Lá E De Volta Outra Vez escrita por Pacheca


Capítulo 45
Alguma Coisa Aconteceu


Notas iniciais do capítulo

A produção está em alta, com o episódio 35 já a vista heheheh Quero só ver. Enfim, depois de um capítulo "pequeno" eu vos bombardeio com outro imenso. E sim, o título é por causa de a Bela e A Fera ♥ Já amava, com a Emma Watson eu apaixonei de novo. Socorro ♥ Aproveitem :3



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A sexta feira começou bem. Minha mãe estava se comportando bem, deitadinha em sua cama, com o computador no colo, mas o braço esquerdo colado ao tronco, como o médico mandara. Meu pai tinha dito que tiraria uns dias de folga da loja e ia curtir a esposa. Fiquei feliz em saber que eu não estaria de vela no momento do casal.

   Peguei minha mochila, ajeitei a roupa no corpo e parti rumo ao colégio, pronta para o tal babado de Peggy. Era bom saber que Peggy tinha tomado consciência dos seus atos e arrumado um jeito de conciliar seu sonho e a alegria dos outros.

   ─ Bom dia. ─ Ela estava na porta, uma pilha de jornais no colo, distribuindo-os para os alunos que chegavam. Sorriu para mim e estendeu o jornal para mim. ─ Anna, oi. Como está sua mãe?

   ─ Ótima, Peggy. Obrigada. ─ Aceitei o jornal e entrei na escola, curiosa. Entrei na sala de aula e finalmente corri os olhos pela página. Uma nova incógnita. Fui para a notícia, lendo interessada.

   “Na próxima segunda feira, nossa adorada Anna Wright perderá seu posto de “a novata”. Isso mesmo, uma nova aluna está para iniciar seus estudos na turma do colégio St. Andrew. Algumas informações foram omitidas pela privacidade da aluna, mas podemos dizer que será uma belíssima aquisição para a escola. A aluna já viajou por outros países antes de chegar até nós, e suas origens prometem uma bela surpresa e choque cultural entre os alunos. Fiquem antenados para a chegada dessa nova colega.”

   Alguns outros comentários sobre a tal aluna, mas eu parei de ler. Perder meu posto. Eu não me considerava mais uma estranha, mas depois de ler o jornal, a sensação de ser a “novata” voltou. Eu não ia mais ser a novidade, o rosto mais fresco nas memórias já cheias com feições familiares. Eu agora seria um desses rostos que a gente até ignora, de tanto ver. Acho que fiz um biquinho, porque Alexy fez um também antes de começar a rir.

   ─ O que foi, garota? Aconteceu algo?

   ─ Ainda não. Vamos ter uma novata.

   ─ Ah, o jornal da Peggy. ─ Ele nem olhou direito na direção do papel e sorriu de novo. ─ É, eu vi. Parece que vai ser legal.  

   ─ É, acho que sim.

   ─ Oh, que foi? Ficou triste por Peggy ter te posto no artigo? Ela parece que tem uma obsessão com você...

   ─ Não, não é isso. É...ah, não sei.

   ─ Ah, que fofinha, você está triste porque não vai mais ser a novata.

   ─ Não é assim. É estranho, só isso.

   ─ Você já está nos nossos corações, minha linda. Vem, sorria.

   Sorri. Era sempre bom ouvir que você era amada, ainda mais quando você estava tristonha por um motivo tão besta. Ele tinha razão. Eu não precisava mais ser a novata. Eu não era mais. Eles já tinham entrado depois de mim. E Kentin, de certa forma.

   Pena que a gente não escolhe como se sentir. Sorri, mas continuei com aquela sombra de dúvida sobre mim mesma. Eu nunca fui de ter muitos amigos, e eu vivia com aquele medo de que ia ser a última opção das pessoas. Deixei aquilo de lado e falei que ia ao banheiro antes da aula.

