mais nervoso.

 Era bom Akamaru pegá-lo logo, pois sentia as pernas fraquejando. Quando se virou para trás para ver a distancia entre ele e o javali ficou surpreso ao ver Jiro saltando e se agarrando nas costas dele.

 O javali começou a agir como um cavalo selvagem tentando tirar um predador das costas. Pulava e girava o corpo com força, mas Jiro se mantinha firme. Mas também não conseguia mover a kunai para onde devia. Na verdade, a kunai estava quase escapando de sua mão. O que iam fazer agora?

 Foi quando teve uma idéia. Pegou a corda que tinha em sua bolsa e fez um laço com ela. Correu para onde os dois estavam e ficou tentando laçar as patas traseiras da fera. Não era fácil, sempre que tentava agarrar acabava levando um coice, pois ele não parava de pular, e o pior era que as vezes tentava correr na sua direção, o que o obrigava a se afastar. Por fim abriu um grande laço e o colocou no chão bem atrás das patas dele. Assim que estas ficaram dentro deste, puxou com força, laçando as duas patas ao mesmo tempo.

 Mas o bicho era forte! Quando o puxou, foi puxado de volta e caiu no chão. Não fosse Jiro bater na sua cabeça para distraí-lo ele o teria acertado com as presas. Levantou-se e tentou puxar novamente, mas sua força parecia não ser o bastante. Foi quando sentiu que a corda era puxada por mais alguém. Era Yoshi que tinha descido da árvore para ajudá-lo.

 Mesmo os dois juntos não conseguiam dominá-lo, e Ringo anotou mentalmente para nunca mais considerar os javalis como meros porcos com dentes grandes. Aquela coisa parecia um touro pela maneira que agia.

 Eles puxavam com força para que o javali não pudesse pular muito, mas só conseguiram resultados quando Akamaru mordeu a corda e ajudou a puxar. Isso distendeu as patas do animal e Jiro finalmente teve chance de usar a kunai. Acertou a primeira estocada no pescoço, mas perfurou pouco e no lugar errado. Ele apenas soltou um som incrivelmente alto e apavorante. Na verdade parecia um terrível grito de agonia que chegou a deixar os três com pena da criatura. Determinado, ia tentar uma segunda vez mas foi impedido pelo sensei que apareceu ninguém sabia de onde.

 Ele olhava sério para Jiro, que não entendia porque ele o deteve. Pegou a kunai de suas mãos e olhando diretamente nos olhos do animal, a cravou bem entre eles, dando-lhe uma morte instantânea e indolor.

 - Desculpe, Jiro – disse ele – mas você não estava mirando direito. Ia apenas machucar mais e mais o animal e ele ia continuar gritando em agonia. E eu pessoalmente não gosto disto.

 - Tudo bem sensei, eu também não ia gostar – ele ofegava quase sem ar. Demorou quase dois minutos até sair das costas do animal. Seus companheiros se permitiram cair no chão e descansar. Estavam todos famintos, mas não tinham forças para fazer nada no momento.

 Kiba olhou para os três com os olhos inexpressivos, quase como se os estivesse repreendendo. Mas estava na verdade impressionado. A melhor maneira de se pegar um javali com pouco risco seria abrir um buraco e induzi-lo a cair neste. Ia sugerir isto para eles, mas os três tinham arquitetado o próprio plano, e parecia ser razoável, especialmente por terem apenas as mãos para cavar. Então decidiu deixar eles tentarem, mas ficou próximo para o caso de ficarem com problemas. E fez muito bem.

 Tinha conseguido ajudá-los sem que percebessem atirando pedras nas patas do javali para este não conseguir correr muito. Mas quando Yoshi ficou  cercado no rio não foi mais possível, teve que mandar Akamaru salvá-lo. E novamente precisaram de ajuda pois não tinham a força física necessária para dominar a criatura. Mas tinha que admitir que apesar do medo que sentiram, conseguiram planejar o que fazer na situação desesperadora.

