Desejo e Reparação escrita por natkimberly


Capítulo 8
O Passeio em Bridgerton


Notas iniciais do capítulo

Essa história é inspirada nas obras da Jane Austen.



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Após a primeira visita à Mansfield Park,  não demorou muito para que os Dashwood recebessem mais convites. Já se passaram duas semanas, e a cada reunião, parecia que os grupos estavam ficando cada vez mais próximos. Mesmo assim, Jane achava essas visitas um estorvo para sua vida, mas Emma e Anne não podiam negar que as tarde em Mansfield Park poderiam ser bem divertidas às vezes. Numa manhã receberam um novo convite. Porém, não era para eles os visitarem, mas sim, para o grupo todo sair em uma expedição a cavalo juntos pelo campo, em direção ao Parque de Bridgerton. Todos da casa já haviam ido àquele parque diversas vezes (menos Noah Russell), então sabiam o caminho mas sempre foram de carruagem, e nunca em seus próprios cavalos.

A notícia do passeio gerou muita empolgação, principalmente, da parte de Emma, pois além de poder usufruir da companhia de seu cavalo, ela também descobriu que Fitzwilliam não poderia estar presente porque eles só tinham dois cavalos em Mansfield Park. Mas, o seu pai cortou essa última alegria da garota declarando que iria emprestar para ele o cavalo de Anne, o Rocky.

— Mas, papai, se Anne já andou mais de duas vezes naquele cavalo já foi muito - Emma declarou, enquanto estavam todos descansando na sala principal. - Ele nunca sequer recebeu algum treinamento, aposto que não deve obedecer a ninguém. Não acha que seria arriscado?

Suas palavras foram ignoradas por completo, pois Sir Dashwood não queria que o trio de Mansfield pensasse que ele era pirangueiro ou egoísta a ponto de se recusar a emprestar um cavalo para uma pessoa, supostamente, confiável. Emma sabia que aquilo não iria dar certo, tentou falar com Anne para tentar persuadi-la a ir junto porque ela era a única que já havia montado em Rocky, então, talvez, ele se comportasse com ela. Mas, Anne recusou totalmente, não sabia cavalgar direito, e muito menos gostava. Sem contar que a irmã informava que o céu estava com algumas nuvens cinzas, então teria uma chance de chover, logo, ela (que tinha a saúde mais frágil) estava com medo de ficar doente com o possível temporal.

O dia chegou, Emma se arrumou cedo e desceu as escadas às pressas, com medo de se atrasar.  Caminhou pelo salão à espera de sua irmã, Jane, ficar pronta, era só ela que faltava. O resto das pessoas estavam no estábulo preparando seus animais, enquanto Emma e Mr. Russell estavam aguardando a loira:

— Argh! O que deu nela para demorar tanto? - Emma perguntou a Mr. Russell. 

— Não sei, deve estar tentando cachear o cabelo, ou fugindo pela janela. - Ele disse, sorrindo.

— Não duvido nada que seja isso mesmo. - Ela se aproximou da escada e gritou: - Vamos, Jane Dashwood! Não temos o dia todo! 

— Espera um segundo! - foi sua resposta, em seguida, abriu a porta de seu quarto e disse enquanto ia na direção de Emma: - Ainda faltam trinta minutos e você ficou me apressando à toa! Não tive nem tempo de tentar cachear meu cabelinho, sua malvada.

— Nem se você tivesse todo o tempo do mundo ia conseguir fazer isso com esse cabelo liso escorrido.

Jane revirou os olhos, tentando não ficar triste com a frase verídica de sua irmã, se juntou a os dois e foram até o estábulo. Noah ajudou as duas a montarem em seus cavalos e depois  montou no seu, em seguida segurou a corda de Rocky e o puxou para segui-lo até Mansfield Park. O grupo foi para o destino e, chegando lá, o trio estava pronto e os esperando. Todos se cumprimentaram e Mr. Russell entregou Rocky ao Fitzwilliam.

— Bom, então, vamos! - disse Sir Collins, parecia estar mais agradável do que o comum.  - Quando chegarmos ao Parque de Bridgerton, nós temos uma notícia para contar a vocês. Espero muito que vocês gostem!

Emma e Jane já ficaram atiçadas para tentar descobrir o que seria, ambas começaram a se questionar e criar hipóteses. Emma percebeu que Sir Collins e Gerald demonstraram estar muito felizes, enquanto Fitzwilliam parecia estar enraivecido. 

