All Out War escrita por Filho de Kivi


Capítulo 50
All Out War – Part Four: What We Become


Notas iniciais do capítulo

Hei!

FINALMENTE ALCANÇAMOS A INCRÍVEL MARCA DE 50 CAPÍTULOS!

Palmas, muitas palmas para todos nós! Essa é uma marca para se comemorar, oras! Afinal, não é toda fic que consegue sobreviver até o episódio de número cinquenta!

Quero agradecer a todos que acreditaram que essa joça poderia dar certo. A todos que retiraram parte do precioso tempo de suas vidas para ler algo de minha criação, feito com todo o amor e carinho por esse falso filho de finlandês. Portanto, kiitos! Muito obrigado a todos!

Agradeço, hoje e sempre, a minha grande amiga Menta, que desde os primórdios, quando All Out War ainda era um embrião, me incentivou e me deu preciosas dicas para me tornar um escritor melhor! Muito obrigado, minha amiga! Você é parte integrante desse universo, e seu Hunter’s Instinct, não só é referenciado, como também serve de total inspiração para esse trabalho!

É claro que uma edição redondinha como essa, não poderia deixar de ser especial. Então, preparei para o capítulo de número 50 (seguindo a tradição das hq’s de The Walking Dead), um episódio gigantesco repleto de tiros, explosões, sangue, ação, drama... Um recorde de POVs dentro dessa história! Sete no total! Teremos Rick, Dwight, Leah., Rosita... Enfim, uma edição feita com muito esmero pelo Filho de Kivi e dedicada a todos os leitores dessa obra humildona! Espero que curtam...

Boa leitura!



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— Isso foi uma explosão?

Michonne tentara erguer-se, ainda tonta após o gigantesco estrondo que atingira a igreja. Os cacos de vidros ainda se encontravam perigosamente espalhados pelo chão. Tomados pelo espanto repentino, os líderes da Aliança que ali se reuniam, lentamente começaram a se erguer, já compreendendo o que estava ocorrendo.

— Temos que sair, precisamos posicionar os nossos homens nos muros! – Exclamara Rick – Não podemos ficar às cegas!

Ao deixaram a capela, um grupo de moradores já se aglomerava próximo ao local da explosão, visivelmente assustados, buscando orientação sobre o que fazer em um momento tão delicado.

Rick Grimes não tinha muito tempo para pensar, precisava agir e precisava ser rápido. Após tudo o que conseguira impetrar no Santuário, o xerife sabia que Negan não teria piedade. O objetivo daquele ataque era puro e simples, vingança. Os Salvadores destruiriam Alexandria se fosse necessário.

Mais até do que responder a altura, Grimes precisava se defender da fúria atroz dos milicianos. A primeira granada era, com toda a certeza, apenas um aviso do que estava por vir.

— Quem não poder carregar uma arma nas mãos, proteja-se! – Vociferara Rick – Juntem os moradores nas casas mais centrais, longe dos muros! Fiquem juntos e resguardem uns aos outros! – Ordenara – Eloise, Jesus, Michonne. Juntem os combatentes, espalhem-se pelos muros e...

KA-BOOOM!

Outra explosão se sucedera, dessa vez atingindo uma casa ao lado de onde o grupo se posicionara. Aqueles que se encontravam mais próximos, acabaram sendo lançados longe assim que a granada detonara. Uma coluna de fumaça se erguera, e chamas rapidamente passaram a se espalhar pelo pouco que restara da residência.

Caído ao solo, juntando a pistola que havia deixado escapar de sua mão, Rick levara o coto até um dos ouvidos, fechando os olhos enquanto um zumbido perpétuo não parecia querer abandoná-lo. Sua audição parecia ter se fechado completamente, e os pensamentos estavam mais lentos, as sinapses ainda tentando retornar a normalidade.

Gritara, nem sem saber se seria ouvido.

— Andrea, Goodwin... Tirem todos de perto dos muros! Tirem todos de perto dos muros!

A sardenta, os olhos arregalados e o mesmo incômodo demonstrado pelo policial, parecera não compreender sua repentina mudança de planos.

— O que você vai fazer? – Indagara, aterrada.

O líder da zona segura levantara-se, caminhando em direção aos muros. Sabia o que Negan queria, portanto, também sabia que poderia negociar um cessar fogo naquele momento. Subira pela estrutura construída para os sentinelas, esgueirando-se para não ser visto pelos invasores.

Negan trazia uma tropa grande, reforçada pelos homens do posto avançado que derrotara Ezekiel. Com um grande caminhão como carro chefe, o psicopata mandatário encontrava-se de pé sobre o capô de um dos veículos, com sua Lucille em uma das mãos e uma granada na outra, exibindo-as como um troféu.

Abaixara a cabeça no mesmo momento, tentando não ser percebido. Cerrara os olhos, buscando encontrar alguma saída, forçando o cérebro a traçar uma estratégia que pudesse minimizar os danos.

O fardo nunca havia sido tão pesado quanto naquele momento. Sabia que precisava carregá-lo, provavelmente para o resto de sua vida, mas não conseguia conjecturar quanto mais suportaria.

A estrondosa voz do assassino começara a reverberar.

— Rick! Vem aqui fora! Vem aqui fora, seja lá onde você estiver enfiado! Não precisa se borrar agora, eu só quero conversar! Mas saiba que há muito mais dessas belezinhas aqui com a gente!

Ele erguera ainda mais a granada, exibindo sua força bélica.

— Vem aqui fora seu filho da puta! Tenho certeza que já chamei a sua atenção! Mas se esses dois pipocos aí não foram suficientes... Olha só, tenho um presentinho para você!

O xerife arregalara os olhos assim que vira o que um dos homens do crápula retirara de dento do caminhão. Com um saco de pano lhe cobrindo o rosto, e amarras tantos nos pés quanto nas mãos, Holly era mantida como refém, sendo bruscamente puxada por um dos Salvadores.

Sentira uma nesga de alívio no peito. De todos os males que poderiam e que provavelmente ocorreram com a mulher que tomara o seu lugar na missão suicida, o pior não havia acontecido. Se Negan a trouxera viva até Alexandria, é porque de alguma forma ele deveria estar disposto a negociar.

Um cessar fogo não estava nos planos de Grimes, mas é claro que depois de tudo o que ocorrera, estava disposto a fazer o que estivesse ao seu alcance para salvar a vida de Holly.

Descera do ponto de observação, ainda sem ser percebido. Caminhara em frente aos demais moradores, ainda aguardando por uma ordem, por uma mera instrução que fosse. Com as feições sérias, Rick nada dissera, apenas caminhando silenciosamente em direção aos portões. Fora seguido pelos combatentes, já de armas em punho.

