Monarquia escrita por Thaís Romes


Capítulo 32
War.


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoinhas!
Bom, atendendo a pedidos, o capítulo hoje está bem diferente, mas espero que curtam tanto quanto eu curti escrevê-lo.
Boa leitura!



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SELINA

Durante os anos em que conheço Bruce, sempre existiu um grande motivo para não nos tornarmos oficialmente um casal. Sou quem sou, e não vou me moldar a um conceito pre concebido do que deveria ser. Ele respeita isso, mesmo as vésperas de me tornar rainha, vejo em seus olhos uma aprovação muda, sempre que me recuso a seguir um protocolo idiota ou outro. Ele simplesmente acena de leve a cabeça para o conselheiro mais próximo, e pergunta onde precisa assinar para tirar tal coisa dos termos. Sinto que evoluímos muito em poucos meses, e me vejo fazendo concessões que nunca faria antes, e na maioria delas acabo descobrindo não ser um sacrifício no final das contas.

Por essa razão, de todas as tarefas que ele me pediu para cumprir, a que estou prestes a fazer é a mais complicada. Conheço Clark a muito tempo, costumávamos sair com ele e Lois quando tudo era menos complicado, o que parece ser a anos luz de distância. Lane é meu tipo de garota, decidida, proativa e cheia de opinião própria. Agora tem essa tal de Diana, que só conheço pelas revistas, sem falar da província bizarra de onde ela vem. Já ouvi um milhão de histórias sobre homens sendo castrados em Themyscira, e bebes sendo entregues a adoção, por causa do sexo. Nada nunca foi confirmado, mas também nunca se deram ao trabalho de negar.

—Boa tarde. –cumprimento ao abrir a porta do grande salão, onde Alfred serviu nosso chá.

O palácio ainda me é estranho, mas com toda essa ameaça de guerra, fui obrigada a me mudar antes da hora. As paredes do salão eram trabalhadas com vigas e pilastras douradas e pinturas dos ancestrais da família real, Grayson, o capitão da guarda, costuma usar de sarcasmo para identifica-los.  Pode soar desrespeitoso, mas observá-lo fazer piada dos Wayne, foi a única coisa que me ajudou a decorar o nome de todos.

Diana estava de costas par mim, observando através de uma janela a província. Ela é muito mais bonita pessoalmente, de uma forma intimidadora. Seus longos e ondulados cabelos negros, pendiam em suas costas, sobre o vestido vermelho que usava. Seu porte era esguio, porém com curvas generosas, como se passasse um bom tempo na academia, mas quando se virou para me receber pude perceber que talvez não seja esteira, abdominais e alteres que lhe renderam aquele físico. Seus olhos azuis e grandes possuíam muita segurança, e algo neles me fez reprimir a vontade de me encolher.

—Srta. Kyle, é um prazer conhece-la. –me oferece a mão dispensando minha reverencia.

—Igualmente, alteza.  –respondo com um sorriso simpático nos lábios. –Sinto muito por meu atraso.

—Não tem problema algum, e por favor, me chame de Diana. –se vira novamente para a janela, com o olhar perdido na imensidão. –Faz tempo que não ficava só, com meus próprios pensamentos. –confidencia.

—Acho que consigo te entender. –paro a seu lado, vendo a província nebulosa em nossa frente. –Sente falta de Metrópoles, ou Themyscira?

—Definitivamente de Themyscira. –um sorriso triste surge em seus lábios, antes de se virar novamente para me olhar. –Bruce pediu para que me fizesse companhia?

—Sim. Ele deseja que se sinta em casa. –ela solta um riso curto.

—Ouvi histórias sobre você, aliás, sobre vocês quatro, e o que faziam para despistar a guarda e a imprensa. –perco o ar por um segundo, Diana sorri com doçura ao perceber isso e me indica o sofá. –Imagino que tentar me fazer sentir em casa agora, não seja muito confortável.

—Na verdade, não é mesmo. –respondo com sinceridade, nunca tive saco para fazer rodeios, e pelo que percebo ela menos ainda.

—Se serve de consolo, odeio estar aqui e não no conselho de guerra com eles. –dá de ombros. –Em Themyscira, nós governamos. Existem príncipes consortes, mas nunca um rei. –ela sorri mais uma vez, diante do meu silencio. –Somos um povo que enaltece as mulheres, as reconhecendo como provedoras da vida. O que nos torna párias em um mundo machista.

