Trevo de Quatro Patas escrita por Maremaid


Capítulo 11
Solangelo no céu com estrelas


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente ;)
Atenção: Capítulo com altas doses de açúcar e fofura! Boa leitura!

P.S.: Título inspirado em "Lucy in the sky with diamonds" dos Beatles.



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Nico tateou o lugar ao seu lado na cama. Vazio. 

Sentou-se na cama, esfregou os olhos e observou o cômodo. O quarto ainda estava com as cortinas fechadas, mas dava para ver que já havia amanhecido por causa da claridade. Estava silencioso, silencioso demais. 

  — Will? — Nico chamou, mas não obteve resposta. Na sua cama improvisada no chão, Cérbero ergueu a cabeça e olhou para ele. 

Então, calçou o chinelo e abriu a porta — com o filhote logo atrás —, checando o banheiro e a cozinha, mas Will não estava em lugar algum do apartamento. Será que seu vizinho havia saído para ir à padaria? Ou já tinha ido para a aula? Afinal, que horas eram?  

Ele voltou para o quarto e finalmente reparou em um post-it amarelo colado no abajur: 

Bom dia, dorminhoco! Dormiu bem? Espero que sim.

Infelizmente, precisei ir para a aula. Desculpa sair sem me despedir, mas você estava dormindo tão profundamente que não quis te acordar. Enfim, tenho duas perguntas: 

1- Você está livre hoje à noite?

(  ) SIM (  ) NÃO

2- Se a resposta for “sim”, quer ir a um encontro comigo?

(  ) SIM (  ) NÃO

Me mande uma mensagem com a sua resposta. Ah! Cérbero pode ir conosco! 

— Beijos, Will.

Nico deixou escapar um suspiro. Por um lado, estava curioso para saber como Will era quando acordava — provavelmente continuaria lindo, mesmo com o cabelo todo bagunçado e a cara de sono. Porém, por outro lado, Nico estava aliviado por ele já ter saído. Não sabia como o encararia após o que aconteceu na noite interior.

Três coisas o impediram de seguir em frente na noite passada. 1- Cérbero estava com eles no quarto. Ele realmente não queria que aquele pestinha os atrapalhasse novamente.  2- Nico estava completamente exausto e esgotado devido à falta de sono. E se ele acabasse apagando bem na hora “H”? Céus, isso seria humilhante! 3- Uma palavrinha de apenas duas sílabas e seis letras o assombrava: virgem. Nico cogitou se contava isso para Will ou não, mas só pela reação exagerada dele quando as coisas estavam começando a esquentar era muito provável que seu vizinho já soubesse. Droga!

Nico andou até a escrivaninha e avistou uma caneca que tinha aquele robôzinho de Stars Wars — como era mesmo o nome dele? R2-D2? Algo assim — e pegou uma das canetas. Assinalou “sim” nas duas respostas e bateu uma foto com o celular, mandando uma mensagem para Will perguntando aonde eles iriam. 

Trocou de roupa, voltando para seus trajes pretos. Nico não era do tipo organizado, mas achou que seria má educação deixar o quarto de Will bagunçado. Então arrumou a cama e dobrou o pijama usado, o deixando em cima da colcha. Olhou para o cobertor que Cérbero havia dormido, sem saber ao certo o que fazer. Não podia simplesmente guardar no guarda-roupa ou deixar em cima da cama, afinal, estava cheio de pelo. Então, apenas o dobrou e deixou na cadeira da escrivaninha.

  — Ei, vamos! — Ele chamou Cérbero, que prontamente o seguiu com o rabo abanando. 

 Ao chegar à porta, notou outro post-it amarelo colado perto da maçaneta: 

Use minha chave reserva, ela está no chaveiro do seu lado esquerdo ;)

— Beijos, Will.

Ele pegou a chave e saiu do apartamento do vizinho, voltando para o seu. Deu comida para o cachorro e pegou algo para si também, tomou café enquanto terminava de revisar a tradução antes de enviar. 

Quando parou para almoçar, checou o celular e viu que Will havia respondido sua mensagem: 

Ok, então te vejo de noite! 

Quanto ao lugar do nosso encontro… é uma surpresa :) 

— Surpresa?! — ele exclamou, olhando para a tela do celular. 

***

Will aproveitou os dois dias em que Nico estava ocupado trabalhando para botar em prática seu plano. Se dependesse dele, o próximo encontro dos dois seria inesquecível

Normalmente, ele ia para a biblioteca com os colegas na sexta-feira para revisar o conteúdo da semana, mas avisou para eles que tinha um compromisso importante e foi direto para a casa assim que a última aula terminou. Quando chegou ao prédio, em vez de pegar o elevador e subir, continuou andando e parou na frente do único apartamento que havia no térreo. 

Will apertou a campainha e esperou, mas ninguém veio atender. Ele aproximou a cabeça da porta, ouvindo vozes lá dentro e sabia que havia um convidado no recinto. Apertou de novo, agora com mais vontade.

Após alguns longos segundos, a porta fora aberta de maneira brusca.

— Boa noite, sr. D! — Will deu o seu melhor sorriso, pronto para agradar o síndico do prédio. 

— O que foi? — Ele resmungou, não parecendo nada contente. O síndico estava usando mais uma de suas camisas horríveis com estampas de animais, uma bermuda roxa e chinelos.  

— Dioniso, seja mais gentil com os moradores. — Um homem de meia-idade numa cadeira de rodas saiu da cozinha. Ele tinha o cabelo ralo e a barba desalinhada, usava um casaco de tweed e estava com uma bandeja com xícaras no colo. — Olá, Will. Como vai? — sorriu de modo simpático para ele.

O homem em questão era Quíron Brunner, um dos moradores mais antigos do prédio e provavelmente a única pessoa que conseguia conviver com o temperamento ruim do síndico. Eles frequentemente se encontravam para jogar cartas. 

— Oi, sr. Brunner! — Will devolveu o sorriso. — Estou bem e o senhor?

— Ah, com um pouco de dor nas costas, mas é da idade e...

Sr. D pigarreou alto, apenas para mostrar que ainda estava presente e não gostava de ter sido excluído da conversa. 

— O que você quer mesmo, moleque?  

— Ah! Eu vim pegar aquilo. — Will olhou de soslaio para o sr. Brunner, que agora estava indo em direção à mesa. Ele não sabia se o Sr. D havia dito algo para o amigo, então achou melhor ser discreto. —  Assim como havíamos combinado. 

Sr. D ficou o encarando por longos  — e torturantes — segundos, com uma expressão indecifrável no rosto.  Will achou que o homem ia mandá-lo embora aos gritos e bater a porta na sua cara, mas ele apenas soltou um grunhido em resposta, que tanto poderia ser um “já volto” como um “odeio ser síndico desse prédio” e sumiu em um dos cômodos. O síndico voltou algum tempo depois com uma caixa quadrada de madeira em mãos. 

— Aqui. — Ele abriu a caixa, revelando o conteúdo. 

Will sorriu e ergueu as mãos na direção do objeto, mas o Sr. D recuou antes que ele pegasse, fechando novamente a caixa.   

— Tem certeza que você não está pretendendo dar uma festa? — a expressão do sr. D parecia desconfiada, mas Will o conhecia muito bem e sabia que ele não estava perguntando isso por ser preocupar com o bem-estar dos moradores, assim como um síndico deveria fazer, mas porque também adoraria ser convidado para essa possível festa.

— Não, não é uma festa. — Ele repetiu a mesma resposta que já havia dado ao síndico quando foi falar com ele dois dias atrás. — Quanto à sua chave, devolverei amanhã. 

— Hm, certo. Pegue — ele ainda não parecia totalmente convencido, mas deu a caixa para Will. — E não precisa ter pressa para devolver. 

Em outras palavras: não me acorde cedo só para devolver a porcaria dessa chave.

— Obrigado! — Will pegou a caixa e deu um sorriso enorme ao síndico em resposta. 

— Quero que você mantenha a sua boca fechada, entendeu? Sobre isso — ele apontou para a caixa. — E também para a chave. Não quero que pensem que estou te privilegiando. 

