A Pequena Lady de Ferro 3 escrita por Lady Danvers


Capítulo 7
Um Aniversário Para Lembrar


Notas iniciais do capítulo

Voltei com um capítulo extra grande para compensar a demora!! As aulas EAD estão sugando a minha vitalidade então peço desculpas pelo atraso.

Fiquem com esse mega capítulo (deu 11 páginas no PC) e bom fim de semana!!



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TONY

 

A lápide tem tantas flores que mal consigo ver o nome dela. 

Perdi a noção de quanto tempo estou parado aqui, encarando uma pedra fria que não contem nada além do nome esculpido. 

O dia está nublado e cinza e é uma representação fiel de como me sinto por dentro desde que ela se foi. Coloco os lírios sobre a lápide, acima de todas as flores, talvez fossem de fãs. Happy me disse que muitas pessoas vieram hoje. 

Era um dia especial, afinal. Para nós dois. 

Julie estaria completando vinte anos hoje se eu tivesse feito ela mudar de ideia. Ela ainda estaria aqui se eu tivesse insistido mais para que ela cursasse a faculdade e se tornasse a cientista que sempre quis ser. 

Quis ser o pai que apoia as escolhas da filha e acabei levando-a à morte. 

Passos atrás de mim me surpreendem. Louise me encarava com seus olhos verdes avermelhados por lágrimas, seu rosto era tão vazio de alegria quanto o meu. 

— A Pepper me avisou que você estaria aqui – Ela traz orquídeas e as deposita na lápide. 

Ficamos em silêncio um ao lado do outro, sem saber o que dizer. Não nos falamos desde o funeral, temi que Louise fosse adoecer, mas Mark e John cuidaram bem dela.  

Ela é mais forte do que eu. Sempre foi. 

— Quando a Julie tinha oito anos, ela veio até mim e me abraçou assim que eu cheguei de um turno difícil no hospital – Louise começou, seu rosto ainda virado para a lápide. - Um trem havia descarrilado e matou muitas pessoas. Pode-se dizer que eu estava acabada quando cheguei em casa, mas minha garotinha estava lá me esperando. Ela me abraçou tão forte que me fez esquecer toda a dor e o sofrimento que eu havia vivenciado naquelas horas de plantão. Então ela olhou para mim e disse que, quando fosse adulta, iria salvar pessoas como eu fazia. Eu nunca amei tanto alguém como naquele momento. 

— Louise, eu sinto muito. Me desculpe por não ter estado lá por você e por ela quando precisavam de mim. Me desculpe por ter acusado você de golpista. - As palavras saíam de mim em uma torrente. Havia tanto que eu havia deixado de falar para elas e agora Julie já não estava mais aqui para ouvir. 

— Tony, você não precisa... 

— Preciso e não sei porque não disse isso antes. Meu orgulho tende a levar o melhor de mim. Se eu não fosse tão imaturo e irresponsável talvez as coisas tivessem sido diferentes, talvez não tivéssemos perdido ela. 

— Talvez, mas a Julie sempre seria a mesma cabeça dura geniosa de sempre. Essa teimosia ela herdou de nós dois e nenhuma escolha diferente ia mudar isso.  

— Ainda assim, sinto que é minha culpa – Louise pega minha mão e a segura forte. 

— Você acha que não me culpo, também? Somos pais, Tony. Sempre vamos nos culpar por tudo que fizemos ou deixamos de fazer, mas nós a preparamos da melhor forma que conseguimos. Nós apoiamos a Julie quando ela precisou. Tudo que ela fez foi uma escolha dela. 

Eu sei, quero dizer. Sei que fizemos o melhor que podíamos, mas não consigo deixar de acreditar que falhei e que isso custou a vida da minha filha. 

— Obrigado por vir, Louise – Foi o que resolvi falar.  

Eu não precisava falar para ela o quanto eu estava quebrado ou o quanto meu coração doía só de pensar que essa é a nossa nova realidade: dois adultos, um muito instável, pais de uma filha morta. 

Sei que ela sente o mesmo que eu. 

— Ainda somos uma família, Tony – Louise me abraça de surpresa e tudo que consigo fazer é permanecer imóvel. A voz dela estava embargada, deduzi. Ela não queria que eu a visse chorar. 

Somos mais parecidos do que ela imagina. 

— Sempre vou te amar porque sem você, a Julie não existiria. Sempre que precisar de uma amiga, eu vou estar aqui. Posso contar com você também? 

