A Senhora do Lago escrita por Enypnium


Capítulo 7
Capítulo 6: SONHOS VERDES.


Notas iniciais do capítulo

Presente de natal, procês!

Para todos que me pediram atualizações mais rápidas: Eu entendo vocês. SÉRIO! Antes de ser uma escritora, sou uma leitora e acompanho algumas histórias a anos (Né, tio Martin?). Fico igualmente ansiosa pelas atualizações.
Mas precisarei me desculpar. Realmente gostaria de postar um capítulo por semana, mas infelizmente não consigo! Hora a inspiração escapa, hora a criatividade trava, hora escrevo só porcaria, e hora a vida atrapalha. Não quero falar em prazos que não poderei cumprir. (Resposta padrão a lá Martin).
Contudo, se vocês tiverem paciência comigo, essa estória será bacana e vai chegar em algum lugar, que espero, será legal para todo o mundo.

Estamos entrando em outra fase a partir desse capítulo, e eu ainda preciso descobrir como vou conduzir isso... comentem para me iluminar.

Obrigada a todos os meus leitores antigos e novos. Sem vocês eu não teria nenhum entusiasmo para continuar.

Boas festas a todos! Festejem com consciência, bebam muita água e usem protetor (de todo o tipo) “solar”. Beijos.

PS 1: Qualquer diálogo ou descrição reconhecível, não pertence a mim. Estou apenas brincando com as ferramentas que o papai e a mamãe deixaram em cima da mesa.

PS 2: Desculpem por qualquer erro de ortografia. Estava ansiosa para postar!



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Capítulo 6: SONHOS VERDES.

 Era como se estivesse caindo há anos.

“Voe”, sussurrou uma voz na escuridão, mas ele não sabia voar e, portanto, tudo o que podia fazer era cair.

O chão estava tão longe que quase não conseguia distingui-lo através das névoas cinzentas que turbilhonavam à sua volta, mas podia sentir que caía muito depressa, e sabia o que o esperava lá embaixo.

— Vou lhe ensinar a voar, pequeno.

— Não posso voar - disse ele. - Não posso, não posso...

— Como sabe? Alguma vez já tentou?

A voz era aguda e fraca. Ele olhou em volta para ver de onde vinha. Um corvo com três olhos, descia com ele, em espiral, longe de seu alcance, seguindo-o na queda.

— É mesmo um corvo? – Ele perguntou.

— Está mesmo caindo? - Retorquiu o corvo.

— É só um sonho - disse.

— Será? - Perguntou o corvo.

— Eu acordo quando atingir o chão - Ele respondeu à ave.

— Você morre quando atingir o chão - Disse o corvo.

Ele estava caindo mais depressa do que nunca. As névoas cinzentas uivavam ao seu redor enquanto mergulhava para a terra. Agora, já dava para distinguir montanhas, com picos brancos de neve, e as fitas prateadas de rios em bosques escuros.

— O que está me fazendo? - Perguntou ao corvo, choroso.

— Estou lhe ensinando a voar, para que ela possa lhe ensinar a ver.

— Ela?

— Você sabe.

— Mas pensei que ela me ensinaria a voar? – Ele perguntou inseguro

— Voar é ver. Ver é voar. Posso lhe ensinar uma coisa, mas só ela pode lhe ensinar a outra – O corvo respondeu, sem fazer sentido algum.

— Mas não posso voar!

— Está voando agora mesmo.

— Estou caindo!

Todos os voos começam com uma queda, disse o corvo. Olhe para baixo.

— Tenho medo...

— OLHE PARA BAIXO!

E Bran olhou, e sentiu as entranhas se transformarem em água. O chão corria em sua direção. O mundo inteiro espalhava-se por baixo dele, uma tapeçaria de brancos, marrons e verdes. Via tudo com tanta clareza que, por um momento, se esqueceu de ter medo. Conseguia ver todo o reino e toda a gente que nele havia. Viu Meistre Luwin em sua varanda, estudando o céu através de um tubo de bronze polido e franzindo a testa enquanto tomava notas num livro. Viu no coração do bosque sagrado, o grande Represeiro branco pairando sobre a lagoa negra, com as folhas a bater sob um vento gelado. Quando sentiu que Bran o observava, devolveu-lhe um olhar sábio. Olhou para sul e viu uma ponte guardada por duas torres, com um festim de cadáveres dentro delas. Massacrados de forma selvagem, os convivas jaziam espalhados por cima de cadeiras viradas e mesas de montar estilhaçadas, estatelados em poças de sangue coagulando. Alguns tinham perdido membros, ou até a cabeça. Mãos cortadas seguravam taças ensanguentadas, colheres de pau, aves assadas, nacos de pão. Clarões de luzes coloridas iluminavam as paredes cobertas de sangue.  Olhou para leste e viu uma galé que se apressava através das águas da Dentada. Viu sua mãe, sentada, só, numa cabine, olhando para uma faca manchada de sangue pousada sobre a mesa à sua frente. Viu o irmão Robb, coroado de bronze e ferro, ele jurava em frente a um Represeiro, casando-se com um leão.  Levantava-se uma tempestade à frente dele, um vasto bramido escuro, mas, de alguma maneira, ele não conseguia vê-la. Viu o pai suplicar ao rei, com dor gravada no rosto. Viu Sansa horar até adormecer, à noite, e Arya guardar seus segredos bem fundo no coração. Viu Hermione, envolta em luz vermelha, arrancando uma lança dourada espetada no coração de um lobo. Seus cabelos ricocheteavam em seu rosto, manchado de lagrimas e dor. Letras de sangue maculavam sua carne macia. Finalmente olhou para o norte. Viu a Muralha brilhar como cristal azul, e o irmão bastardo, Jon, dormir sozinho numa cama fria. E olhou para lá da Muralha, para lá de florestas sem fim sob um manto de neve, para lá da costa gelada e dos grandes rios azuis esbranquiçados de gelo e das planícies mortas onde nada crescia nem vivia. Olhou para o norte, e para norte, e para norte, para a cortina de luz no fim do mundo, e então para lá dessa cortina. Olhou para as profundezas do coração do inverno, e era escuro lá, e muito frio. Por um momento, nada pode ver, mas sentia os pelos da nuca se arrepiarem e o medo secar sua boca. Um raio ribombou nos céus e desceu sobre a terra iluminando o que antes a escuridão escondia. Ele gritou apavorado, e o calor das lágrimas queimaram suas bochechas, em resposta, o raio voltou a retumbar, e ele tinha um rosto, que abriu a boca e trovejou, enchendo os céus com seu feroz rugido...

— Bran? Bran, você está bem? – A voz urgente de Robb flutuou até ele, arrancando-o abruptamente do sonho.

Não era raio que ressoava, era apenas a porta escancarada com violência, e não era a Escuridão das Terras de Sempre Inverno, era apenas a penumbra de seu quarto.

Bran estava deitado na cama, tremendo como uma folha verde no meio de uma tempestade.  O suor grudava a camisa de dormir em sua pele gelada. Seu corpo estava entorpecido de sono e terror.

Ele tentou responder ao irmão, mas não encontrou a voz. Bran ouviu passos adentrarem no quarto, e os sons de velas sendo acendidas. Uns instantes depois, alguns pontinhos de claridade jogaram o ambiente em uma meia luz.

Robb estava de pé, junto a sua cama, ele procurava intrusos no quarto. Seus cabelos estavam bagunçados, mas seus cachos não estavam marcados pelo uso de nenhuma coroa, apenas pelo travesseiro.

 - Mais um pesadelo? - Ele perguntou com gentileza, se sentando na cama.

Bran só conseguiu assentir, ainda respirando pesadamente.

Robb acariciou seus cabelos, mas Bran se esquivou do contato antes que o irmão pudesse perceber as lagrimas que manchavam seu rosto.  

O irmão pareceu entender e se afastou. Os dois ficaram em silêncio por um momento.

