Moonlight Lover escrita por Benihime


Capítulo 9
Verdade




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Selene

Fico deitada na cama, sem energia após uma noite mal dormida. O olhar de Katerina pouco antes de eu sair do seu quarto no dia anterior não me sai da cabeça. Era um olhar antigo, como se ela fosse muito mais velha do que eu poderia imaginar.

Lentamente, quase que por conta própria, meus pensamentos seguem outro rumo, catalogando pequenos detalhes sobre ela, coisas que sempre pareceram tão naturais que eu nem prestava atenção:

Eu jamais a vira realmente comer ou beber nada, apenas beliscar alimentos ...

Sua pele sempre estava alguns graus mais fria do que o normal mesmo quando o dia estava quente ...

Katerina jamais falava sobre seu passado, a não ser o estritamente necessário, e mesmo assim somente quando a situação exigia ...

Na escola, eu era a única pessoa com quem ela interagia e, às vezes, suas palavras saiam de um jeito estranho, como se extraídas de um velho romance de Shakespeare ...

Ela era a melhor aluna da escola em História e, às vezes, quando respondia alguma coisa, parecia saber muito mais do que o que estava nos livros, quase como se tivesse vivido tudo aquilo.

Algumas vezes, quando saíamos juntas, ela se movia tão rápido que parecia nem ter se movido ...

Ela sempre usava aquelas joias, o colar de ouro e o anel que eu admirei no dia em que a conheci, sem jamais tirá-los por motivo algum. Quando perguntei, disse que era por serem heranças valiosas de família, embora sempre mantivesse sua recusa em falar sobre seu passado.

O olhar em seu rosto quando Lacey e as outras a encurralaram ... Era como se estivesse se contendo, como se algo horrível fosse acontecer caso perdesse o controle.

A graça incomum de seus movimentos, sua palidez, a força incomum de seu corpo franzino ...

Quanto mais eu pensava, mais tudo isso parecia saído de um filme científico. Eu nunca tinha pensado sobre isso. Para mim, Katerina sempre fora diferente, mas o mistério era simplesmente uma parte de quem ela era. Apenas Kat, a garota estranha e envolvente por quem eu me apaixonara.

Agora, porém, que eu coloquei todas as suas idiossincrasias juntas, é absolutamente impossível negar o quanto ela é diferente. Há algo mais em Katerina. A pergunta é: o que? Quem, ou o que, é aquela garota?

Minha mãe entra em meu quarto com duas canecas de chocolate quente, sentando-se ao meu lado e fazendo um carinho em meus cabelos. Bebemos em silêncio por alguns minutos.

— Está tudo bem, querida? — Mamãe por fim quebra o silêncio.

Considero mentir, mas já estou cansada de guardar as coisas para mim mesma. Largo o chocolate quente na mesa de cabeceira e me encolho na cama, com a cabeça no colo de minha mãe.

— Não, mamãe. — Confesso baixinho. — É a Kat. Eu sinto ... Que ela está escondendo alguma coisa de mim. Uma coisa importante.

— E o que a Kat diz sobre isso?

— Nada. Essa é a pior parte: sempre que pergunto qualquer coisa pessoal, ela se fecha e desconversa.

— Selene, não sei como estão as coisas entre vocês, então isso pode ser um péssimo conselho, mas ... Se existe algum sentimento mais sério entre vocês, então tem que haver confiança. Não importa o que aconteceu no seu aniversário de quinze anos, você precisa acreditar que nem todos vão traí-la. Entendeu?

Minha mãe está certa, é claro. Algum tempo depois, quando fico sozinha novamente, pego meu notebook e começo a pesquisar.

Katerina

Assim que entro no meu closet para tentar achar uma roupa decente, meu celular toca.

— Quer que eu atenda? — Eva, que está empoleirada em cima de minha cama, pergunta.

— Se for a Selene, pode atender.

— Oi, Lene, é a Eva. — Eu ouço minha irmã dizer. — A Kat está tomando banho. Ok, pode deixar, eu digo a ela. Pra você também. Tchau.

Vou até a porta a tempo de ver Eva desligar e colocar o celular de volta sobre o meu travesseiro.