—Tem razão. –concordo, vendo a coisa toda por outros olhos. –Acho que só tenho receio, por causa de todos os boatos. –confesso e Diana solta uma risada divertida.

—Pode perguntar o que quiser, não precisa estar desconfortável com minha presença.

—Assassinam garotos ao nascer? –sussurro, olhando para os lados.

—Não! –ela parecia se divertir com meu desconforto. –Eles apenas não exercem cargos políticos, mas temos médicos, artistas e advogados. Os homens podem ser o que quiserem em Themyscira. A única diferença, é que precisam lutar tanto quanto uma mulher para alcançar seus objetivos.

—Me parece um bom lugar para se morar. –concluo.

—Srta. Kyle...

—Pode me chamar de Selina. –a interrompo.

—Claro, Selina. –testa. –Posso te fazer uma pergunta?

—Se eu puder responder. –sorrio.

—Pesquisei a seu respeito. Vem protestando a favor do meio ambiente a anos! –noto certa admiração em sua voz. –Por que mora em Gotham? Quero dizer... Olhe para essa província! –aponta na direção da janela, onde até mesmo o ar é meio acinzentado. E respiro fundo antes de responder.

—Por que precisaria lutar pelo meio ambiente onde as pessoas tem plena consciência da importância dele? –devolvo a pergunta a ela, lhe oferecendo uma xícara de chá.

—Ser rainha, vai te limitar. Tem consciência disso? –seu olhar era sério.

—Limitou você? –sorrio com certo sarcasmo que não pude conter.

—Eu seria rainha de qualquer forma, não nasci com o privilégio de uma escolha, como você.

—Não é a mesma coisa, e você sabe. –argumento. –Se fosse a rainha de Themyscira, seria a governante, e ninguém teria mais poder do que você. Não precisaria andar a dois passos de seu rei, ou estar aqui comigo, quando deseja realmente estar no conselho de guerra. –sinto meu celular vibrar em meu bolso, era Bruce querendo saber o que já havia descoberto, sempre impaciente!

—Você realmente não faz rodeios, não é mesmo?

—Não temos tempo para isso mais. –dou de ombros, cansada.

—O que quer saber na verdade? –Diana me encara, séria. –Vá em frente, pergunte!

—Por que se casou com um príncipe herdeiro? –solto em um só fôlego.

—Por que vai se casar com um rei? –sorri. –Não é tão diferente de mim quanto faz parecer.

—Por que amo o Bruce. –digo com sinceridade. –E ele me ama, mas sei que quando ficou noiva, Clark estava prestes a se casar com Lois Lane. –Diana engole em seco, e vejo tristeza em seus olhos, o que me pega de surpresa.

—Bruce não confia em mim. –não era um pergunta.

—E pode culpa-lo? –ergo uma sobrancelha. –Poucos meses após o casamento arranjado às pressas de vocês, Clark passou a ser caçado na própria província, nem mesmo os pais dele puderam o defender.

—Não foi minha a culpa. –Diana se levanta, altiva. –Viu que os governantes de Starlling descobriram que o guarda dele estava nos traindo!

—Então por que se casou? –não consigo entender, e agora depois de conhece-la, ficou pior ainda deduzir.

—Não sou a vilã, e se estão procurando um não deveriam perder o tempo de vocês comigo! –exclama se dirigindo para a porta, mas assim que ela a abre, escutamos o primeiro estrondo, e sinto o chão tremer sob meus pés.

Três anos atrás...

—Por que essa mochila está tão pesada? –questiona.

—Vai descobrir logo!

—Tem certeza que isso é seguro? –Bruce parecia desconfiado, enquanto me seguia correndo pelas ruas escuras e sujas de Gotham.

—Precisa conhecer de verdade sua província, ficar atrás dos muros do castelo revisando planilhas, não vai te mostrar. –grito de volta. –E puxe esse capuz para frente. Não quero o Alfred gritando comigo por te fazer estampar uma capa de revistas com mais um escândalo!

Ele puxa o capuz do moletom preto que usava, e avançamos com mais velocidade, até chegarmos a um beco, onde três garotos pareciam vender algo para uma menina em um vestido azul, com ar de riquinha. Coloco minha mão no peito de Bruce o impedindo de interferir, e observamos a garota comprar seja qual for a droga. Vejo a escada de incêndio sobre nossas cabeças, e a aponto para ele, que a puxa para baixo com um único movimento rápido.

