17 anos e 8 meses antes...

Uma brisa gostosa entrava no quarto através da janela aberta. As folhas da planta verde, em cima do criado ao lado da cama de casal e do velho chapéu de palha, balançavam como se estivessem comemorando a maresia trazida do lado de fora. As águas estavam excepcionalmente calmas naquela noite e por isso pouco se sentia o leve chacoalhar do Sunny sobre elas. O navio estava silencioso, já era madrugada com certeza e, por isso, toda a tripulação dormia tranquilamente.

Bem, talvez nem todos.

Nami tinha parte de seu corpo, no momento nu, coberta por um fino lençol branco e sua cabeça estava deitada sobre o peito desnudo de seu capitão. Seus olhos fixavam-se na parede do quarto do outro lado, enquanto alguns leves arrepios atravessavam seu corpo ao sentir a brisa fresca, indo contra sua pele aquecida por conta dos momentos antes entre ela e o moreno. O braço de Luffy estava sob seu corpo, a abraçando, enquanto os dedos do mesmo acariciavam levemente a cintura nua da navegadora.

Luffy se encontrava de olhos fechados, mas a ruiva sabia que ele não estava dormindo, nem mesmo sonolento. A verdade é que, em todas as vezes depois de fazerem amor, era assim que eles ficavam. Exatamente daquela forma. Apenas em silêncio, aproveitando a presença um do outro o máximo que podiam. Enquanto ainda podiam...

― Luffy... ― Ela chamou em um sussurro tão baixo que até mesmo pensou que ele não ouviria, mas estava enganada e em resposta teve apenas um “hum” muito tranquilo. ― Eu... Eu não estou preparada pra te perder... ― A voz de Nami ainda era um sussurro e agora começava a embargar.

Desde o café da manhã, quase duas semanas antes, em que Luffy tinha dito todas àquelas palavras de encorajamento a seus nakamas, ela não tocara mais no assunto e tentava de toda forma enfrentar a dura realidade de cabeça erguida e com um sorriso, como ele pedira a todos. As coisas no navio voltaram ao normal, ou ao menos o mais normal possível naqueles dias e ela, assim como seus amigos, estavam conseguindo lidar muito bem com a situação. Contudo, havia momentos em que aquele sentimento terrível vinha lhe afligir. Isso acontecia principalmente em momentos como aquele, onde ela se entregava de corpo e alma ao capitão e quando deitava sua cabeça sobre o peito dele, ouvindo seu coração bater ritmado, lembrava que em pouco tempo ele não estaria mais ali; e aquele som que ela tanto amava ouvir não existiria mais.

E naquela noite, o sentimento de medo estava ainda mais forte. Não podia mais guardar aquelas palavras para si. Por mais que talvez isso voltasse a irritar Luffy ― ele realmente detestava quando algum de seus nakamas vinha com aquela conversa ―, ela decidiu dizer. Era a verdade. Ela não estava preparada para perdê-lo. Nenhum pouco.

A reação do moreno, contudo, fora diferente da qual a ruiva esperava.

― Ninguém nunca vai estar preparado pra perder quem ama, Nami. ― A frase saiu em um tom extremamente tranquilo e terno. Muito diferente dos gritos e risadas hiperativas contagiantes que ele externava todos os dias.

Aquelas palavras atingiram a alma da ruiva diretamente e ela não conseguiu evitar. Em um movimento repentino, abraçou o capitão com todas as forças que podia, afundando seu rosto na nuca do mesmo. As lágrimas, constantes e abundantes, molhavam o ombro de Luffy e o travesseiro em que o mesmo deitava sua cabeça.

O moreno retribuiu o abraço com a mesma força e intensidade, em silêncio. Não tinha o que dizer. Sabia que nada do que dissesse iria diminuir a dor que sua navegadora sentia. Se estivessem em posições trocadas tinha plena consciência de que estaria se sentindo da mesma forma. Tudo o que tentava naquele abraço era permitir que ela chorasse o quanto quisesse e passar toda a confiança possível para que ela conseguisse superar os acontecimentos que se aproximavam cada vez mais.

E ele sabia que estava muito mais próximo do que todos imaginavam. A dor em sua cabeça, aguda e que quase o deixou inconsciente naquela tarde, lhe avisara muito claramente.

Se ele pudesse, realmente faria de tudo para não deixá-la, deixar seus nakamas, deixar seu filho que ainda se quer sabiam que existia. Mas ele não podia. Desde o momento em que descobrira sobre sua doença percebera que sua hora estava chegando. Que a única certeza que todos tinham na vida estava muito perto de tornar-se certeza também na sua.

Depois de alguns minutos naquele abraço, o choro compulsivo de Nami fora diminuindo até deixá-la. Queria nunca sair daquele abraço, ficar ali para todo o sempre. Aproveitando o calor e a presença dele tanto quanto era possível, mas Luffy fora quem a afastara, passando assim a encarar o rosto úmido de sua namorada.

Ele sorriu.

― Não chore mais, por favor. A última lembrança que quero ter sua é o seu sorriso. ― Ele enxugou as últimas lágrimas que escorreram dos olhos da ruiva, ainda sorrindo de forma doce.

― Hum. ― Ela afirmou enxugando o rosto e abrindo um sorriso tímido, mas que logo aumentara quando ouviu o moreno com sua risada característica.

― Isso. Shishishishishi’. ― E então ele a olhou nos olhos, um olhar que permanecia trazendo toda a luz que sempre levou por onde passou, embora naquele momento, tão penetrante quanto nunca vira antes. ― Nami... ― Ele pareceu pensativo por um instante. ― Acho que nunca disse isso. Nunca achei necessário, na verdade. Mas... ― Sorriu mais uma vez. Aquele sorriso que só ele sabia dar. ― Eu te amo!

A frase deixou-a completamente paralisada. Sem reação. Não que achasse necessário no meio de tantas formas das quais ele demonstrava seu amor, mas ele realmente nunca dissera aquela frase tão simples, embora tão profunda e significativa.

Mais uma vez ela não pôde conter as lágrimas, mas agora eram lágrimas que escorriam em meio a um lindo sorriso. Sem pensar muito, simplesmente “atacou” seu capitão e o beijou. Não tinha palavras para descrever tudo o que sentia naquele momento. Nenhuma outra forma era melhor do que aquela para lhe demonstrar o quanto também o amava.

Cada pedacinho daquele ser tão raro, estranho e idiota, cada um, ela amava infinitamente.

Luffy ficou surpreso pela reação da ruiva e por um momento não reagiu, mas logo sorriu em meio ao beijo e o intensificou puxando para ainda mais perto o rosto da navegadora.

Logo já estavam retornando há minutos atrás e bagunçando ainda mais os lençóis que cobriam a cama.

Mal ela sabia que aquela seria a última vez em que desafiaram, juntos, as leis da física; que aquela ali seria a lembrança mais vívida de Nami de estar nos braços de seu capitão por todo o resto de sua vida.

Ela não sabia que ao nascer do sol, tudo o que mais desejaria é que aquela noite nunca terminasse e que ele não tivesse dormido, pois na manhã seguinte, ao acordar, Nami já não poderia mais ouvir o coração de Luffy batendo.