Rick chegara até o portal de entrada da comunidade. Do outro lado, os mais de cinquenta sujeitos, carregando os mais diferentes calibres de armas em punho, espalhavam-se por todo o perímetro, cobrindo toda a extensão da entrada da comunidade. Negan estava mais frente, enquanto que Dwight, que também fazia parte do grupo, segurava sua besta ao seu lado.

Um Salvador careca, de braços fortes a mostra por conta do colete que utilizava, segurava a refém pela nuca, que se debatia, atordoada.

— Estou aqui, Negan. – O xerife resguardara sua arma, tentando sinalizar que não reagiria – Solte-a. Eu abrirei os portões e assim que ela estiver segura, vou até você e então poderemos conversar.

Com o típico e maldito sorriso no rosto, Negan, revigorado após conseguir se libertar da armadilha imposta pela Aliança, parecia ter recuperado toda a confiança após a primeira vitória na guerra.

Porra, Rickzyto! Que mau humor é esse? Não vai elogiar o puta embrulho que eu fiz para você? – Ele apontara para Holly com o taco – Eu trouxe a sua vadia de volta. Eu sou tipo o Papai Noel pós-apocalíptico. Não vai mesmo me agradecer pelo presente? – Ele fizera uma pausa de alguns segundos – Tudo bem, sem problemas. Já estou acostumado com a sua ingratidão. Fox, entrega a putinha para eles!

O miliciano libertara a mulher loira, empurrando-a pelas costas. Cambaleante, ela quase tombara, mas seguira caminhando, sem rumo, apenas guiada pela voz de Rick.

— Holly, siga a minha voz. Está tudo bem, você está salva agora. – O xerife passara a destrancar os portões, aguardando a chegada da combatente. Ele olhara para Negan, extremamente revoltado apenas em mensurar o que poderia ter ocorrido com ela.

Ela não dizia nada, apenas balançava a cabeça algumas vezes enquanto tentava alcançar o caminho correto.

— Que porra você fez com ela, Negan? – Protestara Rick – Você a amordaçou?

O líder do Santuário soltara um muxoxo em desdém.

— Ela deve ter tido uma paralisia nas cordas vocais depois que eu regravei Garganta Profunda com ela! E quer saber? Me processe! Essa vadia estava falando merda demais. Você deveria cair de joelhos aos meus pés por trazê-la de volta. Quero negociar com você, seu ingrato de merda. Quero acabar com a porra dessa guerra!

Rick precisara engolir a seco. Sabia do que aqueles sujeitos eram capazes, portanto já imaginava os diversos tipos de tortura pela qual ela provavelmente fora abrigada a passar. E conhecendo Negan como conhecia, sabia também que de alguma forma ele tentaria atingir o seu emocional, possivelmente descontando naquela que se voluntariara a ficar para trás.

Abrira apenas uma brecha nos portões, que permitira a passagem de Holly. Yumiko, que encontrava-se mais próxima, fora a primeira a recebê-la, logo sendo amparada também por Rosita, que como médica da comunidade, precisava verificar quais ferimentos ela trazia.

— Por aqui, te peguei. Você está salva! – Exclamara a asiática, retirando o saco de pano que lhe cobria o rosto – Eu não acredito que esses monstros...

Assim que retirara o saco, Holly revelara o seu real estado. Os olhos leitosos, já sem vida, piscaram duas vezes, sendo libertos junto a um profundo grunhido, assim que sua mandíbula se abrira. Saltando sobre o tronco de Yumiko, a mulher loira conseguira morder o seu ombro, pressionando sua carne com os dentes, o sangue escorrendo e manchando suas roupas.

YUMI!

Magna correra até ela, puxando sua faca da cintura e cravando-a no occipital de Holly, exterminando-a em definitivo. Sua namorada parecia respirar com dificuldades, levando uma das mãos até o ferimento, tentando estancar o próprio sangramento.

Instintivamente Rick virara-se, assim que percebera o que estava ocorrendo. Com a arma em punho, voltara-se para Negan, mas não conseguira ser mais rápido que os gritos ordenados do chefe do bando miliciano.

ATAQUEM! AGORA!

 

*****

 

[ANTES]

— As pessoas não queriam que eu ficasse aqui... De repente parece que todo mundo começou a se importar com o que eu sinto, com o que eu faço. Parece que existe uma placa na minha testa escrito “cuidado, perigo eminente”. Me olham como se eu fosse uma bomba relógio, como se um problema fosse nascer de mim a qualquer momento...

— O grande problema é que ninguém me olhou assim quando descobriram a verdade. Ninguém me olhou assim quando o Vincent morreu, ou quando o Isaiah morreu... Hipocrisia. Não precisa ser muito esperta para saber o que é isso. Principalmente quando se vive todo santo dia.

— Sinceramente... Eu queria ir embora, queria encontrar um novo lugar para viver. Queria que essa merda de guerra acabasse de uma vez por todas... Eu nem sei mais se me importo com o resultado. Até mesmo porque, como disse a Enid, não vai haver vencedor. São dois lados se matando para saber quem perde mais.

— Eu prometo que se você sair dessa, eu até levo em consideração àquela sua proposta de morarmos juntos no Reino. Eu só quero que... Por favor, Tom... Por favor, não me deixe aqui sozinha. Eu não vou saber o que fazer se também perder você.

Leah Fisher segurava a única mão de Tom Price com firmeza. O corpo inerte do soldador encontrava-se em coma após a rápida cirurgia pela qual fora obrigado a passar. Rosita, Yumiko e a própria Leah haviam trabalhado incessantemente nesse caso, e a grande conquista obtida fora o fato de Price não ter morrido durante o procedimento.

Uma das balas atravessa o torso do corpulento homem, mas a outra havia se alojado no baço. Espinoza conseguira retirar o projétil, mas não sabia ao certo se havia realizado todo o processo com precisão, nem conseguia atestar quais danos haviam sido impetrados a ele.

Seu estado era uma grande incógnita, e sem um médico de verdade na comunidade, pouco se podia esperar. Uma real melhora seria praticamente um milagre. E já fazia um tempo que Fisher havia perdido sua fé. Principalmente após perder tanto em tão pouco tempo.

Em silêncio, os olhos fechados e as lágrimas retidas, a garota apenas esperava, aguardava que algo ocorresse. Algo que ela nem sequer sabia o quê. O som ritmado dos bips que avisavam que a respiração de Price, restabelecida após uma traqueotomia de emergência, seguia lenta, porém firme, era o único som no momento que se podia ouvir naquela sala.

Isso é claro, restrito apenas pelo fato de os pensamentos da jovem futura mãe serem silenciosos, já que dentro da sua cabeça, um mar em fúria e revolto, gritava em meio a uma ressaca que não parecia ter fim. Por mais que tivesse conjecturado que aquilo poderia de fato ocorrer, deparar-se com a realidade era sempre muito mais duro.