— Às vezes eu também tenho medo – Robb revelou para a semiescuridão. Sua voz saiu num sussurro rouco – Tudo bem ter medo. Você lembra o que o nosso pai diz: é preciso conhecer o medo...

— Para ser verdadeiramente corajoso – Bran completou o ditado do pai, mesmo não compreendendo seu significado.

— Os pesadelos vão passar – Robb afirmou, fazendo menção de se levantar, mas Bran o segurou pelo pulso.

— Não são pesadelos. São outra coisa – Bran sussurrou, desejando saber falar tão bem quanto Hermione ou Meistre Luwin, para explicar ao irmão.

Cada pedacinho dele, tinha certeza de que esses sonhos eram diferentes de qualquer coisa que ele tivera antes... de cair da Torre.

Antes seus sonhos eram cinzentos e bobos. Sonhos de brincar, de correr e escalar, sonhos de comer torta de maças e duelar com dragões e gigantes, sonhos que faziam algum sentido.

Mas estes eram diferentes... ele não os entendia. Eram coloridos e vividos como a vida. Davam muito medo, um medo que o deixava paralisado... sem ar.

— Eu sonho com coisas estranhas que parecem reais. – Bran tentou explicar.

Robb suspirou exasperado, essa não era a primeira vez que Bran acordava no meio da noite gritando, e nem era a primeira conversa que eles tinham a esse respeito.

— Com que tipo de coisas você sonhou dessa vez? – Robb perguntou pacientemente, apertando a mão de Bran para encorajá-lo.

— Coisas que não fazem sentido. Pessoas que nunca vi. Eu... não sei explicar – Bran estava tremulo – Havia um corvo, e ele tinha três olhos, ele me dizia para voar...

— Essa história novamente, Bran? – Robb o cortou, perdendo, por fim, a paciência. – Não existe isso de corvo com três olhos, você sabe disso.

— Ele existe. Existe sim. – Bran teimou, amuado.

Robb se levantou da cama, pronto para ir se deitar.

— Espere, Robb. Não vá – Bran pediu, atemorizado.

Robb se virou para ele com uma expressão preocupada.

— Você já está muito grande para esse tipo de comportamento. Tem que crescer, Bran, e rápido, já não temos mais tempo.  – Robb suspirou cansado - O dia foi longo e amanhã...

— Quando os exércitos do Norte marcharem... – Bran o cortou. Precisava chamar a atenção do irmão de algum jeito.

Robb o olhou surpreso com o comportamento pouco típico do irmão mais novo.

— Como sabe que vamos marchar? – Ele perguntou, com a testa franzida.

— Sei que algo ruim está acontecendo. Sei que tem a ver com o pai. Você não me conta, mas sei que mandou emissários convocando todos os Senhores do Norte para virem a Winterfell. – Bran falou, orgulhoso de si mesmo, ao notar que a falta de negativa do seu irmão, sugeria que ele tinha compreendido corretamente as conversas sussurradas e as muitas cartas enviadas e recebidas.

— Tudo bem, Bran. Se quero que você se comporte como um homenzinho, preciso te tratar como um – Robb retrocedeu para junto da cama – Convoquei os vassalos do pai para um Conselho, mas não iremos marchar.

Robb mentia, e não era muito bom nisso. Bran insistiu, teimosamente:

— Quando marchar para o Sul, deve levar Hermione com você – Quando terminou de falar, Bran ficou paralisado. Ele dissera aqui? Certamente que sua boca formou essas palavras, seus lábios de mexeram e a voz que reverberou no silêncio do quarto, era a sua, mas não era isso que ele pretendia dizer. Nem passou perto, ainda que o rosto de Hermione, permanecesse firmemente em sua mente, como se ela estivesse no quarto com eles.

Bran se sentiu esquisito, como se olhasse seus aposentos, Robb e ele mesmo, do alto e não dali, onde estava, deitado entre os cobertores quentes. No entanto, assim que as palavras saíram de sua boca, soube que era o mais importante aviso que seu irmão receberia de qualquer pessoa no mundo. Soube que o que dizia era o certo.

Depois de um minuto inteiro de silêncio, Robb soltou uma gargalhada bem-humorada.  

— E por acaso Lady Hermione é uma habilidosa espadachim que eu não conheço? Estava ela escondendo de mim seu verdadeiro dom na arte da guerra?  – Robb brincou.

— Você tem que levá-la – Bran ignorou o tom do irmão e permaneceu muito sério, ainda sentindo aquela sensação estranha de não pertencer ao seu próprio corpo.

Algo na expressão dele fez o sorriso de Robb se apagar, como uma vela sobrada pelo vento.

— Pelos Deuses, Bran. Hermione é uma Lady. O campo de batalha não é lugar para uma garota como ela. – Robb voltou ao seu tom exasperado.

Bran se sentou na cama, apertando com força os cobertores entre as mãos trêmulas, com a lembrança do sonho, secando sua boca.

— Ela não é uma garota. Não como Sansa ou Arya. Hermione é diferente.

— Como ela é diferente? – Robb perguntou, perturbado.

— Ela lutou contra o homem que tentou me matar, a Velha Ama me contou. – Bran argumentou – Sansa não faria isso, ou Arya. Elas só ficariam lá, gritando e chorando.

— Tudo bem – Robb teve que concordar, e Bran quase sorriu em vitória... quase. - Mas ela ficou abalada com o que aconteceu na floresta, aquele dia.

Robb lembrou-o, em tom de preocupação. E era verdade. Hermione passara a primeira semana depois do incidente na Mata dos Lobos, escondida de todos, abatida e mais pálida do que o normal. O Meistre teve que obrigá-la a comer, depois de vários dias em que ela se negava a participar das refeições.

— Mas agora ela já está bem novamente – Bran falou, sentindo o desespero tomar conta dele. Precisava fazer Robb compreender.

— Você não precisa se preocupar, Bran. Aconteça o que acontecer, Hermione, Rickon e você ficaram em segurança, prometo – Robb falou, enquanto começava a apagar as velas, deixando o quarto na escuridão da noite.

— Por favor, Robb – Bran insistiu com a voz embargada pelo choro novamente, tomado de um temor incontrolável, de um medo sufocante. – Você nunca me ouve. Diz que vai me tratar como gente grande, mas me ignora. Não sou criança, não sou! Sei que ela deve ir com você. Isso é importante.

Porque era importante? Bran não sabia. Tinha medo de descobrir, contudo, tinha certeza que Robb precisava manter Hermione consigo, era uma verdade tão grande quanto a que o sol se punha no Oeste. 

Robb se aproximou e beijou sua testa, dessa vez, Bran não se afastou, permitindo que o irmão percebesse as lagrimas que voltaram a cair. Robb congelou no lugar.

— Porque está chorando? – Ele perguntou, temeroso.

Bran estava assustado demais para esconder o pranto. Tinha tudo a ver com o estranho sonho, com Robb e aquela coroa, com todo o sangue derramado, os cadáveres, e a Escuridão das Terras de Sempre Inverno.

Robb suspirou resignado.

— Supondo que os exércitos do Norte marchem. E não estou dizendo que iram, mas, apenas supondo. Hermione não estaria segura em meio a uma guerra, Bran, num acampamento de soldados. Ela poderia se machucar. Você não quer que ela se machuque, quer? – Robb perguntou, com ternura.

Não, Bran não queria que ela se machucasse. Ele não gostava muito de garotas, porque, bem?... Eram garotas. Todavia, gostava de Hermione, muito.

— Se ela não for, você é que se machucará – Bran respondeu, e novamente, foi sua voz que saiu de sua garganta, mas não era ele quem falava e, mesmo assim, sabia que era a verdade. Bran voltou a estremecer.

Robb pairou acima dele. Ficou em silêncio na escuridão do quarto por um momento. Bran se perguntou se finalmente o convencera.  

— Por que diz isso? – O irmão lhe perguntou, num sussurro tenso.

