Lá E De Volta Outra Vez escrita por Pacheca


Capítulo 75
Buscando Respostas


Notas iniciais do capítulo

Alou alou, estou viva e bem haha Ou quase bem, a faculdade não me dá descanso, mas estamos quase acabando num é? Mais um ano e eu não vou mais poder dizer isso, ainda bem. Espero que vocês curtam esse novo ciclo ♥



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O jantar em família foi tranquilo. Meu pai parecia um pouco preocupado com as contas da loja, mas minha mãe estava empenhada em achar uma solução. Eu dava algum palpite, apenas para lembrá-los que eu estava ali de corpo e alma também. Mesmo que não fosse de tudo verdade.

Ajudei minha mãe a arrumar a cozinha antes de me despedir e ir para meu quarto. Vesti meu pijama, puxando as cobertas e me deitando na cama. Suspirei, sentindo todo o peso do dia sobre meu peito. E finalmente eu me vi questionando quando os problemas parariam de me atingir feito ondas, verdadeiros tsunamis.

Peguei meu celular e conferi as mensagens. 2 de Lysandre e uma de Rosa. Abri a de Rosa primeiro, pedindo para atualizá-la sobre a ligação depois. Garanti que ela ficaria sabendo e abri as de Lysandre em seguida.

“Como foi o dia com Alexy?”

“Espero que você durma bem, princesa. Te amo.”

Suspirei mais uma vez, pensando no que responder. Eu sabia que não dormiria bem, e o dia com Alexy tinha sido um tanto complicado. E se eu já estava cansada de me meter em tantos problemas, o que eu menos queria era envolver mais alguém agora. Olhei minha cômoda, a foto de Lysandre cantando na moldura que Violette tinha me dado. E logo ao lado a foto do grande trio. Viktor, Nathaniel e eu. Peguei meu celular mais uma vez e comecei a digitar a mensagem.

“Ei, está ai?”

Enviei, olhando sua foto de perfil enquanto esperava uma resposta. Cinco minutos depois, desisti de esperar e mandei outra.

“Eu sinto sua falta.”

Bloqueei o telefone e me encolhi mais ainda debaixo das cobertas. Pensando na ligação. Eu não sabia muito bem o que esperar daquilo. Será que Alexy queria descobrir que seus pais biológicos não tinham condições de criar dois bebês? Talvez eles simplesmente não os quisessem, uma possível gravidez indesejada e em dobro ainda por cima. Ou talvez eles simplesmente não tiveram uma opção melhor.

Fechei os olhos, tentando dormir. A luz de notificações do meu celular iluminou o quarto, piscando duas vezes e depois se apagando. Estiquei a mão e desbloqueei a tela, vendo a resposta que o garoto loiro finalmente tinha me mandado.

Era uma imagem, iluminada apenas pelo flash do celular. Ele estava deitado na sua cama, com o cabelo completamente bagunçado e uma bola de pelos branca ao lado de sua cabeça. Apesar de estar de cara fechada, eu sabia que ele parecia bem feliz na foto. O telefone vibrou de novo.

“Nós também, mas você podia dizer isso de manhã”.

Sorri, sentindo um pouco do peso ser levantado do meu peito, só um pouquinho. Aquela foto só me mostrou mais ainda como eu sentia falta de Nathaniel. Ele ainda era meu melhor amigo, mas eu já não tinha certeza se eu era a melhor amiga dele. Não depois que a gente praticamente parou de se falar.

“Tudo bem por ai?” O celular vibrou mais uma vez e eu li sua nova mensagem.

“Você me conhece, até quando está tudo bem, não está realmente.”

“O que aconteceu?”

“Posso te contar de manhã. Já está tarde.”

“Agora que você já me acordou?”

“É só uma desculpa pra te ver pessoalmente.”

“Quer treinar amanhã? Não sei se se lembra, mas ainda tem uma inscrição na academia da cidade...”

“Eu te falo quando eu puder.”

Recebi um joinha em resposta, e finalmente desliguei tudo e fui dormir. O dia seria bem comprido amanhã, ainda mais do que os últimos tinham sido.

Acordei meia hora antes do meu alarme, com uma mensagem de Lety. Ainda meio confusa, com o quarto ainda escuro, tateei pelo celular e li o pedido para passar a noite comigo. Pisquei, demorando um pouco para registrar a situação inteira. Eu tinha tido um sonho estranho onde eu corria de calcinha e sutiã pelo colégio, enquanto Delanay tentava de toda forma me pegar para interromper aquele escândalo e eu tentava me esconder de todos os comentários maldosos e nojentos das pessoas. Ironicamente, quando eu ia bater a porta do vestiário no sonho, foi quando meu telefone apitou.

