Acordei com os raios de sol que atravessaram a cortina. Esfreguei os olhos e me sentei no.....sofá?

As lembranças de algumas horas atrás invadiram minha mente com força total. Olhei para o sofá ao lado,não havia nem sinal de Pedro. Me levantei e saí a procura dele,será que ele ainda estava lá?

Cheguei a cozinha e encontrei João fazendo o café da manhã,ou pelo menos tentando.

– João? – Indaguei e ele só então pareceu notar minha presença ali.

– Ah,bom dia Karina. – ele respondeu desanimado.

– Tá tudo bem?

– Tá sim....Ai! – Respondeu,largando o que parecia ser uma frigideira quente dentro da pia. – Por quê cozinhar tem que ser tão difícil?

Eu apenas ri da cena. Não queria nem ver como ia ser quando fosse a minha vez.

– Relaxa,com o tempo a gente pega a prática. – Respondi,dando de ombros. – Erm...cadê o Pedro?

– O nosso vizinho já foi embora,se quer saber. – Ouvi ele dizer e senti minhas esperanças de vê-lo ainda em casa sumirem. – Eu mesmo tratei de mandar ele ir.

– Você o quê???? – Quase gritei,qual era o problema dele?

– Isso mesmo que você ouviu. Mas antes de querer me matar,eu tenho os meus motivos.

– E eu posso saber quais são? – Questionei,me contendo para não voar pra cima dele. Não sabia se sentia raiva porque queria vê-lo ali ou se era outra coisa,mas o sentimento estava ali.

– É simples,maninha: eu sou seu irmão mais velho aqui,quer você goste ou não. Nós nem o conhecemos e ele já passou a noite aqui,naquele estado que você deve se lembrar. – Assenti,e ele prosseguiu com o raciocínio. - Ia ser muito estranho se eu sorrisse e o convidasse para tomar café com a gente,ele podia sei lá,desconfiar de alguma coisa. Eu tinha que bancar o seu protetor para que a missão dar certo.

Eu o encarei,ainda em dúvida. No fim,tive que concordar que ele tinha um pouco de razão.

– É,até que faz sentido. – Respondi,pegando uma maçã na fruteira e mordendo. – Só espero que você não tenha exagerado na dose.

– Pode ficar tranquila,eu não sou nenhum Mestre Cruel. – Ele respondeu,e eu o olhei confusa. – Qual é Ka,vocês estavam dormindo e depois daquilo tudo eu tive insônia. Aí liguei a tv e no canal de desenhos tava passando um legal,onde tinha esse daí. Agora chega de pergunta e sobe pra se arrumar,hoje a senhorita tem aula.

Eu não pude deixar de rir. Para quem não sabia nada da vida dos humanos,João até que já estava interagindo bem com a nova vida.

– X –

– Pedro? – Duca o chamou,mas o garoto parecia alheio a qualquer coisa.

– Chamou? – Ele pareceu sair do transe e respondeu.

Estavam sentados na arquibancada enquanto a aula não começava. Bianca também estava lá,o que era raro. Ela sempre procurava alguma amiga,dizendo que não tinha paciência para o grau de intelecto das conversas deles logo de manhã. Em poucas palavras,ela não queria ouvir Duca falar de outras garotas na frente dela.

Muito menos aturar Priscila grudada no irmão.

– Quê que você tem hoje? – perguntou. – Não dormiu bem? Uma pena,porque eu dormi muito bem...Ai,Bianca!

O lutador tocou o local onde agora ardia pelo tapa de Bianca.

– Cê tem fetiche sexual em me bater,é isso?

A garota já preparava uma resposta quando Pedro se lembrou da cena daquela manhã.

Acordou sem saber aonde estava. Olhou para o relógio,onde marcavam cinco e dezenove da manhã. Tentou se esforçar para se lembrar de alguma coisa da noite passada,mas foi em vão. Ele se lembrava vagamente da briga com Priscila e do escândalo que a irmã fizera,nada mais depois disso.

E então ele a viu. Estava deitada no sofá,onde ressonava um sono tranquilo. Podia estar enganado,mas ali,aos seus olhos,ela parecia tão pequena,tão frágil,tão....Linda. Poderia confundi-la facilmente com um anjo.