“Será que ele não queria ir ao parque conosco, ou não está se dando bem com o cavalo de Anne?” pensou Emma. Quando todos começaram a trilhar em direção ao seu destino, abandonando Mansfield Park, os grupos foram formados naturalmente: Sir Dashwood, Sir Collins e Charles, com seus diversos assuntos sérios e maduros, Emma, Jane e Mr. Russell, que estavam desenvolvendo uma ótima amizade com o último, e Gerald e Fitzwilliam, que pareciam estar discutindo algo, em voz baixa.

— Vamos, Emma! Faça isso, por favor. - Jane implorava como se sua vida estivesse em jogo. - Talvez, dê certo. Noah, diga para ela que ela pode conseguir.

— Não diga nada, Noah. Vocês dois estão me tirando a paciência que eu já não tenho!

— Você pode conseguir, Emma - Mr. Russell afirmou. - Pense comigo, ainda falta muito tempo até chegarmos à Bridgerton, tem certeza que quer passar essas uma ou duas horas sem saber do que Sir Collins está falando? Com esse suspense no ar? Esperava mais de você.

Os dois pareciam pombos famintos que decidiram importunar a paz de Emma, em busca de migalhas de pão. A garota os disse, então:

— Nem adianta insistir, não vou ir até Gerald perguntar sobre isso - ela falou, firmemente, mas, isso e nada, para Jane, eram a mesma coisa.

— Emma, por favor, faça isso por mim! Você não me ama? Não sabe que eu sou muito curiosa, por favor. Você está acabando com meus nervos - ela dizia aquilo com voz de uma criança que a mãe havia recusado oferecer doces. - Você é a única que conhece o Gerald, por favor, tente saber. Tente.

— Exatamente, eu sou a única que já tive algumas conversas com ele e sei o seu tipinho, ele vai me fazer ficar mais curiosa e não vai contar nada. Só vai se divertir com meu sofrimento.

Mas, como antes, Jane não a deu ouvidos e continuou insistindo. Emma sabia que grande parte daquela teima, vinha do fato de Jane estar com um leve medo daquela novidade ter alguma coisa haver com ela, e Emma, como uma boa irmã, depois de resistir muito, cedeu e foi em direção ao loiro.

Não havia percebido que Gerald e Fitzwilliam estavam muito atrás do resto do grupo, logo ela percebeu que isso tinha haver com Rocky estar se relutando para não andar mais rápido, claramente, o cavalo estava tirando Fitzwilliam do sério, mais do que ele já estava antes de montar nele. Gerald, quando percebeu que ela estava vindo, mudou sua postura e passou a parecer mais calmo e agradável, já Fitzwilliam olhou para ela com repulsa e puxou Rocky para se afastar, o que demorou a acontecer, pois o cavalo se negava a obedecer ao que ele queria. 

Emma, no segundo que olhou nos olhos do loiro, sabia que ele já sabia o porquê dela estar ali:

— Mr. Knightley - ela o saudou, tentando manter a compostura.

— Srta. Dashwood - respondeu, sorrindo de lado.

— Belo tempo, não acha?

Emma não tinha ideia sobre o que tinha dado nela mesma para falar aquilo, mas não sabia como chegar no assunto sem parecer uma velha bisbilhoteira:

— Com certeza. - Foi a resposta dele, ele estavam a olhando esperançoso, a espera dela confessar logo o motivo de sua chegada.

Ela não aguentava mais aquele sorriso sínico a fitando como se quisesse mostrar que estava certo.

— Tá certo, você venceu. Por favor, Jane está desesperada para saber. Conte logo.

Gerald começou a rir e se endireitou em seu cavalo com ar vitorioso. Emma percebeu que Jane e Mr. Russell se viraram várias vezes para ver como a dupla estava, e ela não pode deixar de notar um olhar malicioso vindo de sua irmã. Será que ela tinha feito aquela cena para que Emma ficasse junto de Gerald? Se fosse isso mesmo, Emma mataria ela quando chegassem ao parque.

— E o que fez você achar que eu lhe contaria esse segredo? - ele perguntava com um tom de sarcasmo.

— O fato de você ser um bom amigo, que não é de má índole, logo, não me decepcionaria desse jeito - disse Emma, tentando o bajular, para ver se ela o paparicando resolveria a situação. Mas, não resolveu.

