Questão de Sorte escrita por Hakiny


Capítulo 72
Uma Perspectiva Diferente




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— Daqui até Montis são cerca de 8 horas de caminhada, se acelerarmos os passos podemos diminuir isso para 6 ou talvez até 5…

— Ainda temos 12 horas não é? — Catherine tinha um semblante tranquilo e em seguida pôs um sorriso no rosto — Talvez devêssemos comemorar sua recuperação!

Ryu por outro lado a encarava a garota com uma mistura de desespero e incredulidade. Não conseguia entender em qual realidade paralela ela estava, para não compreender a gravidade da situação e principalmente o quanto eles estavam correndo contra o tempo com o Minus no seu encalço.

 — Cat, podemos fazer isso depois que você chegar ao santuário — Josh dizia com ternura — Ouvi dizer que antes do início oficial das aulas, as bruxas têm um pequeno período de folga.

Apesar das palavras de Josh terem tudo para serem aliviadoras, Catherine continuava inquieta.

— Como eu dizia… — Ryu sentia-se satisfeito com a cooperação de Josh para conter Catherine, mas não conseguia engolir a presença dele ali, pelo menos não como alguém confiável — A partir daqui — Ele apontava no mapa — O caminho segue por um vale onde estaremos 100% expostos e vulneráveis.

— São 7km seguidos nesse caminho estreito e depois mais 5km de campo aberto até chegarmos na área desmilitarizada — Josh acompanhava o raciocínio — A partir daqui podemos seguir sem preocupações.

— Não consigo contar com essa vantagem — Ryu estava pensativo — Da última vez que passamos por uma situação parecida, por pouco o Ryan não atravessou a fronteira para Vanitas. Se o Blanc estiver nessa empreitada, eu duvido muito que ele se importe com regras ou leis.

Enquanto os dois rapazes discutiam, Catherine estava pensativa.

— Por que a gente precisa passar por isso? — A bruxa se meteu na conversa — Talvez no desconhecido…

— Não é uma opção! — Josh a interrompeu — Você não tem ideia do quão terrível é aquele lugar.

A garota recuou um pouco assustada.

— Não que eu discorde da sua linha de raciocínio — Ryu continuava a encarar o mapa — Mas não entendo porque você está tão preocupado assim com o bem estar dela.

— O que? — Josh estava incrédulo — Eu é que não estou te entendendo! Somos ou não somos amigos?

— Me diga você — Ryu agora o encarava — Para início de conversa, você se aproximou de nós enquanto tentava assassinar a Catherine.

Os olhos de Josh se arregalaram e sua garganta ficou seca — Isso foi há muito tempo…

— Acho que não se trata de tempo e sim de ocasião — A voz de Ryu estava fria e ríspida — E você é do tipo que se adapta bem a novas necessidades.

Em silêncio, Josh apenas saiu da sala.

— Eu só queria compreender — A voz de Catherine estava séria enquanto ela encarava Ryu — Qual a sua motivação para estar agindo feito um idiota.

— O que? — Ryu havia sido pego de surpresa.

— Eu entendo que você acabou de acordar de um coma e muitas coisas aconteceram — A bruxa tinha um tom ríspido — Mas muitas coisas aconteceram por aqui também.

O guardião permaneceu em silêncio, pois naquele momento estava muito intimidado.

— Quando eu estava sozinha, assustada e perdida… O Josh estava lá por mim, mesmo quando nem você estava — A garota se aproximava de Ryu com determinação — Ele estava muito preocupado com você e até chorou escondido quando achou que você ia morrer!

— Mas Catherine… — O guardião estava receoso com suas palavras — Você não entende…

— Não mesmo — A bruxa suspirou — Ele sempre esteve lá quando precisávamos. Não seja ingrato, não vire as costas para ele agora.

— Acho que eu preciso ter uma séria conversa com ele — Ryu caminhou para fora da sala — E vou fazer isso agora.

— Eu não sei exatamente do que se trata o problema de vocês — Catherine sorriu gentilmente — Mas confio que você vai resolvê-lo da melhor maneira possível.

“EU NÃO!” Eveline berrava dentro da cabeça de Ryu “O que você está pensando em fazer? Você não pode revelar sobre aquilo, não sabe como ele reagirá!”

“Eu tenho minhas garantias.” Ryu também a respondia mentalmente.

“Que garantia você pode ter de que, ao saber o que a Catherine pode fazer, ele não surte e tente matá-la de novo? Ryu, não nos encaminhe para o mesmo fim!”

“Não estou me garantindo nas reações dele e sim no local em que nos encontramos: bem debaixo do teto do Trevor”

“É muita prepotência sua acreditar que o Lorde das Trevas se importa com o bem estar de uma bruxa aleatória”

“É muita inocência sua acreditar que o Lorde das Trevas vai permitir que um caçador do Minus mate uma bruxa que ele escolheu acolher e ainda por cima, dentro de sua própria casa.”

