Três Corações - o Coração que Me Amou escrita por mariana_cintra


Capítulo 24
A Decisão de Dan


Notas iniciais do capítulo

Antepenúltimo!



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Existe felicidade completa?         

Dan e eu estamos casados há sete meses. Nada na minha vida poderia estar melhor. Temos uma casa relativamente grande e muito confortável, um carro bacana, eu consegui um emprego em um escritório e Dan estava trabalhando com John. Claro, Dan não era médico, mas trabalhava como assistente e secretário pessoal. Que chique!         

Quando Dan e eu estávamos juntos, eu sentia que nada no mundo poderia estragar minha felicidade. Cheguei a me esquecer até da doença que eu tinha. Isso é algo que eu não deveria ter feito.         

Nossa vida estava perfeita. Mas aquele dia 25 de agosto mudaria para sempre as nossas vidas.         

Era uma noite comum e nós estávamos em casa depois do jantar. Eu terminei algumas tarefas do trabalho e fui ao encontro de Dan, que estava na sala de estar. Queria namorar um pouco, pois há dois dias andávamos ocupados e não curtimos um ao outro como deveríamos.         

Quando terminei de descer a escada, senti algo que há algum tempo não sentia: uma forte pontada no coração. Chamei por Dan e ele veio me socorrer rapidamente.

- Lana, Lana! ele gritava, desesperado. Eu, no entanto, já não o ouvia com clareza, pois meus sentidos estavam deturpados. A dor era imensa, eu nunca havia sentido uma dor assim. A falta de ar me consumiu e quanto mais eu tentava respirar, mais dor eu sentia. Foi aí que tudo ficou escuro.

Acordei no hospital e levei muito tempo até apurar meus sentidos. Primeiro, certifiquei-me de que aquilo era realmente um hospital. Depois, tentei ouvir coisas a minha volta. Ouvi o som de um bip constante, provavelmente vindo de um aparelho que media meus batimentos cardiácos. Apurando ainda mais minha audição, pude escutar uma conversa vinda de fora do quarto onde eu estava.         

- Você não pode fazer isso de jeito nenhum, Dan! - eu não reconhecia aquela voz, não conseguia ligá-la a uma pessoa. Continuei ouvindo na tentativa de conseguir fazer isso. - Nem eu nem qualquer outro médico permitiremos que cometa um absurdo desses, Dan! - finalmente me dei conta de que era a voz de John.        

 - Mas precisamos fazer alguma coisa! Eu preciso salvá-la! - era a voz de Dan que pronunciava essas palavras. Eu reconheceria seu timbre há milhas de distância.         

Mas sobre o que eles estavam falando? Me salvar? Não, não podia ser... Será que eu estava prestes a morrer? Mas eu não sentia nada naquele momento! Não sentia dor, não me faltava o ar. Alguém tinha que contar ao Dan que eu estava bem, eu não queria que ele se preocupasse.         

- Dan, mas o que você quer fazer é algo absurdo e que nem é permitido! - prestei atenção e notei que era a voz de Matt. - Ninguém vai deixar que faça isso!

- Matt, por que é que você não cala a sua boca? Ela é minha esposa, eu decido o que fazer para salvar a vida dela - eu pude sentir a raiva na voz de Dan. Do que diabos eles estavam falando?        

 - Não me interessa se ela é sua esposa! - Matt elevou o tom de sua voz. - Não me importa a escolha que ela fez - nesse momento, seu tom voltou ao normal e mesmo através da parede que nos separava, eu pude sentir o pesar na voz de Matt. Isso é algo que me machucava muito, vê-lo me amar quando meu coração pertencia a Dan. - É tudo uma questão de pensar, Dan! Eu sei que você quer mais que tudo nessa vida salvar a vida dela e eu também quero! Eu também a amo, eu quero fazê-la viver tanto quanto você quer. Mas não podemos tomar decisões extremas e ilegais. Ninguém mataria uma pessoa para salvar a vida da outra, não dessa forma! Pense!         

Não era possível, eles estavam falando sobre salvar minha vida. Mas eu não conseguia entender quais eram os planos deles.         

Tentei me levantar e ir até o lado de fora, mas então me dei conta da situação deplorável em que eu me encontrava: ligada a aparelhos, eu mal podia me mexer. Então era por isso que eu não sentia dor. Estava tão anestesiada que não sentia mais nada. Eu estava viva porque aparelhos me mantinham assim. Eu não podia acreditar... Era o meu fim?         

Eu começava a entrar em desespero quando John entrou no quarto. Ele me olhou com pesar, e talvez por meus olhos estarem cerrados ele pensou que eu não estava acordada.        

 - Nós vamos dar um jeito, Lana. - ele disse, ainda acreditando que eu estava desacordada. - Eu nunca vou deixar a mulher que Matt ama morrer, e tampouco ele ou Dan deixarão isso acontecer.         

Dizendo isso, senti uma agulha penetrar minha pele. Ele estava aplicando alguma medicação em mim através das veias. Em poucos minutos eu já estava tão grogue que senti que ia dormir outra vez. Ouvi os passos de John caminhando para fora do quarto, e em seguida eu ouvi a voz de Dan do outro lado.         

- Então é isso, John? - ele perguntou. - Vocês não podem dar o coração de uma pessoa viva para Lana?        

 - Não - foi o que John respondeu.        

 - E não podem fazer uma pessoa viva passar a ser uma pessoa morta, certo?       

  - Não - John disse outra vez.       

  - Tudo bem. Mas eu posso. Tudo por ela, porque eu a amo.         

E foram as últimas palavras que ouvi antes de adormecer. Mal sabia eu que também seriam as últimas palavras que eu ouviria de Dan em toda a vida.