   Abri a porta sem olhar e andei às cegas, até trombar em Castiel. Ele, surpreendentemente, nem me xingou. Só apanhou seu caderno no chão e me encarou, aquele sorriso sarcástico na cara.

   ─ Preocupada é? Não está nem vendo o caminho.

   ─ Tecnicamente, você trombou em mim também.

   ─ É, mas eu sei que estava distraído. O que foi? É a menina nova?

   ─ Já ficou sabendo?

   ─ Peggy está nos forçando a pegar os exemplares. Não sabia que ia ficar assim, triste.

   ─ Não estou triste, eu gosto de conhecer gente nova.

   ─ É, mas apesar de não ter sido a última a entrar na escola, era a última menina até então.

   ─ É, estranhei, eu confesso. Bom, tudo bem. Lysandre não está com você? ─ Para tentar trocar de assunto, eu escolhi um bem curioso. Ele voltou a dar o sorriso de lado e comentou do jeito brusco de sempre.

   ─ Você o vê por aqui?

   ─ Já entendi.

   ─ Ele vai te procurar de todo jeito. Nunca vi alguém gostar tanto de alguém tão problemática.

   ─ Ah tá, senhor solução. ─ Ele riu e fechou a mochila, tomando seu rumo sem nem dar tchau. Dei de ombros e voltei para a sala também, um pouquinho mais feliz. Eu gostava muito de Lysandre. Ouvir que ele também gostava tanto de mim me fez dar um sorrisinho bobo que até estranhei.

   Eu me sentei, ainda pensando no que Castiel tinha dito. Seria bom convidar Lysandre para algo, fora da escola, como forma de agradecimento. É, eu sempre gostava de vê-lo em diferentes ambientes. Como no nosso baile, ou no show, ou até mesmo lá em casa, quando viu seu retrato.

   ─ Anna! ─ Rosalya deu um berro, finalmente me despertando. O professor estava na sala, apenas aguardando todos tomarem seus lugares. Peguei meu material e fugi da pergunta.

   Quando a aula de Faraize finalmente terminou, depois de longos minutos, Rosa me parou no corredor, perguntando sobre o que eu estava pensando tanto.

   ─ Ah, era só... ─ Eu detestava a forma como Rosalya via através de mim, e já começava a arquear a sobrancelha quando suspeitava que alguma lorota ia sair de minha boca. Suspirei e tentei ser mais sincera. Não tinha porque esconder aquilo, certo? ─ Hum, Castiel me deixou pensando que eu podia agradecer Lysandre pela ajuda com um...sei lá, um passeio ou...

   ─ Um piquenique.

   ─ O que? ─ Alexy simplesmente surgiu ao nosso lado, sorridente. ─ Vocês querem fazer um piquenique? Eu super topo. A gente precisa se ver mais fora desse lugar horrendo.

   ─ Não, eu... ─ Eu ia explicar, mas então eu me toquei que Rosa entendeu errado também. Ela começou a fazer planos com ele sobre chamar a turma, o dia, o horário e tudo o mais. Acabei dando de ombros. Eu tinha pensado mesmo em sair sozinha com ele?

   ─ Anna, você chama o Lys, igual estava pensando. E os outros meninos também.

   ─ Ah, e a gente pode chamar as meninas. A Vi, a Iris, Peggy. Bela ideia, amiga.

   Sorri, ainda meio desnorteada com o mal entendido. Bem, nem tudo estava perdido, sim. Lysandre ainda poderia ir. Rosa olhou para mim de lado e continuou falando sobre o novo projeto de passeio.

   ─ Vamos chamar todo mundo que estiver disponível esse fim de semana para se encontrar na lanchonete. ─ Alexy arrancou seu celular do bolso e criou um grupo para mandar um mass text. “PIQUENIQUE ESSE FIM DE SEMANA, VAMOS! ENCONTRO AGORA NA LANCHONETE NA FRENTE DA ESCOLA.”

   ─ Uau, Alexy.

   ─ O rei da telecomunicação, princesa. Rosa, se quiser chamar Leigh...