— Claro que sim. 

Louise se afastou e pude finalmente encará-la. Sua compaixão era a sua melhor qualidade e, mesmo depois de tantos anos, consigo enxergar a garota que amei um dia. 

— É o seu aniversário também - Assenti e encaramos a lápide novamente, aquele pedaço frio e austero que agora representava nossa filha, nossa maior alegria e nossa maior tristeza. - Faça os próximos serem incríveis, ela não ia querer que você sofresse por algo que não pode controlar. 

— Eu vou tentar – respondi, mesmo que eu não encontrasse verdade alguma nessas palavras. 

 

 

 

 

 

JULIE

 

A cada dia fica mais fácil. 

Estar em Asgard é como estar em um sonho que não acaba e, a cada dia, me acostumo mais com o palácio, a área de treinamento e meus novos amigos. Claro que ainda sinto muita falta de casa, mas a dor da partida está diminuindo. 

Isso é um começo. 

Giro a espada com força contra a espada de Sif. Estamos treinando há quatro horas e o cansaço ainda não reclamou meu corpo. Uma vitória para quem odiava ginástica. 

— Você não quer parar? - Sif pergunta, seu rosto é um misto de curiosidade e determinação. Ela ataca sem dó. 

— Por quê? Você não está cansada? - Bloqueio seu golpe e dou dois passos para trás. Estou tão suada que vou precisar de dois banhos. 

— Você está determinada demais hoje. Loki fez alguma coisa? - Sif acerta meu ombro com a parte plana da espada em uma velocidade absurda. Dói mais do que se ela tivesse me cortado. 

— O que Loki tem a ver com isso? - Meu ombro dói, mas continuo segurando a espada ainda mais forte. Desistir não é uma opção. Até mesmo em um treino. 

— Quando Loki não tem a ver com algo? Se ele fez alguma coisa a você, diga para mim que eu e ele teremos uma conversa amigável mais tarde – Sif gira sua espada com uma mão, esperando meu ataque. 

As palavras de Heimdall que poderiam insinuar algo sobre Loki me incomodavam, mas hoje, era só uma pequena parte de meus pensamentos. 

— Hoje é meu aniversário. Do meu pai também – Vou para cima de Sif, mas ela bloqueia qualquer golpe que tento contra ela. 

Ataco pelas laterais, usando os passos que ela me ensinou. Dois para frente e um para a esquerda. 

Sif bloqueia com a espada, o lado cortante, e me derruba feito um saco de batatas. 

— Parabéns – Ela abaixa a espada e me estende a mão. – Quantas eras você está completando? 

— Eras? Para mim são anos e estou fazendo vinte – falo enquanto limpo a sujeira de minha calça. 

— Ah sim. Esqueci que midgardianos tem um tempo de vida mais baixo.  

— Quantos anos você tem? 25? – Embainhei a espada. A conversa havia ficado mais interessante que o treino.  

— Tenho 1400 anos, para ser exata, mas o tempo é diferente para nós de como é para você. 

— Wow. Quer dizer, em tese sei como funciona, de acordo com todos os livros de mitologia que eu já li – O pátio de treinamento já começava a encher de jovens. Era a nossa vez de partir. 

— O tempo apenas passa um pouco mais devagar. Ainda assim, vamos morrer um dia. Um exemplo é o Pai de Todos, ele já está beirando o fim de sua vida e por isso seus poderes enfraqueceram. 

Saber que sou apenas um grão de areia qualquer em um vasto deserto se comparada as pessoas ao meu redor só me faz ter certeza de que tenho que aproveitar ao máximo a segunda chance que recebi. 

— Mas e você, Juliet? - Sif continuou. - Não vai comemorar? 

Antes que eu pudesse responder, ouvi uma comoção do outro lado do pátio. 

— Juliet! Sif! Finalmente encontrei vocês! - Amora cruzava o pátio, seu vestido esvoaçante azul atraia os olhares de todos ao redor. A tiara de esmeraldas que adornava seus cabelos louros também não passava despercebido.  

— Nós estávamos bem aqui pelas últimas quatro horas – Sif comenta. 

Não sei que tipo de relacionamento Sif tem com Amora, mas sei que não é tão conturbado quanto com Loki. 

— Eu estava ocupada não sabendo que Juliet está de aniversário e não havia contado para ninguém - Ela me lança um olhar acusatório como se tivesse sido ofendida. - Até agora. 