         - Você é minha vida, Lana.         

A frase ecoava em minha cabeça, como um grito num lugar gigante e escuro. O grito nunca chegava às paredes daquele lugar porque era um grito pequeno para um lugar grande demais. A escuridão era imensa. Era um vazio. Um vazio torturante. Um vazio repleto do mais completo escuro.         

Bip. Bip. Bip         

Abri os olhos. Minha visão ficou turva e eu me senti enjoada, mas só o fato de sentir alguma coisa me deixou feliz. Tentei sair do lugar um centímetro que fosse, mas isso me causou dor.        

 - Lana? - de quem era aquela voz mesmo? Eu não conseguia lembrar. 

 - Ela acordou? - uma voz mais grave questionou.        

 - Acabou de abrir os olhos, mas acho que os sentidos dela ainda não estão completamente de volta. Ela não move o olhar, parece não ouvir.         

- É normal. Em alguns instantes ela terá os sentidos apurados outra vez. - a voz mais grave tranquilizou a outra.        

 Esperei por alguns minutos até que minha vizão se tornasse clara e minha cabeça parasse de rodar. Virei um pouco minha cabeça para a direita e reconheci o rosto de Matt me encarando com preocupação.        

 - M-Matt? - tentei dizer, mas minha voz vacilou e acabou sendo só um sussurro. Ainda assim, ele ouviu.        

 - Lana, graças a Deus está bem! - Ele se aproximou e começou a me olhar com lágrimas nos olhos. Por que ele estava assim?         

Esperei um bom tempo até conseguir me mexer e assim que o fiz, levei uma das mãos ao peito, tentando sentir o local de onde supostamente deveria vir uma dor que não vinha. Curiosamente, senti que havia faixas enroladas em meu peito. Fiquei assustada e olhei para Matt.       

  - Você recebeu um coração, Lana, e vai viver. Você vai viver. - ele me disse, com um sorriso nos lábios. Ele estava muito aliviado e muito feliz, eu podia ver.        

 - Mas ela ainda precisa descansar. Venha, Matt, vamos sair.         

E assim eles sairam do quarto, me deixando sozinha para que eu logo adormecesse.         

- Lana... Eu te amo.        

 Essas palavras ecoaram em minha cabeça exatamente como antes. Isso me fez lembrar de Dan, e lembrar de Dan foi o que me puxou do transe e me fez acordar.         

Sem sentir meu corpo doer como no dia anterior, me levantei um pouco, tentando me sentar. Matt estava ao meu lado e logo reclinou a cama para me deixar sentada. Eu o encarei, enxergando-o com clareza.        

 - Matt... Onde... Onde ele está? - eu fiz a pergunta que tanto me incomodava.        

 - De quem está falando, Lana? - ele me perguntou e eu vi claramente quando desviou o olhar para o chão.        

 - Dan... Onde ele está? Eu quero vê-lo. Onde Dan foi? Onde ele está? - eu temia pela resposta, flashbacks da conversa de Matt, Dan e John me ocorreram e eu formulei uma hipótese maluca na cabeça, esperando que fosse mentira.        

 - Ele... Não está aqui. - Matt disse, ainda sem me olhar nos olhos.        

 - Onde... Ele está?! - eu tentava com todas as minhas forças gritar, mas não tinha tanta força assim.        

 - Lana, não me faça te dizer nada agora, olha pra você.        

 - Eu estou bem. Não sinto dor nenhuma - eu menti -. Estou muito bem, posso saber de qualquer coisa. Matt, por favor, me diz... Onde ele está?        

 - Lana, Dan está muito feliz que você recebeu um coração e vai poder viver sem nenhuma preocupação, sabia disso? - Matt disse, e quando transformou a frase numa pergunta, sua voz ficou rouca e vacilou. Ele finalmente levantou os olhos pra mim e eu vi que estavam úmidos. Ele queria chorar e só de ver Matt assim, senti vontade de chorar também.         

- Matt... Não foi... - eu não consegui terminar, lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto.        

 Ele estendeu o braço e secou minhas lágrimas com um único dedo, tocando minha pele suavemente.        

 - Ele... Ele fez o que eu queria ter feito. Ele fez o que eu queria ter coragem pra fazer. - Matt disse, por fim.        

 - Matt...? - eu o encarei com lágrimas contidas nos olhos e um coração desesperado.        

 - Ele jogou o carro que dirigia num barranco e provocou a própria morte, Lana. Pessoas mortas podem doar órgãos.        

 Eu não acreditava no que ouvia. As lágrimas cairam desesperadamente e eu não deixei que Matt as enxugasse. Ele me olhou com pesar e tentou me conter, mas eu senti que não pararia de chorar nunca mais. Entre soluços, tentei formular alguma frase, mas não tive sucesso.         

- Uma vez Dan me disse que te amava e que você sempre estaria no coração dele, Lana. Agora eu te digo: o coração de Dan estará sempre em você. Ele entregou a própria vida para que você vivesse. Por isso, seja forte - Matt pronunciou essas palavras e se levantou. Acho que ele não queria mais ficar ali por não conseguir me dar forças. Antes de deixar o quarto, apontou para a mesa ao lado da cama e disse: - Dan te deixou essa carta. Leia quando estiver melhor. 

Matt saiu do quarto e eu fiquei sozinha sem saber o que pensar ou sentir. Agora eu sabia que aquela imensa escuridão era o vazio que viveria para sempre em mim, e foi naquele momento que, permanecendo viva, eu morri.


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Notas finais do capítulo

Vão me odiar por isso?
Deixem reviews!