Mas Will sabia que se qualquer outro morador tivesse pedido esse favor, Sr. D teria gritando um alto e sonoro “não”. 

— É claro. 

— Agora vá, você está atrapalhando o meu jogo de pinochle. — Ele colocou a mão na maçaneta, prestes a entrar. — Eu estava ganhando. 

Não, não estava! — Sr. Brunner gritou lá de dentro do apartamento. 

— Esse velhote tem a audição de um cavalo… — Sr. D resmungou mais para si mesmo. 

Eu ouvi isso também! — Sr. Brunner exclamou. 

O síndico ignorou o amigo dessa vez e olhou para Will ao falar em tom de deboche:

— O que você está esperando, Walter? Quer que eu te acompanhe até o elevador? 

Sr. D tinha o costume de errar o nome dos moradores. Totalmente de propósito, claro, ele apenas gostava de ser irritante. Mas o homem conhecia Will há muito mais tempo do que qualquer outro morador do prédio e sabia perfeitamente como ele se chamava. 

— Meu nome é William, senhor. — Will o corrigiu, tentando não rir. 

— Foi o que eu disse! — Sr. D berrou, desempenhando com maestria o seu papel de síndico chato e turrão. 

— Certo, estou indo. Tenham uma boa noite, cavalheiros.

— Tchau, meu jovem! — Sr. Brunner inclinou-se para frente na cadeira, o suficiente para ser visto, e acenou para ele. 

Humpf. — Sr. D deu mais um de seus resmungos ao fechar a porta com força. 

— Sempre tão educado... — Will murmurou para si mesmo e se virou, caminhando em direção ao elevador. 

Ok, agora ele apenas precisava subir e terminar de arrumar tudo rapidamente. Depois, passaria no apartamento de Nico para buscá-lo e o levaria para o local. Mal podia esperar para ver a reação do vizinho.

Afinal, quem não gostava de surpresas, não é mesmo?

  ***

Nico odiava surpresas!  

E quando Will disse que havia preparado uma surpresa para o encontro deles daquela noite, ele não teve coragem de contar a verdade.

Agora, ele estava sentado no sofá, já pronto, apenas esperando o vizinho chegar. A televisão estava ligada, mas ele não estava prestando atenção. Só conseguia pensar onde Will queria levá-lo e o motivo de tanto mistério. Como disse que Cérbero poderia ir junto, não sobravam muitos lugares para o encontro. Mesmo assim, Nico ainda não fazia ideia de onde eles iriam. Sentiu uma sensação estranha no peito, um misto de ansiedade com frustração, como se estivesse andando por um túnel escuro, mas não soubesse exatamente o que iria encontrar do outro lado. 

Nico já havia dito como odiava surpresas? Pois é, ele odiava muito. 

A campainha tocou, mas Nico estava tão perdido em seus pensamentos que nem se mexeu. Cérbero, que estava deitado no chão, levantou a cabeça e começou a latir. Ele olhou para o filhote; depois, para a porta quando a campainha tocou pela segunda vez. 

— Oi! — Will disse com um sorriso enorme nos lábios assim que a porta se abriu. 

— Oi. — Nico sorriu em resposta, mas de forma muito mais contida. — Vamos? 

— Espera. — Ele botou a mão no seu ombro, o impedido de sair do lugar, e lhe olhou de cima a baixo. — Você vai assim?

Nico olhou para as próprias roupas. Estava usando uma camiseta com estampa de caveiras, calça jeans escura, coturno e sua inseparável jaqueta de aviador. Tudo preto. Ou seja, seu visual de sempre. 

— Qual é o problema com a minha roupa? — franziu o cenho.

— Nenhum! — Will tratou de se explicar, balançando as mãos. — Mas… você não está com calor? Poderia ter botado algo mais confortável. 

— Eu teria me vestido apropriadamente, se você tivesse me dito para onde vamos. — Nico o lembrou.

— Se eu tivesse te contado, não seria mais uma surpresa. — Will rebateu com um sorrisinho travesso no rosto. 

Nico analisou as roupas de Will. Ele estava usando camiseta, bermuda e chinelos. Bem, isso mostrava que eles não iriam a nenhum lugar chique, pelo contrário. Então uma ideia passou pela sua cabeça.

— Espera, nós vamos à praia de novo? — Nico não quis que sua voz tivesse soado tão estridente. 

Will deu uma risada. 

— Claro que não, seu bobo! Uma vez foi o suficiente para perceber que você não gosta de lugares assim. Mas se você quiser trocar de roupa, eu espero. 

O dia havia sido absurdamente quente e a noite continuava abafada, ele estava mesmo sentindo calor. 

— Ok, eu já volto — respondeu por fim, indo rapidamente para o quarto. Nem se deu ao trabalho de dizer para Will entrar, afinal, ele já era praticamente de casa e sabia se virar sozinho. 

 Abriu o guarda-roupa e pegou uma bermuda jeans. Não costumava sair de casa assim, pois sempre diziam que ele deveria pegar um pouco mais de sol ou que suas canelas eram muito finas. Não que realmente ele se importasse com que os outros achassem dele, claro, mas preferia evitar esse tipo de comentário para não se aborrecer. Aproveitou e trocou o coturno pelo seu All Star preto que era um pouco mais leve. Resolveu levar a jaqueta, pois poderia esfriar mais tarde. Ao voltar para a sala, encontrou Will agachado em frente ao sofá, fazendo carinho na barriga de Cérbero, que estava  jogado no chão com as pernas para cima e  apreciando muito o afeto. 

— Estou pronto. — Nico informou, já que Will estava entretido demais com o filhote e nem havia reparado na sua chegada.

Will levantou o olhar e sorriu.

— Ah, agora sim! — exclamou, levantando-se. Então foi na sua direção e segurou o colarinho da sua jaqueta, lhe dando um beijo rápido. — Vamos. 

Os três saíram do apartamento e chamaram elevador. 

— Ah, antes que eu me esqueça... — Nico usou a mão livre, já que segurava a guia com a outra, para pegar o objeto no bolso da jaqueta. — Valeu. 

Will olhou para a chave estendida na sua direção, mas continuou com as mãos no bolso, parecendo sem intenção de pegá-la.

— Você não quer ficar com ela? — ele sugeriu. 

 Céus, o que Will estava querendo dizer com isso? Não era um pouco cedo demais para eles terem a chave do apartamento um do outro? Eles ainda não estavam em um relacionamento sério!

Para ser sincero, Nico nem sabia definir exatamente o que eles tinham. Eram ficantes? Vizinhos com benefícios? Ou, talvez, algo mais? Torcia que fosse a terceira opção. 

— Por que eu ficaria? É a sua chave reserva, sua família pode precisar — deu de ombros.

Will o encarou por alguns segundos. 

— Ok, entendi, cedo demais — ele assentiu, pegou a chave e a colocou no seu chaveiro. 

O elevador chegou nesse momento. Mas Will, em vez de apertar o botão de térreo, apertou o botão que levava ao último andar. 

— Por que estamos subindo? — Nico questionou. 

Will não respondeu, parecia determinado a olhar para todos os cantos do elevador — que não eram muitos, já que o lugar era pequeno — do que para ele, contendo um sorriso. 

— Você não vai me dar nem uma pista? — Nico insistiu, cruzando os braços. Will continuou quieto. Isso o fez bufar, sentindo-se impaciente. — Solace, desembuche logo!  

— Desculpa, não posso te contar — ele respondeu, com aquele sorrisinho irritante ainda no rosto. 

Ah, ele claramente estava se divertindo com esse joguinho! Bem, Nico também sabia jogar. 

Ele soltou a guia do cachorro e foi na direção de Will, o pressionando na parede. Apoiou uma das mãos no espelho, bem ao lado da cabeça do vizinho, impedindo que ele fugisse. Com a outra, passou o dedo indicador e o polegar pelo queixo de Will. 

— Tem certeza? — ele perguntou numa voz baixa e rouca.  — Ou será que vou ter que te obrigar a falar? 