   ─ Ele vai trabalhar. Anna, chame os meninos, ok?

   ─ Bom, eu vou atrás deles. Licença. ─ Aproveitei que já estava perto do grêmio e entrei, meio frustrada. Melody estava lá, e o sorriso dela quase sumiu ao me ver. ─ Oi gente. Mel, viu a mensagem?

   ─ A do Alexy? Sim. Obrigada.

   ─ Que mensagem?

   ─ Vamos fazer um piquenique esse fim de semana, no parque? Quer vir?

   ─ Hum, não vai dar. Eu estava pensando em passar um tempo com Ambre. Vocês devem estranhar, mas ela é minha irmã, afinal de contas. E parece que ela se aproximou desde que eu sai de casa.

   ─ Ela deve sentir sua falta. ─ Vi que Melody abaixou o rosto, mexendo com uns papéis. Eu sabia que ela devia detestar quando eu acabava tornando algo em um momento íntimo com Nath. ─ Bom, é uma pena. Você vai, Mel?

   ─ Vou sim. Pelo menos, vou tentar.

   ─ Boa. Vejo vocês por ai. Preciso ir atrás de Lysandre. Beijo, querido.

   ─ Tchauzinho.

   Deixei os dois sozinhos e fui atrás do menino que causou aquilo tudo. Lysandre estava no pátio, pronto para ir embora, então tive que dar uma corridinha para alcança-lo. Ele tomou um susto quando eu segurei seu braço. Soltei, sem graça.

   ─ Ah, desculpa. Eu só não quis te gritar feito uma louca, então vim correndo.

   ─ Oh, oi, Anna. Eu não te vi o dia inteiro. Precisa de algo?

   ─ Hum, não. Eu juro que não te procuro só quando preciso de ajuda. ─ Fiquei mais sem graça ainda. Será que ele entendia que eu gostava dele além de toda a ajuda que já tinha me dado? ─ É que estamos planejando um passeio no parque e eu queria saber se você gostaria de ir?

   ─ Ah, eu vi a mensagem de Alexy.

   ─ É. E então?

   ─ Hum, eu não acho que vou. Não gosto muito de eventos assim.

   ─ Ah. ─ Tentei ao máximo não deixar minha expressão facial denunciar a frustração que retornou com força total. Ah não ser que...Rosa sempre riu de mim com Lysandre, dizendo que eu devia ter mais coragem. Ele me fitava, enquanto eu pensava. E então, quando ele ia falar, eu soltei. ─ Bem, na verdade minha primeira ideia foi chamar só você. Digo, eu...

   ─ Eu adoraria.

   ─ Sério? Quer dizer, eu te devo um agradecimento por tudo que me fez e...Poderíamos ir em outro dia. Só nós dois.

   Respirei fundo, voltando a sorrir quando ele sorriu também, concordando com a ideia. A ideia de sair sozinha com ele me deixava nervosa. Não era a mesma coisa que sair com Alexy, Armin ou até mesmo Nathaniel. O motivo deveria ser óbvio, mas eu não tinha certeza. No fundo, eu tinha medo de estar confundindo tudo e realmente sentir apenas gratidão.

   Mas aquele sorriso...

   ─ Domingo?

   ─ Uhum, claro. Eu levo a comida.

   ─ Quer que eu leve bebida?

   ─ Claro. É. ─ Meu coração estava martelando, tão forte que eu conseguia senti-lo sem nem encostar a mão no meu peito. Controle-se, mulher. Ele concordou e disse que precisava ir. Eu também tinha que ir, então deixei ele ir antes de mim. Sozinha no pátio, soltei um gritinho de celebração.

   ─ Ei, vai ficar ai? ─ Alexy apareceu, o celular em mãos. ─ Anda, temos que decidir tudo.

   ─ Que felicidade é essa? ─ Rosalya questionou, cruzando os braços. Dei de ombros, dizendo que estava empolgada para sair com eles. Ela revirou os olhos e nos seguiu até a lanchonete.