— Se eu contasse, não acreditaria – Bran sabia que se voltasse a falar do sonho poria tudo a perder.

— Você apenas teve um sonho ruim – Robb falou como se tentasse convencer a si mesmo, de suas palavras – Se sentira diferente amanhã. Ira querer ficar com ela somente para si. Eu bem sei que você adora receber os beijos e abraças dela. Até eu os quero. -

Robb confessou, com a voz sumida. – Agora vá dormir. Feche os olhos e pense em coisas boas e verá que os pesadelos não vão retornar.

Robb saiu do quarto depois disso, e Bran suspirou insatisfeito. Queria que o irmão fosse capaz de dizer, com sinceridade, que tudo ficaria bem. No entanto, sabia que era impossível.

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Carregando um grande cesto de roupas, Yve, adentrou no quarto de Hermione sem cerimônias. A criada era uma Senhora de aparência descarnada, com um coração generoso e uma personalidade barulhenta. Ela nutria um carinho especial pela Bruxa, desde o momento em que a “recolhera” do pátio, no dia da chegada de Hermione a Winterfell.

— Bom dia, Yve – Hermione a cumprimentou, enquanto lutava para fazer um laço com a teimosa fita do vestido de lã cinza, que escolhera para usar essa manhã.   

— Bom dia – Yve respondeu, largando o cesto de roupas no chão e afastando as mãos atrapalhadas de Hermione, para que ela mesma fizesse o laço. Quando terminou, Yve olhou-a avaliativamente e suspirou desgostosa.

— Lorde Eddard lhe deu tantos vestidos bonitos, porque não põem outro? Algo mais colorido e enfeitado. Esse é muito simples. – A Senhora opinou.

— Eu gosto dele. É confortável e não é feio. – Hermione defendeu sua escolha, alisando a frente do vestido de mangas longas e gola alta, que não era muito diferente da vestimenta das demais mulheres que trabalhavam no Castelo.

Yve se afastou, lançando de tempos em tempo, olhares furtivos de puro descontentamento em direção de Hermione.

— Milady, deve se apresentar no pátio interno dentro de alguns instantes - A Senhora avisou. Um sorriso enigmático surgiu em seu rosto.  

— Por quê?

— Porque Lorde Stark mandou, hora essa – Yve a repreendeu, como se a pergunta fosse absurda.  

Hermione deu de ombros, aceitando que a obstinada Yve não lhe contaria nada.

— Quando é que irá me chamar apenas de Hermione, como já pedi um milhão de vezes? -  A bruxa mudou de assunto.

Yve a ignorou, enquanto trocava os lençóis.

Hermione se adiantou para ajudar a levantar o pesado colchão de penas. A jovem resistiu à tentação de rolar os olhos para o teto, quando Yve repediu o ritual de levantar uma sobrancelha interrogativamente em sua direção.

— Milady, deve deixar o serviço de Yve para Yve, se não Lorde Stark vai mandar Yve embora e colocar Milady para arrumar as camas – Ela ralhou, mas quando terminou de falar, jogou para Hermione a ponta do lençol limpo, por sobre a cama – Milady, precisa se por bem bonita.

— Por qual motivo? – Hermione colocou as mãos na cintura, desconfiada.  

— Porque sim, hora essa!  - Yve a censurou novamente – Lorde Stark está recebendo muitos outros Lordes. O Castelo está lotado deles. Não seria bom que vissem a Senhora nada menos do que como a Lady que é.

— Não vejo a importância. – Hermione ponderou, voltando a tarefa de ajudá-la a arrumar a cama. 

— A Senhora parece Lady Arya – reclamou – Tem que se pôr bonita, para que os Lordes do Norte respeitam a futura Lady Stark.

Hermione suspirou resignada. Essa era uma conversa recorrente entre as duas. Yve vinha trocar os lenções uma vez por semana, nessa ocasião, ela desfazia a cama e reclamava por Hermione ajudar, enquanto punha os lençóis limpos nas mãos da Bruxa. Em seguida, oferecia casamento à Hermione, sempre com Robb e ninguém mais.

— Não sei de onde tirou essa ideia – Hermione contrapôs, fingindo estar brava – Lorde Stark não tem nenhum interesse em mim.

— E por que não teria, minha criança. – Yve sorriu docemente para ela – Milady é uma moça tão bonita e bem-educada. Nunca vi melhor.

Hermione bufou em descrença.

— Não tenho interesse em casamento. – Ela provocou. 

Yve lhe lançou um olhar horrorizado.

— Milady não deveria dispensar um Lorde. Especialmente quando um tão bom quanto Robb, está à disposição – A Senhora a aconselhou, sabiamente - As moças não podem se dar ao luxo de dispensar um casamento adequado, ainda mais quando o noivo é um jovem, forte e bonitão como meu menino.

Tendo ajudado a criar o primogênito Stark, Yve sempre se referia a ele como “meu menino”. A Senhora suspirou sonhadora, colocando as roupas sujas no cesto.

— Eu tive que me casar com um homem muito mais velho. Não era uma moça bonita e ainda por cima, tão pobre quanto se é possível ser. Não tinha muito o que escolher. Não estou reclamando, eu gostava do meu Sam. Ele era bom para mim, mesmo quando não pude lhe dar nenhum filho. Mas ele era barrigudo.

Yve lhe lançou um olhar travesso e saiu do quarto cantarolando animadamente, talvez, Hermione conjecturou, pensando nos abdomens jovens e definidos, diariamente expostos no pátio de treinamento.

Ela já tinha entendido, há algum tempo, que para a velha Senhora, falar em casamento era uma espécie de passatempo, talvez, o único que ela tinha. Só por isso, a bruxa desistira de dissuadi-la da ideia. Às vezes, ela se pegava rindo, ao imaginar Yve no quarto de Robb oferecendo a ele, Hermione em casamento, enquanto trocava seus lençóis.

Por pura obstinação, ela ignorou o espelho em cima da cômoda, pensando que seu vestido de lã simples, teria que ser o bastante para Robb e seus vassalos, tanto quanto era para ela.

Hermione sorriu consigo mesma, divertida. A ideia de casamento com o Stark era, para dizer o mínimo, estapafúrdia.

Em primeiro lugar, o “noivo” em questão era totalmente indiferente à Hermione. Como não seria? Robb era um rapaz alto e belo, com traços másculos e fortes. As jovens solteiras, suspiravam por ele e as casadas, invejavam a solteirice, quando ele passava. Ele era culto e sofisticado, à sua própria maneira, e um Lorde.  – Por mais que ela repudiasse o sistema classista e excludente de Westeros - não podia ignorar que o status social dele, era abissalmente superior ao dela. 

E quem era Hermione Granger? Uma mentirosa? Uma trapaceira que se fazia passar por uma lady, quando, na verdade era uma bruxa? Uma jovem de aparência absolutamente comum, cabelos volumosos, uma atitude muito combativa, filha de pais dignos e honestos, mas não nobres, e ainda por cima, de outro tempo-lugar?

Yve incentivava essa sandice, apenas para se distrair do tédio da sua rotina, e o que seria melhor para esse fim, do que uma bela estória de amor, entre uma jovem simples e comum, perdida e sozinha, e o Lorde jovem e bonito que a resgatara?

Hermione não podia permitir que tais fantasias a influenciassem. Os Stark, e Robb apenas representava os desejos da família, estavam sendo generosos com ela, acolhendo-a e protegendo-a, porque eram descentes. Mas a verdade, era que Hermione era apenas uma obrigação para Robb, a estranha encontrada em um lago, por quem a família se responsabilizava, por piedade, caridade e nada mais. Esse pensamento fez seu estomago afundar.

“Mas quanta bobagem, Hermione. Você nem mesmo gosta dele desse jeito! ”, ela pensou, exasperada. Não, quando ela pensava em namoro, era outro ruivo que lhe vinha à mente. Ele não era tão inteligente, nem sabia usar uma espada ou era dono de um Castelo, mas era divertido, tranquilo e confiável. Nem belo demais e, nem feio, apenas normal – ou tão normal quanto um bruxo poderia ser— como ela mesma. 