Acabei cochilando mais um pouco, o que resultou numa queda pro meu celular, mas sem maiores danos. Acordei de novo com o alarme. Tomei um banho, vesti minha roupa nova e me preparei para o dia que me esperava. Peguei o celular e, depois de me despedir correndo dos meus pais, fui caminhando para a escola. Finalmente respondi Lety, dizendo que ela poderia dormir lá em casa, e ai discutiríamos sobre o problema que ela estava tendo com a mãe.

Na correria de responder Lety, pensar em Alexy e de ainda estar meio sonolenta, eu tinha me esquecido que minha primeira aula era educação física. Corri até o vestiário, rezando para que meu uniforme estivesse no meu armário. Felizmente estava, mesmo que um pouco amarrotado.

— Bom dia, Anna. – Priya me cumprimentou, também vestindo suas roupas e trançando seu cabelo. Melody estava concentrada em amarrar seus tênis, mas também me deu bom dia. Iris chegou na mesma hora, nos desejando bom dia com a mesma energia de quando a conheci. Me confortava saber que ela não tinha mudado depois de tudo que aconteceu. – Vocês sabem o que vamos fazer hoje nessa aula?

— Ginástica acrobática, de novo. Eu acho, pelo menos. – Melody finalmente ficou de pé e foi prender sua franja com as presilhas. Suspirei, enquanto Iris parecia ser a única empolgada para a aula.

— Você gosta de nos ver montando uns nos outros, hein Iris? – Priya disse, provocando a ruiva, que deu um sorrisinho sem graça, tentando se justificar. Melody retrucou de forma travada, dizendo que ficava desconfortável. Eu entendia bem, mas fiquei quieta.

— E Rosa, ela não vem? – Iris perguntou. Contei que ela teria que viajar, mas não disse com quem, nem para onde, nem porque. Iris também não insistiu, já que já estávamos no último dia da semana. Umas aulas a menos não a reprovariam, como a própria Iris disse.

Violette também tinha chegado, mas ela simplesmente deu bom dia e foi se trocar. Quando já estávamos todas uniformizadas, fomos ao ginásio para a tal aula. Lysandre já tinha chegado, também de uniforme. Era tão estranho vê-lo fora das roupas pesadas, apenas de calças de tectel e uma camisa mais folgada. Ele piscou demoradamente, parecendo ainda meio sonolento. Sorri, achando seu ar ainda mais distraído fofo. E o sorriso que ele me deu quando me percebeu olhando era mais fofo ainda.

— Bom dia, jovens. – A voz de Boris me fez olhar para frente de novo, estranhando a presença da diretora. Kim deixou escapar que talvez ela quisesse tentar o esporte, mas as risadas mal começaram e acabaram, quando Boris pediu atenção ao aviso da diretora.

— Bom dia, meus queridos. Não demorarei. – Ela ajeitou seu óculos no rosto, como se ainda estivesse escolhendo as palavras e tentasse ganhar tempo. – Bom, é lastimável, mas infelizmente a senhorita Charlotte não irá mais nos acompanhar em seu ano letivo. Por motivos pessoais, a colega de vocês precisou se mudar para outro colégio.

Olhei para Iris, vendo sua reação. Apesar de não estar sorrindo plenamente, eu podia quase sentir a onda de alívio e felicidade que a rodeava. Pelo visto, Lysandre e eu somos muito bons em fazer ameaças. Ouvi Li questionar a diretora, enquanto Ambre parecia ter tido o choque de uma vida. Quase me deu dó. Quase.

Enquanto a diretora deixava o ginásio, olhei para Lysandre, que simplesmente me sorriu de leve. Tínhamos vencido aquela batalha. Sorri de volta, finalmente respirando. Tínhamos vencido.

— Bom, vocês ouviram. Vamos desejar boa sorte, mas vamos também nos concentrar. Formem suas duplas das últimas aulas. – E foi ai que eu me vi com problemas. Rosalya era minha dupla, que por um acaso também não estava presente. Suspirei, olhando ao redor. E quando percebi que Alexy não estava ali, Kentin me deu bom dia.

— Parece que fomos abandonados. – Ele disse, parecendo meio sem graça. Sorri, também meio sem reação, aceitando minha nova dupla.