Will engoliu em seco, seu pomo de adão subindo e descendo rapidamente. Ele encarava Nico sem piscar, parecendo surpreso demais com a atitude do outro. Após alguns segundos, ele finalmente falou: 

— Sei que você está tentando me intimidar para que eu confesse, mas... — Will fez uma pausa, mordendo o lábio inferior. — Céus, você está malditamente sexy agora. 

Normalmente, quando Nico bancava “o cara assustador”, as pessoas tinham medo dele. Ele pensou que desta vez não seria diferente, achou que Will iria gaguejar algo incoerente ou realmente lhe contaria a verdade. A última coisa que ele imaginava era cair na sua própria armadilha. 

Nenhum dos caras com que Nico saiu já havia falado que ele era sexy — e se tivessem lhe dito, ele provavelmente não teria acreditado. Mas quando Will falou isso, tanto na noite anterior como agora, ele sentiu mais do que apenas desejo naquelas palavras, sabia que eram sinceras, que seu vizinho não estava falando isso da boca para fora. Nunca sentiu tanta vontade de beijar Will igual agora, mas se controlou, sabendo que estavam em um elevador e podiam ser flagrados por algum outro morador a qualquer momento. 

Enquanto Nico botava seus miolos para funcionar, tentando achar uma saída para o problema em que ele mesmo havia se colocado, o elevador chegou ao último andar. Cérbero estava solto, então saiu correndo assim que as portas se abriram. 

— Droga! — Nico exclamou, agradecendo mentalmente por ter uma boa desculpa para se afastar de Will e saiu apressado do elevador. — Ei, volte aqui, seu pestinha!

Cérbero parou no meio do caminho e se distraiu cheirando um vaso de plantas, então Nico aproveitou a oportunidade para pegar a sua guia. 

Foi então que ele olhou em volta. Nunca havia subido além do sétimo andar, mas o último era praticamente igual. As portas ficavam no mesmo lugar, o corredor era do mesmo tamanho, apenas as paredes tinham outra cor. 

— Por aqui. — Will segurou a mão livre do garoto e o guiou para as escadas que ficavam ao lado do elevador. 

Nico podia nunca ter ido ali, mas sabia exatamente o que eles encontrariam no topo . Eles subiram a escada devagar, pois Cérbero não parecia muito fã de degraus devido suas pernas ainda desajeitadas de filhote. 

— Eu pensei que a reforma do terraço ainda não estivesse pronta — disse.

Desde que Nico havia se mudado para aquele prédio, há dois anos, o local estava “interditado”. Alguns meses atrás, na reunião de condomínio, Sr. Brunner — que era o tesoureiro — havia informado que o local estava enfim passando por uma reforma. Quando tudo estivesse pronto, os moradores enfim poderiam alugar o local para pequenas festas e reuniões com um grupo limitado de convidados. Nico não tinha certeza se a reforma já havia sido finalizada, pois ele havia faltado na reunião do mês passado devido a um projeto que precisava entregar com urgência. 

— E realmente não está — Will respondeu simplesmente. 

— Então por que estamos aqui? — Nico perguntou, mas Will não respondeu. — Solace, como você está pensando em entrar? Vai arrombar a porta com um chute? — questionou, um pouco suspeito. Seu vizinho parecia ser o tipo de pessoa que cumpria regras, até mesmo as menores delas, invadir locais não combinava nada com sua índole de “bom moço”. 

— Não, eu tenho isso — ele mostrou uma chave que tirou do bolso. Colocou na fechadura, mas não girou. — Antes de entrarmos, preciso te perguntar algo. 

— Se eu tenho uma ficha criminal? — supôs. — Ainda não, mas acho que vou gastar meu réu primário esta noite. 

Will riu. 

— Relaxa, eu tenho autorização para estar aqui. Voltando à minha pergunta: você pode fechar os olhos por um momento?

— Solace, eu… 

— Garanto que vai ser rápido! — ele o interrompeu, olhando para Nico com aqueles olhos de cachorrinho. Nico sempre achou muito fácil dizer “não” quando cachorros de verdade faziam isso, mas simplesmente não conseguia ignorar quando era Will.

— Ok… — Nico soltou um suspiro alto e fechou os olhos. Estava ficando cada vez mais curioso para saber qual era a tal surpresa que Will havia preparado. 

— Fique aqui — Will o conduziu, até que suas costas ficassem encostadas na parede ao lado da porta. A guia do cachorro foi tirada da sua mão e ele ouviu a chave girando na fechadura. Ao abrir a porta, uma lufada de ar chegou neles. — Eu já volto. Não olhe.  

— Não sou criança — ele resmungou, ainda com os olhos bem fechados. Estava curioso, mas manteria a promessa de não espiar. 

Mais ou menos um minuto depois, ouviu passos e sabia que Will estava retornando. 

— Voltei. Vou te guiar até lá — ele explicou, virando o garoto gentilmente na direção da porta e colocou as mãos em seus olhos. 

— Ei… — Nico protestou, tentando afastar as mãos do vizinho na escuridão.

— Shh! — Ele o interrompeu. Seus dedos quentes cobriram perfeitamente sua visão e agora ele não poderia espiar mesmo se quisesse. Sua respiração quente fez cócegas na nuca de Nico quando sussurrou: — Preciso garantir que você não vai trapacear. 

Nico não estava enxergando nada, mas seus outros sentidos estavam em alerta. Parecia ouvir mais atentamente os barulhos vindos através da porta aberta: o som do vento batendo nas árvores, o trânsito lá embaixo e… aquilo era Cérbero ganindo baixinho? O tato também estava funcionando melhor, os toques de Will pareciam ainda mais potentes do que o normal. 

— Eu não vou espiar — Nico respondeu com a mandíbula cerrada. 

Nico, você confia em mim? — ele sussurrou de novo em seu ouvido. 

Foi uma pergunta inesperada e talvez tivesse mais significados do que aparentava. Mesmo assim, Nico assentiu em resposta: 

— Hm, claro. 

— Que bom... — Will respondeu em uma voz tão baixa que quase poderia ter sido outro sussurro. — Vamos. 

Enquanto era guiado pelo vizinho, sem ver nada à sua frente, Nico percebeu que não era o único nervoso ali. As mãos de Will no seu rosto tremiam levemente e estavam começando a ficar frias. Will Solace que sempre era tão confiante — ou que pelo menos fingia ser —, agora estava com medo da que sua surpresa não agradasse.

Nico se sentiu um pouco mal por isso, pois imaginava que Will deveria ter se esforçado muito para preparar tudo. Pensou que, mesmo se odiasse, tentaria falar isso de uma forma que não o magoasse. 

— Ok, chegamos. — Will disse, ainda sem tirar as mãos do seu rosto. — Você está pronto? 

— Sim — respondeu, sentindo o vento bagunçar seus cabelos. 

Quando Will tirou as mãos e Nico finalmente abriu os olhos, ficou sem palavras.

Eles estavam no meio do terraço. O chão era feito de madeira — não, era um azulejo antiderrapante que lembrava madeira. No lado esquerdo, quadrados grandes de cimento ainda sem plantas formavam um pequeno canteiro encostado na parede. No lado direito, havia um pergolado com teto de vidro, onde uma mesa posta com duas cadeiras jazia.  E, por todos os lados, luzinhas de natal enfeitavam o ambiente, o deixando mais iluminado. 

— Will, isso é… — ele começou, sem saber ao certo como concluir a frase.

— Meio exagerado demais? — Will completou. — Muito romântico? Brega? Cafona? 

Ele virou-se e olhou para Will, que estava retorcendo uma mão na outra, aparentando estar muito tenso. Então Nico esticou as mãos para alcançar o pescoço do vizinho e lhe beijou.

— Não sei se você fez isso para me calar ou porque gostou da surpresa... — Will murmurou.

 — Os dois. — Nico respondeu, não conseguindo evitar um sorriso no rosto. Porém o vizinho ainda pareceu um pouco incerto.  — Solace, eu gostei, ok? Gostei muito! 

E ele estava sendo sincero.

