We Both Changed escrita por MsNise


Capítulo 22
Entendendo


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Mais um capítulo de WBC saindo quentinho do forno pra vocês :3
Espero que gostem ♥



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JODI

.

Suspirei e pisquei meus olhos, percebendo que eu ainda estava no quarto de Kyle. Mas que Kyle não estava mais lá. Sentei-me em um movimento súbito, tateando o seu lugar que ainda estava quente. Ele tinha recentemente saído do quarto. Engoli em seco e me levantei, procurando por uma lanterna.

Recentemente as monções tinham chegado ao fim, então cada pessoa foi para o seu respectivo quarto. Eu, obviamente, fui para o quarto de Kyle, agradecendo por um pouco de privacidade. Odiava o ambiente agitado de agrupação na sala de jogos durante as monções.

Odiava aquelas cavernas, no geral. Nunca me acostumaria com seus inúmeros corredores, com o cheiro de mofo e com o fato de o local ser abafado. Eu não gostava muito dos humanos que ocupavam aquele lugar e muito menos daquela alma que o Ian se relacionava. Como a chamavam mesmo? Peg, eu acho. Como o Ian foi cair na sua lábia?

Eu não gostava de Sunny também; pelo menos, não enquanto ela ainda dividia a cabeça comigo. Ela pensava que tinha algum direito sobre o meu corpo ou que podia se relacionar com Kyle, o meu marido. A aliança de nosso casamento estava em meu dedo, não nela. Não na parasita.

Queria o antigo Kyle que eu tinha conhecido anos atrás. Queria a nossa vida naquela casa, junto com os meus pais humanos e com Ian. Queria ficar bêbada novamente e me divertir como nós conseguíamos fazer. Não queria aquela vida que tinham me oferecido, trancafiada dentro de uma caverna e tendo que aguentar a tristeza de Kyle pela perda de uma alienígena. A alienígena que estava no meu corpo, que havia me roubado dele.

Encontrei uma lanterna e comecei andar pelos corredores. Não tinha como imaginar onde ele tivesse ido, portanto, andei sem rumo, entrando em corredores aleatórios. A caverna estava silenciosa durante a noite; o único som que eu ouvia era o arrastar de meus pés na areia.

Andei por tanto tempo que comecei a desconfiar que nunca encontraria o caminho de nosso quarto sozinha. Teria que esperar amanhecer para pedir ajuda para alguma pessoa daquela caverna… Somente a ideia de ter que pedir a ajuda fazia o meu estômago revirar. Talvez eu devesse simplesmente seguir alguém e torcer para que me levasse até algum local que me oferecesse algum tipo de localização.

Continuei andando a esmo até ouvir alguma voz distinta no meio daquele pavoroso silêncio. Segui o som. Quanto mais perto chegava, mais tinha certeza de que era a voz que eu procurava. Era a voz de Kyle. Uma luz azul débil escapava da entrada do lugar onde Kyle estava e isso me ajudou a ir até lá.

Quando cheguei à entrada do lugar, freei meus passos. Fiquei simplesmente espiando de fora o que acontecia naquele lugar. Pensei que fosse encontrar mais alguém. Ian. Aquele velho da espingarda. Talvez aquele doutor. Mas ele estava sozinho, conversando consigo mesmo.

Quase entrei no local para interferir, antes de entender que ele segurava um criotanque nos braços. E falava tão suavemente que não parecia o meu Kyle. E realmente não era. Era o Kyle de Sunny. Ele segurava Sunny em seus braços.

Uma pontada dolorosa atingiu meu coração. Ele havia se esgueirado para fora do quarto para ir até aquele consultório e ficar ninando um criotanque com a alma que havia me roubado dele?! Que palhaçada era aquela?! Ele deveria aproveitar a minha presença. Não era aquilo que ele queria? Era aquilo que eu queria, com certeza, mas… e ele?

Por que houve tanta dúvida quando eu voltei à vida e Sunny ainda controlava o meu corpo? Quando ele se afastou, pensei que fosse o choque ou a felicidade. No entanto, ele não parecia… satisfeito. Por que ele não tinha me beijado desde que retornei ao meu corpo? Por que ele havia aceitado Sunny? Por que ele sofria por sua perda?