Hermione suspirou, aborrecida consigo mesmo pelo tempo que gastara com ilusões românticas. “Tão século XIV!

Ela caminhou distraidamente até o pátio interno, onde Robb já a aguardava.

Seu noivo imaginário, segurava as rédeas de um garanhão de pelagem negra, lindíssimo. O cavalo era grande e forte, mas tinha um porte muito elegante e o pescoço levemente arredondado. Ela nunca tinha visto um animal tão majestoso quanto aquele.

— Bom dia, Milady – Robb a cumprimentou, assim que ela se aproximou. – Desculpe por pedir que viesse tão cedo, mas tenho outras obrigações com os vassalos, que tomarão todo o meu tempo hoje.

— Não se preocupe. Já estava acordada – Ela o tranquilizou, acariciando o cavalo de pelo macio.

Hermione não entendia muita coisa sobre os animais, em geral, e os cavalos em particular. Mas, a pedido de Robb, passara as últimas semanas tomando aulas de equitação, e já dominava o básico para cavalgar e controlar a montaria, sem envergonhar a si mesma.

Quanto mais segura ela se sentia sobre a sela, mais apreciava a liberdade e a adrenalina de cavalgar. Coisa que Hermione considerava um feito muito digno, para alguém que nunca praticava nenhum esporte que não fosse uma corridinha até a biblioteca.

Não que Hermione não tenha tentado ler sobre o assunto, mas descobrira, com um pouco de chateação, que era impossível aprender a montar com um livro nas mãos.

Apesar disso, ela estava sendo o motivo de orgulho de Hallis Mollen, seu professor. Ele adorava elogiar o progresso dela para todos os habitantes de Winterfell, constantemente.

— Gostou dele? – Robb perguntou, feliz ao observar a interação de Hermione com o cavalo, que parecia alegre com as carícias recebidas.   

— Ele é belíssimo – Ela respondeu, admirando como a luz do sol fazia a pelagem brilhar.

— É seu! – Robb anunciou entusiasmado, lhe entregando as rédeas.

— O que? – Hermione, totalmente surpresa, olhou para ele em choque.

— O novo plantel que compramos para Winterfell acabou de chegar. Encomendei um holsteiner, especialmente para Milady. Eles são animais fortes, elegantes e corajosos. Pensei que combinaria com Minha Senhora.

Ele sorriu, lançando um olhar esperançoso para ela.

— Eu nem sei o que dizer – Hermione apertou as rédeas nas mãos tremulas. – É um presente muito caro Robb, eu não sei se posso aceitar. Vocês já têm feito muito por mim.

— Por favor, aceite – Ele pediu, num sussurro rouco – Ficarei chateado se me fizer essa desfeita. 

Hermione devolveu o sorriso dele, balançando a cabeça em concordância. Ele suspirou aliviado.  

— Ele tem um nome? – Ela perguntou, sentindo Robb relaxar ao seu lado.

— A tarefa é sua. Mas, por favor, não de um nome de flor ou algo parecido. Ele é um garanhão e não um gatinho fofo, como o seu Bichento.

Hermione mostrou a língua para ele fazendo Robb gargalhar sonoramente diante da ousadia.

— Vou pensar em algo digno – Ela prometeu.

Um chamado ressoou pelo pátio. Estavam procurando por ele.

— Eu preciso ir. Devo me preparar para as infinitas reuniões de hoje. – Robb se afastou com uma expressão de pesar nublando seu sorriso.

— Oh! Tudo bem – Ela concordou, não fazendo nenhum esforço para esconder a tristeza com a partida dele. - Boa sorte.  

Subitamente, ela se lembrou que ainda não havia agradecido pelo presente.

— Robb – Hermione chamou, pegando a mão dele e o puxando levemente para detê-lo.

Robb retrocedeu, olhando para as mãos unidas, antes de levantar os olhos para ela, aturdido.

— Obrigada – Ela falou suavemente, se aproximando e depositando um beijo delicado na bochecha dele.

Robb ficou petrificado no lugar, adquirindo gradativamente um tom rosado.

A bruxa, tão acostumada a esses pequenos contatos com seus amigos, não de sua conta de que tinha feito algo digno de nota, mas o gesto instalou um silêncio que perdurou, alguns instantes, entre os dois, no qual, eles apenas compartilharam um olhar de constrangido contentamento.

Um novo chamado despertou Robb de seus pensamentos. Ele levou a mão dela aos lábios e depositou um pequeno beijo em retribuição, mantendo as mãos unidas, por mais um momento, antes de finalmente solta-la. Os olhos azuis dele se mantiveram presos nos castanhos dela até o último instante.

O coração de Hermione ribombou de felicidade. Ela chegara neste lugar como uma estranha, sem nada e ninguém. Agora ela tinha amigos, pessoas queridas e um cavalo que era só seu. Era pouca coisa, ela sabia, mas não podia evitar o sentimento de pertencimento que a inundou.

Esta era a primeira vez em semanas que ela voltava a sentir um pouquinho de felicidade, o que não acontecia desde o incidente na Mata dos Lobos.

Aquele dia ainda assombrava seus pensamentos, e era em parte por isso, que ela tinha concentrado toda a sua energia nas aulas de equitação, como se fosse um bote salva-vidas, no qual, ela se agarrava para não se afogar.

Hermione demorou vários dias para compreender o sentimento de angústia e raiva que ameaçava sufoca-la, levando-a as lagrimas, sempre que ela se lembrava do incidente. Descobrira que era pura impotência e frustração.

Ela tinha passado uma vida se apoiando e confiando inteiramente na magia, aprendendo a pensar nela, como infindável, infalível e eterna. Fora um choque perceber, que sem sua varinha, Hermione era tão frágil quanto qualquer outro ser humano seria.

Cometera o erro de se imaginar invencível, e sequer tinha pensado sobre si mesma desse modo, até se dar conta de que não era.

A súbita compreensão da sua própria vulnerabilidade, a deixara paralisada na Mata dos Lobos, impedindo-a de ajudar seu amigo, e a si mesma. Esse entendimento só contribuía para aumentar a decepção consigo mesma.  

Um mundo sem magia, era um mundo difícil de viver. Sem ela, Hermione não sabia como se defender. Não sabia usar uma espada, ou um arco e flecha, e só conseguia percorrer a distância que seus pés pudessem leva-la.

Era indignante que ela mal fosse capaz de se livrar de alguns homens famélicos, sozinha. Por isso, Hermione estava disposta a não permitir que situação semelhante se repetisse. Não tinha mais andado, um minuto sequer, sem sua varinha. Até dormia com ela debaixo do travesseiro, segurando firmemente o punho.

Uma comoção trouxe Hermione para fora de seus devaneios. Mestre Luwin, entrava no pátio interno, amparado por um guarda e a mulher selvagem, Osha; os meninos Stark fechavam o cortejo, aos prantos.

A prova de que Robb tratava qualquer forasteira com despretensiosa generosidade, era Osha. A mulher tinha participado da emboscada na Mara dos Lobos, e inclusive, brandira uma lança contra ele, mas, apesar disso, o rapaz decidira mantê-la viva, levando-a ao Castelo, primeiro como uma prisioneira e depois dando-lhe a oportunidade de trabalhar para a família.

A mulher, com não mais do que seus trinta anos, de semblante sofrido e duro, se revelara uma boa pessoa, que apenas agira mal, motivada pela fome e desespero, e Hermione suspeitava, também pelo medo.

Contudo, quando tratada com dignidade, Osha retribuía igualmente, sendo respeitosa, dedicada e leal.

Ela trabalhava nas cozinhas e recebia pagamento, um teto e comida, e conquistara o direito de circular pelo Castelo livremente.