Nico nunca foi uma pessoa romântica. Costumava revirar os olhos e fingir ânsia quando via uma demonstração de amor assim nos filmes que suas irmãs sempre o obrigavam a assistir. Mas agora era diferente, porque Will havia feito isso pensando nele. Isso era muito melhor do que ir a um restaurante ou qualquer outro lugar, cheio de pessoas em volta deles. Eles estavam sozinhos ali — com exceção de Cérbero, é claro —, era algo muito mais reservado e discreto. E discrição era uma das palavras favoritas de Nico. 

Will soltou um suspiro e apoiou a cabeça no ombro de Nico.

— Você não imagina o quão aliviado eu estou! Quando vi sua reação, fiquei com medo de ter exagerado. 

— Sério que você estava nervoso? — Nico ironizou. — Eu nem havia percebido.

Will levantou a cabeça e semicerrou os olhos para ele.

— Engraçadinho. — Ele disse e então sorriu enigmático ao continuar: — Você ainda não viu nada.

— Estou ansioso por isso. — Respondeu, sentindo-se curioso para saber o que Will havia planejado para a noite. — Por onde vamos começar?

— Hm, depende. — Will colocou a mão no queixo, fingindo pensar. — Você está com fome, Sr. Di Angelo? 

— Faminto, Sr. Solace. 

— Ótimo.

Will deu um grande sorriso, daqueles que iluminavam o seu rosto inteiro, e então roubou um beijo rápido de Nico. 

 ***

Nico observou Will enquanto cortava um pedaço generoso de lasanha à bolonhesa. No chão, Cérbero já saboreava a sua refeição também. 

— Esse é o meu prato favorito. Como você sabia? — ele perguntou, um pouco surpreso.

— Não sabia, apenas achei que você apreciaria por ser um verdadeiro italiano. 

— Sou apenas metade italiano — ele o lembrou, — Garoto da Califórnia. 

Will parou o que estava fazendo e soltou uma risada.

— Você acha que eu nasci aqui?  

— Acho… — Nico franziu o cenho, sentindo-se confuso de repente. — Não nasceu?

— Não! — ele respondeu enquanto colocava um pedaço de lasanha no prato de Nico.  — Eu nasci no Texas. 

— Texas?! Mas eu vi fotos suas quando criança no mural e aquilo era claramente a Califórnia! — exclamou.  Afinal, tinham até fotos em pontos turísticos e praias da região.

— Bem, sim, eu cresci aqui, mas nasci no Texas. — Ele explicou. — Como eu te disse naquele dia, meus pais se conheceram na época da escola, e era aqui na Califórnia. Porém quando minha mãe estava prestes a me ganhar, foi passar as férias de verão no Texas, onde minha avó materna mora até hoje. Meu pai foi com ela. No começo, minha avó não gostou nadinha do meu pai, afinal, por que ela gostaria de um cara que havia engravidado a sua única filha de apenas 16 anos, não é? Mas, aos poucos, ele conseguiu conquistá-la com o seu charme, e minha avó adora ele até hoje. Eu fiquei lá até completar 1 ano, depois voltamos para cá. 

Nico nunca imaginou isso, pois Will tinha muito jeito de californiano! O seu bronzeado, o jeito que ele se vestia e falava… tudo nele gritava Califórnia. Bem, parando para pensar, Nico também não parecia muito italiano. 

— Bem, acho que posso dizer que sou metade texano e metade californiano… — Will disse, enquanto colocava um pedaço de lasanha no próprio prato. — Afinal, meus pais me fizeram aqui — deu uma risadinha.

— Isso não conta. — Nico revirou os olhos em resposta. 

 — Ok, ok! Então, como está? — Will mudou de assunto quando viu Nico provando. 

— Não é tão boa quanto da minha nonna, mas dá para comer. — Nico deu de ombros, apenas para provocá-lo.

— É claro, eu realmente não estava esperando cozinhar melhor do que uma avó italiana. Creio que você deve gostar muito da comida dela. 

— Sim, gosto. Ela é uma ótima cozinheira, mas sempre me deixa louco quando vou para lá! — ele bufou. — Está sempre enchendo meu prato, diz que estou muito magro porque na América só tem porcaria e blá-blá-blá. 

— Ela está certa. — Will comentou, mas Nico lhe lançou um olhar furioso. — Desculpa, mas é verdade! Você precisa se alimentar melhor! 

Nico ignorou o comentário dele e continuou comendo. Foi então que notou que não havia bebidas na mesa. 

 — Não vamos beber nada? — perguntou. 

— Ah! Já estava me esquecendo! — Will abaixou-se e pegou uma caixa de madeira quadrada. — Tcharam! 

— Solace, você está tentando me embebedar? — ele franziu ao cenho ao olhar para a garrafa de vinho. 

— Por mais que seja tentador ver você flertando comigo novamente… — Will o provocou com um sorrisinho no rosto, não deixando Nico esquecer a vergonha que ele havia passado naquela noite. — Não. Apenas achei que um vinho combinaria mais com esse “jantar italiano-feito-por-um-americano”. Vamos dividir, ok? Eu trouxe uma só. 

— Certo. E onde você arrumou isso? — Nico tocou no rótulo. Não era uma garrafa de vinho tinto que poderia ser achada facilmente em qualquer estabelecimento.

— Eu conheço um cara… — ele deu de ombros, sorrindo. Encheu as duas taças, que estavam juntas na caixa. Pegou a sua e a ergueu. — Vamos brindar. A nós. 

— A nós. — Nico repetiu, batendo a sua taça de leve na taça dele, tentando não sorrir.

Nico segurou a taça pela haste, inclinou-a levemente em movimentos giratórios. Ele cheirou e deu um pequeno gole, degustando o sabor. Foi aí que percebeu Will, com os cotovelos apoiados na mesa, olhando para ele com uma expressão maravilhada no rosto.

— O que foi? — ele franziu a testa.

— Você parece um profissional! — Seus olhos azuis brilhavam. — Todo dia eu descubro uma coisa nova sobre você!

— Hm, bem, é assim que se degusta um vinho. — Nico se explicou, um pouco envergonhado. Não estava querendo se gabar, apenas fez como sempre fazia. Ele completou: — Você escolheu um bom vinho, é encorpado, combina bem com essa lasagna.

— Sério? Fico feliz em ter acertado, por mais que não tenha sido a minha intenção. — ele riu. — Fale “lasanha” de novo. 

Lasagna. — Repetiu. — Por quê?

— Por nada, só queria te ouvir falando com sotaque. Sabia que você consegue ficar ainda mais fofo do que o normal? — Will estava com um sorriso enorme nos lábios, o provocando. Nico chutou a canela dele por baixo da mesa. — Ai!

— Coma sua comida antes que esfrie — ele resmungou. 

Will assentiu e bebeu um grande gole sem parar de encará-lo. Nico não sabia se era por causa do vinho, mas sentia suas bochechas ardendo, então abaixou a cabeça e se concentrou em comer. 

A lasanha estava tão boa — não que Nico fosse admitir isso em voz alta para Will ficar se achando — que ele até mesmo repetiu. Eles comeram devagar, enquanto conversavam e bebiam o vinho. 

— Ok, sei que você não é muito fã de coisas doces, mas essa receita não parecia muito difícil para um novato em culinária italiana. Além disso, pelos ingredientes, eu imaginei que não era assim tão doce, então resolvi arriscar. — Will explicou, tirando dois potinhos de tiramisù de uma bolsa térmica e os colocando em cima da mesa.  — Usei uma receita que dizia ser tradicional da Itália. Me diga se ficou parecida.

Will aguardava com expectativa enquanto via Nico pegar uma colher e provar. Ele fechou os olhos, saboreando a sobremesa dissolver na sua boca. 

Pelos deuses, havia algo que Will não sabia fazer?! Se ele continuasse cozinhando assim, Nico iria mesmo engordar!

— Então? — Will insistiu. 

— É, lembra um pouco a original... — ele respondeu, se controlando para não pegar mais uma colherada naquele exato momento.

— Mentiroso! Eu sei que você gostou. Estava praticamente tendo um orgasmo enquanto comia. — Will zombou. — Até senti que estava sobrando aqui. 