Naquele momento, vendo-o tão carinhoso, foi quando um muro cheio de verdades caiu em minha frente. Um muro que me revelava que eu tinha me cegado para tudo quando voltei à vida. Era só o meu corpo, não era? A única coisa que ele gostava na Sunny era que ela ocupava o meu corpo; caso contrário, jamais aceitaria beijá-la ou amá-la. Certo?

Por que então ele segurava seu criotanque carinhosamente em seus braços?

Senti uma mão em meu pulso. Mesmo que estivesse concentrada em outras coisas, a mão não me assustou. Caiu suavemente em meu braço. Nada assustador. Pela luz pacata que vazava da entrada do consultório, vi que era Ian. Talvez ele pudesse me explicar tudo aquilo e dizer o que estava me confundindo. Talvez ele soubesse me dizer o que me impedia de concluir meus pensamentos.

Ele me arrastou alguns metros através dos corredores. Ao contrário de mim, não precisava de nenhuma lanterna para se guiar pelos túneis. Sunny também não precisava, mas eu tinha medo de me esbarrar com alguém, portanto sempre mantinha uma lanterna perto de mim. Ian virava apressadamente em esquinas aleatórias, afastando-me da luz, de Kyle e de um fantasma que tinha o nome relacionado ao sol. Sunny era o meu tormento, as minhas trevas, mesmo que representasse a luz para tantas outras pessoas.

Por fim, Ian parou. Ele pegou uma daquelas luzes azuis e iluminou o local. O quarto eu dividia com Kyle. Suspirei e deixei que ele soltasse meu pulso lentamente, fazendo-me sentir um formigamento repentino.

— Não é o corpo — foi a primeira coisa que Ian me disse enquanto me encarava com os braços cruzados. Olhei-o, confusa. — Não é apenas o corpo — ele repetiu e, pela sua expressão, entendi que ele queria que eu soubesse o que aquelas palavras significavam.

Como assim, não era o corpo? O que não era o corpo?

E então eu entendi.

Kyle. Sunny. Ele não estava apaixonado pelo corpo. Mas isso seria meramente possível?

— Isso é impossível, Ian — bufei, descartando suas palavras. — Não dá para gostar de um parasita sem gostar do corpo. Ele não está realmente apaixonado por Sunny, você sabe que não. Igual você não está apaixonado por Peg — o nome saiu arranhado por minha garganta. — É só o corpo.

— Não é o corpo — ele insistiu e parecia acreditar de verdade em suas palavras. — Eu sei que não é o corpo. Eu sinto isso todos os dias. São… Jodi, são as atitudes que importam, mais do que tudo.

— O que quer dizer?

Ele respirou fundo e hesitou antes de falar.

— Kyle se apaixonou pelas atitudes de Sunny, principalmente. Antes ele não tinha tanta capacidade de discernimento; olhava para o corpo e pensava que nele estava sua salvação. Foi aos poucos que reconheceu que Sunny mexia com ele. Que ela mexia com ele, não simplesmente o corpo. É complicado — ele balançou a cabeça e suspirou. — Ah, Jodi… eu acho que você só entenderia se pudesse viver isso. Esse amor pela alma.

Franzi o cenho. O que era aquilo? Ian estar com uma alma já era suficientemente estranho, mas eu ainda me consolava pelo fato de que ele tinha se apaixonado pelo corpo. Aquela criatura prateada não era absolutamente nada. Era apenas o corpo, eu tinha certeza.

— Não dá, Ian. Não dá pra acreditar nisso.

Ele respirou fundo.

— Então me explique porque ele está lá com Sunny e não aqui com você — eram palavras cruéis que eu não esperava que saíssem da boca de Ian. Ele tinha mudado. Eu também tinha mudado. Kyle… bem, não há nem comparação. No entanto, eu conseguia compreender que ele estava defendendo o irmão. Ou, talvez, o inimigo. — Ele ficou com Sunny pelo corpo no início, para mantê-lo vivo e saudável caso você voltasse…

— E agora eu voltei!

— E agora… agora Kyle se apaixonou pela alma. Agora Kyle ama Sunny.

