You Only Live Once escrita por Vero Almeida


Capítulo 28
Momentos que fazem a diferença


Notas iniciais do capítulo

Oieeee! Cheguei!

Márcio, muito obrigada mais uma vez pelo nome da banda. Seu limdo com m de maravilhoso! #Parei hahaha

Amores, esse capítulo é mais um pra lista dos açucarados, mas lembrem-se que a calmaria geralmente vem antes da porca torcer o rabo. As coisas estão bastante quietas, mas não por muito tempo.

Obrigada por me acompanharem até aqui e pela paciência com as minhas demoras. Vocês sabem que eu sou enrolada mas sou gente boa haushaushaushas.

Divirtam-se.



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PDV do Ryan

Estávamos parados ao lado do coreto, todos os quatro membros da banda. O quinto estava lá em cima, terminando de ajeitar a bateria exatamente como queria, Noah podia ser bastante neurótico quanto a isso.

A noite começava a cair agora, era a hora que eu mais gostava de tocar. As vezes, quando subíamos ao coreto, nós dávamos a sorte de pegar exatamente o horário dos últimos vestígios do sol no horizonte. Estar diante do público sempre era mágico, mas quando isso acontecia, era espetacular.

Chequei mais uma vez Alícia, que estava parada bem ao meu lado se tremelicando toda. Contorcia os dedos e praguejava baixinho, acho que nunca a tinha visto tão nervosa na vida, e olha que já tinha a visto enfrentar situações bem piores que uma apresentação em um coreto de praça. Marie estava ao seu lado, rindo do nervosismo da amiga. Algo claramente a estava incomodando, seus olhos se focavam no horizonte hora ou outra, e a peguei prestes a roer as unhas algumas vezes.

Acredite, quando Marie rói as unhas com certeza alguma coisa está errada. Acho que nunca vi essa garota sem esmalte durante todo o tempo em que a conheço.

– Como é? – Alícia perguntou, olhando pra mim com uma expressão ansiosa e aterrorizada ao mesmo tempo. – Lá em cima, eu quero dizer. Quando eu cantava em bares ninguém realmente prestava atenção em mim, isso deve ser completamente diferente.

– Ah é sim. Não existe nada igual. – Pensei em todos os rostos que eu sempre enxergava de cima do coreto, alguns eram bem fiéis, estavam sempre por lá. Não era como lotar uma casa de espetáculos com 16.000 lugares, mas conseguíamos juntar umas 200, 300 pessoas. E era incrível, Nathan tinha os contatos dele e nossas músicas sempre tocavam nas rádios do campus, as pessoas conheciam nossas letras. – É viciante.

Claro que é diferente quando se lança uma coisa nova. A maior parte do nosso repertório teria que ser modificado, ainda nem tínhamos terminado de arrumar o arranjo das músicas, apenas de algumas delas. E claro, agora o vocalista era eu. É melhor não dizer a ela da minha experiência com novidades, eu aposto um rim como o nosso dueto vai ser um sucesso, mas ainda existe o risco de ninguém gostar.

Capaz de ela se recusar a subir ao palco se eu entrar nesse assunto.

– Ryan... – Marie se dirigia a mim, mas seu olhar continuava perdido em algum outro lugar em meio às pessoas que bebiam e se divertiam. – Quanto tempo você acha que um homem consegue ficar sem sexo?

Que raio de pergunta era aquela? Eu olhei pra Alícia e ela me olhou de volta, então caímos na gargalhada. Marie cruzou os braços, e um bico espontâneo se formou em seus lábos.

– É sério! – Insistiu, batendo o pé no chão como uma criança birrenta.

– Depende, esse cara é o Noah? – Eu ainda tentava conter a risada, mas era difícil. Sério mesmo? Era isso que a estava preocupando?

– Não! É uma pessoa hipotética! – Estava brava, não achava graça que eu e Alícia caçoássemos do problema que ela com certeza considerava seríssimo.

– Hm, não sei, quanto tempo acha que Noah agüenta sem sexo? – Virei-me pra Alícia, que resolveu entrar na brincadeira e deu de ombros, como quem não faz ideia da resposta. – Uns três dias no máximo.

– Eu não estou falando do... – Exaltou-se, mas interrompeu a frase no meio. -Três dias? Sério? – Uma ruga de preocupação surgiu em sua testa.