De repente a porta se abrira. Rosita e Yumiko deveriam estar na reunião, assim como Magna, que já havia tentado ter uma conversa com a adolescente, que pouco ouvira, totalmente em choque após ver Tom semimorto, arrastado em um pedaço velho de lona até a enfermaria. Ainda era cedo para que tivessem retornado.

— Carl?

Para a surpresa da adolescente, o filho do xerife adentrara ao quarto, fechando a porta delicadamente. Com o chapéu de boiadeiro sobre a cabeça e uma mecha de cabelo lhe cobrindo o ferimento no rosto, o garoto parecia resoluto. Olhava de cima para baixo em direção à menina.

— Alguém vai te falar para se acostumar com isso. – Dissera seriamente – Te falarão para se acostumar com esse sentimento de medo e tristeza. Vão te dizer que você vai se sentir melhor quando aprender a ignorar isso. – Ele fechara o olho, respirando profundamente – Não dê ouvidos a eles. Não importa o que aconteça, sempre se lembre desse momento. Nunca se permita esquecer... É muito fácil se perder assim.

— Aconteceu comigo quando perdi minha mãe e minha irmã... Sentir alguma coisa, mesmo que seja medo e tristeza, ainda vai te manter presa à realidade, ao mundo de verdade... Porque uma vez fora dele, é quase impossível retornar. E nós já vimos o que acontece com as pessoas que não conseguem retornar.

O menino estendera uma das mãos, aguardando pela resposta da adolescente.

Leah sentira um arrepio lhe subir a espinha. O sentimento não era bom e nem ruim, mas de certo modo, a sensação que tivera ao ouvir as profundas palavras do filho de Rick Grimes, fora reconfortante.

Ela estava com medo. Precisava urgentemente de apoio e acabara encontrando em quem menos esperava. Alguém que aparentemente já havia passado por todos aqueles estágios de dor e angústia. Alguém que não se perdera diante de tanto sofrimento.

Carl Grimes também precisara amadurecer abruptamente, e as cicatrizes que essas mudanças lhe deixaram, fizeram com que o menino se tornasse mais duro, porém, muito mais ciente a respeito do mundo ao seu redor. Aquele era o caminho para ela, precisava aprender a seguir em frente, a sempre encontrar novas motivações para seguir vivendo.

Nada que ocorresse ali seria realmente o fim. O ciclo ainda estava no começo, e o pequeno broto que carregava em seu ventre era o sinal mais do que claro de que sua caminhada ainda estava longe de terminar. Lutar por aquela criança, seguir em frente apesar de tudo faria com que Fisher honrasse a memória de Eileen e Harry, de Vincent, de Isaiah...

De Tom Price.

Ela não estava sozinha.

Segurara a mão que lhe fora estendida, erguendo o corpo e abraçando fortemente o menino, que retribuíra ao seu afago. Não precisara falar absolutamente nada. O abraço apertado, o sentimento de apoio, tudo aquilo era muito mais representativo do que um milhão de frases lançadas ao vento.

Leah precisaria ser forte. Agora mais do que nunca.

Um forte estrondo interrompera o momento dos dois jovens. Uma explosão que reverberara por todas as paredes do recinto. O impacto fora tamanho que a adolescente sentira o chão tremer. A energia elétrica da comunidade fora cortada no mesmo instante.

Ela virara-se para Tom, correndo em direção ao companheiro. Os aparelhos que auxiliavam sua respiração haviam se desligado, assim como todas as outras máquinas. Ela tocara sua mão, tentara sentir sua pulsação, mas estava nervosa demais para conseguir aferir algo. O corpo inerte de Price não respondera a nenhum dos estímulos.

— Tom! Tom? Tom, por favor...

Um novo estrondo, ainda mais alto, provavelmente mais próximo do que o anterior. As paredes que formavam o quarto pareciam ter rachado com o recente impacto. Leah acabara caindo, sentada no chão, sem nem sequer conseguir entender o que estava acontecendo.

Um zumbido invadira os seus ouvidos, interrompendo completamente sua audição. Sentira sua cabeça girar, e por alguns instantes parecia estar catatônica. O mundo parecia se movimentar em câmera lenta, e por poucos segundos sentira como se não estivesse mais ali.

Você precisa ser forte, garota.

Ouvira a voz de Vincent Hall dentro da sua cabeça.

Não importa o que aconteça, o nosso filho deve nascer. Ele deve nascer e ser criado por você, Leah. É assim que as coisas devem ser...

Ela olhara para ambos os lados, como se procurasse pela origem das vozes, mas tudo o que via era um emaranhado de imagens turvas, como se o quarto da enfermaria estivesse se fechando em si mesmo.

Ter essa criança irá ajudar outras pessoas. Só ela pode ajudá-las a corrigir erros do passado... Seja forte, Leah. Você não está sozinha.

Ela então fechara os olhos fortemente, levando as mãos aos ouvidos. Voltara a enxergar o quarto em sua totalidade. A mesma cena anterior à segunda explosão. Carl Grimes agora sacara sua arma, puxando a garota, olhando para os lados como que traçando um plano de fuga.

— O Tom... O Tom! – Bradara desesperada.

O menino então a abraçara mais uma vez. Segurando as suas mãos trêmulas, o pequeno Grimes tentara acalmá-la, situando-a na realidade dos fatos.

— Negan está aqui. Estamos sofrendo um ataque! Não podemos mais ficar aqui, não é seguro!

A garota balançara a cabeça algumas vezes, desnorteada. Ela cerrara os olhos, forçando as lágrimas que se acumulavam em seus lacrimais a escorrerem por sua face. Rapidamente os dois deixaram a enfermaria, tentando proteger-se das futuras novas explosões.

Deixando Tom Price para trás.

Leah seria forte. Aprenderia como.

Seguiria sobrevivendo não importasse o que viesse a sua frente.

 

*****

 

Rick lançara-se para o lado assim que Negan bradara a plenos pulmões, ordenando um novo ataque a sua comunidade. Os tiros em rajada quase o atingiram, mas o xerife fora mais rápido, arrastando-se em direção aos muros e conseguindo se proteger da investida.

Achegara-se a Magna que, com os olhos arregalados em pavor, tentava estancar o sangramento da mordida que sua namorada recebera em um dos ombros, arrancando uma camada profunda de tecido. Yumiko ainda estava consciente, mas sentia muitas dores.

O xerife analisara por alguns instantes o local afetado. Se tivesse atingido o antebraço, poderia facilmente decepá-lo com sua machadinha, o que aumentaria as chances de sobrevivência da asiática. Mas ali, próximo ao pescoço, não havia muito mais o que se fazer.

— Magna, vá buscar um kit na enfermaria, precisamos...

A mulher de volumosos cabelos castanhos trançados para trás, nem sequer aguardara o término da frase do xerife, levantando-se e correndo em disparada pela rua principal de Alexandria.

BA-DOOOOM!