Eveline ficou em silêncio por alguns segundos, ela simplesmente não esperava por aquela resposta e estava muito surpresa com o quanto ela fazia sentindo.

“Você é inconsequente, mas não é tão burro quanto eu pensei” A bruxa murmurou.

— Josh! — Ryu entrou no quarto em que o caçador se hospedava, sem nem ao menos bater — Precisamos conversar.

— Não me leve a mal — Josh continuava a retirar suas botas, atividade que estava fazendo antes da entrada repentina de Ryu em seu quarto — Mas conversar com você não tem me feito nenhum bem. Na verdade só tem me mostrado o quanto qualquer tipo de relação pacífica ou afetuosa que eu estabeleci com você, foi apenas delírios da minha mente carente de amigos.

— Eu acho que depois de me ouvir você vai compreender o motivo das minhas reações — Ryu se aproximou de Josh — Na verdade se você pudesse ver o que eu vi, compreenderia todos os meus sentimentos.

— Eu posso revelar seus pensamentos para além da sua cabeça — Anabel se pronunciou — Se você julgar realmente necessário tal medida.

— É tudo o que eu preciso — Ryu caminhou em direção a Anabel.

Sem nenhuma objeção de ambas as partes, Anabel tomou a forma da bússola e pousou sobre as mãos de Ryu. O guardião sentou-se, talvez por medo de que tais lembranças o deixasse desestabilizado demais para se manter de pé.

Aos poucos uma luz prateada tomou o corpo de Ryu e várias imagens começaram a ser projetadas a partir dessa luz.

O encontro dos dois, a notícia recebida, a jornada até Catherine, a morte de Ivan…

Ryu enxugou os olhos discretamente.

As imagens seguintes se tratavam do surto da bruxa do azar e o início da perseguição de Josh.

A expressão do ex Minus era de pavor, o que Ryu não sabia distinguir era se aquilo vinha das imagens de Catherine matando milhares de pessoas ou de ele mesmo se tornando o vilão daquela história.

Por fim o último ato foi a morte de Joane e o duplo assassinato de seus companheiros.

Josh caiu sentado na cama, suas mãos trêmulas se agarravam as duas cimitarras.

— Consegue me entender agora? — Ryu o encarava, seu rosto estava vermelho e seus olhos marejados — Você é meu amigo e eu não tive dúvidas disso, até que você me provou o contrário.

— Foi um baita pesadelo — Josh tentava conter suas emoções — Não me admira que você esteja confuso.

— Não foi um pesadelo — Eveline tomou sua forma humana — Esse cenário só não se iniciou, porque Ryu conseguiu impedir que Catherine e você saíssem rumo ao desconhecido e que ela fosse capturada por Blanc.

— Do que você está falando? — Josh tinha em sua expressão uma mistura de confusão e pavor.

— Essas imagens estão marcadas na alma desse garoto — Anabel também tomou sua forma humana — Um simples pesadelo não tem tanto poder assim.

Josh ficou alguns segundos encarando Anabel e depois voltou seus olhos para Ryu, repetindo estes movimentos freneticamente, como se estivesse completamente fora de si. As duas gêmeas se sentaram ao lado dele e o abraçaram, tentando de alguma forma passar conforto, mas nada parecia tirar o caçador daquele estado de choque.

— Chega a ser até previsível — Sebastian dizia com desdém.

— Você pode nos dar licença? — Anabel encarou Ryu e apontou para a porta de saída do quarto.

Sem nenhum protesto, Ryu caminhou para saída.

— A Cat sabe disso? — Josh fez com que Ryu interrompesse seus passos.

— Não seria capaz… — Ryu sussurrou — Não seria capaz de destruir o sorriso dela… Eu a vi sem esperança uma vez… ela não merece isso.

Josh se levantou e caminhou a passos largos em direção a Ryu. O guardião sentiu seu corpo inteiro tremer, o que Josh faria? Talvez ele o matasse de uma vez para não ter impedimentos de cumprir sua missão. Ele teria tomado uma decisão estúpida? 

“Ele não apresenta hostilidade” Eveline respondeu calmamente em sua mente.

— O que?

Antes que Ryu conseguisse assimilar tudo o que estava acontecendo, se viu abraçado pelo gigante gentil.

— Me perdoe… — Josh chorava feito uma criança enquanto esmagava Ryu em um abraço — Eu não quero ser um monstro… Eu jamais… Como pude…

Ainda desnorteado Josh se afastou de Ryu e caminhou escada abaixo aos prantos.

— J-josh… — Ryu estava confuso — Acalme-se.

Sentada na sala de estar, Catherine encarava aquela cena, um pouco confusa. Sem ter a oportunidade de fazer qualquer pergunta que esclarecesse aquela situação, Catherine também foi agarrada em um abraço apertado.

— Eu quero que tudo dê certo para você! — Josh chorava ainda mais alto — Quero que você e o Ryu se casem e tenham filhos!