Eu ri, e me aproximei dela, passei meu braço por seus ombros e a sacudi de leve.

– Essa pessoa hipotética é louca por você! – Ela ergueu os olhos em minha direção, o biquinho discreto ainda estava lá. – Sério, não tem que se preocupar com isso.

Marie balançou a cabeça em sinal de concordância, mas eu sabia que esse assunto ainda rodearia a cabeça dela por um tempo.

– Eu sempre me preocupo com tudo. – Cruzou os braços.

– É verdade, assim vai ter rugas cedo. – Brinquei. Ela apenas me fuzilou com os olhos, sem se dar ao trabalho de responder.

É, acho que não estava muito afim de brincar mesmo.

– Hey, tudo pronto aqui. – A cabeleira castanha e desgrenhada de Noah surgiu de cima do coreto e piscou pra nós.

Os caras começaram a se ajeitar, e eu fiz o mesmo, acomodando Charlotte (A guitarra, pra quem não lembra) confortavelmente nos meus ombros. Alícia teve um pequeno chilique, e eu tentei acalmá-la grudando meus olhos aos dela e fazendo-a respirar fundo.

– Calma, vai dar tudo certo. A banda vai tocar as músicas que preparamos, e então eu te chamo e fazemos o dueto.

Ela balançou a cabeça afirmativamente repetidas vezes, tentando manter a respiração sincronizada, sem muito sucesso.

– Você vai arrasar, tenho certeza. – Pisquei pra ela, antes de dar-lhe as costas e rumar até pequena escada que nos levava ao coreto. – Ah, Alícia – Parei já no primeiro degrau, voltando meu olhar a ela. – Não tenha medo das notas altas, sua voz é perfeita pra elas.

Eu estava bem orgulhoso daquela garota, sabe? Não importa o resultado, ela trabalhou duro, e enfrentou boa parte dos seus medos em todos os sentidos desde que chegou aqui. É uma guerreira, alguém que eu quero ter sempre por perto.

_/_/_

PDV da Ana

Claro que eu tinha que estar na praça pra ver minha menina prodígio cantar. Ok que pra mim todos os meus bebês são super talentosos e lindos, mas eu sabia da guerra que foi pra convencer essa menina a pisar num palco (ainda que no caso seja um coreto). E eu sei que tem algo de especial na música que ela faz.

Alícia tem história pra contar, tem uma mensagem a passar. Eu apostaria o meu corpinho nu como isso faria toda a diferença.

Subi em um dos canteiros e escorei-me em uma árvore, já que ser baixinha é uma desgraça e eu não conseguia enxergar nada do chão. Fitei o coreto, Noah ainda estava lá em cima ajeitando sua bateria com mais cuidado do que uma mãe arrumando seu filho pra ir a escola. Ótimo, eu ainda tinha um tempo pra comer alguma coisa.

– Hey, hey, você! – Chamei uma guria de óculos, meio japonesa. Ela andava abraçando o próprio corpo e usava um macacão jeans combinado com uma camiseta branca e um sapatinho de mesma cor. Ela parou, meio confusa, olhando ao redor. – É, você mesma, vem aqui rapidinho.

Ela veio em minha direção, meio relutante. Peguei minha carteira no bolso interno da jaqueta e estendi-lhe um pouco de dinheiro.

– Pegue um Cheeseburguer pra mim, vai sobrar troco, aproveita e compra um pra você também. – Pisquei pra ela, já que era pra ser folgada, pelo menos que fosse simpática também.

Ela pegou o dinheiro de minhas mãos e deu de ombros, se embrenhando novamente no meio do fluxo de pessoas.

– Hey! – A chamei. – Não se esqueça que eu posso te ver daqui do alto, nem pense em sumir com meu dinheiro!

Não me respondeu, acho que pensa que eu sou doida varrida. De qualquer maneira, mantive meus olhos nela durante todo o trajeto até a barraca de hambúrguer, e foi correndo com os olhos atrás da garota que eu avistei Adam sentado com a cabeça entre as pernas num banco um pouco adiante.

Arqueei a sobrancelha e desci do canteiro, seguindo em direção ao garoto a passos apressados, desviando de uma pessoa ou outra.