Uma nova explosão. Uma nova granada lançada por Negan detonara em pleno ar. A explosão fora tão próxima que o tranco jogara o xerife de encontro ao muro metálico. Ficara surdo outra vez, a cabeça girando, as dores se espalhando por todo o corpo. Demorara até conseguir recobrar totalmente os sentidos.

Mas o que vira o deixara completamente atônito.

Magna estava deitada no chão. Havia sido atingida pelo impacto, mas por sorte a explosão em si não retirara sua vida. Uma poça de sangue começava a se formar próximo ao seu quadril. Os olhos do xerife se voltaram para região, fazendo com que sua perplexidade só aumentasse.

A mulher havia perdido a perna esquerda, arrancada a força pela granada dos Salvadores. De olhos abertos, ela tentava arrastar-se pelo chão, os lábios entreabertos e o rosto pálido. Parecia estar imersa em um estado de choque.

— Você pediu por isso, Rick maneta! – Exclamara Negan, sua voz parecendo ainda mais grave e impostada que o normal – Eu estava disposto a trabalhar com vocês! Tudo o que vocês precisavam fazer era colocar a porra do rabo no chão e seguir as minhas regras! Mas agora eu já vi que vou ter que foder com todos vocês para que aprendam que as regras devem sempre ser cumpridas!

Um novo objeto explosivo fora lançado sobre os muros.

— Terra arrasada para vocês, seus filhos da puta do caralho!

KA-BOOOOM!

A fumaça da detonação, que destruíra uma das casas próximas, se espalhara por toda a rua principal, dificultando a visão e a respiração de todos que estavam ali. Grimes levara a mão até os olhos, tentando se proteger, tentando entender que porra estava ocorrendo, e mais ainda, tentando encontrar uma forma de agir. Não podia se estagnar, precisava responder a altura.

Olhara para o lado e vira que Yumiko erguera-se correndo em direção a Magna. O sangue ainda escorria por sua mordida, manchando toda a sua roupa. Mas naquele momento toda a dor parecia ter se esvaído, e como uma leoa protegendo os filhotes, a namorada da sentinela partira em direção à amada, tocando o seu rosto, igualmente assustada pelo horror de todo o cenário que os rondava.

Rick então agira, erguendo e correndo em direção as duas.

— Rick, preciso que me ajude! – Implorara Yumiko – Temos que tirá-la daqui! Precisamos estancar o coto... Rosita pode me ajudar, ela... Por favor, Rick, me ajude!

O policial piscara algumas vezes, atendendo ao pedido da asiática e ajudando a erigir Magna. Apoiando os braços da mulher em seus ombros, os dois começaram a arrastá-la para longe do campo de batalha, enquanto novas explosões se sucediam, assim como tiros a esmo, provavelmente tentando utilizar o mesmo método da Aliança nos ataques anteriores.

Os alexandrinos estavam presos em uma caixa, cercados por todos os lados, sendo bombardeados e metralhados. A cúpula da Aliança estava totalmente encurralada, presa a uma armadilha da qual não havia como sair.

Era melhor Rick pensar rápido se quisesse realmente sobreviver.

— Rick! Aqui! Venham para cá!

Eloise, surgindo em meio a fumaça, sinalizara para que a seguissem, levando os três até uma das casas nos pontos centrais, na linha determinada pelo próprio xerife como área segura. O sangue que escorria pela coxa de Magna traçava um rastro pelo caminho. Os pedaços de pele dependurados, o osso femoral a mostra, a pele cada vez mais pálida e sem vida.

Casas explodidas ao redor, pedaços de concreto e madeira espalhados pelo asfalto. Vários cones de fumaça subindo aos céus. Gritos, sangue, pessoas correndo de um lado a outro sem rumo, sem orientação. Grimes não sabia o que fazer. Estava assustado com o resultado do que plantara. Talvez não imaginasse que a guerra chegasse tão longe assim.

— Você foi mordida... Você foi mordida... Você foi mordida...

Magna sussurrava sem parar, os olhos abertos, a cabeça que não conseguia manter-se ereta. Olhava a todo o tempo para sua Yumi, preocupada, zelando por ela como se nada de grave tivesse ocorrido consigo.

O xerife pensara em Andrea e Carl. Havia os perdido em meio a toda a confusão. Não fazia ideia se estavam bem ou não.

A ferida fora largada sobre o sofá da casa que adentraram, mas Rick não permanecera lá dentro nem sequer dez segundos. Abrira a porta, saindo pelas ruas, caminhando em meio à desolação que só se ampliava. As explosões não cessavam. O poder de fogo dos Salvadores parecia infinito, e os calibres de suas armas faziam com que todo o esforço de Grimes se mostrasse inútil.

Será que realmente havia como vencer aqueles homens?

— Andrea! Carl!

Vociferara, juntando todo o ar que havia em seus pulmões. Olhara para todos os lados, mas não havia resposta algumas aos seus chamados. Tudo o que conseguia enxergar era desolação cinza. Tudo o que seus olhos fitavam era a sua derrota, sua queda.

Você perdeu de novo, Rick. Mais uma vez não conseguiu proteger aqueles que ama. Você os levou a morte!

Lori jamais o deixaria em paz. Mas talvez em partes ela estivesse realmente com a razão.

O fogo nas casas começava a se espalhar, e mesmo aquelas que não haviam sido afetadas primordialmente com as explosões, começavam agora a tombar por conta das chamas.

Rick vira quando Michonne e Ezekiel correram em disparada, fugindo da residência da samurai que já começava a ser atingida pelas chamas. Vira quando Jesus, há cinco metros de distância, conseguira ser rápido o bastante para segurar uma granada lançada em pleno ar, jogando-a de volta para o outro lado dos muros. Vira quando Goodwin e Hanso, armados até os dentes, tentavam criar um cordão de isolamento, retirando as famílias sobreviventes das casas atingidas, levando-as para um lugar seguro.

Se é que isso ainda pudesse existir dentro da zona caótica que sua comunidade se transformara.

— Rick! Aqui, Rick!

O xerife ouvira a voz de Andrea, que chamava por ele na rua paralela a que se encontrava. Ela, Carl e Leah Fisher bradavam da porta de uma das residências ainda não atingidas.

Seu coração disparara. Eles ainda estavam vivos.

Ele não havia falhado por completo.

 

*****

 

— Que foda! Meu pau tá duro que nem aço! – Negan observava os inúmeros cones de fumaça oriundos das explosões provocadas por suas granadas. O sorriso estampado em seu rosto retificava o quanto aquele ataque estava sendo prazeroso para ele – Acho que vou enrolar arame farpado nele e chamar de Lucille dois!

Os seus homens permaneciam em formação, seguindo as instruções dadas por seu líder. Parte dos Salvadores se deslocara para o setor leste dos muros, atacando os sentinelas e sufocando ainda mais os Alexandrinos.