—Sabia que todo aquele treino de madrugada, me seria útil em algum momento! –provoco em um sussurro, apertando de leve o músculo de seu braço, antes de dar um salto e começar a subir a escada, com ele logo atrás.

—Não parece ter dificuldade em fazer nada disso. –comenta, o que para Bruce Wayne, significa perguntar de forma não invasiva.

—Sou uma atleta, não tem por que ser difícil. –dou de ombros o deixando frustrado, mas não falaria sobre todos os meus anos de prática.

—Quer me mostrar mais pessoas vendendo drogas? –sinto a impaciência nada contida em sua voz quando alcançamos o alto do prédio.

—Não grandão. –sussurro em resposta, o tomando pela mão e indo em direção ao outro lado do prédio. –Quero que veja aquilo. –aponto para baixo, onde crianças dormiam em cima de papelões, em um beco fedorento em frio. –Essa é a realidade que precisa conhecer. –Bruce parece não ter palavras, mas sei que ele ama seu povo, posso ver o choque em seu rosto quando pela primeira vez na vida se sente incapaz.

—Meu pai construiu abrigos por toda a província, a fim de dar a essas pessoas um lugar para morar. –murmura em choque. –Por que não estão neles? –sorrio encantada com a inocência dele.

—Já esteve em um abrigo, alteza?

—Não gosto quando me chama assim. –responde, sem tirar os olhos das crianças encolhidas por causa do frio. –Qual o problema dos abrigos?

—Existe um prazo para cada criança permanecer neles, e uma série de burocracia que impede outras de se quer tentar. –conto tirando minha mochila das costas. –Temos que descer! –anuncio fazendo o percurso que já repeti milhares de vezes em minha vida.

 Me penduro na beirada do prédio, até sentir com os pés a grade da escada de incêndio que ficava ao lado do beco, e caio com um baque surdo. Bruce observa meus gestos com atenção, então simplesmente pula direto na cerca, como um verdadeiro ginasta. Deus, não tem como esse cara ser mais sexy!

—O que está fazendo? –pergunta, quando volto a colocar a mochila nas costas e passo a descer as escadas.

—Vai finalmente descobrir por que essas mochilas estão pesadas! –sorrio para ele, antes de me aproximar das três garotas, que estavam mais afastadas do resto do grupo.

Kate, Jessica e Cassandra tem respectivamente dezessete, quatorze e onze anos. Kate é ruiva, com a pele muito clara e um rosto delicado. Jess se parece com uma boneca desenhada por um profissional, com seus olhos azuis e grossos cabelos louros, que mesmo sujos ainda a deixava bonita. Cass é minha preferida, moleca com seus cabelos curtos negros, e o rosto sapeca. Ela faz com que me lembre de mim mesma a alguns anos atrás. Deus sabe o que eu fiz para sair das ruas, não me orgulho, mas faria novamente se necessário.

—Oi linda. –acaricio os cabelos da Cass, que se levanta assustada, acordando Kate, que se ergue com um pedaço de madeira nas mãos, para proteger as outras. Jess é a primeira a me reconhecer e arranca o graveto das mãos da amiga.

—É só a Selina. –murmura, e vejo o rosto de Kate relaxar antes das três se atirarem em meus braços.

—Desculpe não passar aqui mais cedo, tive problemas no trabalho. –conto abrindo a minha mochila e entregando a elas vasilhas com comida, e garrafinhas de suco. –Princesa, pode ir acordar os garotos? –pergunto a Cass que sai em direção aos três meninos que dormiam mais afastados. Olho para Bruce que observava do outro lado, encostado na parede.

—Quem é aquele? –Kate questiona desconfiada.

—Um amigo. –respondo com um sorriso tranquilo. –Vou apresenta-lo assim que os garotos chegarem. –digo ao ver três adolescentes altos andando em nossa direção. –Oi Terry! –cumprimento o primeiro que se aproxima, com um toque de punhos. –Jean, Tim! –abraço os outros. –Precisamos conversar depois. –sussurro para Tim, que desvia os olhos dos meus no mesmo instante. –Quero apresentar alguém a vocês! –anuncio estendendo minha mão para Bruce, que se aproxima com cautela. –Esse é Bruce. –digo e vejo o queixo dos garotos cair quando conseguem ver o rosto do príncipe na escuridão.