 - Chega de descanso – disse ele – agora precisam arrastá-lo de volta para o acampamento e prepará-lo.

 Os três o olharam com os olhos implorando piedade, mas ele não lhes deu atenção. Montou em Akamaru e foi com ele até onde montaram acampamento. Ao chegar observou com mais cuidado as camas que prepararam com folhas e galhos secos. Pelo menos isso eles fizeram certo, e também a cobertura com galhos amarrado com fibras. Se chovesse teriam um teto. Mas ainda estava preocupado em como fariam fogo.

 Quarenta minutos depois os três chegavam arrastando o javali morto pela corda que Ringo tinha usado. Caíram de exaustão a poucos metros de distancia e por lá ficaram por mais uma hora. Chegaram mesmo a cochilar. Mas Kiba não sentiu piedade. Quando acordaram ele os mandou abrir um buraco fundo usando as kunais como pás, com quase meio metro. Quando terminaram ele puxou o javali para este buraco e deixou a cabeça dele em cima do mesmo.

 - Ringo, pegue uma kunai e venha aqui.

 O garoto obedeceu, posicionando-se bem a frente do pescoço do javali e aguardando.

 - Corte aqui – ele apontou com um dedo no pescoço do animal – bem fundo.

 Ele obedeceu, e logo em seguida sentiu asco. Começou a sair sangue do corte que tinha feito.

 - Bem diferente de pegar uma carne já cortada do açougue, não é mesmo? – disse aos três que apesar de não se sentirem bem, não conseguiam tirar os olhos da cena – bom, quando apenas ficar gotejando, vou mostrar como cortar e separar o couro e os órgãos internos. Aproveitem este tempo e vão pegar madeira para fazer a fogueira. A propósito. Alguém trouxe um isqueiro?

 Os três negaram com a cabeça.

 - Alguém conhece algum jutsu de katon?

 Os três negaram novamente. Pensou em fazê-los comer a carne crua, mas não estava se sentindo tão malvado assim. Pos as mãos no bolso e jogou alguns fósforos para eles.

 - Agora peguem madeira e folhas secas – comandou ele.

 Levou duas horas até acenderem o fogo e limparem o animal. Mas agora tinham comida para alguns dias pelo menos, bem como um local para descansarem com algum conforto. Mas quando começaram a comer ele viu que talvez a carne não durasse nem até o jantar. Eles realmente estavam esfomeados, e não tinham nenhum pudor em comer com as mãos mesmo. Depois disto caíram no sono pelo resto da tarde.

 Kiba sorriu satisfeito. Seus genins finalmente estavam percebendo que a vida de um ninja não é assim propriamente romântica como imaginavam. Mas também estava sentindo um certo orgulho deles terem enfrentado um javali com tão pouco preparo.  

 No dia seguinte voltaram a tentar pegar Akamaru, mas desta vez estavam trabalhando juntos. Kiba decidiu retirar a regra de que quem não pusesse a coleira, estaria reprovado.

 

-x-

 

 Ouvia uma goteira distante, mas nem ao menos tentou abrir os olhos. Não tinha interesse em saber onde estava bem como se tinha sido resgatada ou se apenas era prisioneira de outra pessoa. Considerava-se morta desde o momento que percebeu que não podia mais mover as pernas. Não só isso, tinha também dificuldade para respirar e até mesmo para manter a consciência. Aquele shinobi devia tê-la matado logo e não deixá-la sofrendo daquela forma. Mas considerando o que já tinha feito antes, não podia realmente ser justa com um pedido de morte rápida.

 Pensou mesmo que ela estava chegando desta vez. Mais alguns dias e iam decapitá-la. Até ser resgatada. Não acreditou nisto. Porque alguém a acharia útil? Tinha falhado em sua missão e tinha sido capturada. E nada podia fazer para tirar a própria vida. Mesmo seus braços mal obedeciam. Não tinha força com eles para cortar a própria garganta.