Mascando o pouco de tabaco que ainda lhe restava, Dwight apenas assistia a derrocada de Rick. Com a balestra apoiada nas costas, o arqueiro mantinha o personagem de braço direito de Negan ativo. Queria poder fazer alguma coisa, mas estava completamente de mãos atadas. Parecia que daquela vez, Grimes e seus homens teriam de se virar sozinhos.

— Você ficaria com ciúmes? – O mandatário psicótico encarava o seu bastão como se realmente estivesse falando com alguém. Cada gesto daquele homem só aumentava a repulsa no interior do arqueiro – Você é realmente uma vadia bem ciumenta, não é?

— Mas eu não te culpo... – Seguira Negan, ainda encarando o bastão enquanto falava – Ficar aqui fora, ouvindo a todos esses gritos, vendo o fogo queimando a porra toda... É como estar de mãos atadas, não é minha putinha? E enquanto isso eu estou aqui parado, só pensando em como chupar o meu próprio pau! Quero dizer... – Ele pigarreara, corrigindo-se – Eu também quero cair na porrada. Ver todo o sangue, as tripas... Quero ver esses filhos da puta queimarem vivos!

Davis, um dos maiores puxa sacos dentro da elite dos Salvadores, quase sempre arrastando-se ao lado de seu líder, escolhera a bizarra e infortuna hora para se manifestar.

— Concordo plenamente, senhor. Eu também estou de pau duro!

Negan voltara-se para ele.

— Que porra é essa que você está falando, seu fodido?

O homem arregalara os olhos. O filho da puta realmente sabia como intimidar alguém. Principalmente um fracote como Davis.

— Eu quis dizer que... Eu também estou de pau duro. Sabe... Também estou com tesão para matar e tudo mais. – Ele tropeçava nas próprias palavras – Meu pau está tão duro quanto o seu, senhor!

O mandatário do Santuário ignorara o sujeito bajulador, girando o corpo e olhando diretamente para Dwight, que mantinha-se firme, resoluto.

— Leve alguns com você. Circundem os muros e estourem os cus desses filhos da puta com todas as granadas que tiverem! Vão! Vão! Não quero que sobre uma viva alma dentro desse covil de merda, está me ouvindo?

Negan estava na mira. Seria tão fácil simplesmente disparar uma flecha entre os olhos daquele homem maldito. Por tudo o que ele fora obrigado a fazer, por tudo o que fizera com Sherry, por todas as cicatrizes que jamais seriam fechadas. Ele merecia aquilo. Era o seu dever finalizar com aquele mal de uma vez por todas.

Mas a hora ainda não havia chegado. E por mais que quisesse, o poder de acabar com a vida do homem que destruíra a sua ainda não estava em suas mãos.

Paciência, Dwight. Paciência.

O arqueiro gesticulara positivamente com a cabeça, sinalizando com a mão e levando mais cinco homens junto a ele. Assim que cruzaram a primeira curva do perímetro metálico, ultrapassando as trincheiras que protegiam a murada, passaram a acelerar o passo, correndo enquanto preparavam as primeiras granadas a serem lançadas.

— Vocês ouviram Negan! Espalhem-se e lancem as granadas por cima dos muros! – Bradara. Os demais Salvadores o respeitavam, de certa maneira também o seguiam – Precisamos ser rápidos, não podemos deixar que eles respondam!

Gary, um homem de pele negra e que carregava uma .50 nas costas, fora o primeiro a jogar o explosivo por cima dos muros. Porém, de forma totalmente inesperada, alguns segundos depois, a mesma granada que fora lançada acabara retornando, voando por cima dos muros na direção dos Salvadores. O motoqueiro, único a testemunhar a absurda cena, só tivera tempo de dar dois passos antes de ser lançado longe com a explosão inesperada.

KA-BOOOOM!

Levara as duas mãos a cabeça. Sentia que o seu cérebro havia sido comprimido dentro do seu crânio. Piscara algumas vezes, tentando enxergar quais danos o seu grupo havia sofrido. Bambeando, apoiara-se nos joelhos antes de conseguir se levantar. Tossindo algumas vezes, olhara para os lados e, imediatamente, sentira vontade de vomitar.

Gary estava totalmente desfigurado. O corpo havia basicamente se dividido em duas partes, o tronco encontrava-se a poucos metros do arqueiro, enquanto que as pernas haviam sido lançadas metros distantes. Um dos braços estava ausente, assim como parte da cabeça, totalmente esfacelada.

Respirara profundamente, tateando os bolsos do seu colete até encontrar o famigerado colírio, já quase no final. Pingara duas vezes sobre o olho afetado pela queimadura, deixando com que o líquido atingisse sua íris. Balançara a cabeça, resguardando o pequeno frasco. Sua visão agora estava cem por cento recuperada.

Caralho! Caralho... Mas que porra foi essa?! – Indagara Bolton ao deparar-se com a mesma cena que o motoqueiro.

Pelo visto, mais ninguém havia se machucado. Olhando ao seu redor, Diwght começava a imaginar que talvez tivesse encontrado uma forma de ajudar a Aliança mais uma vez. Usaria o medo estampado nos rostos dos sujeitos que os acompanhara. Talvez desse certo.

— Eles jogaram uma das granadas de volta. – Respondera, mantendo a seriedade – Pelo que conheço deles, já imagino quem tenha sido.

O mesmo homem coçara a cabeça, abanando a fumaça da explosão que ainda os circundava.

— Como assim jogaram de volta? Isso é mesmo possível? Tipo... Essas coisas não explodem no ar? Olha só cara, eu não quero terminar igual ao Gary aí não, hein?

Dwight o encarara.

— Aguardem um pouco antes de jogá-las outra vez. Assim eles não terão tempo de lançá-las de volta. Esperem dois ou três segundos e depois as lancem pelos muros. Não tem erro. Vamos! Precisamos continuar a missão!

Os homens, ainda aterrados, passaram a se armar outra vez, preparando-se para uma nova rodada de ataques. Aproveitando-se da distração imposta, o arqueiro sacara a pistola que carregava no cinto.

Com a 9mm e mãos, Diwght fora rápido e preciso para exterminar todos os Salvadores que o acompanhavam. Com disparos na cabeça, os milicianos de Negan caíram um a um, friamente assassinados.

Assim que resguardara sua pistola, vira Jesus surgir sobre os muros, provavelmente atraído pelo barulho dos disparos.

— Mas que diabos... – Exclamara o barbudo – Ouvi tiros. Achei que um dos nossos pudesse estar aí fora!

O motoqueiro abrira os braços.

— E eu não sou? Olha só, cara, eu vou te passar as granadas que estavam conosco e dizer para o Negan que fomos atacados! Não deixe de falar para o Rick que eu estou fazendo tudo o que posso para ajudar! – Ele suspirara – Só peço que sigam confiando em mim! Eu sei o que estou fazendo!