Hermione amarrou as rédeas do garanhão no poste destinado a esse fim, e correu para junto do grupo que se aproximava para a entrada da fortaleza.

— O que houve, Meistre? – Hermione perguntou.

— Ele caiu das escadas enquanto alimentava os Corvos – Informou Osha.

— E as crianças? – Hermione pegou Rickon no colo, ele chorava de soluçar, mas não parecia machucado.

— Só se assustaram – Meistre falou com os dentes serrados de dor.

— Vamos leva-lo para a Torre dele, lá tem medicamentos se precisar – Pediu Hermione, que sabia disso, pois, ajudava ocasionalmente o velho Senhor, com o preparo dos remédios.

A subida foi lenta e dolorosa para o Meistre, que tinha um corte profundo no braço e mancava com a perna direita. Quando finalmente alcançaram o topo da torre, Hermione teve que por Rickon no chão, para afastar a bagunça de Luwin e abrir um caminho seguro, que facilitasse sua passagem.

O cômodo particular dele, estava atravancado de instáveis pilhas de livros que cobriam mesas e cadeira; fileiras de frascos rolhados; tocos de velas e poças de cera seca espalhados pela mobília; uma luneta, feita de bronze, apoiada num tripé perto da porta da varanda; cartas estelares que pendiam das paredes; mapas sombreados pelo chão; e papéis, penas e potes de tinta por toda a parte.

Osha, ajudou o Meistre a se sentar em uma das cadeiras que Hermione desocupou. A bruxa começou a reunir as pomadas e faixas limpas, seguindo as concisas instruções de Luwin.

— O Senhor vai morrer? – Bran perguntou assustado. 

— É claro que não. Ficarei bem, dentro em pouco – O Meistre tranquilizou o menino, bagunçando seus cabelos com a mão sadia, enquanto mantinha o braço ferido estendido sobre a mesa para que Hermione e Osha limpassem a ferida.

— Desculpa, Meistre – Pediu Bran, sussurrando – Estávamos brincados de fazer mágica nas escadas, não vimos o Senhor.

— Foi minha culpa – Disse Rickon choroso. Ele estava do outro lado da sala com medo de se aproximar.

— Venha cá – Pediu Luwin com carinho. O menino foi hesitante para perto dele. O Senhor segurou o rosto de Rickon perto do seu – Foi apenas um acidente, mas quero que me prometa que você e Bran não vão mais brincar nas escadas. É muito perigoso. Está bem?

— Está bem. – Prometeu o menino, mais aliviado. Ele se desvencilhou do Senhor e foi se sentar no chão, próximo do fogo que ardia na lareira, ao lado do irmão.

— Vocês gostam de magia é? – Osha perguntou, surpresa. – Eu conheço magia. Além da Muralha, a magia é livre.

Hermione quase deixou o frasco de unguento que aplicava no ferimento de Luwin, cair no chão. Era possível que houvesse magia para além da muralha?

Por tudo o que Hermione lera, a Grande Muralha de Gelo, era uma construção antiga de Westeros, erguida a mais de oito mil anos, com quinhentos quilômetros de cumprimento e duzentos metros de altura, feita de puro gelo, cortando o norte do país de um oceano a outro; protegida Patrulha da Noite. 

Do outro lado da Muralha, era um lugar frio e desolado, com nada além de geleiras para cobrir a terra, onde viviam o Povo Livre, chamados de Selvagens pelos Senhores de Westeros, apenas porque, não aceitavam nenhuma autoridade política, que não aquela escolhida por eles.

Os Selvagens, e Osha era um deles, ainda viviam em tribos que muitas vezes brigavam entre si. Era comum que invadissem as terras ao sul da Muralha para saquear e sequestrar.

Por causa deles, os Senhores de Westeros mantinham uma ordem militar, conhecida como Patrulha da Noite. A Patrulha construiu, ao longo da muralha, vários Castelos e instalações para treinar um exército, que deveria proteger os Sete Reinos do Povo Livre e do que mais houvesse do outro lado do muro de gelo.  

Contudo, nada do que Hermione lera sobre o assunto, indicava qualquer existência de magia nas terras sempre geladas do Norte.

Com o coração palpitando na boca, Hermione fingiu estar concentrada no curativo do Meistre, enquanto ficava muito quieta ouvindo o que Osha tinha a dizer.

— Gostaria que todas essas histórias de magia pudessem ser reais. Então um feitiço curaria meu braço com menos dor – Luwin se remexeu com desagrado na poltrona, e lançou um olhar de reprimenda para Hermione, como se fosse culpa dela, que as crianças gostassem tanto do assunto.

“Bem, talvez fosse mesmo” ela pensou, lembrando das estórias sobre Hogwart que ela contava todas as noites, aos meninos.

Hermione terminou de enfaixar o braço ferido do Senhor, sem se atrever a levantar os olhos para ele, subitamente muito consciente do contato quente da madeira de sua varinha, contra seu antebraço direito. 

— Deste lado da Muralha, a magia está morta, isso eu sei – Osha voltou ao assunto, falando com convicção – Mas do outro lado, do lugar de onde venho, a magia ainda existe viva do que nunca.

As mãos de Hermione tremeram dificultando a tarefa de arrolhar os frascos de unguentos usados no ferimento. Ela sentia como se toda a Winterfell estive olhando para ela, embora soubesse conscientemente, que ninguém a observava.

— Conte sobre o que me disse outro dia, Osha – Pediu Bran, com os olhos brilhando de expectativa. – Conte sobre os Caminhantes Brancos.

Osha se adiantou para cativar a plateia. Disfarçadamente, Hermione passou a organizar a escrivaninha do Meistre, separando penas de pergaminhos e outros objetos, mas com a atenção presa em cada palavra da mulher.

— Há milhares e milhares de anos, caiu um inverno que era mais frio, duro e infinito que qualquer outro na memória do homem. Chegou uma noite que durou uma geração, e tanto tremeram e morreram os reis em seus castelos como os criadores de porcos em suas cabanas. As mulheres preferiram asfixiar os filhos a vê-los passar fome, e choraram, e sentiram as lágrimas congelarem em seu rosto. Nessa escuridão, os Outros, também conhecidos por Caminhantes Brancos, vieram pela primeira vez. Eram coisas frias, mortas, que odiavam o ferro, o fogo, o toque do sol e todas as criaturas com sangue quente nas veias. Arrasaram fortificações, cidades e reinos, derrubaram heróis e exércitos às centenas, montando seus pálidos cavalos mortos e liderando hostes de assassinados. Nem todas as espadas dos homens juntas logravam deter seu avanço, e até donzelas e bebês de peito neles não encontravam piedade. Perseguiam as donzelas através de florestas congeladas e alimentavam seus servos mortos com a carne de crianças. Esses foram os tempos antes da chegada dos Ândalos, e os reinos desses tempos eram os reinos dos Primeiros Homens, que tinham tomado essas terras dos Filhos da Floresta. Mas aqui e ali, nos bosques mais densos, os Filhos ainda viviam em suas cidades de madeira e colinas ocas, e os rostos das árvores mantinham-se vigilantes. E assim, enquanto o frio e a morte enchiam à terra, o último herói decidiu procurar os Filhos da Floresta, na esperança de que sua antiga magia pudesse reconquistar aquilo que os exércitos dos homens tinham perdido parta os Caminhantes Brancos.  Ele partiu para as terras mortas com uma espada, um cavalo, um cão e uma dúzia de companheiros. Procurou durante anos, até perder a esperança de chegar algum dia a encontrar os Filhos da Floresta em suas cidades secretas. Um por um, os amigos morreram, e também o cavalo, e por fim até o cão, e sua espada congelou tanto que a lâmina se quebrou quando tentou usá-la. E os Outros cheiraram nele o sangue quente e seguiram seu rastro em silêncio, e quando este último soldado, estava prestes a ser morto pelos Caminhantes Brancos, os Filhos da Floresta surgiram e o salvaram com sua magia. E então, o último soltado, o Último Herói, conseguiu forjar uma aliança entre os homens e os Filhos, esses seres mágicos que já habitavam essas terras antes que fosse chamada de Westeros.  Juntos, os Filhos e os Homens lutaram na grande Batalha da Aurora e conseguiram a vitória sobre os Outros, forçando-os a recuar para além das Terras de Sempre Inverno.