— Hm, resposta errada. Poxa, Emma, me enalteça de verdade! Quero mais elogios, você consegue.

— Ora, seu… - ela se segurou para não bater nele com seu chapéu. Respirou fundo, e resolveu seguir o caminho da sinceridade: - Está bem, se não quiser falar, me avise agora mesmo, pois não estou com disposição para seus joguinhos, ouviu bem? Não tenho tempo a perder.

— Nossa, você falou como meu irmão, os dois estão sem paciência comigo hoje, o que eu fiz para merecer isso? - ele se perguntou, mas ao ver que Emma não o iria responder, prosseguiu: -  Está bem, aviso-lhe que não vou dizer a surpresa de Collins, mas posso confirmar que não é relacionado diretamente a sua irmã. Se ela está pensando que é alguma “certa coisa romântica” para ela, está enganada.

Emma sentiu alívio por Jane. Ela o agradeceu pela sinceridade e resolveu refutar o que ele havia dito antes:

— O que aconteceu com você e seu irmão hoje? Ele parece estar mais chateado do que o normal, o que você aprontou, Gerald Knightley?

— Mas você já vai me acusando assim? - ele indagou, em tom de brincadeira. - Ele está de mal humor esses dias, acho que os irmãos mais velhos sempre são assim, se estressam por qualquer coisa. Jane e Charles também são assim?

Emma desviou o rosto, com vergonha de admitir que a pavio curto da casa era ela mesma, quando o olhou para responder, foi atrapalhada pelo seu pai, que gritava para dar uma ordem a ela:

— Emma! Emma! Vá ajudar o Mr. Knightley com o cavalo da Anne, ele está com problemas. Vigie Rocky, ele precisa estar perto de alguém que reconhece. Vamos, acelere, minha filha!

Quando Emma virou para olhar Fitzwilliam, viu que ele estava a muitos metros de distância do unido grupo, a morena se irritou mas nem adiantava opor-se, de todos ela era a que estava mais perto dele. Se despediu de Gerald com muito aperto no coração de ter que estar trocando uma boa companhia por uma péssima.

— Te desejo sorte - disse o loiro, dando uma piscadinha, quando viu ela fazendo uma cara de tristeza.

“O que eu fiz para merecer esse castigo?” pensou. Quando chegou perto do tal homem, desceu de seu cavalo e tentou acalmar o cavalo marrom, Rocky. 

— Não seria melhor trocarmos de cavalo? - a voz boçal de Fitzwilliam sugeria aquilo, mas Emma nunca deixaria ele tocar em seu precioso cavalinho.

— Não acho que seria ideal, nunca montei no cavalo de Anne, e o meu, com certeza, estranharia você. 

Apesar daquilo não ter sido dito como ofensa, Mr. Knightley tomou como se fosse e se calou, voltando para sua indiferença e desdém. Emma deu um petisco a Rocky. Voltou a subir em seu cavalo e os dois andaram juntos a partir daí.

Nenhum dos dois apreciava a presença do outro, ambos se detestavam, mas se tinha uma coisa que Emma odiava muito era silêncio, estava relutando para falar alguma coisa, nem que seja para brigar com ele.  Fitzwilliam estava disperso em seus pensamentos, refletindo sobre tudo o que ocorreu para que estivesse hospedado em Meryton e não em Rosings, que era o destino da viagem do seu trio de companheiros, desviou-se desse raciocínio quando percebeu que a garota de cabelos longos e ondulados às vezes se virava para o olhar, mas não para apreciar sua aparência formosa, e sim, para tentar adivinhar no que aquele rosto ameno estava tão concentrado pensando. Fitzwilliam deu uma risada abafada e com tom de deboche, e Emma logo viu aquilo como sua chance de quebrar o ar de quietude que tanto a importunava:

— O que foi? - ela o questionou rapidamente.

— Não é nada - respondeu Mr. Knightley, se recompondo. Emma continuou a insistir, então ele a disse: - Estava apenas analisando a sua angústia, você estava desesperada para se livrar desse clima horrível que prevalece entre nós, mas, ao mesmo tempo, não gosta de mim, então seus demônios ficam lutando entre si para saber o que fazer. Fique tranquila, eu também não gosto de você, então não precisa se sentir pressionada a falar algo que me agrade. Não conseguiria de todo jeito, já que seus problemas de etiqueta parecem vir desde o berço.