— Sabe por que Alexy não veio? – Tentei perguntar, mesmo que eu já pudesse imaginar a resposta. Ele deu de ombros, perguntando se seríamos mesmo uma dupla. Concordei. – Claro, vamos.

— Nossa, quanta alegria. Eu sou tão ruim assim? – Ele respondeu pela minha falta de ânimo. Suspirei, envergonhada pela minha atitude.

— Claro que não, desculpa. Sou eu quem sou péssima em ginástica. – E não era mentira. Até ai, ele não me animou nem um pouco.

— Eu também. – Suspirei, finalmente vendo Boris explicando as poses que faríamos naquela aula, e aquilo me desanimou ainda mais. – Bem começamos com o equilíbrio invertido de braço. Você vai primeiro?

— Isso vai ser uma catástrofe. – Resmunguei, mas ele me garantiu que ia me segurar. E eu até acreditava, era em mim que eu não confiava. Suspirei, vendo-o posicionado para me segurar. Levei as mãos ao chão e tomei impulso, e coragem, de uma vez só.

Infelizmente, foi impulso demais. Minhas pernas passaram direto e começaram a descer na direção do Kentin. Ele fez o melhor possível para me segurar e, mesmo não conseguindo evitar a queda, garantir que ninguém ia se machucar. A questão é que o melhor jeito foi segurar minhas pernas e me puxar na direção dele. E o estrondo foi grande o suficiente para todo mundo nos olhar.

Eu estava no meio do ginásio, sentada em cima de Kentin, enquanto ele ainda tinha as mãos nas minhas pernas e eu tinha me apoiado pondo as mãos em seu peito. E com todo mundo nos olhando também, inclusive o professor.

— Eu fico feliz pelo entusiasmo de vocês, meus jovens, mas vamos tentar manter essa aula livre para todas as audiências, sim? – Boris disse, dando uma risadinha satisfeita. E ele poderia simplesmente concluir ali, mas ele não ia perder aquela piada. – Bom, não era uma das posições sugeridas, mas é sempre bom ousar, não é?

Ali, eu estava pronta para pular dentro de uma cova e esperar meu fim. Toda a turma caiu na gargalhada, menos Kentin, Lysandre e eu. Fiquei de pé quase num pulo, limpando meus joelhos. Lysandre tinha o cenho franzido, mas voltou sua atenção ao exercício. Kentin ficou de pé também.

— Você está bem? – Perguntei, tentando não pensar que meu peso podia ter machucado o garoto, ainda mais naquela velocidade. Ele deu de ombros.

— Desculpa, eu achei que ia ser mais...devagar. Tentamos de novo?

— Acho que sim, né? – Suspirei, repetindo a posição com mais cuidado dessa vez. Bem mais cuidado. Senti suas mãos segurarem meus tornozelos, enquanto eu sentia o tremor nos meus braços pelo esforço.

— Seu namorado não parece nada feliz. – Tentei olhar para cima para conferir, mas mal conseguia mexer meu pescoço. Kentin parecia satisfeito pelo tom de voz. – Eu não sabia que você gostava dele. Quero dizer, é tão óbvio. A menina bonita gosta do cara misterioso. Isso é um filme clichê do horário da tarde?

Finalmente resmunguei, fazendo-o soltar meus tornozelos, me deixando ficar de pé de novo. Meu rosto estava vermelho, eu não sabia se por irritação dos comentários ou se só pelo fluxo de sangue na minha cabeça.

— Está com ciúmes? – Resmunguei, mas ele ouviu mesmo assim.

— Não, por que? – Dessa vez, sua voz não tinha firmeza. Respirei fundo, prendendo meu cabelo de novo e encerrando o assunto. Eu tinha defendido Kentin a vida inteira de todo o mal trato, não seria eu agora quem o humilharia por gostar de mim.

Conseguimos acabar a aula sem mais nenhuma queda ou posição comprometedora, e com Kentin calado. Ao fim da aula meu humor já não estava dos melhores. Eu odiava aquela aula, odiava ter sido piada pelo professor, odiava ter quase discutido com Kentin e odiava o tanto que eu estava suada. Enquanto a maioria ia se trocar nos vestiários, fui até o pátio e me sentei num dos bancos, sentindo o ar fresco resfriar meu corpo.