 Aquele que a trouxera até ali nada tinha dito. Apenas a carregou com delicadeza pelo caminho que mal se recordava devido a ter perdido os sentidos tantas vezes. Desde então tinha ficado largada ali naquela cama. Uma cama descente pelo menos, mas ninguém tinha ido vê-la ou conversar. Sabia que alguém estava cuidando dela pois estava sempre limpa e o soro espetado em seu braço era trocado quando se esgotava. Mas fora isso, não tinha reparado em mais nada que indicasse que alguém tinha interesse nela.

 Ouviu passos pelo corredor. Não era a primeira vez, e temia não ser a ultima. Concentrou-se em manter a mente limpa, apressando um estado de inconsciência que viria mais cedo ou mais tarde.

 Mas não conseguiu. Diferente das outras vezes os passos não se afastavam, continuavam mais e mais próximos. Abriu os olhos e ficou olhando a parede do quarto em que estava, imaginando em que ponto do corredor atrás desta a pessoa estava. Viu a sombra de suas pernas por baixo da porta e suspirou resignada. Finalmente alguém fora vê-la.

 A pessoa ficou atrás da porta por alguns segundos, como se esperasse algo. Irritada, decidiu falar.

 - Vamos acabar logo com isso – murmurou ela esperando que a pessoa atrás da porta ouvisse.

 Ouviu o som da maçaneta se abrindo e observou a figura que entrava. Não era a mesma pessoa que a tinha resgatado da prisão. Usava um capuz e capa que cobria todo o seu corpo, de forma que apenas podia ver suas mãos. E estas eram muito brancas, quase como se fossem de um cadáver. Como ela própria estava a beira da morte, não se incomodou com isso.

 - Faça suas perguntas – murmurou ela sem fôlego – só quero que me mate ao fim de tudo. Não suporto mais isso...

 - Perguntas, Etsu-chan? Acha que eu teria todo esse trabalho apenas para interrogá-la?

 Sua voz era suave, e ele falava de forma muito pausada, como se estivesse descontraído. Na verdade tinha dito o seu nome de forma tão pausada que parecia que o tinha soletrado.

 Espere...

 Como ele sabia o seu nome?

 - O que quer? – ela tentava fixar os olhos nele, mas além de sua visão estar turva, a iluminação do local deixava seu rosto totalmente negro.

 Ele riu levemente. Aproximou-se dela e retirou lentamente o lençol que a cobria. Ficou um pouco perplexa com a ação dele, mas como não sentia nada do peito para baixo, mal se incomodou.

 - Não é terrível este belo conjunto de músculos e carne estar fadado a ficar imóvel agora? – disse ele em um tom com leve sarcasmo que longe de a deixar assustada, apenas lhe deu vontade de bocejar.

 - Não poder nem ao menos sentir a brisa sob a ele – continuava ele tocando o dedo indicador da mão direita na sua barriga. Ela notou que este não só era muito branco, como parecia haver algumas dobras... talvez escamas neste – mal sentir o gosto da comida – seu dedo tocou sua garganta – lábios que ao fim de cada missão se deliciavam com vinho caro e fino das melhores fazendas – tocava seus lábios e deslizava suavemente por eles.

 Parecia que a conhecia bem, mas não estava realmente impressionada. Mal sentia dor, por isso não temia tortura agora. E se era uma tortura psicológica, estava dando muito errado.

 - Porque alguém como eu teria interesse em resgatá-la neste estado, Etsu-chan? – sua mão agora estava em sua testa, mantendo suas pálpebras abertas de forma a olhar diretamente para seus olhos que pela penumbra percebia serem amarelados – uma das melhores kunoichis assassinas do País do Fogo, relegada a uma mera boneca indefesa.