Fitzwilliam viu essa como sua vingança pela vergonha que a morena o havia feito passar no dia do baile do Mr. Preston, sendo a primeira moça a recusar dançar com ele em toda sua vida, ou seja, uma completa idiota. Emma ficou boquiaberta com sua resposta direta e sincera, puxou a corda de seu cavalo para que parasse, Fitzwilliam não entendeu o porquê ela fez aquilo e a encarou com uma expressão de curiosidade:

— Por que parou? O grupo já está muito longe, não adianta parar agora para ajeitar o seu cabelo, nós vamos acabar nos perder deles. - Emma tentou o responder com máximo de polidez e calma que conseguia:

— Mr. Knightley, desde a noite que o conheci, no baile do Mr. Preston, achei que o senhor tinha um temperamento difícil de lidar, - ela mordeu os lábios, tentando falar educadamente - mas depois que o conheci tive certeza de que você consegue ser muito pior que isso. Se está tão incomodado de estar na minha presença, eu posso até o entender, pois fui rude recusando dançar com você na frente de todos, isso eu admito. Não estou me desculpando, até porque faria de novo, se pudesse. Mas, eu não o permito, em hipótese alguma, você ofender aqueles que eu amo, e que nunca fizeram mal algum a você. Se está tão incomodado em se hospedar em Meryton? Por que não vai embora? Se está precisando de algum cavalo para isso, ou uma carruagem, eu mesma lhe empresto, se preciso. 

A garota soltou a corda e voltou ao seu caminho, sem dizer mais nada, quem quer que ofendesse sua família não merecia seu perdão. Porém, se Mr. Knightley já estava zangado antes com suas desavenças com seu irmão mais novo, agora estava duas vezes mais, seus olhos azuis misturados com verde pareciam olhar para Emma como se ela fosse a garota mais miserável do mundo. Fitzwilliam nunca havia sido tão menosprezado por uma mulher, como era por Emma, isso o deixava desnorteado:

— Você pode me chamar de tudo de pior que tem no mundo - ele disse, a olhando com tanta convicção que Emma se sentiu amedrontada. - Mas, nunca pode dizer que não sou honesto, pois não fico me fingindo de bom, como o lobo em pele de cordeiro que você tanto adora.

Ele parou para tomar um pouco de ar antes de continuar seu intenso recado. Emma só conseguia pensar em quem ele estava se referindo com aquele aviso.

— Você? Uma pessoa honesta? Eu duvido muito. - A garota refutou.

— Eu sinto muito se você não vê minhas tentativas de afastar Sir Collins de sua nociva família como um ato de lealdade sincera ao meu melhor amigo de infância. Na verdade, preciso o afastar, principalmente, de seu pai, antes que ele convença William a se casar com a tonta da sua irmã. Seria o casamento mais imprudente da história. Não consigo nem imaginar tamanho desastre.

— O que quer dizer com isso? - Emma não conseguiu se segurar, agora estava irritada de verdade, gritou tão alto que o bando de passarinhos que estavam pousados em uma árvore saíram voando assustados. - Você nem pense em ofender a meu pai, nem a minha irmã. Quem você pensa que é?

— Eu estou apenas citando os fatos, acha que há uma esperança de amor verdadeiro naquele casal? Acha que seu pai está querendo juntá-los porque acredita em um potencial de amor que pode surgir? Não seja estúpida, ele quer usufruir do dinheiro do meu amigo para ele poder pagar as suas dívidas, e eu não vou deixar que isso aconteça. Aquele homem interesseiro. Collins não merece se envolver com uma família tão bagunçada, por isso, esse é um dos desesperos para arrumar as malas e partir para Rosings o mais rápido, se não fosse pelo tolo do meu irmão.  

— Cala a boca! Volte para sua imunda cidade e não pise mais aqui! Você pode achar que tem direito de falar o que bem entende por ter muito dinheiro, mas nenhum dinheiro no mundo compra caráter! E você é a prova viva disso - gritou Emma, o que não havia sido uma boa ideia.

Rocky começou a ficar desconfortável com a discussão dos dois, e começou a rugir,  estava com medo e nervoso. Fitzwilliam tentava controlá-lo, mas era em vão. Rocky estava muito assustado e não queria mais sair do lugar, voltou a se irritar com Mr. Knightley, então tentou de tudo para tirá-lo de cima dele.