Nico tentou chutar a canela de Will de novo, mas ele estava preparado desta vez e tirou a perna antes, lhe mostrando a língua em resposta. 

— Se você quer tanto me punir, sei de alguns jeitos melhores — ele disse num tom malicioso.

Nico tossiu, sentindo seu rosto esquentar com a insinuação e a apontou para o potinho de Will com a colher. 

— Apenas coma. 

Will assentiu e provou o tiramisù, soltando um gemido em seguida. 

— Hmmm... Delicioso! 

Seu gemido deveria ter soado como “Hm, essa sobremesa está deliciosa”, mas nos ouvidos de Nico acabou soando muito mais erótico do que deveria. 

Controle-se, Nico! Sua consciência ralhou com ele. 

 — Nossa, acho que estou tendo um orgasmo culinário também! — ele gemeu de novo. Will definitivamente não estava ajudando nada. 

— Use sua boca apenas para comer, Solace — retrucou, incapaz de encará-lo agora.  

— Não posso usar minha boca para outras coisas também? — ele perguntou em tom malicioso. 

Nico deixou a colher escapar da mão e cair na mesa. 

— Eu ia dizer para beijar! — Will explicou, se controlando para não rir. — Céus! Que mente pervertida você tem! 

— Eu… eu não… — ele se atrapalhou na resposta.

— Claro, claro. Coma.  — Então, para mostrar que estava falando sério, Will voltou a comer sua sobremesa, totalmente quieto. 

E Nico agradeceu mentalmente aos deuses por isso.

***

Quando terminaram, Will disse que arrumaria a mesa, então Nico foi ao parapeito e apoiou os braços na grade, observando a vista. A maioria das moradias da vizinhança também eram prédios, porém eram mais altos do que o que eles moravam. Olhou para baixo, vendo os poucos carros passando na rua naquele horário. 

Ele já estava acostumado com a movimentação do bairro, então parecia um pouco estranho tanto silêncio. 

— No que você está pensando? — Will apoiou a cabeça no ombro dele, trazendo Nico de volta à realidade. 

— Ah, nada. Só me distraí olhando a vista daqui de cima. A noite está bonita hoje. 

— Não tanto quanto você — Will deu um beijinho na bochecha dele e colocou os braços no parapeito, prendendo o garoto entre ele e a grade.

— Ugh, você tem umas cantadas tão bregas! — Nico murmurou, sentindo-se um pouco envergonhado. Ainda bem que Will estava atrás dele e não podia ver seu rosto agora. 

— Só falei a verdade. — Ele riu, encostando os lábios na curva entre seu pescoço e o ombro direito e depositou um beijo ali. Nico sentiu um arrepio. Ao se afastar, disse: — A marca que eu deixei está quase imperceptível agora.

— Felizmente. Céus, eu queria te matar quando vi meu pescoço naquela noite! 

— Se você quiser tanto assim se vingar de mim, pode fazer o mesmo. Eu não vou me importar — ele disse com uma voz totalmente sexy bem perto do seu ouvido. — Pelo contrário. 

— Solace! — Nico olhou por cima do ombro e lhe deu um olhar de advertência. 

Will fez biquinho, tirando os braços da grade e os cruzando na altura do peito. 

— Até quando você vai me chamar assim? Já passamos da fase “apenas vizinhos”. 

Bem, eles realmente estavam longe de serem apenas vizinhos, mas Nico ainda não sabia exatamente qual era o status do relacionamento deles.

— Como você prefere que eu te chame então? — Nico virou-se, apoiando as costas na grade, olhando diretamente para Will agora. — Will? Ou William?

— Não, todo mundo já me chama de Will. E William… só meus pais me chamam assim quando querem me dar uma bronca. 

— Ah, já sei: Raio de Sol? — perguntou de forma debochada, lembrando o apelido que Leo havia o chamado no parque de diversões.

— Não, só meus amigos da escola me chamam assim. Crie seu próprio apelido, Anjo.

— Um apelido derivado do meu sobrenome? Que criativo! — ele revirou os olhos. — Além disso, se fosse para alguém aqui ser chamado de “Anjo”, claramente seria você com seus malditos cachinhos dourados e olhos azuis angelicais — zombou, passando o dedo em uma mecha do cabelo dele.

— Estou longe de ser angelical... — Will segurou o pulso de Nico e, sem quebrar o contato visual, deu um beijo demorado nos nós dos seus dedos. 

Merda! Will estava mais para “sexy como diabo” naquele momento. 

— Ok, como eu devo te chamar então? — mudou de assunto, torcendo para o seu rosto não denunciar seu nervosismos agora. 

— Hm… Amor? Querido? Alma Gêmea? — Will deu as opções com um sorrisinho provocador no rosto, enquanto Nico revirava os olhos. — Ou talvez… namorado? 

— Hã?! — Nico murmurou, sua voz saindo quase num sussurro. 

Namorado?!

Nico abriu a boca, mas não conseguiu falar nada. A palavra havia o pegado totalmente desprevenido. Foi então que ele lembrou-se de Will falando para Leo naquela noite do parque de diversões: “Não somos namorados… ainda”.

Droga, como Nico poderia ter sido tão desatento? Estava tão focado em tentar descobrir o local do encontro que nem pensou o motivo dele ser uma surpresa! É claro que Will estava planejando algo grande!  

— Nico… — Will tocou seu cotovelo gentilmente, chamando sua atenção. — Tudo bem? Você está mais pálido do que o normal.

Ele sabia que se tentasse falar algo agora, sairia algum som incoerente, então apenas balançou a cabeça em concordância. 

 — Venha, vamos nos sentar.

Nico queria dizer que não precisava se sentar, que ele estava bem, mas seria uma mentira. Ainda estava um pouco atordoado, então deixou que o outro o guiasse até um cobertor estendido no chão, onde havia algumas almofadas espalhadas por cima. Isso não estava ali quando eles chegaram, então Will provavelmente havia arrumado tudo no momento em que ele estava distraído observando a vista.   

 — Você quer um pouco de água? — Will perguntou, após os dois se sentarem. 

— Não precisa… — ele finalmente conseguiu falar. — Eu só fiquei surpreso. 

— Bem, a intenção era mesmo ser uma surpresa… mas eu não deveria ter falado assim do nada, desculpa.  — Will riu, passando a mão pela nuca. — Deixe-me fazer isso direito agora então. 

Will pegou algo no bolso da bermuda, uma caixinha de veludo quadrada que cabia perfeitamente na palma da sua mão. 

— Nico, nós somos exatamente o oposto um do outro: como os dois lados de uma moeda, como os dois polos de um imã, como yin e yang, como o dia e a noite, como o verão e o inverno, como o sol e a lua. Mas você sabe o que dizem, não é? Os opostos se atraem e se completam. E é assim que eu me sinto quando eu estou com você: — E então abriu a caixinha, revelando o seu conteúdo. — Completo.

Eram duas pulseiras de miçangas: uma preta e a outra branca. 

— Você parece decepcionado. — Will estudou o rosto do vizinho. — Estava esperando um anel? 

— Hm, não. — Nico mentiu. No fundo, ele realmente achou que poderiam ser anéis. 

 — Bem, admito que cogitei essa ideia, mas ninguém ia reparar nele quando você usa algo tão chamativo como isso — ele debochou, passando o dedo indicador pelo anel de caveira que Nico sempre usava.  

Nico revirou os olhos. 

— Você vai colocar essa pulseira no meu braço ou terei que fazer isso sozinho?

— Calma, calma! — Will riu, tirando a pulseira preta da caixinha e colocou nele, mas continuou segurando seu pulso. Pressionou o dedo indicador e médio esticados em seu pulso e aguardou alguns segundos. Espera, estava medindo a sua pulsação agora? — Uau, seus batimentos estão rápidos! É por minha causa?  

— Claro que é, seu idiota! Quem mais faria isso comigo? — Nico resmungou, fingindo estar irritado e desviou o olhar. Seu coração sempre o traía!