— O-o que?  — Catherine foi pega de surpresa com aquelas palavras e por isso ficou extremamente vermelha.

Ryu, que antes estava assustado com aquela reação, sentiu um intenso alívio tomar o seu corpo. Alívio tão grande que o fez rir, algo que ele não fazia há muito tempo. Ao perceber aquela oportunidade, ele não se conteve e intensificou a sua risada, até se tornar a gargalhada mais gostosa que ele se lembrava.

— Ryu! — Catherine reclamava ainda com Josh chorando em seu ombro — O que você fez com ele? Você sabe que o Josh é sensível!

— Eu não tenho culpa se ele é um bebê chorão! — Ryu continuava rindo sem parar.

— O que você fez? — Catherine se desvencilhou do caçador e avançou contra Ryu.

— Explica para ela o que eu fiz Josh — Ryu tinha um tom debochado.

Josh tentou ficar sério enquanto bolava alguma explicação que justificasse aquela cena, mas com o rosto vermelho e o nariz escorrendo, ele não parecia nem um pouco respeitável.

— Ai ai — Ryu enxugava uma lágrima que havia escorrido no meio da sua crise de risos — Vamos voltar a organizar nossa estratégia para o fim da travessia.

Em silêncio e enxugando o nariz, Josh acompanhava Ryu a passos lentos.

— Vocês dois vão ficar de segredinho agora? — Catherine arfava de raiva.

— Catherine! — Trevor chamou em alto e bom som.

A bruxa deu um pequeno salto assustada.

— Quer que eu te mostre alguns truques com a relíquia que eu te dei? — O bruxo sorriu pretensiosamente.

Aquela bruxa tinha prioridades e com certeza aprender novas magias estava no topo delas.

O que ela não sabia, é que Trevor era apenas mais um cúmplice naquela história. Mesmo que nenhum deles soubesse, ele sabia de tudo que se passava naquela casa, inclusive do que Catherine não sabia. Ele também compartilhava com a opinião dos dois garotos, aquela bruxa não merecia saber de nada daquilo. Não merecia o devaneio do que jamais iria acontecer. Isso ele poderia garantir. Aquilo jamais iria acontecer.

— Olá… tem alguém aí? — Naira caminhava a passos lentos pelo antigo depósito do Minus.

Ninguém respondeu.

Ela não conseguia mensurar o ódio que cultivava por Ryan Rousseau.

— Mimado! — Naira resmungava — “Achei que tinha sido claro que queria tudo igual antes” — A garota imitava de forma caricata a fala de seu superior.

 — Posso ajudar? — Um velho se aproximou sorrateiramente da garota.

— AI MEU DEUS! — Naira saltou metros de distância — Caramba… Nesse susto eu fui despedida e recontratada.

O velho deu uma risada escandalosa, seguida de um pigarro longo.

— Isso que dá falar mal dos patrões às escondidas — Ele ainda estava rindo.

— O senhor me julga porque não precisa conviver com os caçadores de elite — A menina cruzou os braços e fez bico — Eles são muito folgados e acham que são melhores que o resto de nós.

— Eu já fui um caçador garota — O velho tinha uma expressão terna em seu rosto — Mas tenho que admitir que as coisas ficaram muito sujas nas últimas décadas.

— Como assim… sujas? — Naira estava um pouco assustada.

— Perdemos nossa essência entende? — O velho explicava — Os fins agora justificam os meios, e o caminho para o fim é pavimentado com os corpos dos nossos. Só que eles não ligam.

Naira tremeu.

Aquele homem dizia coisas tão assustadoras.

— O que quer aqui?

A pergunta do velho fez a garota se tremer.

— É que bem… — Naira gaguejava — Eu estou atrás de um certo comunicador…

— Ryan Rousseau? — O velho a interrompeu.

— S-sim… — A menina estava cada vez mais assustada — Como você sabe?

— Todos os comunicadores foram destruídos — O velho se sentou atrás de um balcão — Quem está atrás desse?

— O dono… — A garota falava desanimada — Acho que vou perder meu emprego…

Antes que a menina pudesse olhar para o velho novamente, foi surpreendida por um arremesso onde ela conseguiu agarrar o tal comunicador.

— Mas esse seria…

— O próprio — O velho sorriu para a garota.

— Mas o senhor tinha dito que os comunicadores haviam sido destruídos — Naira estava confusa.

— Entregue diretamente para o garoto — O homem dizia sem olhar para Naira — O caminho que ele escolheu seguir é pavimentado com justiça. Mesmo em um solo morto, de vez em quando um ramo de folha consegue nascer. Mas temos que dar condições para que ele consiga se desenvolver e se tornar uma grande árvore. Talvez a partir desse ramo, o solo possa ser novamente um local cheio de vida.

— Tá… legal… — Naira se afastava daquele local — Muito obrigada senhor!

Após se despedir educadamente, a garota saiu do depósito.

O velho era maluquinho da silva, mas havia salvado sua pele, e ela não poderia se sentir mais feliz com isso.


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