— E como você sabe? 

— Eu sou uma bruxa. Não me chamo Encantor por nada – Ela responde como se fosse óbvio. - Enfim, preparei chá, biscoitos e tenho um presente para você. Você também vai Sif. 

— Está bem, mas acabamos de treinar e precisamos... 

— Ok. Problema resolvido – Amora disse e estalou os dedos. 

Se antes estávamos no pátio de treinamento, agora nos encontrávamos em o que parecia ser um solarium. O sol brilhava pelo teto de vidro, aquecendo as plantas ao redor. A mesa no centro do lugar estava cheia de biscoitos e pães. 

Nunca estive com tanta fome. 

— Não podia esperar até tomarmos banho? - Virei para Sif e vi que seu uniforme de treino havia sumido. Em seu lugar, um vestido dourado adornava suas curvas. Até seu cabelo estava solto. 

— Para que se preocupar com isso quando posso avançar o processo? Como está se sentindo, Juliet? 

Minhas roupas de treino surradas haviam sido substituídas pelo vestido salmão que estava no meu armário. O suor e as dores no corpo haviam desaparecido e meu cabelo estava trançado e adornado por uma tiara dourada.  

— Você aceita ser minha fada madrinha? - Amora sorriu satisfeita. Ela fez um ótimo trabalho. 

— Pelo menos alguém aprecia meus esforços - Amora diz a Sif que apenas revirou os olhos, mas parecia concordar. 

— Você gostaria da minha amiga Megan. Ela não consegue viver sem comprar pelo menos um vestido por semana. 

— Posso dizer que seríamos melhores amigas – Amora respondeu e eu realmente consigo visualizar isso. - Ah, quase esqueci! Seu presente. 

Ela corre para o outro lado do solarium e volta com uma caixa retangular. 

— Espero que goste – Ela fala, seus olhos verdes brilhando. 

Abro a caixa e pareço esquecer de respirar por um momento. É uma corrente dourada com uma coruja. É a corrente dourada que meu pai me deu. 

— Como conseguiu isso? Achei que eu tinha perdido. - Meus olhos enchem de lágrimas, mas me contenho. É o mais perto que me sinto do meu pai em um bom tempo. 

— E perdeu. Ele quebrou quando você quase morreu e Loki pediu para que eu o reparasse para você - Amora explicou. 

Loki. É claro que foi ideia dele. Ele me conhece muito bem. 

— Obrigada. Eu adorei. Onde está Loki? Gostaria de agradecê-lo também. 

— Ele saiu cedo e até agora não voltou. - É tudo o que ela diz. 

Tudo bem. Posso agradecer depois. 

Os trinta minutos seguintes se passam com muitos biscoitos e fofocas asgardianas. Amora parece saber tudo da vida de todo mundo e até Sif parece estar se divertindo. 

Entramos no tópico de relacionamentos e Amora tem histórias tão absurdas que só alguém com o tempo de vida estendido pode ter. 

— Espera aí. Então você só ficou com ele depois que ele conquistou um planeta para você? - Perguntei, esperando ter ouvido o relato da forma certa. 

— O que posso dizer? Ele era jovem, bonito e não tão inteligente. Fiz tudo o que pedi apenas por um beijo meu – Amora recorda, orgulhosa de si mesma. 

Gostaria de ter histórias tão divertidas quanto essa. O máximo que cheguei perto foi Brad e todos já sabem como tudo terminou mal. 

— E você, Sif? - Amora continua. Tomo meu chá, agradecendo por não ter sido a escolhida para esse assunto. - Já superou a sua paixonite pelo Thor? 

— Nunca tive paixonite pelo Thor – Sif responde um pouco rápido demais. Ela disfarça bebendo seu chá, mas dá para notar que seu rosto ficou vermelho de repente. 

Me seguro para não rir. 

— Toda garota e garoto de Asgard já foram apaixonados pelo Thor. Não precisa se envergonhar – Amora brinca, mas suas palavras tem um fundo de verdade. 

— Até você? - Pergunto. 

— O que posso dizer? Todos temos fraquezas e o meu era o senso de humor dele. 

— Achei que você gostaria do Loki já que ele é um feiticeiro como você - A frase saiu de meus lábios antes que eu pudesse contê-la. Agora era a minha vez de me esconder atrás do meu chá. 