Alexy sequer aparecera para a aula e aquilo me preocupava. Talvez ele tivesse desistido do tal telefonema, talvez só tivesse arrumado mais uma briga em família. Em todo caso, eu sabia que o dia não seria nada tranquilo. Respirei fundo e fiquei de pé, finalmente indo me trocar.

Peguei meu uniforme para deixá-lo no meu armário, assim ao fim do dia eu lembraria de levá-lo para casa. Ele merecia ser lavado depois de tanta emoção. Aproveitei para conferir meu horário e pegar meu material.

Era difícil ignorar aquela presença atrás de mim, ainda mais tão perto. E sem nem olhar eu sabia quem era, só pelo perfume e pela energia. Sorrindo, me virei e encontrei os olhos heterocromáticos que eu tanto adorava.

— Bom dia, minha bela acrobata.

— Bom dia. Deu pra ver que você prestou atenção na minha grande apresentação. – Respondi, acabando de ajeitar meu cabelo e devolvendo o pente para o armário.

— Seria mais difícil não ver. Até porque seu parceiro parecia...nas nuvens. – E lá vinha o ciúmes. Pelo menos dessa vez, ele estava contido. Continuei sorrindo, tranquila.

— Kentin? Não reparei.

— A situação toda não pareceu envergonhá-lo, pelo contrário. Eu diria até…

— Que você estava deslumbrante com seu uniforme? Eu concordo. – Interrompi, finalmente fechando a porta do armário e me escorando nele, fitando meu namorado. Ele pareceu perdido por um segundo, antes de me encarar de novo. – Eu diria até que você tem sorte por ser o único garoto que me interessa, sabia?

Estiquei minha mão e segurei a dele, sorrindo para ele, esperando ele retribuir. E quando ele ainda parecia encafifado com Kentin, eu o puxei pela nuca e lhe dei um beijo. E que beijo.

Ficar de pegação no meio do corredor não era exatamente o que eu tinha em mente, mas a pressão do corpo dele contra o meu me lembrava dos armários nas minhas costas e do cenário, mesmo assim eu continuava retribuindo o beijo. Eu poderia ficar ali o dia inteiro, a semana inteira, e ainda seria pouco. Eu nem precisaria respirar.

Foi ele quem me soltou primeiro, olhando ao redor. Fora uns dois alunos mais novos, ninguém tinha nos visto. Ajeitei meu cabelo mais uma vez e o lembrei que tinha que ir para a aula. Ele concordou, vindo atrás de mim, com minha mão na sua.

Passamos as aulas afastados. Castiel parecia fazer questão de ter o amigo para si em toda ocasião, e eu acabava aproveitando para passar um tempinho com o meu. Nathaniel ficou todos os horários comigo, mas mal nos falamos. Mesmo assim, algo parecia ter voltado ao normal entre nós. Ou pelo menos, a estranheza diminuíra.

Ao fim das aulas, Alexy me mandou uma mensagem, de que estava me esperando no parque. Suspirei, passando correndo no meu armário, pegando meu uniforme e deixando meus livros, antes de deixar a escola correndo. Tinha falado para Lysandre que teria que sair assim que os horários acabassem, então ele não se preocupou quando passei por ele no corredor e dei apenas um aceno corrido.

Alexy não tinha dormido, era notável na sua postura e nas olheiras em seu rosto. Antes que eu tivesse a chance de me aproximar de Alexy, meu celular tocou. Atendi depois de conferir que era Lety. Eu tinha esquecido disso também.

— Oi, Lety. Tudo bom?

— Ei, tudo sim. Eu quero saber que horas eu chego na sua casa? – Olhei o relógio do celular, tentando imaginar a que horas eu estaria em casa. – Anna?

— Ah, oi. É, eu tenho umas coisas para resolver antes, então não sei bem a que horas eu chego. – Percebi o tom chateado da resposta dela e me apressei em pensar numa solução. – Fazemos assim, deixa suas coisas prontas, assim que eu acabar eu te ligo e você me encontra em casa, ok?

— Ok, pode ser. Te vejo mais tarde. – Ela me mandou um beijinho e desligou. Guardei o celular, percebendo que eu começava a tremer. Eu podia imaginar como Alexy devia estar se sentindo. Eu, que era apenas uma espectadora da situação estava com o coração a mil. Engoli em seco e me aproximei, dando boa tarde.

Ele não se esforçou para me dar um sorriso, apenas respondendo o boa tarde. Assumi meu posto ao seu lado no banquinho, respirando fundo. Ele batia com um dos dedos ritmadamente na tela do seu celular, bloqueado.

