Olhos de Cobra escrita por Laura Salmon


Capítulo 31
Capítulo 30 - Cobra


Notas iniciais do capítulo

Estou tão feliz pelo capítulo de hoje e pelo beijo de Cobrina segunda feira que vou postar mais um capítulo! Obrigada pelos comentários!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/600337/chapter/31

Acabei dormindo esperando por Karina e pelo almoço que não veio. Acordei um tempo depois com o gelo derretido encharcando tudo enquanto meu celular tocava desesperadamente. Primeiro eu o ouvi bem distante. Os remédios para dor pareciam me dopar. Depois, piscando os olhos com força, o senso de realidade me despertou completamente.

― Fala, tia. ― Pigarrei, esfregando o rosto.

― Ricardo, temos um problema.

Suspirei, esperando que ela reclamasse mais uma vez de como eu ferrara com sua vida. Um barulho rouco me fez perceber que o telefone estava mudando de mãos.

― Ricardo! ― Uma voz masculina familiar fez o meu coração arder. ― Ah, quanto tempo, meu menino!

Era a mesma voz que me dava ordens quando eu fazia trabalhos sujos. Eu nunca havia visto seu rosto, nem sabia do seu nome. Eu o chamava por chefe. Engoli em seco.

― Vejo que até perdeu a voz. Fique tranquilo. Ninguém vai fazer nada contra a sua família. Até porque eles não valem muita coisa pra você. Eu encontrei algo que vale um pouco mais.

― Do que você tá falando? ― Tive que me apoiar na parede para não cair.

― Sabe. De uma menina loirinha linha dura de olhos lindos. ― Parei de respirar subitamente. ― Que vacilo, Ricardo. Deixar uma prova tão contundente como um celular no local do crime. Foi extremamente fácil localizá-la. Nós sabíamos que você estava por perto, mas aqueles imbecis pegaram o cara errado achando ser você.

― Como assim? Quem vocês levaram? ― Andei até a saída do QG. Tudo parecia tranquilo.

― Sem rodeios, Ricardo. Estamos com a sua marrentinha e com um dos amigos dela. Vamos levá-la para o esconderijo que você espertamente encontrou. Você tem o resto do dia para se entregar. Ou a maré vai subir demais. E, oh, que pena. Eles vão se afogar. Estamos esperando por você. Venha se juntar a essa festinha da Ilha Grande. Abraço.

Passei a mão nas chaves da moto, enfiando o celular no bolso. Só tive tempo de pegar uma camiseta e sair o mais rápido que eu podia. Deixei para trás remédios, ataduras e comida. Eu precisava chegar até Karina. Mas quem estaria com ela?

A mãe e a irmã de Pedro vinham conversando animadamente pela rua quando me viram.

― Meu Deus do céu! ― Delma disse. ― O que aconteceu com você?

― Perdi uma luta. ― Segurei o capacete. ― Onde está o Pedro?

― Com a Karina. ― A menina cruzou os braços sentindo-se vitoriosa por me dizer aquilo. ― Com quem mais?

Droga.

Ignorei-as, montando na moto com dificuldade e arrancando. Todo o meu corpo doía. Mas o meu peito era o local mais afetado. Karina estava em perigo eminente. Por minha causa. E Pedro estava com ela. Eu não podia deixar que nada de ruim acontecesse a eles. Acelerei, contornando os carros pela rodovia. A sorte é que a moto era bem mais rápida e o trânsito não estava tão intenso assim.

Eram cinco horas quando saí do QG. Com sorte gastaria menos de duas horas para chegar até Angra e teria que encontrar um barco que me levaria a Dois Rios. Eu sabia por alto que a maré enchia à noite. Precisava encontrar Karina e Pedro antes do escurecer.

A cada movimento da estrada minhas costelas pareciam prontas para explodir. Minhas mãos estavam rígidas e o meu corpo todo reclamava. Eu não podia me dar ao luxo de sentir dor. Não naquele momento. Tentei me concentrar na minha última imagem de Karina. Tão desconcertada. Tão frágil e ao mesmo tempo tão segura de que finalmente iríamos nos entregar ao que estávamos sentindo. Ela saíra do QG desnorteada. Se fora falar com Pedro com certeza iria terminar com ele.

E ele agora estava nas mãos dos bandidos.

Eu tinha pouco tempo antes que a Delma e o Gael percebessem. Se a polícia fosse envolvida, a vida deles estaria três vezes mais em perigo.

Acelerei. A moto chegou a guinar. Meus ossos rangeram. Apertei os dentes e me obriguei a continuar. A minha determinação naquele momento venceria todas as minhas dores. Eu só não podia ser negligente no trânsito. A composição de cuidado e rapidez me levou até Angra rapidamente. Deixei a moto estacionada perto do cais e segui até um quiosque.

― Ei meu chapa. ― Um único senhor descansava no porto, mastigando um palito. Ele se assustou quando viu o meu estado. ― Quando sai um barco pra ilha?

― Não sai. ― Seu corpo grande e truculento veio em direção a mim, apoiando os meus ombros. ― O que houve com você? Foi assaltado?

― Quase isso. Preciso chegar a ilha. É uma questão de vida ou morte.

Meu telefone tocou. Número desconhecido.

― Você sabe o que é bipolaridade, Ricardo? ― A mesma voz me atingiu em cheio. ― Eu tenho transtorno bipolar. Não estou mais bonzinho. Andei refletindo o quão mesquinho você foi. Fugindo e se escondendo tão bem. Então como você gosta muito desse jogo, vou esconder a sua Karina.

― Não toca nela, seu desgraçado!

― Ih, já toquei. ― Algo ardente se espalhou pelas minhas veias. ― O outro carinha fez xixi. ― Ele gargalhou. ― Não é, garotão? Fez xixi na calça.

― Para de brincadeira! Não machuque a Karina! Eu estou chegando, chefe. Me diga onde ela está.

― Ah! Mas você não achou que seria assim tão fácil não é? Encontre-a, querido. Dica número um: eles irão se afogar em algumas horas.

Ouvi um grito nervoso ao fundo.

― Karina!

― Ah! Ele ouviu a sua voz! Não é fofo? O tempo tá correndo, Ricardo. É melhor correr mais que ele.

E desligou.

― Preciso de um barco. Preciso chegar até a ilha! Minha... ― Engoli em seco. ― Amiga. Está em perigo. Não consigo nadar até lá nesse estado.

― Meu filho eu vou chamar a polícia.

― Não! Não. Se você envolver a polícia nisso...

― Entendi. ― O homem coçou a barba. ― Tem um jet-ski logo ali atrás. ― Ele apontou para outro quiosque. ― Pode ser que sirva.

Servia. Mas antes que eu pudesse sair em disparada ele me entregou as chaves e abriu uma gaveta, tirando uma arma de lá de dentro.

― Tá carregada. Seis balas. É só isso que tenho.

Segurei a arma, sentindo a força do metal.

― Não vou usar nenhuma delas. ― Apertei os dedos, guardando-a no cós da calça. ― Mas por precaução... Obrigado. Devolvo tudo quando eu tirar meus amigos dessa encrenca que eu os coloquei.

Ele assentiu me desejando boa sorte e me abençoando. Eu ia mesmo precisar.

Mas primeiro eu precisava pensar. Em que lugar eles esconderiam Karina e Pedro sem que ninguém visse e eles ainda se afogassem? Dois Rios era a minha única pista. O presídio de Ilha Grande fora o esconderijo que o chefe mencionara. Era por lá que eu iria começar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!