   O barulho dos adolescentes enchia o recinto. Peggy tinha uma caderneta em mãos e uma caneta atrás da orelha. As outras meninas esperavam, conversando sobre a suposta aluna nova.

   ─ Olá, queridas, vamos logo com isso.

   ─ Oh, Alexy. ─ Iris pegou sua mochila na cadeira, abrindo espaço na mesa antes de perguntar. ─ Seu irmão não vai?

   ─ Gente, ele odeia lugares abertos. Luz do sol, árvores, isso tudo dá uma crise de abstinência nele.

   ─ A crise vem, na verdade, quando você toma o PSP dele.

   ─ E eu faço certo. Quem merece isso? Natureza e o garoto com o olho pregado naquela tela. Enfim, vamos ser só nós.

   Foi uma discussão até organizada. Nos juntaríamos no dia seguinte, às nove da manhã, numa árvore perto do lago. Eu ia ficar responsável pelas compras, por ser a que vivia mais perto do mercado. Concordei, pegando a lista que Peggy tinha feito durante a conversa. Ninguém podia dizer que ela não era organizada.

   ─ Acho que dez para cada dá e sobra. Eu uso o troco para comprar os pratinhos e garfos para todo mundo.

   ─ Boa, menina. Então Iris leva a toalha. Kim a caixa de isopor. Anna as compras. Eu vou chegar mais cedo para garantir nosso lugar. Rosa?

   ─ Acompanho Anna amanhã. Precisa de ajuda com as sacolas.

   ─ Tudo bem. Bom, o dinheiro. ─ Todo mundo saiu fuçando nas mochilas para encontrar as notinhas. Bia foi a única que disse que preferia levar a própria comida. Quem chamou aquela criatura? Ignorei e botei tudo na mochila. ─ Então, até amanhã, queridas.

   Fui para casa, os fones tocando as músicas mais felizes do meu celular. Seria um belo fim de semana. Um passeio com os amigos, uma tarde com Lysandre. Parecia estar indo tudo muito bem. Deixei o celular para despertar as sete e fui passar um tempo com minha mãe.

   Acordei cedo, tomei meu banho e vesti uma calça jeans e uma camiseta. O sol ia acabar esquentando lá para as dez da manhã. Peguei o dinheiro das meninas e a lista de comprar e deixei a casa, antes mesmo dos meus pais acordarem. O mercado acabava de abrir, então ainda estava vazio.

   Fui pegando as coisas enquanto ligava para avisar Rosa que já podia vir. Paguei e ela chegou com uma mochila, para facilitar a viagem das compras. Ela enfiou metade lá dentro e fechou o zíper, me deixando com o restante. Seguimos para o parque, onde Alexy já estava nos aguardando.

   Nove horas todo mundo já tinha chegado. Foi um encontro divertido. Depois de comermos e de conversarmos sobre os meninos, aproveitando que Alexy era o único garoto presente, decidimos descansar. Kim deitou no gramado, sob o sol. Violette começou o que eu acho que era um desenho. Bia e Melody continuavam conversando. E o restante foi até a beira do lago com Alexy, ficar vigiando os peixes.

   ─ Observando o céu, Kim? Não faz seu tipo.

   ─ Eu sei. Deita ai, guria. ─ Aceitei o convite e me deitei, olhando para o céu com algumas nuvens. Sorri. Era um belo dia. Tomara que também estivesse daquele jeito no dia seguinte. ─ E então? Gostando?

   ─ Adoro sair com vocês. Você?

   ─ Eu vivo ocupada. Descanso sempre é bem vindo. ─ Acabamos nos sentando, observando o desenho de Violette. Ela acabava de copiar uma foto do celular, nós todos sentados ao redor da toalha. Sorri para ela. ─ Sabe o que mais é divertido?