Sentei-me ao lado dele, suspirando longamente. Eu fazia uma boa ideia de qual era o problema, sempre que botava os olhos nele eu sabia que uma hora isso aconteceria.

– Levanta essa cabeça moleque, nem parece meu aluno! – Baguncei-lhe os cabelos. Ele ergueu o rosto em minha direção e eu pude ver seus olhos vermelhos e a expressão confusa. Era de partir o coração.

– Ele nunca mais vai falar comigo. – Disse, com a voz meio chorosa. – E eu estou confuso. Não sei de mais nada, eu não sou mais eu!

Segurei suas bochechas levemente, e olhei em seus olhos assustados.

– Você continua sendo você. – Enfatizei cada palavra. – Nada em você mudou, a não ser um pequeno detalhe. Ou um grande detalhe, mas mesmo assim, eu garanto que tudo parece bem mais complicado do que realmente é agora.

Ele não disse nada, apenas ficou ali, olhando pra mim como se eu fosse uma espécie de luz no fim do túnel. Ainda assim, eu sabia que sua mente estava uma bagunça, sabia que ele entendia perfeitamente o que eu dizia, mas ainda não tinha admitido pra si mesmo o mais importante.

Eu tento não me apegar a esses monstrinhos que aparecem na minha casa, mas quando eu os vejo todos perdidos em meio aos próprios conflitos, medos, dilemas, é uma tarefa quase impossível. Eles são jovens, e estão naquela idade em que pensam que são velhos demais pra pedir colo de mãe, e mesmo se não fosse o caso, a maior freqüência com que vêem os pais é de final de semana. E quando me dava por mim, lá estava eu, ninando-os como se fossem meus bebês.

– Adam, o que quer que esteja se passando nessa sua cabecinha aí, bota pra fora. Fala, você vai se sentir melhor. – Sorri de maneira encorajadora. Ele estava relutante, ensaiou pra falar várias vezes, mas nada saía de sua boca. – Você gosta dele?

Ah pronto, agora sim eu tinha pego a merda e jogado todinha no ventilador. O garoto se debulhou em lágrimas, fungando e soluçando hora ou outra. Eu revirei os olhos e o abracei, dando tapinhas em suas costas. Demorou uma eternidade pra que parasse de chorar (claro que não literalmente, a banda dos garotos nem tinha começado a tocar ainda, tampouco a garota tinha voltado com meu lanche.), mas levaram-se alguns minutos até que os soluços cessassem.

–... Gosto. – Respondeu por fim. – O que vai ser de mim, Ana?

– Depende de você. – Estendi as mãos em direção às bochechas extremamente vermelhas de Adam e sequei as lágrimas que caiam, deixando uma trilha molhada entre os olhos e a boca. – Primeiro você vai parar de chorar, e encarar seus problemas de frente. Depois vai olhar bem pra esses lindos olhos verdes de frente pra um espelho e ter uma conversa franca consigo mesmo. Se está pronto pra admitir o que sente pra mim, tem que estar pronto pra fazer isso pra si mesmo. E depois, só depois, você vai atrás do Aaron.

– Mas e minha família? E as outras pessoas? Aquele irmão louco dele vai me bater também!

Suspirei. O caso de Adam era bastante complicado, pois apesar de todas as complicações que homossexuais tem que enfrentar geralmente, como preconceito, direitos negados e outros absurdos que vemos todos os dias, ainda existia um agravante.

O próprio Adam tinha vergonha de si mesmo, ele não precisava de ninguém que lhe dirigisse algum ato preconceituoso pois ele mesmo se torturava com isso.

– Eu preciso que você entenda que estar apaixonado não é crime, não é errado. Quando você tiver a consciência de que o que você faz não é errado, o que as outras pessoas acham disso vai perder a importância. Sua família é ótima, pode ser estranho no começo, mas vão acabar aceitando. Você vai mostrar a eles que ainda é a pessoa que eles te criaram pra ser, e tudo vai melhorar.

– No caso do Aaron, não melhorou. – O garoto estava relutante em aceitar a minha ajuda. Eu estava ali, lhe dizendo pra dar a cara a tapa, que era exatamente o que não queria fazer de jeito nenhum.

– Existem famílias e famílias. O que você precisa entender é que pessoas que valem a pena manter por perto, vão te aceitar como você é. E isso se aplica também a família. Aaron tem pais doentes, que acham normal deixar os filhos se matarem. Eles cresceram num universo onde prevalecia a lei da selva. Seus pais te amam, e se existe amor, existe a aceitação. Ela pode demorar, mas sempre chega.