Se aquela guerra era um jogo de tabuleiro, Dwight com toda a certeza era uma peça de suma importância. Suas jogadas poderiam não só definir os próximos passos do conflito, como também movimentar o destino de todos ali.

 

*****

 

Os pés tocaram a superfície quebradiça, subindo sobre o entulho que se amontoava naquela região. As duas árvores que se posicionavam logo à frente, mostravam-se como o esconderijo perfeito para o que aconteceria a seguir.

Controlara a respiração, verificando mais uma vez com os olhos se não havia ninguém a sua espreita. Tudo estava limpo, os demais já estavam posicionados.

Chegara a hora.

— Preparem-se. Com calma... – Erguera um dos braços, o punho fechado sinalizando para que aguardassem o melhor momento – AGORA! VAMOS! TODOS!

Kal e Eduardo foram os primeiros a atirar, seguidos pelos demais combatentes trazidos do Hill Top. Pegando os Salvadores de surpresa, que naquele instante ainda seguiam jogando granadas em direção a Alexandria, o grupo guiado por Glenn Rhee desde o Alto do Morro, atacara sem piedade, acertando todos os milicianos que encontravam pela frente.

Protegidos pelas construções mais afastadas, ruínas da civilização que outrora habitara aquele local, os soldados conseguiram avançar até os muros, literalmente espantando os homens de Negan que destruíam a zona segura. Utilizando um explosivo como cortina de fumaça, os Salvadores conseguiram retornar aos veículos, fugindo em meio aos disparos incessantes dos guerreiros que marcharam para ajudar a Aliança na grande guerra.

A breve vitória viera com um gosto amargo. Não havia o que comemorar. Negan conseguira fazer o que planejara. Em uma rápida investida, deixara Alexandria completamente às ruínas.

O descendente de coreanos olhara para a zona segura em chamas. Parte dos muros havia tombado. O entulho e destroços das casas se espalhavam por toda a parte. Havia corpos e sangue no chão. Um rastro de destruição se fazia presente. A comunidade pela qual Rick e seu grupo tanto lutaram, o lugar onde ele e Maggie um dia viveram, havia ruído por completo.

Era o fim.

— Devemos ir atrás deles?

Kal ainda empunhava sua arma, observando o caminhão dos Salvadores sumindo no horizonte.

— Não. – Glenn verificara sua própria munição – Seremos mais úteis aqui. Me ajudem a abrir os portões. Vou ver como as coisas estão lá dentro. Enquanto isso, junte o nosso grupo e os proteja.

Ele olhara para os céus. A negritude da fumaça dos incêndios podia ser vista a quilômetros de distância.

Precisara ver com os próprios olhos para atestar a grandiosidade que aquele conflito acabara alcançando. Era real e era palpável. Vidas estavam sendo perdidas... Vidas já haviam sido perdidas. Precisava acabar. Precisava acabar logo.

— Deus... – Rhee suspirara – Como as coisas puderam ficar tão ruins assim?

O asiático então caminhara em direção aos portões. Parcialmente arrebentado, provavelmente por conta do impacto de uma das muitas explosões que haviam ocorrido por ali, o portal tinha parte da sua grade de ferro retorcida, exposta.

A fumaça tomava conta do local como uma forte neblina, dissipando-se ainda muito lentamente. Logo de cara, assim que dera os primeiros passos, vira a casa que pertencera a Denise e Heath consumida em chamas, parte das paredes já desabadas. A mesma imagem multiplicava-se nas demais. O casal Green, a família Robbie, a casa da senhora Margot que adorava fazer biscoitos horríveis nos finais de semana.

Sua própria casa, que ocupara com Maggie e Sophia logo que aportara na comunidade. Tudo destruído, em pedaços, engolidas pelas labaredas do ódio do psicótico que tirara a vida da mulher que tanto amou.

Até então Glenn não sabia ao certo o porquê de ter se rebelado contra Gregory, de ter convencido parte da população do Hill Top a segui-lo rumo a Alexandria. Tudo ainda parecia ser movido por sentimentos que brotavam a flor da pele, sem muita explicação. Mas agora, ao ver tudo o que vira, ao atestar outra vez a crueldade de Negan e seus milicianos, sentira que de certo modo também era responsável pela Aliança. Não podia virar as costas aos amigos. Não podia simplesmente tentar tocar a sua vida, como se nada daquilo o afetasse.

Negan matara sua esposa, arrancara o seu bem mais precioso. Ele precisava pagar. Aquilo precisava ter um fim.

Os Sobreviventes precisavam se reerguer. A luta só estava começando.

— Glenn?!

Andrea assustara-se ao ver o rapaz adentrando a comunidade. Correra em sua direção, acompanhada por Rick, que mancava, provavelmente ferido em combate. A loira o abraçara fortemente, tendo o afago respondido de pronto por Rhee.

— Negan e seus homens se foram... Nós os expulsamos. – Dissera Rhee, tentando de alguma maneira reconfortar a sardenta, que parecia extremamente assustada.

— O que você...? – Rick mal podia falar. Sua cabeça estava sangrando, mas aparentemente ele estava bem.

— Com tudo isso que está acontecendo, eu achei que o Hill Top não era mais seguro. Eu achei que estaríamos melhor juntos. – O asiático desviara o olhar mais uma vez para o panorama. Nunca estivera tão certo e tão errado em toda a sua vida – Eu liderei boa parte deles até aqui. Alguns se recusaram a sair, mas todos estão assustados. Gregory não podia mais continuar no comando. Só que agora... Eu não sei o que fazer. Há crianças conosco Rick. O que faremos?

O xerife estava dispneico.

— Você... Você está no comando do Hill Top agora?

A resposta era simples. Estava na hora de assumir as rédeas.

— Eu... Sim. Eu estou no comando.

Glenn sabia que não poderia fugir da guerra. O Hill Top estava destinado a ele. Tudo poderia ser diferente a partir de agora, havia a chance de um verdadeiro recomeço. Mas para isso, precisavam vencer Negan, precisavam destruir a torrencial de medo que ele criara.

Só assim poderia dar prosseguimento àquilo que ele e Maggie haviam começado. Só assim Sophia, o grande laço que o ligava a memória da mulher da sua vida, poderia crescer e se desenvolver em total segurança.

Seria difícil, mas não havia opção. Ou venceriam, ou morreriam tentando.

 

*****

 

[DUAS HORAS DEPOIS]

— Esse é um trabalho realmente incrível! Não é impecável, mas dada as condições, o material que possuíam e a quantidade de sangue que ela estava perdendo... Ela tem realmente muita sorte de estar viva! É verdade que uma das suas ajudantes havia sido mordida um pouco antes de realizarem essa cirurgia?

Rosita Espinoza estava de pé, apenas observando o minucioso trabalho do Doutor Carson, que limpava o coto de Magna, inconsciente na cama de uma das poucas casas que restaram intactas.