   ─ O que? ─ Kim me respondeu com o montinho de grama no meu cabelo e começou a rir. Abri a boca, indignada, tirando a planta da minha cabeça. ─ Ah, vai ser assim? Beleza.

   Corri e peguei uma das garrafas vazias, descendo até o lago e a enchendo. Kim me viu voltando e saiu correndo. Para a tristeza dela, eu ainda tinha as pernas mais compridas, então não demorou para eu alcança-la e virar a água no cabelo dela. E começou a guerra. Quando ela foi contra atacar, a água acabou caindo em Alexy, que declarou o combate.

   Duas horas de pura correria e água para todo lado. Quem começava a passar perto saia rapidamente, com medo de acabar entrando na batalha por acidente. Eu já estava molhada das cabeças aos pés, o cabelo começando a pregar ao redor do rosto e grama por toda a roupa, de tanto cair enquanto tentava fugir. Alexy e Rosa se uniram e me jogaram no chão, esvaziando outra garrafa bem no decote da minha blusa, me fazendo tremer mais ainda de frio.

   ─ Eu me rendo. ─ Tirei uma ponta de cabelo dos olhos e pedi ajuda para ficar de pé. Eles me ajudaram, rindo. Torci a camisa, vendo água o suficiente para encher outra garrafa escorrer. ─ Ai, que frio.

   ─ A gente devia ir embora. Todo mundo no parque já nos viu fazendo papel de doidos. ─ Rosa falou, tampando a garrafa e começando a juntar o lixo. Com a ajuda de todo mundo, foi feito num instante. ─ Prontinho. Agora, podemos encerrar o dia. Eu estou exausta.

   Já eram quase três da tarde. Se eu queria preparar algo para o dia seguinte, eu tinha que ir logo embora. Torci a camisa mais uma vez e juntei minhas coisas, acenando em despedida para todo mundo. Quando cheguei em casa, minha mãe quase deu um troço. Não passei nem perto do tapete caro dela e subi direto pro meu quarto.

   Após um belo banho e alguns minutos navegando pela internet, enquanto secava meu cabelo, encontrei uma receita de muffins que parecia ser simples, até para mim. Estava disposta a testar. Avisei meus pais que ia comprar algo para tomarmos um café da tarde e voltei ao mercado.

   Comprei uns biscoitos que minha mãe gostava e as torradas do meu pai, para então encher a outra sacola com os ingredientes que eu ia precisar. Paguei a conta pela segunda vez no dia e agradeci, voltando para o apartamento. E encontrando a criança mais assustadora do planeta bem no meu portão.

   ─ Nina, oi. O que está fazendo aqui?

   ─ Hum? Ah, oi, Anna. Você viu Lysandre hoje?

   ─ É fim de semana, Nina. Não.

   ─ Eu ouvi que ele estaria por perto esses dias.

   ─ É, não. Bom, se me der licença. Você deveria ir para casa. As ruas estão meio desertas hoje. Boa tarde.

   Subi as escadas, meio preocupada. Se aquela menininha sonhasse que eu estava para sair com Lysandre no dia seguinte, eu nem sei o que aquela cabecinha seria capaz de pensar. Parece meio surreal ter medo de uma criança, mas quando ela claramente tem algum distúrbio psicológico a ponto de perseguir e vigiar seu ídolo, era melhor se manter atenta.

   ─ O que está fazendo? ─ Minha mãe entrou na cozinha pouco depois do nosso café, onde eu estava tentando fazer os tais muffins. Contei para ela sobre a sobremesa, dizendo que eram um teste. ─ E têm algum motivo em especial?

   ─ Ah, não. São em agradecimento para um amigo.

   ─ Se o amigo não é o Nathaniel ou o Alexy eu já suspeito. E então? Qual deles?

   ─ Hum, Lysandre. Nathaniel nunca aceitaria comida sabendo que fui eu quem fiz.

   ─ Ah, o menino dos olhos diferentes. Vocês se aproximaram bastante desde o acidente da floresta, sim?