O silêncio reverberou pelo aposento. Os meninos tinham os olhos arregalados de medo e as boquinhas abertas. Luwin, por outro lado, estava contrariado.

— Mas o Meistre diz que os Filhos da Floresta estão agora todos mortos. – Questionou Bran – Como vamos deter os Caminhantes Brancos se eles vierem novamente?

— Aqui estão - disse Osha. - A norte da Muralha as coisas são diferentes. Foi para lá que os Filhos foram, tal como os gigantes e as outras raças antigas. E os Outros que nunca morreram de verdade.

Meistre Luwin suspirou.

— Mulher, por favor, devia estar morta ou encarcerada. Os Stark a trataram com mais bondade do que merece. Não é bom retribuir-lhes a simpatia enchendo a cabeça dos rapazes de besteiras.

— Não são besteiras Meistre – Osha se defendeu, ofendida.

— São contos, lendas e nada mais. – O Senhor falou, exasperado. 

— Mas Meistre, gosto dessas histórias – Bran protestou.

— Eu também – Rickon cruzou os braços e fez beicinho.

— Depois, à noite, não dormem com pesadelos de corvos de três olhos e coisas sangrentas. – Luwin repreendeu, de mau-humor.

— Os Filhos poderiam dizer uma coisa ou duas sobre os sonhos verdes. São esses os sonhos que você tem, rapaz? – Osha perguntou a Bran.

 - Eles são? – Bran perguntou a Luwin com um olhar confuso no rosto.

O Meistre levantou as mãos para o alto e suspirou desgostoso, lançando um feio olhar na direção da mulher.

— Agora chega! Obrigada Osha, você fez um bom trabalho com o ferimento. Agora pode voltar para seus afazeres. E vocês meninos, hora de se aprontar para o jantar. Seu irmão está recebendo os Karstark hoje, e quer vocês no Grande Salão. Os Três – ele concluiu, com aceno em direção de Hermione.

O Meistre dispensando-os da sala sem cerimônias.  

Hermione se dirigiu aos seus aposentos, com o estomago dando voltas alucinadas, com tudo o que ouvira.

Osha não tinha dado uma descrição muito precisa sobre os tais Filhos da Floresta, nada que lhe desse a mínima indicação de que poderia se tratar de um povo magico.

Contudo, se Hermione pensasse sobre sua própria sociedade do ponto de vista de um trouxa, era fácil entender as imprecisões. Tudo o que os trouxas conheciam sobre magia, era um amontoado de bobagens das mais variadas, e poucas delas, para não dizer nenhuma, chegavam perto da verdade. Era possível que o mesmo acontecesse com esses Filhos? Que fossem bruxos escondendo a magia com lendas e estória horripilantes? Onde estaria a verdade nisso tudo?

Perguntas sem respostas, era tudo o que Hermione tinha para recomeçar suas tentativas de voltar para casa, mas a esperança estava até mesmo nas pequenas possibilidades, afinal.

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Yve tinha razão! Em uma coisa... pelo menos. Winterfell estava lotada de Lordes Nortenhos, seus filhos e seus soldados. Eles enchiam o Grande Salão muito mais do que a visita Real tinha conseguido, há messes atrás, e os campos para além das muralhas do castelo, estavam cobertos por tendas das mais várias formas e cores.

Doze mil homens, ou tão perto disso que não fazia diferença, armados e organizados para marchar em direção ao Sul, estavam prontos para se juntar a Lorde Eddard que enfrentava dificuldades na Capital.

Isso era tudo o que Hermione sabia. Tanto Robb, quanto Meistre Luwin, passavam todas as horas do dia, em intermináveis reuniões que se arrastavam madrugada adentro, com os Lordes que chegavam a Winterfell. Ninguém parecia pensar que Hermione devia saber de alguma coisa.

Ela se sentia deixada de lado e inútil. Tinha se imaginado amiga de Robb, pelo menos o suficiente para oferecer apoio, se nada mais. Contudo, se enganara. Ele não precisa dela por perto.

Mesmo assim, era impossível evitar o sentimento de tristeza que a inundava, com a eminente partida dele, especialmente agora que, Lorde Karstark, o último senhor a responder a convocação, finalmente chegara com seus soldados à Winterfell.

Hermione seria deixada para trás, com as crianças, os velhos e as mulheres indefessas. Isso despertava nela uma sensação absolutamente nova de impotência. Não estava acostumada a sentar e esperar; não agir; não ir ao encontro do perigo. A perspectiva a desanimava.

Ela deu o seu melhor para disfarçar a mortificação que sentia com o rumo dos acontecimentos, quando adentrou no Grande Salão, preparado para realizar a última refeição da família Stark, antes da partida de Robb.

O recinto estava iluminado por muitas velas e tochas. A meia luz, projetava sombras fantasmagóricas nas paredes de pedra. A atmosfera de imprevisibilidade enchia o ar, e apesar da grande quantidade de pessoas reunidas, as conversas eram sussurradas, os modos contidos e até os criados, baixavam tigelas e jarros nas mesas, em silêncio. O clima era glacial ali dentro.

Robb apareceu diante dela. Ele estava pálido e mais sério do que o normal, seu maxilar se apertava duramente. Todavia, ele estava lindamente vestido, com as corres cinza Stark, e os cabelos castanhos avermelhados em contraste, como o único toque de cor. Ele usava um grosso manto com acabamento em pele de animal acastanhada, adornando seus ombros largos e sua pesada estada pendia da cintura confortavelmente. 

— Boa noite, minha Senhora – Ele a saudou distante.

Ela podia entender isso. Fora sua convocação que trouxera o exército nortenho a sua porta, o tornando o único responsável por colocar tantos homens em risco.

Hermione descansou a mão no braço forte que ele lhe oferecia para se apoiar. Ela já estava tão habituada a esse costume, que já lhe era natural.

— Permita-me conduzi-la até o lugar que reservei para a Senhora – Ele pediu, com um formalismo que ela julgara estar superado entre eles. Se enganara novamente.

Ela se deixou conduzir por entre as muitas mesas e convidados que abarrotavam o salão, refletindo sobre o momento em que cometera o erro de se imaginar alguma coisa mais do que uma estranha para essas pessoas.

A felicidade que sentira a tarde, com o presente que ganhara e depois com a informação tão valiosa sobre magia além da Muralha, foi se esvaindo aos poucos. 

— Já escolheu um nome para o cavalo? – Robb perguntou, distraidamente.

— Ainda não tenho certeza. Gosto bastante de floquinho – Hermione o provocou, desejando ver uma última vez, o belo sorriso que ele tinha.

Robb fez um som de divertimento que saiu aranhado de sua garganta, mas seus lábios não se abriram.

— Quem sabe pinguinho? – Ela continuou.

— E tem que ser no diminutivo? – Ele balançou a cabeça em descrença.

— Você gosta de biscoitinho?

— Detesto. É o pior nome possível – Ele sorriu fracamente, relaxando um pouco.

— Então vai ser biscoitinho. – Hermione anunciou, com energia.

— Pobre garanhão – Ele suspirou pesaroso, enquanto puxava uma cadeira para Hermione se sentar.

Foi só neste momento, que ela notou que Robb a conduzira para a mesa principal, no estrado elevado. Robb lhe destinara um assento ao lado de Bran, que se sentava a direita dele mesmo. Era um lugar de honra, ocupado apenas mais próximos da família.

Essa seria a primeira vez que ela se sentaria na mesa principal, desde que os vassalos dos Stark começaram a chegar em Winterfell.