O nervosismo dele passou para o cavalo de Emma, quando ela freou para contê-lo teve o azar de ter sido muito brusca, assim, seu cavalo acabou perdendo a ferradura de sua pata esquerda traseira. “Que azar!”. O tempo que estava tentando procurar a ferradura no chão, foi o tempo que Fitzwilliam acabou perdendo o equilíbrio com os revoltados movimentos de Rocky, e despencou do cavalo, caindo em cima de seu braço.

Emma, imediatamente, desceu de seu bicho e correu em sua direção para prestar ajuda, quando olhou para os lados a procura de sua família, percebeu que eles já não estavam mais a vista, ela estava sozinha nessa enrascada, olhando para frente, via apenas a silhueta do cavalo marrom de Anne cavalgando para bem longe dali. Rocky estava perdido, para sempre.


 

— Essa demora deles não é normal - Jane dizia, andando de um lado para o outro, dentro da sala de jogos que havia no Parque de Bridgerton. - Papai, você tem que fazer alguma coisa, eles, com certeza, estão tendo problemas com Rocky, e veja só, o céu está fechando.  Ai, meu Deus. 

— Jane, fazem apenas cinco minutos desde que chegamos, tenha calma. - Enquanto dizia isso, Sir Dashwood apreciava uma xícara de chá de hortelã, seu favorito. - Se quando eu terminar essa bebida, eles dois ainda não estiverem aqui, eu mesmo irei atrás deles, nem que seja sozinho. Por favor, sente-se e relaxe um pouco. Agora, Sir Collins, onde estávamos mesmo? Ah, sim, na sua novidade. Conte-me, estou curioso.

Jane sentou-se junto de Noah, perto da lareira. 

— Seja sincero, acha que ela está bem? Juro a você que estou com um mal pressentimento. 

— Eles podem até estar com desavenças com o Rocky, mas quem vai ter real encrenca vai ser nós dois, se não nós juntarmos ao Sir Collins e descobrirmos o que ele está escondendo. Emma mataria a gente se descobrir que ele revelou a sua noticia mas não demos ouvidos, por estarmos aqui na lareira discutindo.

Jane sorriu e assentiu, os dois se levantaram e foram até a mesa onde o resto do grupo estava, quando Jane se sentou, ouviu o barulho do sino da porta se abrindo, sinalizando que alguém havia entrado. A srta. Dashwood se levantou imediatamente e disse em voz alta:

— Emma? Mr. Knightley? São vocês?

— Está frio - disse uma voz familiar, mas que ela não estava reconhecendo.

Entraram na sala, Mr. Preston e a srta. Preston, completamente encapuzados e levemente molhados, pois havia começado a chover. Jane se sentou de novo, com um ar de angústia que só aumentava a cada minuto que passava.

Os recém chegados cumprimentaram a todos e adoraram a coincidência que os uniu. Os dois, em seguida, foram sentar perto da lareira para se aquecerem e pediram duas xícaras de chá para se acalmarem, Jane não deixou de reparar que Charles parecia mais agitado do que antes, mas achou que estava vendo coisas. Sir Collins, após um gole de whisky, começou a contar seus planos:

— Bom, Sir Dashwood e todos que estão presentes, três dias atrás, recebi um comunicado do Parlamento, me pedindo para retornar o mais rápido possível, pois haviam ocorridos problemas em relação a alguns negócios meus na cidade, não é nada grave, mas só pode ser resolvido pessoalmente, com meus contadores. Com isso…

Jane estava totalmente dispersa na conversa, não conseguia parar de olhar para as janelas, em busca de alguma silhueta familiar. A loira, quando se deu conta da falha que não havia percebido, interrompeu Sir Collins bruscamente:

— Um segundo, Sir Collins, poderia deixar eu me dirigir uma palavra aos nossos vizinhos? Vai ser rápido. - Sir Collins assentiu, sem se incomodar. Jane virou e perguntou aos Prestons:

— Com licença, Mr. e Srta. Preston, - ambos se viraram para ela - me permitem perguntar, como vieram para aqui?

Todos presente olharam para Jane com estranheza, a garota não se deixou abalar e prosseguiu:

— Vieram como? A cavalo ou usando uma carruagem? - ela perguntou.