A mulher dormia profundamente, mas apesar de tudo, sobreviveria. O sangramento fora estancado com muitas dificuldades, suturado logo em seguida por Rosita, que recebera ajuda de Yumiko para realizar a tarefa. A namorada de Magna desmaiara pouco tempo depois, já sendo afetada pela forte febre oriunda da mordida que recebera.

Assim que os embates terminaram, o povo do Hill Top, que fora trazido em marcha por Glenn, aportara a comunidade em pedaços, ajudando a consertar parte do muro que havia tombado, assim como os portões, detonado após as inúmeras explosões do ataque de Negan.

Carson, oncologista que vivia no Alto do Morro, se prostrara a ajudar os feridos, verificando o trabalho já previamente realizado pela latina, e dando auxilio aqueles que ainda precisavam de tratamentos. Foram muitos os mortos e feridos no fatídico dia que ainda não se encerrara. Com toda a certeza o mais sangrento que já haviam presenciado.

— Sim. – Respondera secamente. Sua blusa estava totalmente manchada de sangue, assim como o seu antebraço e o rosto. Não tivera tempo de se olhar em um espelho, e para falar a verdade, no momento, aquilo era o que menos importava.

— É totalmente incrível! – O médico seguia verificando os sinais da mulher de cabelos castanhos. Tomara em mãos um rolo de atadura, começando então a enfaixar o coto – Gosto de pensar que minha dedicação pelo bem-estar dos outros um dia irá me fazer realizar algo tão heroico assim... Mas talvez isso seja arrogância demais da minha parte. Nunca se sabe até chegar a hora, certo?

Ele olhara para Espinoza. A enfermeira apenas meneara positivamente.

— Acho que vou precisar de mais ataduras. Você poderia buscar mais dois rolos para mim? – Rosita concordara. O médico sorrira, agradecendo-a pela prontidão em ajudá-lo – Só me diga uma coisa. A moça que foi mordida tinha alguma relação com nossa amiga aqui? Elas eram da mesma família...?

— Namoradas. – Interrompera – Yumiko e Magna eram namoradas. E elas realmente se amavam...

Espinoza não permanecera na sala, mas imaginara que Carson deva ter reagido com certo espanto a informação recebida. Ela e Magna tinham um bom relacionamento, e desde que Yumiko resolvera aprender suporte básico a vida com a latina, para tornar-se realmente uma segunda enfermeira da comunidade, as duas acabaram se aproximando ainda mais.

Jantara pelo menos duas vezes na casa do casal, eventos que sempre terminavam em divertidos papos, onde, pelo menos por algumas horas, todo e qualquer problema era suplantado de suas cabeças. Bebiam cerveja, falavam besteira, criavam rankings sobre os homens da comunidade... Enfim. Se divertiam.

Algo que talvez nunca mais voltasse a ocorrer.

Caminhara pelo corredor, indo em direção as poucas caixas que conseguira salvar, retirando-as da casa-consultório em chamas. Próximo a elas, ainda mais ao fundo do corredor, dois corpos encontravam-se sobre uma mesa. Recobertos por lençóis brancos, os cadáveres aguardavam pela decisão de Grimes, que ainda não havia julgado a necessidade de um funeral em meio a uma comunidade em ruínas. Era provável que simplesmente fossem enterrados. Sem maiores alardes.

Retirara os rolos de atadura de uma das caixas, mas seus orbes não deixavam de focar-se nos corpos, largados de lado, como se não mais significassem nada, como se não mais fossem pessoas. Fora então até a mesa, retirando o lençol do rosto de um deles.

Holly. Os olhos leitosos arregalados, a boca entreaberta, a marca da facada desferida por Magna. A ex-namorada de Abraham havia perdido a vida por se arriscar por Alexandria, por se lançar em uma missão suicida para vingar a morte do amado. Do homem que também jamais saíra de suas lembranças.

Levantara então o segundo lençol.

Tom Price. O turrão, porém afável sentinela, também havia tombado para a guerra que parecia não acabar nunca. A explosão na enfermaria, que desligara os aparelhos que ainda o mantinham com vida, acabara sendo o ponto final de sua existência. Ainda fora retirado de lá, evitando que encontrasse o seu fim em meio às chamas. Mas após inúmeras tentativas de reanimação, tivera sua morte decretada. Em sua testa, a marca do disparo que o impedira de se transformar em uma das horrendas criaturas sem vida.

Quantos mais ainda precisariam morrer?

Cobrira os dois outra vez, prestando os pêsames necessários. Caminhara de volta ao quarto de Magna, mas interrompera os passos diante de uma das portas ao lado do corredor. Girara a maçaneta e adentrara o pequeno cômodo.

Uma estante de livros, uma mesa de centro, um velho baú e uma cama preenchiam todo o espaço do pequeno quarto. Sobre ela, Yumiko, as mãos amarradas na cabeceira, em uma cruel tentativa de evitar que, ao alcançar o inevitável, a asiática não ferisse ninguém.

Sua testa estava tomada por suor, sua pele, mais branca que o normal. A febre já passava dos quarenta graus, e a infecção interna, fruto da ação violenta da mordida que recebera, iria logo, logo retirar sua vida. Outra que morreria por ação dos Salvadores, mais uma peça fora do tabuleiro que suas vidas foram transformadas.

— Ro... Rosita...?

A latina achegara-se a acamada, sentando-se ao seu lado. Segurara uma das mãos de Yumiko, mais parecia que estava pegando fogo. Os olhos se encontraram, havia verdade naquela troca.

— Como... – A voz da asiática estava fraca, saindo quase como um suspiro – Como ela está?

Rosita tentara sorrir, na busca em demonstrar que nem tudo estava perdido. Sabia que ela perguntaria pela amada, sabia que, apesar de tudo pelo que estava passando, sua maior preocupação seria com a companheira.

— Demos muita sorte. Ela vai sobreviver... Terá de se adaptar a uma vida nova, mas vai sobreviver.

As feições da arqueira, apesar de sofridas, demonstraram alívio ao receber a notícia. Ela fechara os olhos, estava serena, pronta em aceitar o seu inevitável destino. Espinoza tocara sua testa, arrumando uma mecha de seus negros cabelos lisos. Era tão cruel vê-la naquela situação. Algo com o que jamais se acostumaria.

— Eu e ela costumávamos falar, sempre brincando, claro... – A voz de Yumi seguia mansa, apagando-se na medida em que se esforçava para prosseguir falando – Falávamos que éramos o último casal gay da terra. Que nunca poderíamos nos separar, que estaríamos sempre juntas, que nos casaríamos...

Rosita apertara sua mão mais fortemente.

— Ela é durona, parece irascível, mas no fundo é uma manteiga derretida. Eu... Eu vou sentir tanta falta dela...