— Não sei se devo – Hermione sussurrou para ele, correndo os olhos para os demais Lordes, que observavam cada gesto de Robb como falcões vigiando a presa, a espera de que ele cometesse um erro para atacar.  

— Milady é família. Hoje quero toda a família sentada ao meu lado – Robb proclamou em tom de quem não admitira negativa.

Ela não tinha nenhuma para isso, exceto que ela sabia, que as palavras dele eram apenas cortesias. Hermione se sentou, ganhando a companhia de Theon Greyjoy que ocupou o outro assento ao seu lado. Mestre Luwin tomou o assento do lado esquerdo de Robb, e assim estavam todos estavam reunidos, exceto por Rickon, que sendo ainda muito pequeno não participaria dessa reunião.

E pele dela formigava diante do escrutínio a que fora submetida pelos muitos Lordes que não disfarçavam sua desconfiança e curiosidade ao encara-la descaradamente. Contudo, nenhum deles foi corajoso o bastante para questionar seu suserano, a respeito da presença de Hermione na mesa principal.

— Está belíssima essa noite, Milady – Theon falou, chamando sua atenção.

Ele sustentava um sorriso malicioso que causava calafrios na espinha dela.

— Obrigada – Hermione agradeceu indiferente, enquanto lutava para não deixar transparecer o desconforto que sentia diante daquele sorriso.

Dois assentos depois, Robb bateu sua taça com força sobre a mesa. Hermione se alarmou com a expressão sombria que repentinamente nublou as feições de Robb. Ele ignorou o olhar interrogativo que Hermione lhe lançou.

A refeição foi servida. Este seria um jantar melhor do que o habitual, pois, era um o banquete de despedida. A mesa foi posta com carne de javali e cervo, peixe e pato com mel, batatas, nabos e beterrabas cozidas na manteiga, mais de um tipo de pão, ervilhas, cereais e caldos variados, peras em calda, bolos e pudins para a sobremesa. E bebida. Muita bebida.

Hermione nunca tomava da forte e espessa cerveja, ou do vinho que muitas vezes era misturado com água. Entretanto, essa noite, deixou que um criado lhe enchesse uma taça de vinho. A bebida estava sendo servida pura. Era rica e forte, fazendo Hermione sentir o corpo relaxar gradativamente, conforme beberica o vinho.

Robb passou o jantar dando atenção a todos os Lordes a sua volta. Ele ouvia elegantemente o que cada um tinha a dizer, antes de dar sua própria contribuição para as discussões.

Rapidamente, Robb havia se tornado um rapaz diferente daquele que ela conhecera.

Antes, ele sorria e gracejava com facilidade, passava o dia rodeado dos amigos e com seu treino de espadas, mas conforme as responsabilidades cresciam e as notícias do Sul chegavam, ele se tornava mais sóbrio e compenetrado, gastando muitas horas em reuniões e atendendo a todos os deveres exigidos de um suserano.  

Contudo, nem mesmo sua visível dedicação, tinha sido, no começo, o suficiente para convencer os vassalos de Lorde Eddard Stark, que eram homens tão duros e frios quanto o próprio Norte, de que Robb tinha competência para suceder ao pai, pelo menos, por enquanto.  

Durante as semanas que se seguiram, Robb fora testado de todas as maneiras possíveis pelos velhos Senhores.

Tanto Roose Bolton, frio e perigosamente contido, quanto o orgulhoso Robett Glover, exigiram a honra do comando da marcha, o primeiro de forma brusca, o segundo com um sorriso e um gracejo. A resoluta e grisalha Maege Mormont, vestida de cota de malha, disse abruptamente a Robb que ele tinha idade para ser seu neto e que não tinha nada que lhe dar ordens..., mas acontecia que tinha uma neta com a qual estava disposta a deixá-lo se casar. Lorde Cerwyn, um homem de falas mansas, tinha até mesmo trazido consigo a filha, uma donzela desajeitada de trinta anos, que partiria com o pai, para, segundo ele, servi-lhe de camareira, o que Theon dizia brincando, ser apenas uma desculpa para enfia-la na cama de Robb e obriga-lo ao casamento. O jovial Lorde Hornwood não tinha filhas, mas trouxe presentes, um dia um cavalo, no seguinte um quadril de veado, no outro um corno de caça com relevos de prata, e nada pediu em troca... nada exceto uma extensão de terra que fora tirada de seu avô, e direitos de caça para norte de uma certa serra, e licença para construir uma represa na Faca Branca, se agradasse ao senhor.

Robb respondia a todos com fria cortesia, e de alguma forma dobrava-os à sua vontade.

E quando Lorde Umber, cujos homens alcunhavam como Grande-Jon, quase tão alto quanto Hagrid e duas vezes mais largo, ameaçou levar suas forças para casa se fosse colocado atrás dos Hornwood ou dos Cerwyn na ordem de marcha, Robb disse-lhe que o fizesse, se assim desejasse.

— E quando resolvermos o assunto dos Lannister - prometera, coçando Vento Cinzento atrás da orelha - marcharemos outra vez para o norte e os arrancaremos da sua fortaleza e os enforcaremos por quebra dos votos.

Praguejando, Grande-Jon atirara um jarro de cerveja ao fogo e berrara que Robb era tão verde que devia mijar erva.

Quando Hallis Mollen se aproximara para refreá-lo, atirara-o ao chão, virara uma mesa e desembainhara uma espada. Por toda a sala, seus filhos, irmãos e soldados puseram-se em pé de um salto, puxando seu aço.

Mas Robb dissera apenas uma palavra em voz baixa. Um rosnado e um piscar de olhos depois, Lorde Umber deu por si estatelado de costas, com a espada girando no chão a um metro de distância e a mão pingando sangue no lugar de onde Vento Cinzento arrancara dois dedos.

— O Senhor meu pai me ensinou que empunhar o aço contra o seu suserano significa a morte - Robb dissera-, mas sem dúvida que o senhor queria apenas cortar-me a carne.

Grande-Jon lutara para se erguer, chupando os tocos vermelhos dos dedos..., mas então, espantosamente, o enorme homem soltou uma gargalhada.

— A vossa carne - o homem rugiu - é dura como um raio.

E de algum modo, depois daquilo, Grande-Jon transformara-se no braço direito de Robb, no seu campeão mais dedicado, dizendo sonoramente a todo mundo que o senhor rapaz era afinal um Stark, e que fariam melhor em dobrar o raio dos joelhos se não quisessem vê-los arrancados à dentada.

Todas essas coisas, Hermione sabia, apenas pelo que Meistre Luwin deixa escapar ocasionalmente.

Hermione pestanejou para fora de seus devaneios, prestando a atenção nas conversas da mesa.

— Corre um boato, de que Bran foi atacado por um assassino Lannister – Lady Mormont estava comentando com Robb.

A grisalha Sra. Maege, era a Lady da casa Mormont. Ela não tinha vindo a Winterfell, apenas para responder a convocação de seu Senhor, ela marcharia para o Sul, com sua filha Dacey, e todos os homens de que sua casa dispunha. As duas Mulheres eram as únicas que Hermione vira usando uma espada na cintura e cota de malha.

A mesa principal emudeceu para ouvir a resposta de Robb.

— Sim, Milady. Segundo informações que recebi, Tyrion Lannister foi o mandante. – Robb se remexeu desconfortável na cadeira – Minha mãe mantém a custódia do anão no Ninho da Águia, na casa de minha tia Lisa Arryn, que também suspeita que a morte de seu marido, a antiga mão do Rei, Jon Arryn, tenha o envolvimento dos Lannisters. 

Os Lordes ficaram em silêncio, por um momento, olhando de Robb para Bran. O menino estremeceu.

— Quando ouvi essa estória pela primeira vez, pensei que não passava de um boato absurdo - Lorde Grande-Jon Umber, rugiu espalhafatosamente – Principalmente porque diziam que uma moça magrela, lutou com o assassino e o subjugou.