 Ficou quieta olhando aqueles olhos. Não se sentia incomodada com eles, mas estava curiosa sobre onde ele queria chegar com aquela conversa. Se queria lhe mostrar o quanto estava debilitada, não precisava. Sentia-se tão prisioneira de seu corpo imóvel que já tinha pensando em simplesmente morrer de inanição.

 - Diga-me, Etsu-chan – novamente ele disse seu nome como se soletrasse as silabas – o que pagaria para poder ter de volta tudo isso que perdeu?

 Semicerrou os olhos e o observou bem. Se tivesse sido operada por um excepcional ninja médico logo após ser ferida poderia ter se recuperado, mas agora dias depois sabia ser impossível. Achava que a enganava? E porque iria querer isso? já tinha se disposta a contar o que sabia, desde que a deixassem morrer.

 - Se quer saber de algo, pergunte. Já disse que vou dizer, só quero morrer depois disto.

 - Não minha cara Etsu-chan, não há nada que saiba que me interesse no momento. De fato, eu quero fazer uso de algumas de suas habilidades ninja. Habilidades que quase a deixaram apta a matar um dos lordes feudais.

 Ela engasgou-se quando riu daquilo. Suas habilidades?

 - Como já disse, estou presa a esta cama.

 - E, como eu também disse, o que faria para poder sair dela? Andar novamente, ter suas habilidades ninja de volta?

 Olhou em seus olhos novamente. Ele estava falando serio? Não via sentido em tentar enganá-la. Na sua atual posição não poderia impedir uma criança de fazer o que quisesse com ela, quanto mais alguém como ele, que parecia ser muito ameaçador apesar de falar daquela forma calma e amiga.

 - Isso... não é possível...

 - E se for, Etsu-chan. O que faria? Claro, não será rápido, mas creio que em duas semanas após meu tratamento irá ser tudo o que era antes. Mas vou querer que me pague por isso.

 - E o que vai querer? Ouro, jóias? A morte de alguém?

 - Há... parece que a mercenária dentro de você voltou a vida. Pense um pouco minha cara... o que eu iria querer de você?

 Pensou um pouco no assunto. O colega dele que o resgatou não deveria ter problemas para obter riquezas se assim o quisesse. Sendo assim, o que iria querer em troca desta oferta?

 - Quer que eu lhe faça alguma tarefa – murmurou olhando-o com os olhos frios – algo que você e seu amigo não poderiam fazer.

 - Inteligente como eu tinha pensado. Sim Etsu-chan, eu quero que me faça alguns.. favores. Favores que vão necessitar de algumas de suas habilidades raras.

 - Minha percepção de chakra...

 Ele não respondeu, mas percebeu o reflexo da luz das tochas em seus lábios que formavam um grande sorriso. Então era isso o que ele queria! Queria um sensor, alguém que podia rastrear chakra. Bom, se ele a curasse, iria atendê-lo. Mesmo porque sentia que ele poderia tirar facilmente o que estava para lhe dar.

 - Acho que podemos negociar – disse ela demonstrando pela primeira vez em dias uma vontade de viver em seus olhos.

 

-x-

 

 Tinha que admitir. Estava muito impressionado com aquele trio. Sem nenhuma instrução da parte dele, mostraram que tinham um bom conhecimento de técnicas de sobrevivência, especialmente Minato que por vezes usou clones para distraí-lo enquanto pegava raízes no meio da mata. Inclusive ele era o único que prestava uma boa atenção ao redor, escolhendo o caminho entre as árvores para ficar sempre o mais distante possível de qualquer emboscada. Enganou-o com os clones e kawirimi várias vezes durante aqueles dias. Haruka também dominava com perfeição o jutsu de clone das sombras, mas como tinha aconselhado, usava poucos destes por vez. Mas foi inesperado ela usar um clone transformado em Minato para dar a impressão de que ela e ele estavam indo juntos pegar peixes. Enquanto ficou distraído tentando pegá-los de surpresa, os clones de Minato conseguiram colher frutas e também encontrar a sua mochila com mantimentos, não deixando nada para ele. Sua única compensação foi manter Haruka como “prisioneira de guerra” por algumas horas, fazendo cócegas ocasionais nos seus pés até um grupo de clones de Minato aparecer para o resgate.