   ─ Somos colegas de classe. ─ Eu não quis mentir, porque ela perceberia, então decidi omitir informações. ─ E ele me ajuda bastante. Merece um agrado.

   ─ Tudo bem. Tente seguir a receita direitinho. Não queremos que ele vá para o hospital.

   ─ A senhora fala como se fosse a chef de um restaurante. Sai daqui, anda. Precisa de repouso. ─ Deu para notar que ela já estava irritada com todo o descanso pela cara que ela fez com a palavra repouso. Botei os bolinhos no forno. Na receita dizia que eles continuariam fofinhos no dia seguinte se eu os deixasse no forno, mesmo depois de desligado. Foi o que eu fiz. Voltei ao quarto, quando já tinha terminado, às quase onze.

   Agora, uma roupa. Pensei em ligar para Rosa ou Alexy para pedir ajuda, mas pensar em ter que explicar a situação toda e ainda aguentar os berros de “eu sabia” pela próxima hora não parecia tão bom assim. Olhei meus vestidos. Algo leve e comportado, fofo. Um vestidinho lilás que tia Ágatha tinha me dado. Sorri, deixando a roupa no banheiro para desamarrotar.

   No dia seguinte, tive que dizer ao meu pai que ia dar um passeio com Alexy e Rosa no parque para meu pai não se incomodar. Ele estranhou, já que tínhamos nos encontrado no dia seguinte, mas minha mãe me acobertou, dizendo que aquele seria mais privado. Agradeci mentalmente e deixei a casa antes que ele voltasse a questionar.

   Eu tinha combinado com Lysandre no mesmo lugar do piquenique com a turma. Ele estava lá, quando eu cheguei. E lá foi meu coração de novo, martelando com todo vigor. Respirei fundo, sorrindo. Ele me viu e sorriu, oferecendo ajuda com a cesta. Agradeci.

   ─ Bom dia. 

   ─ Bom dia, Anna. Eu trouxe uma toalha também. Não sabia se você ia se lembrar.

   ─ Quem costuma dizer isso sou eu. ─ Ri, aceitando a toalha depois de deixar a cesta no chão. Ele deu uma risada sem graça, se abaixando pra me ajudar a arrumar nosso lugar. ─ Oh, você trouxe suco de uva. Que bom.

   ─ Você gosta? É um dos meus preferidos, então eu me deixei levar.

   ─ Adoro. Bem, eu tentei te fazer um presente, daquele obrigado que eu tanto falo, mas eu sou péssima cozinhando. Pode ser que esteja uma porcaria.

   ─ Não deve ser tão ruim. Os muffins?

   ─ É. São de blueberry. Receita de internet. Eu realmente espero não te matar de intoxicação alimentar.

   ─ Calma. Você está sofrendo em antecipação. Vamos ver. ─ Ele pegou um dos bolinhos e me olhou. Tomei a decisão de provar junto dele. Se algo desse errado ninguém poderia dizer que não foi um acidente.

   ─ Ok. Pronto. ─ Respirei fundo e enfiei o bolinho até a metade dentro da boca. Se estivesse ruim era só engolir feito pato. Eu cheguei até a fechar os olhos de tanto medo. Ia ser a vergonha do século.

   Abri os olhos de novo quando ouvi Lysandre rir abafado e morder outro pedaço. Só então eu me concentrei no gosto na minha boca. Era bom. Surpreendentemente bom. Quer dizer, fui eu quem fiz. Era pra estar seco e sem doce.

   ─ Gente, eu consegui fazer algo gostoso. Incrível. Bom, então agora o obrigado é válido. Obrigada.

   ─ Hum, Anna... ─ Olhei para ele, vendo que o muffin já tinha acabado. Ia perguntar o que havia, mas ele se inclinou por cima da toalha quadriculada, vindo na minha direção, rápido o suficiente para me paralisar no lugar e ficar imaginando mil cenários diferentes. ─ Aqui, deixa eu limpar.