— Digamos que Loki estava na sua fase de adolescente rebelde e sofredor. É bonitinho, mas cansa depois de um tempo – Ela explica e não consigo conter minha risada. Até consigo imaginá-lo assim. - Acredite, ele ficou realmente se remoendo por um tempo depois de uma aposta... que eu não lembro. E você, Juliet? Nos conte um descaso amoroso. 

E eu contei tudo. Desde nossa infância, nossa separação e nosso reencontro. Para falar a verdade, me sinto até mais leve. É verdade quando dizem que guardar as coisas para si mesma não é uma boa ideia. 

— Então descobri que ele era um agente triplo. O que fez pouca diferença porque ele ainda assim mentiu e me traiu com uma de nossas piores inimigas. Foi ela que quase me matou, e então eu vim parar aqui - Concluí. 

— Que bastardo – Sif diz, visivelmente ultrajada em meu nome. 

— Se você tivesse outra chance, voltaria com ele? - Amora pergunta, séria. 

Outra chance. Brad e eu já passamos por tantas coisas juntos e já machucamos muito um ao outro. Antes mesmo de chegar em Asgard, eu tinha minhas reservas em relação à Brad e a traição foi apenas o último prego no caixão de nosso relacionamento. 

— Ele me magoou muito. Se o encontrasse novamente, e espero que sim, ele ainda será um amigo querido. - Respondo e nunca senti tanta clareza em minhas palavras como naquele momento. 

Amora sorri satisfeita e sinto que passei em algum tipo de teste.  

— Ok, Amora. Sua vez de nos contar mais um descaso amoroso. - Digo. 

— Desculpe, mas vou ter que deixar para a próxima. Alguém precisa da minha ajuda – Amora levanta, seu olhar distante. - Juliet, parabéns mais uma vez. 

— Obrigada por tudo isso. Você não precisava... 

— Precisava sim. E tem alguém procurando por você, vou redirecioná-los para cá. Nos vemos mais tarde. 

Amora se desfaz em magia verde e brilhosa, deixando Sif e eu sem entendermos nada. 

— Pelo menos ainda tem bastante biscoitos – Sif diz. 

Continuamos comendo e conversando até que um guarda aparece. 

— Desculpe interromper, Lady Juliet e Lady Sif, mas A Lady Encantor pediu para trazê-los aqui... 

Assim que ele disse isso, um garoto de cabelos brancos veio correndo em minha direção. 

Era Narvi. 

— Lady Juliet! - Ele me abraçou tão forte que quase caí, mesmo ajoelhada. 

— Narvi! Eu não esperava que viesse hoje – falo, lembrando que havíamos combinado de que ele seria treinado em Asgard. 

— Ele queria muito vir aqui hoje. Disse que sentia que você precisava de um abraço - Seryn explica. Seu rosto muito mais calmo e convidativo desde a última vez que nos vimos. 

— Ele estava certo. É meu aniversário hoje – Levanto e a cumprimento. - Você é muito intuitivo Narvi. 

— Viu, mãe? Eu sabia! - Narvi diz como se tivesse ganho na loteria. 

Esse aniversário estava se tornando ótimo, apesar de tudo. 

 

 

 

 

ENCANTOR

 

Senti sua presença, assim que ele colocou os pés em Asgard. 

Loki é tão previsível que até consigo sentir pena dele. Ele está perdidamente apaixonado pela mortal, o que só confirma minhas suspeitas. 

Não sei se ela sente o mesmo. Juliet é difícil de ler até mesmo quando ela está brincando. Não consigo ver se o que ela sente por ele é realmente amor ou uma forte gratidão. 

Para o bem de Loki, espero que seja a primeira opção. 

Será que ele sabe? 

— Sabia que o encontraria aqui. – Loki estava vestido como um midgardiano comum, de calça jeans e camiseta preta e encarava um monte de fios sem saber o que fazer com eles. - As coisas que fazemos por amor. 

Ele enfim me encara, sério. 

— Uma ajuda cairia bem. 

— Agradeça por eu ser sua amiga. – Me aproximo para inspecionar a bagunça. - O que espera fazer com tudo isso? 

— Juliet gosta de assistir filmes então pensei em proporcionar isso a ela. O que não me ocorreu é que Midgard e Asgard funcionam de maneiras bem diferentes. - A frustração era evidente em seu rosto e por mais que eu gostasse de provocá-lo, ele precisava mesmo de ajuda. 