O silêncio reinou por um tempo. Ele fitava algum ponto aleatório no chão, mas a veia saltada no pescoço e a maneira como estalava os dedos, me revelavam o tamanho de sua tensão.

Decidi dar um tempo a ele, e aproveitei pra pescoçar a garota do hambúrguer. Olhei em todas as direções possíveis e imagináveis, mas nada da malandrinha. Filha duma puta! Era o único dinheiro que eu tinha no bolso.

No coreto, os garotos começavam a se preparar, agora que Noah tinha acabado de arrumar sua bateria, finalmente. Queria subir num canteiro para ver melhor, mas não poderia deixar Adam ali, não agora que pela primeira vez alguém tinha conseguido fazê-lo falar quase abertamente.

– E então, cadê o rei do mau humor? – Perguntei. Era mesmo estranho que depois de tanto tempo juntos, o garoto tivesse sumido e Adam tivesse acabado sozinho e aos prantos no meio da praça.

– Ele nunca mais vai olhar na minha cara. – Não era bem a resposta que eu queria, isso ele já tinha me dito. Resolvi não insistir na pergunta.

– Astrólogos são uns canalhas. – Falei, mais para descontrair. Qualquer que fosse o motivo que levara Aaron a se afastar, eu sabia bem que não podia ser culpa só dele. O garoto já tinha tido muita paciência com a indecisão de Adam, claro que uma hora se esgotaria.

– Aaron te fuzilaria se o chamasse de astrólogo. – Deixou um riso contido escapar por seus lábios. – Ainda mais sabendo que você já sabe o termo corredo.

E eu conhecia mesmo, Astrônomo estuda as estrelas, Astrólogos a parte exotérica da coisa, signos e essas coisas. Essa piada já estava mais do que ultrapassada, mas eu tinha um motivo bastante razoável para continuar a provocação.

– Eu sei, mas Faros também detesta que falem errado, e eu adoro irritá-lo. Diz a lenda que um fio de cabelo branco surge naquele cabelo irritantemente invejável cada vez que alguém confunde o termo. – Eu ri, abraçando-o pelo ombro e bagunçando-lhe novamente os fios loiros, só pra não perder o hábito. Ele se permitiu dar umas risadas também, o que eu encarei como um ótimo sinal. – Larga de ser besta, e assuma seus sentimentos. Pode ser difícil, mas você será mais feliz assim. Agora vai, some da minha frente e trate de se entender consigo mesmo e ir atrás do seu rabugentinho!

– Eu vou tentar! – Levantou-se num ímpeto. Eu sabia que dali a meia hora eu o encontraria chorando pelos cantos de novo, mas o primeiro passo estava dado, agora era só questão de tempo. – Mas pode ser depois do show? – Perguntou.

Eu ri, e o puxei comigo pro canteiro mais perto. Tínhamos perdido uma pequena parte da apresentação, mas eu estava feliz por vê-los tocando de novo.

_/_/_

PDV do Ryan

Ah cara, eu sentia tanta falta disso! A adrenalina, a entrega, estar em contato íntimo com a música como se não houvesse mais nada ao redor, e ao mesmo tempo totalmente sintonizado com cada uma das pessoas que ali paravam pra nos escutar.

Eu estava nervoso, embora já tivesse cantado algumas vezes na antiga formação, essa não era minha responsabilidade. Agora é, eu sou o vocalista.

Minhas mãos suavam frio quando apresentei a todos a nova formação da banda. Nenhum dos integrantes era novidade, mas a perda de Stella era algo que merecia ser noticiado. O publico a amava, e eu mal podia descrever o tamanho do medo que eu tinha disso. Eu sou bom no que faço, sei que sou. Era isso que ficava repetindo em minha mente pra me acalmar.

A primeira música que tocamos era inédita. As coisas começaram meio paradas já que ninguém conhecia a letra, mas acabamos levantando a galera, acho que a música agradou!

Era a primeira música que eu compunha pra eu cantar, era diferente de compor pra Stella. Ela gostava de rebeldia, jogadas de cabelo, se jogar no chão, agitação, gritaria, eu gosto da animação, mas sou bem mais discreto. Agradar as pessoas com o meu estilo significava mais pra mim do que palavras poderiam explicar.