A latina fechara os olhos, não conseguira impedir que as primeiras lágrimas caíssem de seus lacrimais. A asiática fixara os seus orbes em Rosita, fitando-a profundamente.

— O processo é muito doloroso, Rosita... Eu não quero ir até o final, não quero passar por tudo isso. Eu estou pronta. Agora que eu sei que ela vai viver, eu... Eu posso descansar.

A latina meneara a cabeça, não conseguindo encarar sua amiga. Já esperava que ela viesse a pedir isso, mas de forma alguma sentia-se preparada. Precisaria ser muito forte, não só nesse momento, como também em tudo o que ainda viria.

— Você tem certeza? – Indagara a latina, a voz embargada, presa na garganta.

Yumiko esboçara um sorriso, encarando-a olhos nos olhos. Sua reação já dizia tudo. Não precisa dizer uma palavra para mostrar que já estava decidida.

— Obrigada por tudo, minha amiga... Diga a ela que eu a amo muito. Que eu sempre a amarei muito.

Ela então fechara os olhos, aguardando o ponto final. Rosita sacara o seu revólver, recostando o cano no parietal da amiga. Suas mãos estavam trêmulas, por alguns instantes imaginara que não iria conseguir. Pensara então em tudo que haviam passado juntas, em todos os momentos felizes que compartilharam.

Pensara no amor que Yumi que sempre sentira por Magna, e no quanto as duas se demonstravam, mesmo que nas situações mais complicadas, verdadeiras parceiras. Juntas para o que desse e viesse.

Devia isso a elas. Jamais poderia negar-lhe um pedido, principalmente um tão importante quanto aquele. Era difícil, mas precisava ser feito.

Tomara coragem, respirara profundamente e...

BLAM!

O tiro ecoara pelo quarto. O corpo sem vida de Yumiko sobre a cama, o sangue de seu crânio manchando os travesseiros. Rosita caíra aos prantos, resguardando o rosto da amiga com a coberta.

Estava feito.

 

*****

 

— Vocês ouviram isso?

Eugene caminhara lentamente em direção à porta de metal que dava acesso a fábrica de balas. O som das explosões a distância chamara a atenção de todos, interrompendo o trabalho no mesmo instante.

Com uma chave de fenda nas mãos, o professor de ciências aguardara por breves segundos, tentando aferir se os sons realmente haviam cessado. Nada mais pudera ser ouvido. Seu coração estava acelerado, e sua mente viajando em mil e uma divagações, tentando naquele momento decifrar as inúmeras possibilidades a respeito do que realmente estava ocorrendo.

Nenhuma delas era promissora.

— Não. – Dissera Laura. Uma alta mulher com inúmeras tatuagens nos braços e pescoço, os cabelos curtos e negros. Era uma das mais fiéis ajudantes de Eugene na produção de munições – Está tudo quieto desde que os tiros cessaram.

O silêncio permanecia na sala.

— Beleza então. – John, um quarentão de barriga protuberante, boné e camiseta se manifestara. Coçara a barba cheia em seu rosto redondo, prosseguindo – Vou ali fora dar uma mijada. Não aguento mais segurar!

Eugene o olhara com reprovação.

— É melhor não. Ainda não é seguro. Urine em copo até que possamos atestar se...

O bronco o ignorara totalmente, avançando em direção à porta zelada pelo professor. Ficar enfurnado por horas a fio dentro daquela fábrica estava mexendo com o psicológico de todos.

— Eu não vou mijar na porra de um copo! – Bradara, metendo a mão na maçaneta – Só vou dar um pulo lá fora e já volto. Esticar um pouco as pernas. Não vou fazer barulho, tá legal?

A porta fora aberta, mas John não conseguira sair. Acompanhando o movimento do metal sobre gonzos, um errante invadira o local. Os braços pútridos esticados agarraram o homem pela camisa, que puxara uma chave de roda que se encontrava em uma prateleira, acertando a cabeça da criatura até levá-la ao solo.

Junto a ela mais dois, três, quatro errantes se esgueiraram para o lado de dentro. John ainda tentara lutar, mas fora derrubado pelos monstros, que passaram a lhe arrancar as tripas, devorando-o por completo.

— Me deem cobertura! – Gritara Eugene – Eu tenho que fechar aquela porta! Temos que manter esse lugar, não podemos desistir!

Porter tentara correr até o portal de entrada, mas fora impedido por Laura que passara a levá-lo para a outra saída, localizada nos fundos. O pretenso cientista ainda se debatera, olhando para trás enquanto era arrastado ao lado oposto. Todo o equipamento, todo o trabalho de meses seria perdido para as criaturas mortas-vivas.

Todo o seu esforço para ajudar a Aliança a vencer a guerra estava se esvaindo.

Se esvaindo como lágrimas na chuva.

— Vamos Eugene! – Exclamara a mulher, libertando-o do torpor – Há muitos deles e não podemos perder você!

O restante do grupo os seguira, avançando por um estreito corredor, e derrubando propositalmente um armário de quinquilharias, para que servisse de obstáculo para os famintões.

A porta dos fundos fora praticamente arrombada. Eugene e Laura, que partiram na frente dos demais, saíram em um pique, sendo os primeiros a chegarem do lado de fora. O beco que se encontrava por detrás da fábrica, não continha nenhum errante a espreita dos alexandrinos.

Mas isso não significava que estivessem sozinhos.

Os dois congelaram assim que se depararam com uma imagem totalmente inesperada.

— Mas ora vejam só... Parece que eu realmente fui um bom menino esse ano! Papai Noel até me trouxe presente mais cedo!

Negan e sua tropa de elite encontravam-se enfileirados. Armados até os dentes, os milicianos ameaçavam o grupo de Eugene, apontando as metralhadoras, fuzis e pistolas nas suas direções. O porta-voz, o próprio mandatário, dera dois passos a frente. Com o amplo sorriso no rosto, o Salvador líder parecia realmente contente com o encontro que o universo lhe proporcionara.

— Me digam uma coisa... O que os ratinhos estão fazendo fora da gaiola?


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam?

Esqueci de dedicar no último capítulo, então farei a homenagem por aqui... RIP Shiva! A tigresa siberiana fará muita falta na história... Ezekiel precisará de muito apoio para seguir em frente...

E quanto aos acontecimentos desse episódio... RIP Holly, RIP Tom, RIP Yumiko... RIP toda a galera da construção civil que morreu no meio das explosões... Acredito que tenha sido um capítulo bastante intenso... E se me esqueci de mais alguém, RIP para ele também! Hehehehe...

Glenn agora oficialmente está na liderança do Hill Top, e fará parte da guerra! O que acharam disso?

Quais os próximos passos agora que Alexandria está totalmente destruída e Eugene fora tomado como refém?

Vejo vocês nos comentários, acho que temos bastante assunto hehe...

Abraços a todos! Até o próximo!

Moi moi.



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