— Você não me parece bem. Quer mesmo fazer isso? – Perguntei, preocupada com a palidez de Alexy. Ele também suava, mostrando quanto ele estava nervoso.

— Eu não estou com medo, eu estou apavorado. Eu não consegui dormir de tão nervoso, e de manhã eu não consegui sair de casa para vir para a aula. Eu tenho medo do que vou descobrir, se é que vou descobrir algo. – Ele falou, um pouco ofegante. Olhei para ele, esperando confirmação de que iríamos mesmo seguir com aquilo. – Eu quero fazer, eu só não quero me iludir.

— Eu estou pronta quando você estiver. – Reforcei, sentindo que ele estava se convencendo uma última vez de que ficaria tudo bem. Ele anuiu, sorrindo fraco para mim.

— Eu nunca vou esquecer do seu apoio nesse momento. Obrigado, de coração. – Ele pegou minha mão, e eu apertei um pouco, sorrindo de volta.

E então ele respirou fundo, pegou o celular e digitou o número que ele tinha trago rabiscado num papel. Aproximei minha cabeça da dele, enquanto ele deixava o celular no viva-voz entre nós dois. Começou a chamar. A linha ainda existia, pelo menos.

Pareceram horas ouvindo o tu prolongado da chamada. Quando Alexy, ainda meio trêmulo, estava prestes a desistir achando que o telefonema cairia na caixa postal, quando uma voz masculina atendeu. Ai sim, Alexy ficou pálido igual um fantasma.

— Alô. – Alexy me olhou, meio desesperado, e tentei incentivá-lo com o olhar. – Alô? Quem fala?

— Ah, oi… – Alexy conseguiu começar a falar, ainda meio perdido. Acho que ele pensou tanto no que descobriria que não pensou tanto no como descobriria. – Oi, desculpa…

— Quem fala?

— Oh, eu...é bom, é complicado, eu…

— Estou ouvindo, o que foi? – A voz esperava sua resposta, paciente do outro lado. Alexy respirou fundo e finalmente começou a se explicar.

— Eu consegui esse número através do meu dossiê do estado civil, uns dados confidenciais da polícia. E eu estou envergonhado do que fizemos, mas eu e meu irmão...nós somos gêmeos e fomos adotados bem bebês ainda. Bom, enfim, eu sei que talvez tenha sido uma má ideia, mas eu achei que talvez ligar para esse número pudesse, sei lá, me dar uma luz sobre minhas origens.

Silêncio. Alexy respirava fundo depois de falar tudo de uma vez. Eu conferi a tela do celular para ver se a chamada ainda estava conectada. Estava. O silêncio era quase esmagador, quando finalmente ele decidiu falar de novo.

— Armin? – Senti meu coração saltar no peito e vi no rosto de Alexy o mesmo choque.

— Eu...eu sou o Alexy. – Ele conseguiu responder, ainda me olhando meio perdido.

— Claro, Alexy e Armin. O que você quer saber, Alexy? – Não sei se Alexy reparou, mas o tom da voz do sujeito tinha mudado. Estava menos confiante, como se ele também estivesse um pouco assustado com aquela ligação.

— Eu… – Ele não sabia o que perguntar. – Você conhece meus pais? Os biológicos, no caso.

Mais silêncio do outro lado da linha. Alexy tinha voltado a tremer, enquanto meu coração ainda martelava no meu peito. E novamente, a voz voltou um pouco menos corajosa que antes.

— Eu os conhecia, sim.

— Oh, então...eles...

— Morreram, sim. 16 anos atrás, num acidente de carro. – Era aquela a resposta. A resposta que ele tanto esperava. A razão para terem sido colocados para adoção. Eles eram órfãos. Alexy ainda digeria aquela informação, o semblante mais calmo do que eu imaginara.

— Eu meio que esperava por isso. – Não sei se ele falou para o homem na linha ou se para mim, ainda estudando a reação dele. A voz do homem voltou aos nossos ouvidos, meio embargada agora.

— Me desculpe.

— Bem, se você me permite perguntar, por qual razão seu número estava na nossa certidão de nascimento?

— Posso te assegurar de que é uma boa razão, mas eu preferiria te contar pessoalmente. Não acho que um telefonema seja o espaço para isso, já é difícil comunicar a morte de alguém por um pedaço de plástico. – Alexy me encarou, esperando uma resposta. Sinalizei com a mão para ele ir em frente com o tal encontro.