Lorde Umber gargalhou sonoramente e continuou:

— Uma fábula que sou obrigado a desmentir para as mulheres de minha casa, antes que ponham em suas cabecinhas ocas, qualquer ideia absurda.

Foi a vez de Robb gargalhar, lançando um olhar divertido para Hermione. Bran protestou indigno, mas ninguém lhe deu atenção.

— Sinto muito em desaponta-lo Lorde Umber. – Robb falou, sorrindo de modo tranquilo, pela primeira vez na noite. – A história é inteiramente verdadeira. Deixe-me lhe apresentar a nossa heroína, Lady Hermione Granger.

Robb indicou Hermione com um gesto, sorrindo carinhosamente para ela.

Todos os olhos se voltaram para Hermione novamente, com expressões que iam da incredulidade a compreensão.

A bruxa se sentiu constrangida além da conta. Desejou ainda poder desaparecer debaixo de uma capa de invisibilidade.

— Um feito e tanto – Grande-Jon, finalmente se recuperou e levantou seu copo na direção de Hermione em um cumprimento. – Pela primeira vez um boato é inteiramente verdadeiro. 

— Como fez isso? – Perguntou Lorde Bolton, com seu tom de voz baixo e frio como gelo.

— Eu só consegui retardar o atacante. Foi Verão, o lobo de Bran, que parou o homem. Eu não fiz muita coisa. – Hermione deu de ombros, sentindo-se desconfortável por falar do homem brutalmente morto pelo lobo, de maneira tão banal.

— Salvou a vida de meu irmão e isso foi muita coisa para mim. – Robb falou, muito sério, lançando um olhar penetrante em sua direção.   

Quando todos terminaram de comer, os pratos foram retirados e os jarros de bebidas foram reabastecidos.

Robb escolheu esse momento para se levantar. Ele sustentava um olhar grave e resoluto. Não parecia o rapaz jovem que era, e sim um homem, já acostumado em se fazer ouvir.

Rapidamente o salão emudeceu e todas as atenções estavam nele.

—  Meus Senhores – A voz de Robb ressoou forte, chegando a todos os cantos do salão. -Agradeço a todos por responderem ao meu chamado tão prontamente. Gostaria que a convocação fosse para nos reunir em celebração, mas infelizmente não é esse o caso.  

Robb fez uma pausa deixando que suas últimas palavras preparassem o espirito de todos.

Hermione estremeceu com o clima de apreensão que crescia a sua volta.

— Meu pai, Lorde Eddard Stark, o suserano de todos vocês, está a mil léguas de distância de sua terra natal. Preso em uma masmorra Lannister.

Exceto para o Lordes, que já conheciam as notícias discutidas, a informação foi uma chocante surpresa para os demais e uma avalanche de urros, rompeu com o silêncio do salão.

Hermione ficou entorpecida. Não fazia ideia de que as coisas estivessem tão ruins. Muito além do ponto, de uma conciliação amistosa.

Bran apertou o braço de Hermione com força, chamando sua atenção. O menino tinha lagrimas nos olhos e uma expressão angustiada.

Hermione não sabia o que dizer, apenas passou um braço em volta dele, em uma tentativa de reconforta-lo. Ele se agarrou a ela com força.

Subitamente, um medo pegajoso acendeu em Hermione, fazendo seu coração disparar no peito.

Pacientemente, Robb esperou a comoção passar e continuou:

— Isso não é tudo. Homens nortenhos, bons homens. Nossos pais, filhos e irmãos, primos e tios, sogros e genros, que estavam na Capital, para servir a casa Stark, foram assassinados. Cinquenta bons homens, foram friamente mortos na sala do trono, diante e pelas ordens, do Rei Joffrey Baratheon.

Os murmúrios rebentaram pelo cômodo, os homens estavam aturdidos.

— Rei Joffrey?

— Como assim Rei?

— Quem é esse?

— E quanto a Robert?

— Que houve com o Rei Robert?

— Rei Robert Baratheon está morto.  Foi fatalmente ferido em uma caçada, por um javali. É o que dizem – Robb retornou às suas explicações, em tom de ceticismo - Seu filho, Joffrey, ocupa o Trono de Ferro. Partiu dele a ordem que matou nossos Nortenhos e aprisionou nosso suserano.

Mais rugidos indignados sobrepuseram-se a fala de Robb e ele, novamente, esperou que cada um dos homens terminasse de expressar sua ira antes de continuar:

— Já se luta nas terras do Rio. A família da minha mãe, a Casa Tully de Correrrio, está sob ataque Lannister. Tywin Lannister, pai da Rainha e de Jaime Lannister, avô de Joffrey Baratheon, marcha sobre Correrio, queimando e matando tudo por onde passam. Usam, como desculpa, uma suposta traição que meu pai teria cometido contra o Rei Joffrey, para tomar-lhe o poder.

— Mentira

— Absurdo

— Um ultraje

Os gritos de indignação, voltaram a reverberar pelo salão.

Bran começou a chorar, as lagrimas que antes ele tentava segurar rolavam pelo seu rosto copiosamente. Hermione deixou que ele se sentasse em seu colo, embalando-o protetoramente.

— Eu só posso agradecer pela lealdade que tais palavras representam, meus Senhores. Sabemos que tal acusação é uma vil mentira. Não era segredo para ninguém no Norte, que o meu pai sempre amou e respeitou o Rei Robert como a um irmão. Ele jamais conspiraria pelo Trono de Ferro, tendo a melhor gente e a melhor terra de Westeros para governar.   – Robb falou com paixão, sua voz subiu alguns tons. Ele prosseguiu:

— Tywin se aproveita da situação para expandir seu domínio. Com o neto no Trono de Ferro, ele pretende tomar a posse das Terras do Rio, e usa essa suposta traição de meu pai, para isso. Ele marcha em direção do Norte.

Robb fez uma nova pausa. Ele tomou um gole da sua taça de vinho. Os nós de seus dedos estavam brancos, tamanha era a força com que ele segurava o cálice. Hermione notou como ele estava ficando gradativamente pálido sobre a luz bruxuleante das velas.

— Rei Joffrey, convoca minha presença em Porto Real para lhe jurar fidelidade.  – Robb falou novamente, e dessa vez sua voz soou um pouco mais alta e mais forte -  Ele exige que o Norte lhe dobre os joelhos, e continue lhe mandando tributos, enquanto subjuga minhas irmãs e mantém meu pai preso em uma masmorra.

Gritos indignos fizeram o salão estremecer:  

— Absurdo.

— Jamais.

— O Norte não se dobra.

— Jamais.  

— Senhores. Senhores... – Robb pediu silêncio – Vou responder a convocação!

— Não meu Senhor.

— Não deve.

— Não faça isso.

— Sim. Vou! – Robb proclamou, seu tom saiu mais rico e exaltado, ecoando ainda mais alto – Mas, não sozinho. Estarei na companhia de minha armadura, de minha lança e de minha espada, e com a força de todo o Norte.

O salão rebentou em gritos de concordância.

— Vamos juntos enterrar uma lança no coração dos leões. Vamos dobrar os joelhos... os joelhos Lannister, até que eles estejam enterrados em sangue!

Urros explodiram, canecas foram batidas e aplausos encheram o ar, mas Hermione estremeceu.

— Convido a todos para beberem à nossa última noite em casa. Amanhã, partiremos com o primeiro clarear do dia. Vamos mostrar ao povo do Sul do que é feito um Nortenho.

O discurso de Robb mexeu com os ânimos do Salão. Hermione observou chocada, que ao contrário de estarem preocupados com a guerra iminente, os homens estavam extasiados, em polvorosos até.

Robb sentou novamente, tomando um grande gole de vinho. Ele fechou os olhos por um segundo, para retomar o controle, mas apenas Hermione percebeu que ele tremia.

Seu coração palpitou descompassado no peito, com um sentimento de mal agouro inundando cada partícula de seu ser.  Parecia que qualquer ideia de paz havia acabado em Westeros.


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