— E aí. — Pergunto. — O que ela queria?

— Você está em apuros, irmãzinha. — Ela diz. — Selene pediu para eu te avisar que ela quer te encontrar perto da cachoeira antes do almoço.

Eu solto um gemido baixinho, me deixando cair na cama, ainda enrolada na toalha de banho.

— Ei, não faça drama. — Eva passa um braço por meus ombros. — Vá e veja o que ela quer. Não pode ser tão ruim.

— Ah, tá. — Eu bufo ironicamente. — Você não conhece a Selene como eu. Ela ter mudado os planos assim, em cima da hora, é um péssimo sinal.

— Relaxa, ok? Selene não vai te morder. — Minha irmã mais velha abre um sorriso safado. — Não no mau sentido, pelo menos.

Sua piada indecente me faz soltar uma sonora gargalhada. Só mesmo Eva para me fazer rir num momento como esse.

— Quieta, sua pervertida. — Eu lhe dou uma cotovelada de brincadeira. — Pelo menos seja útil e me ajude a escolher uma roupa decente.

— Vá assim. — Evanora retruca. — Aposto que Selene vai adorar.

— Cale logo essa boca e venha me ajudar.

— Tudo bem. — Seus olhos escuros brilham travessamente. — Mas só se você prometer que vai usar o que eu escolher, independentemente do que seja.

— Tudo bem. — Suspiro pesada e teatralmente. — Sei que vou me arrepender mas ... Eu prometo.

Eva abre um largo sorriso e desaparece em meu closet, voltando minutos depois com uma pequena pilha de roupas dobradas nos braços. Eu as visto sem sequer olhar, com medo de descobrir o que minha irmã tramou dessa vez.

— Ficou ótimo. — Ela diz quando termino. — Exatamente como eu imaginei. Se você não fosse minha irmãzinha, eu lhe daria um beijo agora mesmo.

— Pare com isso, Eva!

— Venha. — Ela ri, dando tapinhas para que eu me sente ao seu lado na cama. — Esse cabelo precisa de atenção. Sente aqui e deixe a mestra trabalhar.

Mais uma vez obedeço sem protestar, ficando imóvel enquanto Evanora faz meu cabelo e maquiagem. Depois de um tempo surpreendentemente curto, ela acaba.

— Perfeito. — Anuncia. — Todos vão querer te beijar ... Ou te matar.

Rio de sua provocação enquanto me dirijo para o espelho de corpo inteiro no interior da porta do closet. Meus olhos se arregalam.

A blusa que Evanora escolheu para mim é branca, modelo tomara que caia, decorada com renda, é justa na medida certa, destacando meu corpo ao invés de escondê-lo como normalmente faço, seu tecido claro contrastando com a calça jeans azul escura, quase preta, que minha irmã vive insistindo para que eu use. Separado aos pés de minha cama está um par de sapatilhas rosa-claro que combina perfeitamente com o resto de minhas roupas. Em meu rosto, apenas uma camada leve de maquiagem, e meu cabelo está preso em uma trança grossa, jogada casualmente sobre meu ombro esquerdo.

— Obrigada, Eva. — Eu giro diante do espelho, apreciando o chão acarpetado sob meus pés descalços. — Você acertou em cheio.

Selene

Depois de ajudar mamãe com o almoço, corro para tomar um banho rápido e me enfio em meu closet, mas hoje é um daqueles dias em que não consigo fazer as roupas combinarem, por mais que me esforce.

No final, já quase sem tempo, escolho um short jeans azul marinho com a estampa dos Vingadores na perna esquerda, uma camiseta do Nirvana que roubei do meu pai e meus All Star favoritos, prendendo meu cabelo rebelde em um coque bagunçado.

Me olho no espelho. Não estou como gostaria mas, objetivamente, sei que não estou tão horrível como meu nervosismo me faz crer. Balanço a cabeça para expulsar esses pensamentos, giro nos calcanhares e desço as escadas correndo. Meu coração está disparado, mas sei que não é da corrida. Alguma estranha intuição me diz que o dia de hoje definirá meu relacionamento com Katerina.