—Alteza! –dizem sem jeito, fazendo reverencias estranhas.

—Olá. –Bruce tira a mochila das costas e a estende em minha direção, me recuso a pegar, o incentivando a abri-la. –Acho que Selina trouxe mais coisas para vocês. –fala se abaixando, para ficar da altura da Cass, que sorri sapeca pra ele. –Quer me ajudar? –ela confirma balançando a cabeça, e começam a abrir a mochila. Bruce retira os cobertores e seis maçãs, garrafas de água e pacotes pardos com o lanche que os seis levariam a escola no dia seguinte.

Conversamos por horas com as crianças, Bruce parecia entre a indignação e admiração ao ouvir as histórias dos seis. Cass se sentou em meu colo, estava começando a ficar cumprida demais para isso, mas não me importo com esse detalhe, apenas a aperto com cuidado e tento entender que não posso carrega-la comigo para minha casa. A hora de ir embora é sempre a mais difícil, os abraço e puxo Tim para o canto.

—Por que não foi fazer sua prova? –pergunto o encarando séria.

—Não me lembrei que havia uma. –dá de ombros, mas vejo mais uma mancha em seu pescoço.

—Foi ele? –sussurro, tentando conter meu ódio.

—Selina, não é nada. Eu juro. –responde puxando a gola do casaco para cobrir o hematoma. –Legal você conhecer o príncipe. –brinca, tentando desviar o assunto.

—Conversei com sua professora, Timothy. –falo seria, o ignorando. –Consegui que te desse outra chance. Vou deixar a chave do meu apartamento em baixo do tapete, como sempre. Pode passar por lá, tomar um banho e se arrumar. Falta pouco para as inscrições na faculdade começarem, precisa ir bem na escola, me entendeu?

—Por que? Não vão aceitar um sem teto! –ver a falta de esperança em seu rosto me mata.

—Se eu consegui, você consegue. –murmuro pegando sua mão para que me olhasse nos olhos. –Tim, você é um gênio. –beijo seu rosto, tentando ser o menos sentimental possível, ele assente, e sorri para mim com tristeza. –Nos vemos amanhã.

—Claro. –responde, e me viro, dando de cara com Bruce que me observava de uma forma totalmente nova. Merda, ele ouviu o que eu disse!

Fazemos todo o caminho de volta para meu prédio em silencio. Tentava pensar em uma forma de contar a ele quem eu realmente sou, enquanto minha mente lutava de todas as formas para encontrar um caminho alternativo que não me expusesse. Ele por outro lado, parecia perdido em seus próprios pensamentos, com o semblante ainda mais fechado que o normal.

—Chegamos. –digo quando paramos em minha porta. –Não precisava me trazer.

—Não tem problema.

—Não queria que descobrisse sobre meu passado dessa forma...

—Selina. –me interrompe, quando começo a tentar me explicar, desajeitada. Olho para ele, percebendo pela primeira vez que seria um saco não o ter mais na minha vida, mas não vou me tornar uma pessoa diferente para fazê-lo gostar de mim. Não mesmo....

 Minha linha de raciocínio é interrompida quando ele me beija com paixão. Sinto que só existe Bruce Wayne ao meu redor, e me perco em seus braços fortes que me puxavam para mais perto, sem parar. Quando finalmente o beijo chega ao fim, não consigo desfazer o semblante assustado.

—Você me beijou? –sussurro em choque, e vejo seus lábios se retorcerem em um sorriso discreto.

—Você me olhava como se sua cabeça fosse explodir. –responde.  –Foi minha forma de desativar a bomba.

—É... gostei. –digo meio abobada, o puxando para outro beijo.

—Você arruinou qualquer chance que ainda tivesse de te superar, algum dia. –ele sussurra com a testa encostada na minha. Nós sempre soubemos que não poderíamos nos levar a sério, mas não significa que em algum momento a nossa teimosia crônica não tenha feito isso por conta própria. –Eu realmente gosto de você, Srta. Kyle.

—Você é noivo desde que nasceu, praticamente. –respondo, para reprimir as três palavrinhas que realmente gostaria de dizer e que com toda certeza, arruinariam a minha vida.