— Viemos de carruagem. - Srta Preston respondeu docemente, mas, ainda assim, sem compreender o sentido daquilo. - Mas, não viemos pelo campo, como vocês, e sim, pela estrada, mesmo.

— Mas, por acaso não viram um casal de jovens no caminho?  Sabe, a minha irmã Emma, usando um vestido bege, em cima de seu cavalo preto? - Sr. Preston negou ter a visto e lhe assegurou de que se tivesse avistado a querida Emma, teria a reconhecido. Jane, então, o perguntou se não tinha visto Fitzwilliam, mas eles negaram: - Têm certeza? Absoluta? Ele estava montado em um cavalo marrom, de porte médio.

— Já chega, Jane! Pare de os afortunar com suas perguntas. Já disse que eles já já estão chegando. - Sir Dashwood disse firmemente, volto a conversa com Sir Collins. Jane se virou para o seu grupo, sentido que poderiam estar só atrasados mesmo.- Então, Sir Collins, irá voltar para Londres? Mas que tragédia, vocês não passaram nem um mês em Mans…

— Na verdade, estou me lembrando, - dizia Srta. Preston - papai, lembra que eu o havia dito, que vi um cavalo solto cavalgando muito rápido, como se estivesse ansioso.

— Lembro, minha filha, mas isso não significa nada, achar cavalos soltos pelo caminho é uma coisa normal.

— Não, papai, mas acho que ele se encaixa no que a srta. Dashwood está dizendo, pois tenho total certeza de que ele era marrom e, pensando bem, tinha o achado estranho, pois jurei que o tinha visto usando uma sela, mas, na hora, achei que era coisa da minha cabeça. Porém, percebo que não, aquele cavalo marrom estava certamente com uma sela, em seu corpo. Logo…

— É o Rocky! - gritou Jane. - É ele, sim. Ai, meu Deus, então, aconteceu alguma coisa. Eu sabia! Vou para lá, agora. 

Jane se levantou e caminhou em direção à porta com passos apressados, seu pai tentou a acalmar, dizendo que ele mesmo iria, mas a garota já não o escutava mais. Mr. Russell e Mr. Knightley afirmaram que iam se juntar a ela em busca dos dois desventurados. E, assim, o trio saiu do Parque de Bridgerton, em seus cavalos e na chuva carregada, esperando que o pior não tivesse acontecido.


 

Ainda bem que Emma não estava usando maquiagem, pois, se estivesse, nesse momento seu rosto estaria todo sujo. Ela estava numa situação deplorável, seu cabelo estava bagunçado, seu corpo todo encharcado e seus pés pisavam na lama, o que fez seu vestido ficar com as bordas sujas.  Já estava caminhando a alguns minutos caminhando segurando a corda de seu cavalo negro em uma mão e apoiando Mr. Knightley com a outra.

Fitzwilliam tinha caído de Rocky, machucando seu braço direito e a sua perna, por isso estava mancando. 

— Estamos perto? - ele perguntou com a voz fraca. 

— Eu juro que se você pergunta isso mais uma vez - disse a garota, com extremo cansaço -  eu o abandono aqui, e vou embora com meu cavalo. Eu já disse que estamos perto!

Embora Emma (e o próprio Fitzwilliam) sabia que não iria deixar ele sozinho e machucado. O desespero havia tomado conta dela. A chuva não ajudava ela a enxergar para onde estavam indo, somando com ela ter que ajudar um homem de mais de setenta quilos a ficar em pé, ela não aguentava mais. Embora estavam andando em um campo, haviam algumas árvores perdidas no caminho. Emma parou ao lado de um carvalho e amarrou seu cavalo em um galho:

— Por que estamos parando?

— Preciso descansar e essa chuva caindo na minha cara não está me ajudando a enxergar. 

Ela apoiou suas costas no tronco da árvore e ficou respirando ofegante. Só conseguia pensar: como um dia que ela tanto almejava que seria feliz se transformou nesse desastre? Estava chateada, não só do previsões do tempo que Anne disse estarem certas o tempo todo, mas também de não achar que os dois voltariam para casa tão cedo. Fitzwilliam, também apoiado no carvalho, tentava ao máximo não se mexer para sua perna e braço não doerem, estava realmente cogitando ter quebrado o pobre braço.