— Mãe, pai! — Grito, já escancarando a porta da frente. — Volto logo!

Disparo porta afora e entro em meu carro. Ao pegar o volante, percebo que minhas mãos tremem e, sem sucesso, tento me acalmar.

Katerina

Assim que chego ao final da pequena estrada de terra, vejo o carro de Selene, mas ela não está por perto. Há, porém, uma pequena fita vermelha amarrada em um galho de árvore, a cor viva se destacando contra o verde que a cerca.

Esse pequeno sinal marca o começo de uma trilha quase oculta pela vegetação, que sigo até perto da margem do rio. Selene me ouve chegar, posso ver pelo modo como sua postura fica tensa, mas ela não olha para mim, apenas continua encarando a água que corre.

Me sento ao seu lado, surpresa quando ela imediatamente se move, colocando distância entre nós.

— Selene. — Meu tom é baixo, abafado. — Por que você me chamou aqui?

— Por causa disso.

Ela me entrega um pequeno bloco de anotações no qual está rabiscada uma lista, obviamente feita às pressas a julgar pela letra. A lista é sobre mim.

— O que ... — Tento fingir confusão, embora saiba exatamente onde essa conversa vai nos levar. — O que isso quer dizer?

— Não finja que não sabe, Katerina. — Ela rosna, seus olhos luzindo de raiva. Aqui, o verde não se destaca tanto. É como se pertencesse a este lugar, como se Selene fosse uma espécie de dríade. — Eu já descobri tudo. Sei quem, e o que, você é. Quero a verdade, e quero ouvir da sua boca.

— Não, você não quer. — Rebato amargamente. — Não pode lidar com a verdade.

Eu sei que ela não pode. Ninguém que eu conheci jamais pôde. Eu mesma às vezes ainda duvido, embora já viva com esse segredo há tanto tempo.

— Kat, por favor. — Para minha surpresa, Selene se aproxima, segurando minhas mãos entre as suas. — Pode confiar em mim. Sabe disso, não sabe?

Afasto o olhar, sem conseguir encará-la.

— Não se trata de confiança, Selene.

— Trata-se de que, então? — Ela pergunta impacientemente.

— Eu não ... Não quero perder você.

— E prometo que não vai. — A morena afirma docemente. — Se me disser a verdade. Podemos lidar com qualquer coisa.

— É mesmo? — E subitamente estou com raiva. Raiva dela, por não entender. Raiva do destino, por ter me feito o que sou. E raiva de mim, por ainda me importar. — Tudo bem, então. Você está certa, Selene. Cada detalhe dessa sua lista ridícula está certo. Eu sou uma vampira.

Selene praticamente pula de pé, pálida de medo. Posso ver que, embora tenha conjecturado o impossível, jamais realmente acreditou que fosse verdade.

— O que?!

O tom de medo e incredulidade em sua voz me irrita, o bastante para me fazer perder a paciência.

— Pensei que tivesse dito que já sabia de tudo. — Eu digo zombeteiramente.

— Sim, mas ... Qual é, isso não pode ser real! Você está fazendo uma pegadinha comigo, não é? Isso é uma piada.

— Não é piada nenhuma. — Deixo minhas presas aparecerem, e vejo Selene dar um passo para trás. — É a verdade, e agora você sabe.

— Então ... — Todo o seu corpo treme, mas ela não desvia os olhos de mim, num misto de medo e desafio. — Agora que sei ... Vai me matar?

Ergo a mão, tencionando puxá-la para perto de mim e explicar tudo, mas ela se afasta como se tivesse levado um choque.

— Selene ... — Eu praticamente imploro. — Por favor, me escute. Isso não muda nada. Ainda sou eu. Você me conhece!

— Não, Kat. — Selene está tão longe de mim quanto possível no momento, com as costas contra uma árvore. — Isso muda tudo.

— Selene, por favor! — Me ponho de pé e dou um pequeno passo em sua direção. — Apenas me escute. Por favor!

Ao invés de me dar ouvidos, Selene apenas grita para que eu fique longe dela e sai correndo pela trilha, de volta para a estrada principal. Não tento segui-la, por sei que não adiantaria de nada. Eu já a perdi.


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