— Que bom, porque você também faz o meu coração disparar. — Will levou a mão de Nico, que ainda segurava, até seu peito. — Olha só! 

Nico não sabia se estava mais nervoso porque conseguia sentir como o peito de Will era forte ou porque o coração dele estava batendo feito louco debaixo da palma da sua mão. 

— Hm, sim… — murmurou, puxando a mão de volta para si. 

Nico reparou que sua pulseira tinha um pingente de sol. Olhou para a outra, ainda na caixinha de veludo, e viu que tinha um pingente de lua. Ele entendeu na hora que isso fazia referência ao sobrenome deles e não pôde evitar que um sorriso escapasse dos seus lábios.

— Você está sorrindo, significa que gostou. Certo? — Will perguntou. 

Nico pressionou os lábios, fazendo o sorriso sumir. 

— Hm, sim. Onde você comprou?

— Não comprei, eu mesmo fiz as pulseiras. 

— Você só pode estar brincando! — Arregalou os olhos, olhando novamente para a pulseira. Era igual a algo comprado. 

— Não estou! Eu só precisei ver uns vídeos no Youtube — ele deu de ombros —, foi fácil de fazer. 

— Claro que foi. — Nico disse em tom de deboche. — Porque não há nada que o incrível Will Solace não saiba fazer! 

— Uau, não acredito que Nico di Angelo finalmente está me elogiando! Ganhei meu dia! Ou melhor, minha noite!

Nico apenas revirou os olhos em resposta. 

— Na verdade, tem algo... — Will coçou a nuca, parecendo meio constrangido do nada. — Eu sou muito desafinado! O que parece meio irônico porque minha mãe é cantora, e meu pai também canta muito bem, porém eu não puxei nem um dos dois. Mas eu sei tocar violão. E ukelele. E um pouco de harpa. E…

— Ok, já entendi. — Nico o cortou, imaginando que sua lista de instrumentos musicais deveria ser extensa. Pegou a outra pulseira, fazendo sinal para que Will desse seu braço para ele colocar. Assim que terminou Will tomou sua mão rapidamente com as duas mãos antes que ele tivesse tempo de se afastar, e lhe um beijo no pulso. — O que você…

— Nico. — Will o interrompeu, olhando fixamente para ele com aqueles lindos olhos azuis. — Você quer seu meu namorado?

— Eu realmente preciso responder? — ele estreitou os olhos. — Não está óbvio?

— Não, não está — o provocou, dando um sorriso torto.

Nico revirou os olhos e puxou sua mão de volta. 

— Hm, ok… sim. 

— Desculpe, acho que não ouvi muito bem — ele colocou uma das mãos perto da orelha e fez uma cara confusa. — Será que você poderia repetir, por favor?  

— Então limpe os ouvidos, idiota — cruzou os braços, olhando para o outro lado. 

— Sabe, sua boca pode estar proferindo xingamentos a mim, mas seus olhos não mentem. — Will colocou a mão no queixo dele, fazendo seus olhares se encontrarem de novo. — Eu sei que você só está com vergonha de dizer isso em voz alta. 

— N-não estou! — ele exclamou, tirando a mão de Will do seu rosto e encarando o chão. Droga! 

— Então diga — Will o provocou, com um sorrisinho nos lábios. 

Normalmente, Nico odiava quando alguém o provocava. Mas quando era Will, tudo que ele queria fazer era beijá-lo e tirar aquele sorrisinho irritante do seu rosto. 

 E foi isso o que ele fez. Inclinou-se para frente, depositando um beijo rápido nos lábios de Will. 

— Sim, eu aceito namorar com você. Satisfeito? — questionou ao se afastar. 

Will não disse nada, ele apenas deu um sorriso gigante em resposta, puxou Nico pela cintura e o beijou novamente. 

***

Os dois estavam deitados sobre o cobertor, olhando para o céu estrelado. Cérbero estava dormindo pacificamente perto dos pés deles. Nico havia tirado o tênis, ficando só de meia e Will estava descalço. Ele estava ensinando as constelações e Nico tentava prestar atenção, mas ficava um pouco complicado quando os dedos do pé do outro ficam roçando sua perna propositalmente. 

— …Ficam bem ali. — Will apontou para um conjunto de estrelas no céu. — Está vendo?

— Hm, claro. — Nico respondeu sem saber ao certo de qual constelação ele se referia. Havia se distraído e não tinha ouvido direito o começo da conversa.

— Poxa, se eu soubesse que o céu estaria tão limpo hoje, teria trazido o telescópio junto! — ele lamentou. 

— Você tem um telescópio? — Nico perguntou surpreso. Havia entrado apenas duas vezes no apartamento de Will, mas certamente teria visto um objeto tão grande.

— Não, mas tia Ártemis tem, ela é irmã do meu pai. — Will explicou. — Inclusive, foi ela quem me ensinou tudo o que sei sobre estrelas. 

— Ah, então é assim que você conquista seus interesses amorosos, hein? Mostrando os seus conhecimentos astronômicos em uma bela noite sem nuvens. — Foi a vez de Nico provocá-lo.

Will soltou uma gargalhada. 

Não. Eu só mostrei para você.

— Aham, sei… — Nico fingiu não acreditar. 

— É sério! — ele riu de novo e olhou para o céu. — Hoje seria uma ótima noite para passar uma estrela cadente pelo céu. Você sabia que, de acordo com a lenda, esse é o momento em que os deuses estão contemplando a vida na terra? Por isso as pessoas fazem pedidos, esperando que seus desejos se realizem. 

— Não sabia disso — respondeu, e era verdade. — Mas por que você quer tanto ver uma estrela cadente? Vai pedir algo? 

— Não, só achei que seria romântico… — Will riu quando Nico fingiu uma ânsia. — Além disso, meu pedido já se realizou. 

— E qual era? — perguntou, não conseguindo esconder sua curiosidade, mas então se lembrou que muitas pessoas não gostavam de contar antes de realizar. — Ah, foi mal… você não precisa dizer se não quiser. 

Você. — Ele olhou diretamente nos olhos de Nico. — Eu pedi aos céus para que você correspondesse meus sentimentos. 

O coração de Nico deu um duplo twist carpado no peito ao ouvir isso. Ele abriu a boca, mas não sabia ao certo o que dizer depois dessa declaração. 

Por sorte, seu celular começou a tocar naquele instante, o salvando. Ele pegou e viu o nome de Bianca na tela. 

— Não atenda. — Will expiou por cima do ombro de Nico para ver quem era. — Você está ocupado agora.

— E como exatamente eu estou ocupado?  — Nico questionou, erguendo uma das sobrancelhas. — Estamos aqui sem fazer nada, olhando para o céu.

— Você está em um encontro com o seu namorado. — Ele disse como se fosse óbvio. — Estamos fazendo algo.

Namorado. Nico precisava se acostumar com essa palavra, ainda não parecia real. 

O telefone parou de tocar. 

— Ela vai ligar de novo. — Nico garantiu. Afinal, conhecia muito bem a irmã mais velha. 

— Se ela ligar, basta você ignorar de novo — ele deu de ombros. 

— Eu não posso ignorá-la. Da última vez que eu não a atendi, ela veio até aqui me procurar, lembra? — Nico disse, se referindo à noite do primeiro encontro deles no parque de diversões. 

— Lembro, mas mesmo que ela venha até aqui, não vai nos achar — ele deu um sorrisinho. 

Will estava certo, afinal, Bianca nem deveria saber da existência do terraço. O próprio Nico morava no prédio há dois anos e nunca havia ido ali.

— Não quero que ela fique preocupada e... — Nico nem conseguiu concluir a frase, pois seu celular já começou a tocar de novo. — Viu? Eu te disse. 

— Ok, atenda, mas coloque no viva-voz. — Will pediu. Nico lhe lançou um olhar que dizia “É sério?”. — O que foi? Eu só quero dizer “oi”! 

Ele bufou e atendeu a chamada. 

— Oi, mana.  

Oi, maninho! Você demorou a atender… Ainda não terminou o livro? — Ela fez uma pausa antes de continuar num tom malicioso: — Pare de pensar no seu vizinho gato e se concentre no trabalho! 