 Imaginava o que fariam no dia seguinte, que era quando a prova iria começar de verdade. Observando-os agora, pareciam apenas estar treinando. Ayame praticava o jutsu do clone das sombras, Minato parecia querer aprimorar alguma coisa na técnica, visto que parecia tentar algo diferente e seus clones saiam imperfeitos, e Haruka treinava o kinobori nas arvores do outro lado. Estranho que ela e seu clone treinavam ao mesmo tempo. Será que ela percebeu que o que o clone aprendia retornava para ela assim que o jutsu era desfeito? Era bem provável. Ela era muito esperta e tinha um controle natural de seu chakra, facilitando o aprendizado de qualquer jutsu. Minato era mesmo como o pai, aprendia melhor por tentativa e erro, mas parecia ser bem mais paciente que este. Bom, as vezes...

 Sentiu uma presença no pé da árvore em que estava deitado e franziu o cenho. Não era um genin, tinha certeza disto. Quando olhou para baixo viu Kiba subindo pelo tronco da árvore em sua direção. Será que ele já tinha terminado com os alunos dele?

 - Veio fazer uma visita? – perguntou assim que este ficou no mesmo galho que ele.

 - Só passeando um pouco – respondeu ele – só nos dois ainda estamos avaliando os genins. Os outros já terminaram.

 Ele imaginava aquilo. Na verdade tinha ficado surpreso de Kiba também não ter terminado a avaliação dele.

 - Como seus genins estão indo?

 - Desesperados atrás de Akamaru – ele se sentou no galho a poucos centímetros de seus pés para observar melhor o trio treinando – não pregaram o olho a noite inteira.

 - Ele é o seu teste? – Konohamaru riu – se forem espertos, vão tentar seduzi-lo com um suculento bife.

 - Perderam a chance de fazer isso uns dias atrás – ele ria enquanto pensava em alguma coisa - mas seria uma idéia válida – ele olhou de lado pensando no assunto – Akamaru não come nada desde ontem... mas e os seus pupilos? Parecem que estão treinando. Já passaram na prova?

 - Não a apliquei ainda – ele fechou os olhos para relaxar melhor – Vê aquela bandeira fincada perto das toras? Eu lhes dei cinco dias para se preparem para defendê-la. Se eu a danificar, eles estão reprovados. O prazo termina amanhã.

 - É esse o seu critério? – ele o olhou torto – eles não têm chance.

 - Que chance seus genins têm para pegar Akamaru?

 - Até que é possível, você sabe. Mas não é pegá-lo que conta.

 - Assim como não é conseguir defender a bandeira neste caso – retrucou ele.

 Kiba sorriu indicando que tinha entendido.

 - De qualquer forma – ele continuou – vai ser a Sakura-neechan quem vai decidir se estão aprovados ou não. Moegi-chan me sugeriu esse tipo de avaliação. Eles cresceram juntos, fizeram traquinagens na aldeia juntos, e mostraram que sabem muito bem como se virar no meio do mato. Um teste de trabalho de equipe é desnecessário.

 - Que inveja... meus alunos nem sabiam acender uma fogueira. Na verdade aposto que foi a primeira vez que ficaram sozinhos na vida. Mas se forem aprovados eles já fizeram uma missão de nível “C”.

 - Como? – ficou curioso com aquela informação.

 - Eles vieram sem estarem preparados. Nem mesmo trouxeram uma garrafa de água com eles. Então no segundo dia eu achei melhor lhes ensinar o básico de acampamentos, e calhou de ter um javali solto perto de onde estávamos. Eu os levei para caçá-lo e terem comida por uns dias.