—Eu sei. –nos afastamos a contra gosto. –Por que aquelas crianças estão nas ruas? Não parecem exatamente como “sem-teto”.

—Por que não são, não exatamente. –respondo destrancando minha porta, não discutiria nada disso nos corredores. –Tim, Jess e Cassandra sofriam abuso dos padrastos e namorados das mães. Acabam fugindo de casa de tempos em tempos. –respiro fundo, contendo minha raiva. –Hoje mesmo vi um novo hematoma no pescoço do Tim.

—Sinto muito.

—A mãe de Kate tem transtorno bipolar, ela tentou ficar por muitos anos, mas um dia a mulher afirmou que precisava lavá-la, e tentou jogar água fervente na filha enquanto ela dormia. Ainda estremeço ao me lembrar como foi. Terry tecnicamente deveria morar com uma tia avó, que ao invés de cuidar dele, rouba a pensão que ganha pela morte dos pais, e maltrata o garoto. Jean viu o pai ser morto por um traficante, e a mãe enlouqueceu de tristeza depois disso, passa dias sem nem mesmo se levantar da cama. Ele não entende por que ela não consegue ser forte por ele, e resolveu deixa-la. Não posso culpa-lo, era ele quem deveria ser cuidado, não ela. Não agora.

—Você ama essas crianças. –conclui ao ver meus olhos marejados, e sinto sua mão em meu rosto.

—Queria poder trazê-los para cá, mas os moradores do prédio são idiotas mesquinhos! –praguejo irritada. –Ainda assim, eles passam as vezes quando ficam mais de dois dias na rua, para tomar banho e essas coisas. –Cassandra é a que mais me preocupa. –passo a mão em meus cabelos. –Tentei adotá-la, mas não sou exatamente uma boa candidata, não com o meu histórico e a vaca da mãe dela fazendo teatrinho de boa moça!

—Como assim? –seus olhos não deixavam meu rosto, chego a sentir sua análise de todos os fatos que estava contando.

—Eu fugi de casa aos treze anos, meus pais.... Bom, se um dia estivermos a beira da morte juntos, me pergunte sobre eles e ficarei feliz em contar. –dou de ombros. –Passei sete meses no sistema, pulei de abrigo em abrigo por mais dois anos, até que aprendi que existem coisas que você precisa fazer acontecer. Foi quando passei a me virar por conta própria, e sabia que se um dia quisesse sair de onde estava, precisaria ser alguém. Aos dezesseis anos conheci um cara... Olha, tem certeza que quer mesmo saber disso?

—Selina, nada vai mudar, eu te prometo.

—Não pode prometer, mas tudo bem. Esse cara se interessou por mim, e eu precisava de uma casa como endereço fixo, para minhas inscrições para a faculdade, e me arrumar um pouco para as entrevistas...

—Você ficou com esse homem? –não havia julgamento em sua voz, só estava tentando me oferecer uma saída quando percebeu que eu não conseguiria falar de cara. Confirmo com um aceno.

—Por dois anos, então me estabeleci em Blue Vele. Foi um novo começo para mim. – deixo meu corpo cair, me encostando no suporte do sofá. -Isso muda alguma coisa?

—Um pouco. –sinto meu coração se apertar ao ouvir sua resposta. –Sei que você fez o que podia, e não te julgo, se é o que está me perguntando.

—Obrigada. –sorrio com sinceridade.

—Esse garoto, Timothy. É mesmo um gênio? –fico feliz por ele mudar de assunto.

—Sim! Ele fez dezoito anos a algumas semanas, e começamos a mandar as inscrições para a faculdade na semana que vem. Vou ser o endereço dele. –conto feliz. –Kate também começa esse ano.

Agora...

 

—O que está acontecendo? –Diana grita, voltando para a sala e olha em volta como se procurasse por algo.

—Estamos sendo atacados. –concluo.

A vejo me lançar um castiçal, e pegar parte de um suporte para cortina para usar como arma, tranco a porta e empurramos juntas o sofá na direção dela. Enquanto isso os estrondos continuavam por toda a parte.

—Essas coisas não vão ser muito úteis! –aponto para o castiçal em minha mão.

—Tem alguma ideia melhor?

—Andem logo! –um quadro na parede é arrastado, e vejo Tim com o uniforme da guarda passar por ele. –Corram! –entramos apressadas pela passagem.