Pelo Tártaro! Por que sua irmã era tão tagarela? Nico queria matá-la agora. Ele olhou de soslaio para Will que parecia estar se divertindo com toda essa situação. Ah, agora ele queria matar os dois!

— Hm, eu enviei hoje de manhã... — limitou-se a responder. 

Ele sabia que uma hora ou outra, Bianca descobriria a verdade. Mas se ele pudesse prolongar isso pelo maior tempo possível e fugir do interrogatório constrangedor… era o bastante.

— Oi, Bianca! — Will se inclinou na direção do celular antes que Nico pudesse impedi-lo. — É o Will, o vizinho gato. — ele explicou, como se realmente precisasse. — Adoraria falar mais com você, mas seu irmão e eu estamos um pouco ocupados agora em um encontro. 

Não houve resposta do outro lado. Nico olhou para a tela, achando que a ligação poderia ter caído, mas o sinal no terraço era incrivelmente alto. 

Claro, eu entendo perfeitamente! — Ela finalmente respondeu. Nico sabia que Bianca estava morrendo de curiosidade e se controlando para não pedir detalhes naquele exato momento. — Desculpa, ele não me falou nada que vocês iriam sair hoje… 

— Ah, Nico não sabia. Era uma surpresa! — ele disse num tom extremamente animado. — Enfim, tenha uma boa noite, cunhadinha. Tchau!

Bianca deu um grito entrecortado.

Espera, você estão...?!  

— Tchau, Bianca! — Nico nem esperou a irmã concluir a frase e encerrou a chamada rapidamente. E então lançou um olhar furioso para a pessoa ao seu lado. — Você tinha que chamá-la assim, ela sacou tudo! 

— Qual é o problema? Você disse que ela gostou de mim.

— E ela gostou — confirmou. — Eu apenas queria contar para ela pessoalmente. E então enfrentar o interrogatório que viria a seguir. 

— Eu não me importaria de participar desse interrogatório — Will deu de ombros, como se não fosse nada de mais. 

— Sério? Você vai responder todas as perguntas dela e eu fico só assistindo? — ele perguntou e Will balançou a cabeça freneticamente em concordância. Nico soltou uma risada baixa e deu tapinhas de consolo nas costas do namorado. — Ah, cara, você está tão ferrado! Bianca sabe ser bem insistente e enxerida quando quer. Não diga que eu não te avisei. 

A expressão de pavor que passou pelo rosto de Will naquele momento era muito cômica. 

— Por falar em Bianca… — Will começou. — Por que você salvou o contato dela pelo nome? Poderia ter botado “irmã” ou algo do tipo. 

— Eu tenho duas irmãs, lembra?

— Claro que eu lembro, mas você poderia ter botado “big sis” e “little sis”, ficaria perfeito já que você é o irmão meio — ele explicou e Nico apenas revirou os olhos em resposta. — Isso me fez pensar… 

— O quê? — Nico perguntou, mas Will não concluiu a sua frase. 

Em vez disso, ele apenas arqueou uma sobrancelha e pegou o próprio celular, procurando por algo. Logo depois, o celular de Nico começou a tocar novamente. 

— Por que diabos você está me ligando…? — Nico demorou alguns segundos para processar o que estava acontecendo. Quando finalmente entendeu e iria recusar a chamada, já era tarde demais. Will foi mais rápido e segurou seu pulso para olhar a tela. — Ei, espera!

— “Solace”? — Seu namorado perguntou de forma incrédula, então encerrou a chamada no próprio celular. — É sério?! 

— Qual é o problema? Eu sempre te chamei assim. — Ele respondeu, sem entender direito o motivo para tanto drama, mas Will ainda parecia indignado com isso. — Ok, se isso é tão importante para você, como está o meu contato no seu celular? 

— Aqui, olhe! Eu editei hoje. — Will colocou o celular tão perto dos olhos de Nico que ele teve que segurar sua mão e afastar um pouco para conseguir ler. 

Nico ficou sem palavras. O contato na tela estava salvo como “Meu namorado fofo” e tinha um coração ao lado. 

— Ah… — ele olhou para a tela por alguns segundos. — Espera, você editou antes de eu aceitar? Como sabia que eu ia dizer sim?

— Nico, não mude de assunto…

— Não estou mudando! — reclamou. — Responda. 

— Sim, eu editei antes, ok? Imaginei que você não teria motivos para dizer não. — Will explicou. —  E, caso você tenha ficado curioso, antes estava “vizinho”. 

 Meu vizinho fofo. Isso fez Nico lembrar quando Will disse no último encontro deles: “Você sempre foi o meu adorável vizinho”. 

Merda! Eles estavam namorando há menos de um dia e Nico já estava se sentindo um péssimo namorado! 

— Eu vou trocar. — Ele disse de forma decidida, desbloqueando o celular. 

— Você não precisa fazer isso… — Will fingiu não se importar, mas Nico sabia que ele se importava. 

— Preciso, sim. Afinal, eu teria que trocar mesmo em algum momento.

Enquanto ele editava o contato, Will parecia se controlar muito para não espiar, o que fez Nico curvar um pouco os lábios em um quase sorriso. Assim que terminou, entregou o celular para Will conferir. 

— “Namorado”. — Will leu em voz alta. — Você poderia ter botado um emoji bonitinho ao lado, mas tudo bem. 

— Se você ficar reclamando, eu coloco “Solace” de novo! — ameaçou. 

— Assim está ótimo! Eu amei! Sério! — ele exclamou, devolvendo o celular para o seu legitimo dono. 

— Acho bom mesmo.

Nico estar prestes a bloquear o celular e guardar, quando uma notificação surgiu na tela. Bianca havia lhe mandado uma mensagem curta e simples: 

Não pense que você se safou quando desligou na minha cara. Quero saber os detalhes do pedido depois!

P.S.: Agora posso dizer que Solangelo é oficial!

Droga, Nico estava ferrado! 

— Solangelo?! — Will olhou por cima do ombro de Nico. 

— Ah… Bianca juntou nossos sobrenomes. — Ele guardou o celular, sentindo-se envergonhado em ter que explicar as doideiras da irmã.  — Não ligue, ela não tem nada melhor do que fazer e fica inventando nome de ship

— Hm… eu tinha pensado em Wilico ou Wico — Will coçou o queixo, — mas Solangelo fica muito melhor! Adorei!  

— Você estava pensando em um nome para a gente? — Nico não conseguiu esconder a surpresa na voz. 

— Claro, nós merecemos. — Ele sorriu. — E Solangelo é muito fofo! Assim como você. 

— Você vai ver como eu sou fofo quando eu chutar suas bolas, Solace! — Nico ameaçou, dobrando o joelho na direção da virilha de Will. 

— Ei — Will segurou o joelho de Nico antes que o atingisse e deu um sorrisinho irritante. — Eu já disse para você não me chamar mais de Solace. Mesmo que você queira me xingar, diga “namorado”. 

 — Foi mal, é que eu ainda não estou acostumado com essa palavra… — confessou.

— Tudo bem, é algo novo para mim também. 

Nico deixou escapar uma risada debochada. 

— Claro, como se eu fosse seu primeiro namorado! Você é bom demais em flerte para não ter experiência na área amorosa! 

— Sou um bom flertador, é? — Um sorriso afetado surgiu no rosto de Will. Droga, Nico havia falado demais! — Você é meu segundo namorado. Só tive um na época em que eu era calouro e as coisas não terminaram muito bem.

— Foi aquele que não era assumido? — Nico deixou escapar sua pergunta. Will olhou para ele um tanto surpreso, como se não soubesse como ele havia descoberto isso. — Hm, naquela outra noite, quando você achou que eu ainda estava no armário, você disse “não acredito que estou passando por isso novamente”. 