Tocamos também as outras músicas já conhecidas pela galera, porém com alguns reajustes. A essa altura eu já estava completamente a vontade, era ótimo poder ouvir as pessoas. O tempo voou, quando finalmente cheguei ao final parecia que toda a apresentação tinha durado o tempo de uma piscada.

Fomos aplaudidos fervorosamente pelo pequeno porém animado grupo de pessoas que ali havia, e eu os agradeci em uma reverência muda.

Agora vinha a segunda parte do show, e era bom eu anunciá-la logo antes que a minha parceira sumisse dali.

Olhei pelo canto do olho para onde estava Alícia, bem ao lado da pequena escada que levava ao coreto. Pisquei pra ela, mas não obtive resposta, ela apenas olhava pra frente, como se enxergasse algo através de mim. Estava nervosa, bastante nervosa.

Voltei meus olhos novamente ao público, e respirei fundo.

– Nós somos a Twisted Logic, e temos uma última surpresa pra hoje a noite. – Anunciei. – Quero que conheçam uma grande amiga, extremamente talentosa. Por favor aplaudam Alícia Baquedano!

Uma salva de palmas se seguiu, mas Alícia mal se moveu. Voltei meus olhos pra ela, a cabeça balançava negativamente, e seus pés deram dois paços pra trás ao invés de avançarem.

– Alícia... – Tentei novamente, mas a garota parecia estar tomada pelo nervosismo e insegurança. – Esperem só um segundo.

Corri em direção a ela, e toquei seu ombro com uma das mãos. A outra tinha que apoiar Charlotte, eu não podia deixar que minha preciosidade suprema sofresse nenhum arranhão.

– Vamos, suba logo ou eu vou te carregar. – Sorri, brincalhão, mas ela não parecia estar me ouvindo. Estava perdida em algum lugar em meio a sua crise nervosa. – Você pode fazer isso. – Insisti, como não obtive resposta, tomei o rosto dela entre a mão. – Você pode fazer isso, ensaiou pra isso, e está pronta pra arrasar. Trabalhamos duro pra isso, faça valer esse trabalho e mova o seu traseiro lá pra cima, vamos.

– Eu... eu consigo! – Respondeu por fim, ainda meio trêmula.

– Sim, consegue! – Segurei-a pela mão e a puxei pra cima antes que mudasse de ideia. – Kyle vai começar a tocar, ignore as pessoas, ninguém está te olhando.

Ela acenou afirmativamente, ainda completamente insegura.

Dei o sinal a Kyle, que passou a dedilhar os acordes suaves da canção em seu violão.

A primeira parte era minha, e eu a cantei toda com os olhos cravados nela, monitorando cada pequeno sinal em sua expressão, e sorrindo amigável, tentando lhe passar tranqüilidade.

Ela fechou os olhos, respirou fundo umas duas vezes, e apertou o microfone em suas mãos de maneira firme. Quanto mais se aproximava o final da minha parte, mais eu temia que ela não conseguisse cantar

Você consegue. Eu acredito em você

Era tudo em que eu conseguia pensar.

Houve um momento de tensão em seguida, os dois acordes localizados entre a minha vez e a dela de cantar. Se eu soubesse que haveria tanta expectativa, teria o tirado dali com certeza.

Prendi a respiração, aguardando os dedos de Kyle fazerem seu trabalho, e torcendo pra que Alícia conseguisse fazer o dela.

A garota titubeou por um momento e quase perdeu o tempo da música, mas literalmente nos 45 minutos do segundo tempo, ela começou a cantar.

Seus olhos se abriram ansiosos, e encontraram os meus revelando um misto de sentimentos contrários, como um imã que puxa algo em direções opostas. Estava tão feliz por estar cantando que abriu um sorriso estonteante que me fez sorrir também, e ao mesmo tempo suas pernas tremiam tanto que eu temia que ela tivesse um troço a qualquer momento.

Cantou seus versos em espanhol com maestria, e eu simplesmente não tinha forças pra tirar os olhos dela. Não importa quão nervosa estivesse ou quão baixinha fosse, no momento ela soava maior que um gigante de 10 metros, e poucas vezes eu tinha presenciado algo tão belo em toda a minha vida.