— Ele não pode ter se apaixonado por uma criatura prateada quando ele me queria de volta! — explodi, aproximando-me de Ian e o encarando. Estava cansada de suas teorias. Estava cansada de ser deixada de lado. — Ele queria a mim.

Ian segurou-me pelos ombros.

— Sim, ele te queria — ele afirmou em uma voz neutra. — Ele queria você, a humana. Queria suas expressões, queria o seu coração batendo por ele. Queria a sua figura corajosa. Nada de almas gentis, nada disso. Kyle não queria o inimigo; tinha medo que você fosse odiá-lo por isso.

— Eu realmente o odeio por ter aceitado Sunny — afirmei, tentando me desvencilhar de seu aperto.

— Ele não aceitou-a simplesmente. É mais que isso — ele replicou. — Ele quis você por muito tempo, até entender o que ele precisava. Ele não precisava de alguém que fosse corajosa, distante e forte como você. Ele não precisava de alguém que fosse machucada e cheia de sequelas. Ele já estava cicatrizado o suficiente. Ele queria quem você era quando nos encontrou, a nossa luz, a nossa esperança. Você nunca mais seria assim. Você não era o que ele precisava.

As palavras foram lentamente absorvidas por minha mente nebulosa. Eu era a garota forte, distante e cheia de ódio por uma sociedade modificada por alienígenas intrusos. Alienígenas que arrancaram meus pais de mim e me deixaram com sequelas. Estava machucada. Nunca mais voltaria a ser a mesma.

Tinha levado a esperança aos irmãos O'Shea no começo da invasão, contudo a tirei deles quando fui invadida. Depois que se é roubado de si mesmo, não há retorno. Nunca mais seria a mesma. Nunca mais teria meus pais e seria obrigada a conviver com um Kyle imensamente machucado.

Machucado pela perda de uma alma. Machucado pela perda de Sunny. Porque, embora eu não gostasse dela, a conhecia um pouco pelo tempo em que compartilhamos o mesmo corpo. Ela era gentil e agradável, apesar de tudo. E ela era uma espécie de sol, mesmo que fosse discreta à sua maneira.

E então eu entendi.

c Fazia anos que não chorava. No entanto, senti que poderia lamentar por tudo naquele momento. Eu tinha o direito.

— Sinto muito — ele sussurrou, prendendo-me contra o seu corpo de maneira carinhosa. Como se fosse o meu irmão. Irmão que tinha me avisado sobre o que estava realmente acontecendo na minha vida.

Eu amava Kyle. Muito, mais do que o meu coração suportava. Amava-o, mesmo o odiando por ter aceitado uma alma. Por ter amado uma alma. No entanto, não poderia ser egoísta em pensar que aquela alma não tinha o devolvido uma vida que eu tinha tirado dele sem permissão. Não poderia culpá-lo por gostar dela.

Agora eu entendia que, mesmo que colocassem Sunny em um corpo qualquer, Kyle a amaria. Porque era dela que ele precisava. Ele precisava de um sol dentro de uma caverna que cheirava a mofo. Ele precisava de outra companhia além de seu irmão. E essa companhia não era eu ou o meu corpo.

Essa companhia era Sunny.

Eu o amava muito. Tanto que fui capaz de compreender que ele não precisava de mim e que nunca seria feliz comigo rodeando a sua vida. Eu o amava ao ponto de compreender que Sunny era a pessoa que ele precisava, alguém que não estava machucada e que não carregava nenhum tipo de ódio no peito. Alguém que partiu por espontânea vontade a fim de me devolver para ele.

Precisava partir. Precisava tomar a mesma atitude de Sunny e entregar o meu corpo para uma alma que o faria feliz. A minha atitude constaria como algo relacionado ao amor. Ficando com ele, jamais conseguiria prová-lo todo o amor que carregava em meu peito. Partindo, ele entenderia do que eu seria capaz de fazer por ele. Ficaria feliz com isso e poderia ficar ao lado de Sunny com a paz rodeando-o.

Eu amava-o o suficiente para escolher me aniquilar e lhe entregar uma alma da qual ele precisava.


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Notas finais do capítulo

E entãããão? O que acharam da decisão da Jodi? O que acham que vai acontecer a partir de agora?
Digam-me suas opiniões!
Até semana que vem :*