Nós o seguimos em direção a um abrigo. O lugar era pequeno, mas tinha dois beliches, uma pia, uma portinha que dava em um banheiro minúsculo, um armário de metal com suprimentos e um telefone por satélite.

—Tim, onde está o rei? –questiono assustada, na porta do abrigo, impedindo Tim de nos fechar lá dentro. –E os outros?

—Preciso saber do Clark! –Diana exige.

—Estão seguros, os dois. –responde nos olhando nos olhos. –Terry levou Cassandra e a Jess para um abrigo perto da cozinha, Jean e eu estávamos junto da guarda pessoal do rei quando escutamos o primeiro estrondo, o Rei Bruce ordenou que encontrasse vocês, imediatamente na sala dos retratos.

—Não podemos ficar aqui! –protesto com a garganta embargada, e sinto a mão de Diana em meu ombro. –Você não pode voltar sozinho!

—Vou ficar bem, Selina. Sou treinado para isso a anos. –sorri tentando me passar segurança, mas só consigo ficar ainda mais tensa. –É uma invasão pequena, querem nos distrair. Aqui, pegue isso. –me entrega uma chave pequena de metal. –No banheiro ai dentro, vai encontrar um armário trancado, essa é a chave, tem armas lá. Essa porta só pode ser aberta do lado de fora, então espere que alguém venha buscar vocês. Se cuidem.

—Tim... –tento protestar, mas ele tira minha mão do batente e bate à porta com força. Encaro a porta fechada por alguns segundos, tentando fazer com que minha ficha caísse.

—Vamos ficar bem. –Diana diz, mas sua voz estava tão embargada quanto a minha.

—Não é com a gente que estou preocupada no momento.

—É, eu sei.

Acho que passamos horas, ou minutos em silencio, não saberia dizer. Cada segundo me parecia uma eternidade, até que o telefone na prateleira de metal começa a tocar, e Diana e eu nos olhamos, tentando decidir se atendíamos ou não. Ela se levanta correndo e pega o telefone.

—Alô? -vejo seu rosto tenso se aliviar e aperta o botão do viva voz. –Estamos bem, ela pode te ouvir agora.

“Selina, como você está?” A voz grave de Bruce sai pelo telefone.

—Bem, não se preocupe comigo. Como você está? Sabe se os garotos estão bem?

“Mandei o Sr. Todd ficar com Cassandra, Jess e alguns funcionário no abrigo em que elas estão. Terry, Jean e Tim estão aqui com minha guarda pessoal.”

—O que aconteceu?

“A maior parte das tropas foram frustradas pelos soldados de Starlling que Oliver nos mandou, eles acamparam nas fronteiras e obstruíram a maior parte das entradas. Os poucos que conseguiram passar, foram esses que invadiram o castelo, mas não foi um problema assim tão grande, fizeram mais barulho do que um real estrago. Agora estamos verificando se conseguimos conter o ataque por completo, e logo estarão buscando vocês.”

—Por favor, não seja um herói. –murmuro, deixando o egoísmo tomar conta de mim.

“Vou ficar bem.”

“Diana?” outra voz toma conta da linha.

—Clark! –ela exclama, sem conter um sorriso enorme que surge em seu rosto. –Você está inteiro?

“Sim.” Posso ouvir o sorriso em sua voz. “Não se preocupe, não vai ficar viúva hoje.”

—Acho bom. –a vejo dar um pequena risada, cheia de alívio.

“Precisamos ir, fiquem calmas que vai ficar tudo bem.” Clark com certeza é bem mais otimista do que Bruce, meu noivo não diria isso sem antes passar o pente fino no castelo umas três vezes e checar todas as baixas, tanto dos seus homens, quanto nos de Oliver.

“Nos vemos em breve.” É a forma de Bruce se despedir, mas sei que quando estivéssemos sozinhos seria diferente, ele não precisaria ser o rei.

—Nos vemos em breve. –respondo.

—Se morrer, eu te trago de volta, só para te matar de novo! –Diana se despede, e conseguimos ouvir a risada de Clark, seguida por um “Sim, senhora.” Então voltamos a ser apenas nós duas nesse cubículo de metal.

—Você o ama. –as palavras escapam por meus lábios, com mais surpresa do que gostaria. Diana suspira, voltando a se sentar na cama que estava antes, e me sento na outra em sua frente.