— Admita que não sabe onde estamos -  ele disse. Emma o olhou com desgosto, mas cansada de mentir para si mesma, afirmou:

— Admito. Estamos perdidos, essa chuva está cobrindo toda minha visão, não sei se vamos sair daqui tão cedo. Que inferno! 

Emma não podia montar no seu cavalo porque ele estava sem ferradura e poderia machucar sua pata, e mesmo que resolvesse seguir o risco e cavalgar, não iria conseguir ajudar Mr. Knightley a subir em seu cavalo com sua perna e braço machucados, pois Emma era muito magra e não tinha essa força toda. Teve a ideia de esperar o tempo melhorar para voltar a seguir o caminho desconhecido. Os dois estavam com frio e exaustos. Ela pensou que o melhor jeito de fazer os minutos passarem mais rápido era estando distraída conversando, se virou e disse:

— Quando estávamos discutindo, antes dessa infelicidade acontecer, quando você disse que meu pai está tentando juntar Jane e William para quitar suas dívidas, estava falando sério? Meu pai tem dívidas? - Mr. Knightley resolveu ser franco e a respondeu que sim, ele estava endividado já faziam alguns meses:

— Ele que casar vocês o quanto antes para aí poder conseguir manter a casa em que vocês moram. Vocês são mulheres, dependem de um bom casamento para terem uma vida tranquila. - Emma odiava essa realidade.

— Está certo, mas o que isso tem haver com as dívidas dele? Se todas sairmos de casa ou continuarmos ele vai continuar com problemas financeiros, não?

— Vão ser menos três bocas para alimentar, menos roupas para comprar e menos três, ou melhor, dois cavalos para cuidar. Ele vai poder gastar menos.

A garota deu um longo suspiro. Não tinha ideia dos problemas do seu pai, e em como ele a afetariam, se não dessem um jeito, teriam que se mudar para uma casa mais barata, e Emma nunca imaginou deixar Meryton tão cedo, amava aquele lugar. Para tentar tirar esse pesadelo de mudança da sua cabeça, ela tentou trocar de assunto:

— O que tem em Rosings que o deixa tão angustiado para partir? - era uma pergunta muito evasiva, mas nesse ponto Emma já não ligava mais para nada.

— É um assunto extremamente confidencial, nem Sir Collins sabe - Fitzwilliam falou com franqueza, e depois continuou : - Infelizmente, William vai ter que voltar para Londres amanhã…

— Então, era essa a notícia que ele iria nos contar em Bridgerton? - interrogou Emma.

— Não, era para eu e Gerald ficarmos em Mansfield esperando ele voltar para aí partirmos, mas aquele paspalho do meu irmão colocou na cabeça de William que ele deveria levar vocês junto com ele para conhecer sua casa em Londres e mostrar os pontos turísticos.

Emma ficou abismada com o convite, já fazia muito tempo que havia visitado Londres, nunca foi muito fã da cidade, pois achava muito suja e muito populosa. Porém, sentiu seu coração acelerar ao ouvir que foi Gerald que tinha dado a ideia de os convidar para passar um tempo na casa de Sir Collins, será que ele fez isso por gostar de sua presença, ou apenas por educação? Com certeza, Emma aceitaria. 

— Não o entendo, Mr. Knightley, se está incomodado de viajar para Londres conosco, por que não parte para Rosings sozinho?

— Porque só tem uma carruagem e dois cavalos em Mansfield Park, - ele dizia como se fosse óbvio - e vai ser esses que Collins vai usar para ir a Londres.

O silêncio voltou a reinar, mas Emma, dessa vez, não se incomodou porque estava pensando muito no que iria oferecer, seria certo? Depois de indagar, Emma o ofereceu sua proposta:

— Escute o que vou falar com atenção, pois não irei falar duas vezes - ela estava séria e mirando seus olhos castanhos nele. - Eu posso lhe emprestar uma carruagem, para ir à Rosings. - Fitzwilliam a olhou extremamente desconfiado.

— Posso saber o motivo dessa bondade espontânea?

Não, não era bondade, muito menos uma tentativa de Emma de começar uma bela amizade. 

— Preste atenção, você tem assuntos importantes em Rosings, e eu tenho uma viagem muito legal para ir e não gostaria de sua presença desanimadora lá, você iria estar irritado e reclamando de tudo. Se eu lhe dar um meio de transporte, os dois sairiam ganhando, entendeu? Mas, se você não quiser, tudo bem, eu vou ter que me conter em te aturar e você me aturar na capital. 