— Ah… — Will assentiu, lembrando-se agora. — Sim, era ele. No começo, achei um pouco excitante esse lance de “namorar escondido”. Na frente dos outros, ele agia como se fosse só meu amigo, até mesmo flertava com umas garotas para manter as aparências, mas sempre me chamava de noite para o apartamento dele. Então um dia eu disse que queria contar para os nossos amigos que estávamos juntos e ele praticamente surtou! Disse que não, porque os pais deles não sabiam e ele temia que a notícia se espalhasse. Bem, claro que eu não ia arrancar o cara do armário contra a própria vontade. Eu sei como isso é complicado, afinal, eu tive que me assumir para os meus pais quando percebi que também gostava de garotos. Então eu simplesmente terminei com ele — deu de ombros. 

— Ok… E as namoradas? — prosseguiu. Will lançou um olhar confuso para ele. — Não faça essa cara, aposto que você namorou com garotas também, afinal, você é bi. 

— Ok, ok… eu tive duas namoradas! — ele confessou. — A primeira foi na época do Ensino Médio, terminamos porque ela entrou numa faculdade de Nova York e optamos por não namorar à distância. A segunda foi um tempo depois desse cara, eu estava terminando a graduação. Mas ela era aquele tipo de pessoa que não estava interessada em estudar e só queria ir em festas, ela não entendia o porquê de eu estudar tanto, mas é Medicina, caramba! Óbvio que eu precisava estudar igual um louco! A gente brigava muito, então eu terminei com ela porque não estava mais aguentando. 

— Entendi… — Nico murmurou. Sinceramente, ele imaginava que a lista de namoros de Will era mais extensa, pois ele parecia um cara muito namorável.  Bem, ele havia citado apenas relacionamentos sérios, mas deve ter saído em encontros com muitas outras pessoas.

— Ok, agora é a sua vez. 

— Vez de quê? 

— De dizer sobre seus antigos relacionamentos, ué! — Will exclamou como se fosse óbvio. — Não pense que serei o único a falar sobre o meu passado amoroso aqui! 

— Hm, eu não tenho nada para falar... — Nico murmurou, sem saber ao certo como dizer aquilo sem parecer um idiota completo. — Digo, claro que eu já saí com alguns caras, mas nunca foi nada sério...

  Parabéns, Nico! Você está fazendo uma ótima propaganda de si mesmo, como um cara não-namorável! Sua consciência debochou dele. 

— Espera, você está tentando me dizer que eu sou seu primeiro namorado? — Will estava tentando, sem sucesso, não sorrir. 

— Sim… — ele encarou o céu, incapaz de olhar para Will agora. 

— Sabe — Will sussurrou baixinho perto do seu ouvido. —, estou curioso para saber em quais outras coisas eu também sou seu “primeiro”. — e deu um beijo na orelha dele.

— Will! — Nico disse em tom de aviso, o empurrando levemente. 

— Estamos tendo um avanço, você não me chamou de Solace. 

— Eu só te chamo assim quando você está sendo irritante — Nico disse como se fosse óbvio.

— Mas você me chama assim quase sempre... — ele o lembrou. 

— Exatamente! 

— Ah, você me paga! — Will deu um sorriso diabólico e moveu as mãos estendidas em sua direção.

No mesmo instante, Nico soube que iria sofrer outro ataque de cócegas se não agisse rápido. 

— De novo, não! — ele exclamou, segurando as mãos do namorado antes que chegassem ao alvo: sua barriga. 

Nico achou que isso seria suficiente para que o outro desistisse, mas estava errado, pois Will acabou jogando o corpo contra o dele e os dois caíram em cima do cobertor. Pareciam duas crianças rolando pelo chão, tentando fazer cócegas um no outro, rindo e falando alto. 

Will finalmente conseguiu uma vantagem quando os movimentos de Nico começaram a ficar mais lentos devido ao cansaço. 

— Você lutou bravamente, soldado, mas acabou! — Will sorriu vitorioso, conseguindo ficar por cima. Segurou as mãos de Nico no topo de sua cabeça, impedindo que ele pudesse revidar. — Você se rende?

— Nunca! — respondeu enquanto ainda respirava com dificuldade. 

— Nico, seja um bom perdedor e apenas admita sua derrota.

— Não foi uma luta justa, você sabe disso. Sou menor, mais fraco e mais sedentário! 

— Só alguns centímetros, querido — Will desdenhou e Nico quis muito dar um murro naquele rostinho bonito dele agora.  — E o resto poderia ser resolvido facilmente se você praticasse exercícios físicos e se alimentasse melhor. 

Nico apenas revirou os olhos em resposta.

— Diga que se rende e eu te solto — Will anunciou, inclinando o corpo da direção dele, parando alguns centímetros do seu rosto com aquele sorrisinho irritante nos lábios.

Nico ainda tinha uma última carta da manga: se não podia vencer Will pela força, venceria de outro jeito. Então ele esticou o pescoço, diminuindo a pequena distância que os separavam e o beijou, mordendo seu lábio inferior. Will pareceu surpreso por uma fração de segundos, mas logo correspondeu, abrindo mais a boca do outro com a sua e aprofundou o beijo. Aos poucos, as mãos que seguravam seus pulsos foram se afrouxando e Nico usou essa oportunidade para conseguir se soltar, segurou os braços do outro e rolou no chão, ficando por cima. 

— Quem é o perdedor mesmo, hein? — debochou, sentando em cima da barriga de Will para que ele não conseguisse se levantar.

— Isso não vale, você me seduziu de propósito. — Will advertiu.  

— Vale tudo no amor e no jogo, querido — ele debochou ao proferir a última palavra.

— Você sabe que posso me soltar facilmente se eu quiser, não é? — Will questionou, dando uma olhada rápida para as suas mãos atadas ao lado da sua cabeça. Ao olhar novamente para o namorado, sorriu. — Mas ter você em cima de mim é uma visão que vale a pena, então deixarei passar. 

Céus, por que Will nunca perdia uma oportunidade de proferir frases ambíguas?

— Diga logo que eu venci — Nico o lembrou, evitando o encarar nos olhos para não vacilar.

— Ok, ok! Ao contrário de certas pessoas, eu sei admitir minha derrota. — Ele o provocou. — Você venceu, Nico. Trapaceando, mas venceu. Parabéns.

 — Obrigado. — Ele disse. Estava prestes a soltar Will, mas então notou o sorriso em seus lábios.  — Por que você parece tão feliz se acabou de perder?

— Não me importo de perder num joguinho bobo, afinal, como diz aquele ditado: “azar no jogo, sorte no amor”. 

— Segundo essa lógica, eu não deveria ser azarado no amor então? — questionou.

— Claro que não! Você é muito sortudo nesse quesito, pois conseguiu conquistar o cara mais bonito e charmoso desse prédio! — Will exclamou, nada modesto. 

Nico deu uma risada debochada. 

— Deuses, o que eu fiz de errado? —  Ele olhou para os céus, de forma dramática. — Eu taquei fogo no Olimpo na minha vida passada para merecer um namorado tão egocêntrico assim?! 

Em um movimento rápido, Will girou  os pulsos e se soltou, segurou a cintura de Nico e o puxou na sua direção, fazendo seus corpos colidirem. 

— Porra, o que você…? 

— Repita, por favor. — Will pediu, o interrompendo. — Diga que sou seu namorado. Preciso ter certeza que não estou sonhando.

Nico beliscou a bochecha dele, que fez uma careta.

— Não é um sonho, viu?  É real — ele fez uma pausa, se preparando para dizer essa palavra até então nunca usada antes por ele para se referir a alguém. — Você… Você é meu namorado.

Will abriu um sorriso gigante. 

— Você está ficando vermelho, isso é tão fofo — seus braços subiram nas costas de Nico, o abraçando. — Meu namorado fofo.

E, desta vez, Nico não retrucou por ser chamado de fofo. 

Acho que os deuses já realizaram o meu desejo também, Nico pensou. E retribuiu o abraço de Will. 


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Notas finais do capítulo

* Gente, apenas lembrando que estamos na reta final de TDQP. O próximo será o último capítulo :/ Mas não fiquem tristes, porque eu preparei um epílogo bem lindinho para vocês também!

No próximo capítulo, Cérbero irá embora. Como Nico ficará após a partida do filhote?

Até sexta-feira que vem! õ/



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