— É fofo o quanto você tenta – Loki revira os olhos. - Devia mostrar mais desse seu lado que se importa. Faria sucesso. 

— Você consegue fazer funcionar? - Ele pergunta, cruzando os braços. 

— Não seria eu se não conseguisse – Deixo a magia fluir pelos meus dedos e logo tudo estava instalado e pronto. 

— Obrigado – ele se vira e espera que eu saia, mas tenho algumas dúvidas e preciso saber agora. 

— Loki, você lembra de quando éramos muito jovens e Thor nos desafiou? - Ele me lançou um olhar de surpresa. Ele lembra. - Eu estava conversando com Juliet agora há pouco e essa memória voltou para mim. O desafio de escalar o monte e ver o que você mais ansiava, mas nunca teria. 

— Onde quer chegar com isso? 

— É ela, não é? 

Só pode ser isso. Ele nunca esteve tão vulnerável quando está na presença dela. 

— Eu não sei, mas suspeito que sim.  

— Suspeita? Para mim está bem claro.  

Naquela noite, todos nós completamos o desafio e cada um viu algo diferente. Se essa é realmente a resposta de Loki, temo por ele. 

— Tem que contar a ela. 

— Preciso ter certeza primeiro. – Ele responde e, pela primeira vez em muito tempo, vejo aquele adolescente de mente tumultuada. Nunca escolhido primeiro, nunca amado primeiro. 

— Tenha cuidado. Ela vai quebrar o seu coração.  

Gostaria de dar esperanças a ele, mas não sei se tenho esse direito. 

 

 

 

 

JULIE

 

A noite já se fazia presente quando finalmente entrei em meu quarto. Apesar de não ter planejado nada, meu aniversário foi ótimo. A visita de Narvi e Seryn apenas ajudou a levantar ainda mais meu espírito. 

Tudo que faltava era colocar minha camisola, deitar na cama e talvez ler um livro. Eu nem estava pensando em... 

— Loki!? - Quase pulo de susto ao vê-lo ali, sentado em uma poltrona no canto do carto. - O que você está fazendo? Que roupa são essas? 

Ele estava usando jeans e camiseta. Loki nunca pareceu tão humano e normal. 

— Eu sei que essas roupas são hediondas – Loki diz assim que começo a rir. - Mas era a única opção para conseguir o seu presente. 

— Presente? 

— Claro. Onde você acha que eu estive o dia todo? - Ele levanta e aponta para a parede. 

— Uma televisão? - Pergunto, surpresa. - Mas como vai funcionar? O tipo de eletricidade usada aqui é diferente da Terra. Só a descarga de nêutrons que iria ocorrer poderia, hipoteticamente, causar uma explosão. 

— Quanto mais tempo você passar aqui, mais vai perceber que há um feitiço para tudo. - Loki responde, me entregando o controle. - E a Encantor ajudou também. 

Então foi por isso que ela saiu às pressas mais cedo.  

— E o que está passando na TV? Espero que não seja jornal. 

— Você me disse uma vez que amava filmes então pense em um filme e aperte o botão do meio – Loki explica. Ele parecia tão ansioso quanto eu para ver o resultado de seu experimento. 

Fecho os olhos e tento visualizar. São tantas opções que passam pelas minhas lembranças. 

— Você tem que se concentrar – Loki fala e sua voz está perto demais para o meu conforto. 

— Estou me concentrando – Digo, ansiosa.  

Penso nos últimos filmes que assisti com meus amigos e meu pai. Penso em Loki e seus presentes para me fazer sentir menos deslocada e minha mente finalmente fixa em um. 

— O que é isso? - Loki pergunta assim que abro os olhos. 

— A Bela E A Fera. É um romance e um dos melhores filmes da Disney. 

— Bem, aproveite o seu presente. Boa noite, Juliet – Loki diz e caminha até a porta. 

— Espera! Você não vai ficar para assistir? 

— Você quer que eu fique? - Há surpresa genuína em seu rosto. Como se depois de tudo, ainda fôssemos estranhos. 

— Claro que sim. É a minha forma de agradecê-lo pelo presente e apresentá-lo a filmes de qualidade. – Ele está hesitante, consigo notar. Sentir. 

Somos amigos, não é? 

— Tenho que sair logo desse vestido então me espere aqui – Continuei. 

Loki se afastou da porta então acho que ganhei a batalha que ele pesava em sua mente. 

— Se é o que você quer. - Ele diz, finalmente. 