   Ele passou a mão grande pelos cantos da minha boca, tirando farelo de muffin do meu rosto. Tinha sido um dos cenários que minha cabeça criou, apesar de não o melhor deles.

   Ter o rosto de Lysandre tão perto assim só serviu para apagar 90% da dúvida que eu tinha sobre o que eu sentia. A gratidão estava lá, só não era o nome desse sentimento que eu tinha por ele. Se é que eu sabia nomear aquilo.

   ─ Obrigada. ─ Murmurei, ainda perdida naquela linha de pensamento. Ele deu um sorriso, exibindo a fileira de dentes brancos. Era normal se imaginar passando a língua nos dentes de alguém? Quer dizer, não é a primeira coisa que a gente pensa quando está afim de alguém, é?

   ─ Você fez um bom trabalho com os muffins. Parabéns. Talvez você só precise de um pouco de prática para a culinária.

   ─ Eu confesso que não é meu hobby preferido. ─ Acabei com meu muffin pela metade e limpei as mãos, ainda sentindo nas bochechas o contato que tivera antes com a palma de Lys.

   Foi uma tarde um tanto agradável. Conversamos um tempo, aproveitamos um pouco do sol. Ele me contou alguns casos de família depois que eu acabei comentando algo sobre Viktor. Acho que ele ficou com medo de eu ficar para baixo e quis me animar. Não acho que era muito coisa que o convencia a falar da família. E o esforço dele até que foi válido.

  Com o passar do tempo acabamos indo parar um ao lado do outro, escorados numa árvore. Eu mexia com a fivela do sapato, tentando fingir que não tinha ido de salto para um piquenique, enquanto ele comia o último muffin, agora já meio duro. Ele não pareceu se importar.

  ─ Foi uma tarde divertida. ─ Arrisquei, meio sem olhar na sua direção. Lá vinha a bateria de samba que eu chamava de coração. Ele limpou a boca antes de concordar, me olhando. ─ A gente devia fazer de novo.

  ─ Sim. Eu gosto de passar tempo com você. Anna, eu realmente gos...

  ─ Ei, gente. ─ Tomei um susto com a voz animada, finalmente notando o quanto eu tinha aproximado meu nariz do de Lysandre. Ele piscou também, olhando para a frente. Iris acenava, um garoto também ruivo com cara de paisagem bem ao lado. ─ Não sabia que vocês iam voltar aqui hoje. Só estão vocês?

  ─ Iris, acho que você acabou de atrapalhar o casal. ─ O menino comentou, quase me fazendo engasgar na minha própria saliva.

  ─ Thomas, que ideia. Esse é meu irmão.

  ─ Ele é o dono da guitarra?

  ─ Eu mesmo. Você deve ter sido quem organizou o show. Prazer.

  ─ Oi, Thomas. Anna. E esse é o Lysandre.

  ─ O cantor? Iris comentou de vocês na época do show. ─ Os dois fizeram conversa rápida em alguns poucos minutos antes de Iris checar a hora e dizer que tinham que ir. ─ Foi um prazer conhecer vocês. Até mais.

   E os dois atravessaram o parque e sumiram. Confesso que fiquei feliz por Iris ser tão lerda, mas o encontro aniquilou qualquer clima que minha cabecinha fértil poderia estar criando. Ele me ajudou a juntar as coisas e disse que também devíamos ir. Concordei, pegando a cesta agora leve.

   Ele me deixou no portão e esperou eu subir para só então ir embora. Subi correndo pro meu quarto, nenhum dos meus pais estava a vista. Fui para a escada de incêndio, vendo o cabelo branco se afastando pela rua. Meu coração só ia se acalmando à medida que a distância ia crescendo.

   ─ Ai, Lysandre. Quando foi que isso aconteceu? ─ Sorri, distraída, lembrando da mão dele no meu rosto.                    


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Notas finais do capítulo

Pra uma leitora ai que decidiu shippar Lysanna ♥