 - Você colocou três genins inexperientes para caçar um javali? – abriu os olhos para ele surpreso.

 - Coloquei sim. Eles escolheram isso. Claro que se soubessem como um javali é perigoso, iriam preferir caçar uma ave – ele riu um pouco – mas conseguiram fazê-lo. A noite fui na aldeia só para informar o ocorrido e descobri que o tal javali era um fugitivo de uma entrega de animais da aldeia. Já estava classificado como uma missão de nível “C” que a hokage iria dar para um dos times aprovados.

 - Hum... – fez ele pensativo.

 - Mas não teriam feito o trabalho sozinhos – admitiu com um sorriso amarelo – na verdade, se Akamaru não os ajudasse, o javali teria acabado com eles. Mas pelo menos perceberam como é importante se estar preparado.

 Ele balançou a cabeça concordando.

 - Nesse assunto estou em bem melhor situação. Essa turma ai veio preparada até demais para genins recém formados.

 - Concordo – disse ele observando as crianças a distancia. Apertou os olhos para observar melhor e parecia haver mais de um Minato ali – vejo que está ensinando a técnica do clone das sombras para Minato.

 - Ensinei para todos. Mas como eu esperava, só ele tem chakra em quantidade para fazer clones e mais clones, mas não percebeu isso ainda. Haruka praticamente já aprendeu a técnica, mas não deve conseguir fazer mais do que três destes ao mesmo tempo. E já sabe como aplicar a transformação nos clones. Ayame já domina o kinobori e agora quer fazer este jutsu. Só não entendo o que Minato esta fazendo agora. Ele já sabe fazer o justu há dois dias, mas parece estar tentando algo novo com ele.

 Viu o garoto chutando um dos clones que estavam caídos no chão e riu com gosto.

 - Shikamaru me disse que pode ser um erro querermos que ele se torne um novo Naruto.

 - Sei disso. Vou lhe ensinar as técnicas. Se ele vai usá-las, será decisão dele. Mas no tocante a alguém com a personalidade Naruto, Ayame é a melhor escolha. Está se sentindo compelida a competir com a amiga. Viu no primeiro dia que ela estava aprendendo melhor a fazer o bushin e decidiu desistir. Mas eu a vi praguejando a cada vez que ela fazia um clone melhor que o anterior.

 Ficou observando as crianças praticando por algum tempo. Depois reuniu coragem para dizer o motivo de estar ali.

 - Miki-chan foi reprovada pelo sensei dela – murmurou um pouco chateado – vim aqui porque estava preocupado com Minato.

 - Foi reprovada?

 - Todo o time na verdade. Sei que isso é mais comum do gostaríamos. Na verdade muito poucos recebem a aprovação final. Mas fico chateado com isso. Ela é a irmã de Shino. Acho que ele ficaria arrasado se estivesse vivo.

 - Talvez não. Melhor ser reprovado agora do que ser reprovado em uma missão, ou seja, ser morto.

 - Eu sei – disse ele com o rosto abatido – mesmo assim, fico chateado. Não sei qual a expectativa que o clã tinha para com ela, mas espero que sejam compreensivos.

 - Falando em clãs, e você?

 - O que tem eu? – olhou para ele com os olhos arregalados.

 - Foi ou não foi conversar com a amiga da Moegi-chan?

 - Há, isso? – ele ficou encabulado – eu não sei... depois das ultimas duas... eu acho que ela vai fugir com medo de mim como as outras.

 - Nunca saberá se não tentar – disse ele sorrindo.

 - Depois que terminar esta prova vou pensar no caso, prometo!

 Konohamaru apenas relaxou melhor no galho de árvore, ignorando a falta de jeito que o amigo ficou. No dia seguinte iria saber como os seus genins realmente estavam. E era bom o surpreenderem, pois diferentes dos outros times eles estavam melhor preparados, portanto sua avaliação também tinha que ser mais rígida.


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