Fitzwilliam refletiu e aceitou sua proposta. Os dois deram um aperto de mão forte.  Fitzwilliam estava pensando em a agradecer por te-lo ajudado a andar, enquanto estava incapacitado. Antes que o fizesse, a morena se levantou rispidamente e andou até fora da sombra do grande carvalho.

— Está ouvindo isso? - ela o perguntou, Fitzwilliam negou, apenas escutava o barulho da grossas gotas de chuva caindo nas folhas de sua árvore de conforto. Ele a questionou o que estava escutando. - Barulho de galopadas de cavalos em poças de água.

Ela saiu em busca da origem do som, Fitzwilliam continuou imóvel. Emma não conseguia correr muito rápido porque seu vestido molhado pesava o dobro do peso normal e suas botas se afundaram na lama.

— Emma! Fitzwilliam! - gritou uma voz doce, que Emma conhecia desde que nasceu. - São vocês aí?

— Jane! Jane! Jane! - ela gritou e correu na direção do cavalo branco de Jane, onde a irmã mais velha estava montada e totalmente encharcada.

O reencontro foi eufórico, Emma quase chorou de felicidade. Avistou Noah, Jane e… Gerald? Ele também veio procurá-la? Ela ficou chateada por todos terem que a ver nesse estado deplorável, com esse cabelo todo bagunçado e vestido destruído. Mas, enfim, abraçou todos e começou a falar rapidamente engolindo as palavras sobre tudo que havia acontecido:

 - Foi tudo muito rápido, eu e Fitzwilliam brigamos, Rocky surtou e aí fugiu, Fitzwilliam não conseguiu controlá-lo e aí ele caiu e ele está machucado, está mancando, estávamos nós protegendo do dilúvio embaixo daquele carvalho. Achei que nunca nós acharíamos e que só voltaríamos para casa amanhã. Vamos, me sigam, temos que chamar um médico para ele imediatamente, acho que ele fraturou o braço. 

— Mas, e o mais importante… o Rocky, ele ficará bem? - perguntou Gerald, fingindo seriedade.

— Rocky… Rocky? Está preocupado com aquele demônio? Depois de tudo que eu acabei de dizer?! - Emma deu um surto de histeria e quase o agrediu: - Aquele maldito cavalo, Anne vai se ver comigo quando eu voltar para Meryton, se depender de mim, ela nunca vai ter contato com nenhum animal até se casar e ir embora. Cavalo maldito e teimoso, se não fosse por ele, eu não teria passado por esse tormento! E você preocupado com ele ao invés de mim e seu irmão, maldito seja.

Todos riram do nervosismo dela, Jane tirou um lenço (também encharcado) de seu bolso tentou limpar os braços sujos de lama de Emma. Todos foram ao encontro de Fitzwilliam, Noah o ajudou a subir em seu cavalo. Jane contou a Emma que Mr. Preston estava no parque também e que ele pediu ao seu cocheiro para ir em sua casa trazendo mais uma carruagem para você e Fitzwilliam. 

Começou a anoitecer quando eles chegaram a sala, todos fizeram um alvoroço e encheram os desafortunados de perguntas. Emma não conseguiu responder nada, se sentou no chão perto da lareira e lá ficou, enquanto Fitzwilliam estava do outro lado da sala, colocando gelo na sua perna, enquanto gemia de dor, pois andar a cavalo fez a dor piorar.

Quando o cocheiro chegou com a carruagem deles, Emma e Fitzwilliam entraram o mais rápido que puderam. Como era uma carruagem de quatro pessoas, Emma o perguntou se podia chamar sua irmã e Mr. Russell para ingressarem na jornada de volta para Meryton com eles, Mr. Knightley não deu nenhuma objeção. Os quatro seguiram o trajeto pela estrada, a chuva havia amenizado, Emma os contou sobre a viagem a Londres. Jane não ficou muito empolgada, mas, mesmo assim, disse que iria porque não se recusa um convite tão vantajoso desse, pois, além de ter o privilégio de poder conhecer melhor a cidade mais famosa da Inglaterra, se Jane recusasse ir Emma não iria, e se Emma não fosse, isso iria destruir seu plano de fazer Emma e Gerald se aproximarem. Então, seria uma excursão muito divertida, pelo menos era isso que a loira torcia.


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Notas finais do capítulo



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