Tentou lembrar seu nome. Era....Karina? Ou algo assim,tinha quase certeza ser esse. Por quê ela dormia no sofá ao lado,ao invés da cama? Alguns flashes vieram a tona. Neles,Karina chorava,e ele secava suas lágrimas. Sabia da gravidade de seu estado,mas se lembrava com muita nitidez da imensidão daqueles olhos azuis. Duas orbes que o fitaram com pesar na noite passada,que transmitiam tudo que a pequena sentia.

Num ímpeto de insanidade – ou nem tanta assim -,se aproximou dela,se ajoelhando ao lado do sofá. Queria poder lhe pedir desculpas,ou pelo menos se retratar pela maneira que agira. As palavras não saíam.

Quando finalmente criou coragem,ouviu um barulho de alguém tossinso,indicando que eles não estavam sozinhos.

– Erm...Oi. – Pedro quebrou o silêncio,ao ver João,que o encarava. – Você deve ser irmão da Karina.

– E você deve deve ser o irmão da Bianca. – João respondeu,sem desfazer a expressão séria. Precisava agir dessa forma,ou nada daria certo. – Escuta,a minha irmã foi muito generosa ontem a noite,deixando você dormir aqui e poupando a sua irmã de te ver naquele estado. Mas agora eu acho melhor você ir.

– Eu também acho. – Respondeu,se dirigindo a porta. Quanto mais problemas pudesse evitar,melhor.

Quando chegou em casa,viu Duca abraçado a Bianca no sofá. Os dois dormiam tranquilamente,a cabeça dela encostada no peito do amigo. Foi até os dois e desligou a tv,que transmitia mais um daqueles comerciais que vendiam coisas inúteis.

Olhou o relógio da cozinha,constatando ainda ser cedo para ir para o colégio. Subiu as escadas e entrou no banheiro. Tomou um banho e se arrumou. Quando desceu as escadas para sair novamente,nada havia mudado.

– Ah Duca,você vai me explicar isso.... – sussurrou para si,antes de entrar no carro e dar partida,indo em direção a casa da namorada para buscá-la.

Saiu de seus devaneios e Duca ainda brigava com Bianca,ou seria o contrário?

– Mas e você,o que tava fazendo dormindo com a minha irmã no sofá? – Questionou.

Pedro nunca se encaixou na linha de irmão ciumento,mas sabia como Duca era,e ver a irmã sofrer por ele não era uma possibilidade.

– Calma brother,não aconteceu nada. – Respondeu Duca com naturalidade,e Bianca quis abrir um buraco pra se esconder,de tanta vergonha. – Eu só dormi lá porque não quis deixar a Bi sozinha....

– Acho que a pergunta que deveria ser feita é onde VOCÊ estava na noite passada,não é Pedro? – Indagou Bianca,e o irmão desejou não ter entrado no assunto.

– Isso não é da sua conta,Bianca,vê se não enche. – Respondeu o guitarrista da Ribalta,ríspido.

Nos últimos meses,não se lembrava de ter tido alguma conversa civilizada com a irmã. Sempre que tentavam um diálogo,a menina o acuava com perguntas que ele podia – ou não queria – responder. A medida que o tempo passava,viu a boa relação que tinha com Bianca se destruir cada vez mais.

Viu Duca o encarar com raiva pela maneira com que tratou Bianca e se pôs logo a consertar a besteira que havia feito.

– Eu tava com a Pri. Satisfeita? – Viu a morena revirar os olhos com a resposta.

– E falando nela....

Pedro não precisava se virar para ver de quem o amigo falava. Priscila chegou e foi logo cumprimentando o namorado.

– Oi,Pê. – E o beijou.Pedro a abraçou,e então ela notou a presença dos dois ali. – Oi Duca,e que milagre ter você por aqui Bianca.

– Bom dia. – Bianca forçou seu melhor sorriso. – Erm,Duca eu lembrei que preciso conversar com o Edgar antes da aula,vem comigo? – E o olhou pedindo para acompanha-la sem questionar.

– Claro,Bianquinha. Tchau casal.

Se afastaram das aglomerações no pátio do colégio e seguiram até a sala,mas algo os fez parar no meio do caminho.

Algo não,alguém.

A alguns metros de distância,estava Karina,entrando na Ribalta para seu primeiro dia de aula.