Ela era um pássaro saindo da gaiola.

E eu me sentia completamente encantado e confuso.

Cantar com ela parecia certo, os versos que cantávamos juntos cada um em seu idioma nativo pareciam dançar a nossa volta e brincar conosco como borboletas que sobrevoam cabeças alheias.

Aquela garota fazia com que eu tivesse vontade de seqüestrá-la e nunca mais devolvê-la. Eu nunca senti nada parecido antes.

E mesmo assim, existia outro sentimento no ar. Stella ainda estava lá, como uma nuvem negra que anuncia uma tempestade, só que no meu caso ela nunca cai, nem vai embora de vez.

Meu Deus, eu vou enlouquecer. Como algo pode parecer tão certo e tão errado ao mesmo tempo?

Ao final da canção, eu estava completamente ofegante e embevecido pela experiência fascinante que tivera. Fomos aplaudidos, muito aplaudidos, mas ela parecia estar na mesma sintonia que eu, já que mal se dava conta disso.

Desliguei o microfone e apertei-lhe a ponta do nariz, arrancando-lhe uma risada gostosa.

– Eu sabia que conseguiria. – Sussurrei. – O público te ama, cumprimente-os.

O sorriso dela se alargou, e seu dedos acenaram pras pessoas enquanto dava pulinhos histéricos. Agora sim o nervosismo tinha finalmente dado espaço para a euforia.

Eu dei um ultimo aceno e me retirei, com Kyle em meu encalce. Mal tinha alcançado o último degrau da escada quando senti dois braços se jogarem em torno do meu pescoço.

Eu a tomei nos braços e a tirei do chão, apertando-a contra mim como se fôssemos pra pólos opostos da terra em poucos minutos.

Esse momento era um dos mais memoráveis da minha vida, e estava prestes a acabar. Eu tinha que aproveitá-lo ao máximo.

– Isso foi incrível! – Ela gritou no meu ouvido, com a voz esganiçada de sempre. Eu ri, e a coloquei no chão. Me permiti tocar-lhe a face, me amaldiçoando por isso logo em seguida, pois percebi que agora seria quase impossível tirá-la dali.

– Você é incrível. – Corrigi, dedilhando-lhe a bochecha, o maxilar, o queixo. Eu já tinha visto tanta coisa vinda daquela garota, e ainda parecia ter tanto pra descobrir.

Os lábios dela estavam delineados de vermelho, e agora me pareciam mais sedutores que nunca. Droga, aquela apresentação tinha posto abaixo todas as minhas defesas, e me parecia impossível colocá-las de pé de novo.

Você não pode beijá-la Ryan. Ela merece mais, merece alguém cujo coração seja só dela.

E ao mesmo tempo em que esses pensamentos me ocorriam, meu estômago se revirava só de imaginá-la com outra pessoa.

Eu queria beijá-la, queria tanto que conter meu impulso me exigia muita energia, energia essa que se esvaía aos poucos. Eu estava quase cedendo.

– Cara! – Noah me deu um puta tapa no ombro, se metendo entre mim e Alícia e me retirando de meu devaneio maluco. Eu não sabia se agradecia ou se chutava aquela bunda magricela dele, acabei optando por respirar fundo e botar meus pensamentos em ordem enquanto tinha a oportunidade. – Isso foi demais! Nós somos oficialmente uma banda de novo! Temos que comemorar isso.

Eu lhe dediquei um sorriso amarelado em concordância, e ele se virou pra Alícia.

– E você garota, caralho, você arrasou! – Agarrou-a pelos ombros e sacudiu-a. – Ah por favor, digam que vocês vão pra balada com a galera!

– Ah eles vão sim, ao menos Alícia vai! – Marie interviu, surgindo do além. Os olhos de Noah passaram a seguir-lhe os lábios instantaneamente. Me perguntava como ela podia ser tão insegura quando o cara era tão visivelmente louco por ela. – Mas antes nós vamos trocar de roupa, não estamos vestidas pra balada.

Noah revirou os olhos.

– Ok, como quiserem, nós vamos na frente.

Uma Marie serelepe saiu empurrando uma Alícia tão perplexa e confusa quanto eu. Seus olhos não abandonavam os meus, e eu a observava se afastar, lamentando o final do meu momento quase perfeito.


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