—Fui obrigada a me casar. –começa a narrar, como se estivesse cansada de guardar aquilo só para si. –Eu amei um homem em minha província, seu nome era Steve Trevor. –um sorriso triste passa por seus lábios.

“Steve era piloto da guarda, o melhor que já tivemos. A maior parte do exército de Themyscira é composto por mulheres, mas Trevor merecia o posto que possuía. Nós conhecemos em um dos meus treinamentos, ele veio falar comigo, sem me reconhecer a princípio. Queria corrigir um de meus golpes, aquele abusado!” ri com ela mesma. “Nós ficamos mais próximos a cada dia, até que cansei de me esconder e disse a minha mãe que desejava me casar com ele. Como te disse antes, em Themyscira só existem príncipes consortes, mas Trevor não era qualificado para isso, ele era um guerreiro, e um guerreiro poderia desejar arrancar o trono de minhas mãos a força.” Uma lágrima escorre por seu rosto, e me sento a seu lado, sem saber o que mais fazer nessa situação.

—Mas ele faria isso?

—Não! Claro que não! –exclama. –Mas as conselheiras pensaram que sim, e duas semanas depois encontraram o corpo dele boiando as margens do rio de Themyscira.

—O meu Deus! –não consigo conter o horror em minha face. –Eu sinto muito.

—Obrigada... Eu não poderia mais ficar lá, e não responderia por mim se colocasse as mãos em quem foi o responsável por aquilo. Então soube dos rumores dos reis de Metrópoles estarem tentando arranjar um casamento para o príncipe.

—Mas disse que foi obrigada a se casar? –questiono confusa.

—Eu fui. O que faria se descobrisse que sua mãe foi responsável pela morte do homem que você ama? –bom, minha mãe não é o melhor exemplo, então ela pode ver com clareza a raiva que passa por meus olhos. –Exato. Eu precisei ficar o mais longe possível de lá, e Clark acabou sendo melhor do que esperava. Encontrei um verdadeiro amigo. –ela sorri enxugando as lágrimas. –Aprendi a admirá-lo, e essa admiração pode ter se transformado em algo maior.

—E ele?

—Você quer dizer, ele e Lane? –me corrige, e dou um sorriso culpado a ela. –Não tinha intenção de ser realmente casada com ele, se é que me entende. –confirmo com um aceno. –Disse que poderia vê-la se quisesse, não me importaria. Mas esse não é o tipo de homem que Clark Kent é.

—Eu sei...

—Então ele descobriu uma matéria que Lois planejava publicar. Coisas que só alguém da família real poderia saber, coisas que arruinariam a Monarquia de Metrópoles para sempre. Ela partiu o coração dele, Selina.

—Me desculpe, não sabia disso. –falo com sinceridade.

—Não tinha como saber, Clark fez um acordo com ela, e abafou todo o resto...

—Ele ficou com toda a culpa.

—Como um verdadeiro cavalheiro...

—Diana? –somos interrompidas pela porta se abrindo e um homem alto e forte passando por ela. Diana se levanta e corre para seus braços, desvio os olhos sem querer invadir a privacidade do reencontro dos dois. –Fiquei tão preocupado... –o escuto dizer, sem soltá-la.

—Parece estar desconfortável com toda essa demonstração de afeto. –sorrio ao reconhecer a voz grave, e me levanto de imediato.

—Bruce. –sussurro seu nome, e o vejo me dar o menor dos sorrisos, mas que para mim valiam mais que o mundo.

—Fico feliz por estar bem. –é tudo o que diz, e estende as mãos para segurar as minhas, damos um abraço breve e apertado. Sem rodopios ou palavras desesperadas, mas posso ver seus olhos cheios de alívio, e toda a sensação gigantesca de ter um imã nos puxando em direção um do outro.


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Notas finais do capítulo

Então é isso pessoal!
Espero por vocês nos comentários, por favor me digam o que acharam do capítulo, me contem coisas que querem saber ainda, conversem comigo, ou mandei um sinal de fumaça, só me deixe saber que estão ai.
Estou muito curiosa sobre a opinião de vocês quanto as histórias de Selina e Diana. Sempre adorei escrever sobre o ponto de vista da Selina, e foi muito legal fazer isso em Monarquia.
Bjnhos !