IV

.

{a mad tea party}

.

.

O chá era terrível. Os biscoitos ainda piores. O vira-lata malhado latia empolgado. O fogo crepitava na lareira, deixando o pequeno chalé abafado. Amontoado entre os amigos, em uma mesa de madeira lascada, Scorpius Malfoy se sentia contente de um modo indescritível. Era sempre assim quando iam visitar Hagrid. O meio-gigante era uma companhia agradável, cheio de histórias interessantes e um coração gigantesco. E o garoto se sentia mais acolhido ali do que qualquer outro lugar em Hogwarts.

Era estranho, considerando que o homem conhecia Rose e Albus desse que eles eram bebês. Mais do que isso, era um amigo íntimo e muito querido de suas famílias há décadas. Sendo assim, havia uma óbvia intimidade entre eles que deixara o Malfoy desconfortável no começo. Scorpius era a peça sem lugar em um quebra-cabeças completo. O recém-chegado. A novidade. E, quando os amigos lhe convidaram para acompanha-los em uma visita ao guarda-caças pela primeira vez, acreditou que seria deixado de lado. Ignorado. Que simplesmente não se encaixaria naquela antiga equação. Afinal, não eram sempre assim?

No entanto, não poderia ter se enganado mais. Hagrid o abraçou desde o início. Literalmente. O tratou da mesma forma como tratava Rosie e Al. O fez se sentir confortável. Aceito. Em casa. E talvez aquilo fosse um pouco irônico, uma vez que a velha cabana não se parecia em nada com a grandiosa Mansão Malfoy, o único lar que o menino conhecia. Naquele momento, contudo, isso era uma coisa boa.

No fim, era sempre bom estar ali. E naquele dia não foi diferente. Albus passara meia-hora reclamando da vida, do universo e de tudo mais. O que, bom, era apenas Albus sendo Albus. E sua rabugice era, na maior parte do tempo, bem-vinda e hilariante. Além disso, Scorpius gostava bastante de ter alguém para odiar o mundo ao seu lado. Um fiel companheiro nas artes do sarcasmo e do rancor leve e inocente.

Era Rose, de qualquer forma, quem dominava a conversa. O que não era exatamente uma surpresa. Naquela tarde, ela e Hagrid debatiam animadamente sobre dragões. Tal como em sala de aula, a garota fazia milhões e perguntas, e as comparava com informações que havia arrancado previamente de seu tio Charlie. Mesmo em poucos meses, Scorpius já entendera que não havia limites para a curiosidade da Weasley.

Minerva McGonagall uma vez havia dito à menina que talvez aquela fosse a maior diferença entre ela e a mãe. Hermione parecia ter todas as respostas, enquanto Rose parecia ter todas as perguntas. Ela contara aquilo ao Malfoy entre gargalhadas, afirmando que não tinha qualquer interesse em ter certezas. Pelo menos, ainda não. Afinal, que graça aquilo teria?

Scorpius, que desde que chegara a Hogwarts se via cercado por constantes dúvidas e confusões, não conseguia concordar. Adoraria ter algumas certezas para chamar de suas. Adoraria entender quem era, quem a sua família era e qual o seu lugar em meio a tudo aquilo. E, bom, adoraria algumas respostas acadêmicas também, já que não era exatamente o melhor aluno da turma.

De qualquer forma, aquela agitação interna – assim como seu péssimo desempenho escolar – podia ser esquecida por algumas horas. Enquanto ele estivesse bebendo chá ruim e ouvindo as histórias de Hagrid, os resmungos de Al e as perguntas de Rosie, tudo estaria bem. O resto podia esperar.