Volto do banheiro vestindo meu pijama mais comportado que consiste de uma calça e camiseta de manga longa. Apesar de não querer admitir, estar com Loki em um espaço fechado traz recordações que prefiro não nomear. 

— Você não vai trocar de roupa? Achei que essas roupas eram hediondas para o seu senso de estilo – Sentei na cama e abracei meu travesseiro, observando Loki do outro lado do quarto. 

— E são, mas admito que são confortáveis. - Ele diz e se aproxima, mas não o suficiente. 

— Loki, pode sentar ao meu lado. Eu não vou te atacar – Digo e posso jurar que vi seu rosto ruborizar. 

Loki conjurou chocolates e logo começamos a assistir. Eu havia esquecido o quanto é bom apenas relaxar e assistir algo com alguém. Estive tão preocupada com tudo ultimamente que quase me esqueci como é ser uma pessoa normal aproveitando o seu tempo. 

Admito que é divertido assistir filmes com Loki. Ele faz muitas perguntas e a maioria nem faz sentido, mas é bom ter alguém com quem compartilhar meu conhecimento cinemático. 

— Então, ela escolhe a fera ao invés do cavalheiro que a ama? - Ele pergunta quase ao fim do filme. 

— O Gaston apenas ama a ideia de estar com ela. A fera a vê como uma pessoa com pensamentos e identidade própria, já ela consegue ver além do exterior dele. - Respondi. 

— É um pensamento bonito, mas que só vivem em histórias. - Ele disse e, dessa vez, olhava para mim. 

— Tenha um pouco de fé - Falei, cutucando seu braço. - Você não gostaria de estar com alguém que o vê como você realmente é? 

— Você gostaria? 

— Como assim? - Pergunto. Me sinto nervosa pela primeira vez desde que começamos o filme, não sei o que esperar. 

— Você é mais inteligente que qualquer pessoa que já conheci, mas nunca fez nada que superasse o seu pai porque é muito mais fácil ficar na sombra dele do que se colocar no holofote; Você usa humor para disfarçar quando está desconfortável ou triste porque não quer parecer fraca diante de ninguém; Você ainda se sente abandonada, mesmo que tenha seu pai porque nunca terá os anos que perdeu com ele; Aparenta ser arrogante e pretenciosa porque é mais fácil do que realmente confiar em alguém e quando sua confiança é quebrada, dificilmente pode ser ganha novamente. 

De repente o quarto havia ficado menor do que realmente era. Será que ele havia visto tudo isso enquanto minha mente estava sem proteções ou foi algo que ele foi encaixando, peça por peça, como um quebra-cabeças? 

— Você realmente me conhece. - Falo, finalmente. 

— Então, me responda, Juliet. Quem sou eu na sua história, a fera ou o cavalheiro? 

Ele está perto demais. Tudo o que consigo pensar é em fugir. Fugir do assunto, do quarto e até dos sentimentos. Essa é quem eu sou, uma covarde. 

Não hoje. 

Não posso fugir para sempre. Olho ao redor, para o quarto banhado em luz do luar, para o filme que havia acabado, para Loki que esperava uma resposta.  

Eu devia uma resposta a nós dois. 

— Você é o meu reflexo – Falei, finalmente o encarando. Tomando coragem. - Você é aquele que foi abandonado e não amado por seu pai; Você ama seu irmão, mas odeia viver à margem de comparações com ele; você não confia em ninguém porque confiar significa perder o controle e se confia, seu medo os afasta; você se esconde por trás de atos horríveis e erros que cometeu porque você acha que é assim que todos sempre vão vê-lo. 

Não sei por quê, mas uma lágrima escorre pelo meu rosto. Loki levanta a mão e a limpa, arrepiando minha pele. 

— Eu não o vejo assim – Continuo. - Você é muito mais do que todos pensam que você é. Eu vi o seu pior e o perdoei porque vi você de verdade. O menino abandonado, o jovem perdido, o príncipe das mentiras, o rei gentil, todos são você. Na minha história, você é a fera e o cavalheiro. Antes meu carcereiro e agora meu salvador. 

— E o que isso significa para você? - Ele pergunta e nem olha para mim por medo da resposta. 

Sinto que nunca pensei tão claramente em toda a minha vida. Minhas mãos tremem e estou suando frio. Medo, ansiedade e clareza. 

As máscaras caem. 

E eu o beijo. 


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