Ele falou para o homem o endereço da praça, ao que descobrimos que era perto da casa do tal sujeito. Alexy tinha voltado a ficar pálido, trêmulo. Voltei a segurar sua mão, enquanto ele dizia que esperaria uma hora para encontrar com o homem na lanchonete perto da escola.

— Está tudo bem se você quiser mais tempo antes...de me ver. – O homem falou, ao que Alexy respondeu que estava tudo bem. E então, a tal ligação chegou ao fim, comigo e Alexy encarando um ao outro, completamente perdidos.

— Eu sinto muito...Pelos seus pais...– Falei depois de tomar um pouco de coragem. Ele deu de ombros, sorrindo fraco.

— Não precisa ficar assim, era o cenário que eu tinha imaginado. Não se abandona dois bebês de uma só vez sem uma boa justificativa...ou pelo menos é o que eu queria acreditar.

— Precisamos avisar ao Armin...sobre tudo isso. – Comuniquei, tentando soar tranquila. Ele concordou, respirando fundo.

— Eu não sei como ele vai reagir.

Quase por passe de mágica, Armin apareceu perto de nós, literalmente saindo de trás de uma árvore. E eu consegui ver no rosto dele a mesma expressão perdida que Alexy tinha.

— Eu...eu ouvi...tudo. – E ele simplesmente virou as costas e saiu correndo até o portão do parque. Alexy se levantou, chamando o irmão e eu fui atrás dos dois. O alcançamos pouco depois, segurando as grades do portão do parque, trêmulo.

— Armin. – Chamei, na tentativa de acalmá-lo. Partia meu coração ver que Armin, nosso grande jogador brincalhão, estava com os olhos cheios de lágrimas que ameaçavam cair a qualquer momento. – Ei…

— Desculpa. Eu não devia ter vasculhado nada, não devia ter tocado nesse assunto. Foi a pior ideia que eu já tive. Você tinha razão, às vezes é melhor deixar a verdade quieta no cantinho dela.

Alexy foi se aproximando devagar do irmão, segurando os ombros trêmulos dele. Eu dei um passo para trás, querendo que os dois se entendessem por eles mesmos, mas ainda estando ali pros dois.

— Para de se culpar por isso. Eu não te culpo mais, você também não deveria.

— Eu fui um idiota, me desculpa. Eu não quis admitir que eu tinha ido longe demais, e olhe agora. O resultado de tudo isso, eu não acreditaria que chegaríamos a esse ponto. – Ele finalmente ficou de frente para nós, respirando fundo. – Eu não queria saber, por isso eu interrompi as pesquisas. E foi por isso que eu briguei com vocês ontem no café.

Pela forma como até Alexy estava surpreso, eu imagino que era a primeira vez que Armin se abria tanto sobre alguma coisa. Voltei a me aproximar devagar, e Armin esticou um braço para me receber num meio abraço. Deixei ele me aninhar contra ele.

— Eu entendo. Não vou ficar zangada porque ficou nervoso ontem. Ok? – Ele concordou, ainda me apertando contra ele. Alexy o abraçou pelo outro lado, explicando sobre o encontro com o sujeito.

— Bom, acho que agora já está marcado. Pelo menos, vamos saber logo sobre tudo isso. Você vem, né? – Armin falou, finalmente encerrando nosso abraço em trio. Olhei para os dois, pensando que não era realmente meu lugar.

— Eu sei que você não quer mais se meter na vida dos outros, mas dessa vez é um convite. – Alexy falou, rindo fraco. Sorri também, mesmo que sem muita energia. – É bem importante pra gente que você encontre esse desconhecido conosco.

— É, ok. Se vocês insistem. – Armin sorriu para mim, agradecido. Sorri de volta. Quando finalmente deixamos o parque, depois de todos tentarmos nos acalmar, Alexy recebeu uma mensagem do sujeito. Ele acabara de chegar.

Ficamos os três parados perto das mesas do lado de fora, esperando encontrar alguém que também estivesse procurando. Só tinha um sujeito de camisa branca, sentado de costas para nós. Alexy e Armin o estudavam antes de se aproximarem.

Ele ficou de pé para cumprimentar um outro cara, os dois parecendo bem amigos. Apertei os olhos, achando a silhueta familiar. Os dois discutiam sobre o amigo do cara e se era o encontro deles, quando eu finalmente falei.

— Aquele não é o Kentin? – E os três voltaram a encarar a dupla, cada vez mais confusos.


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