#Katie

Katherine gostava muito da hora que antecede a noite, um pouco antes do anoitecer completo, quando o crepúsculo está quase no fim. O céu deixa de ficar roxo escuro para assumir um tom azul que não é totalmente o indigo do céu noturno. Esse momento precioso dura no máximo 3 minutos e eram os 3 minutos mais sagrados para ela.

Ela se sentou em sua escrivaninha, em seu quarto, que ficava de frente para janela e apoiou seu queixo na mão direita. Seus olhos estavam pesados porque ela não conseguia dormir bem há algum tempo. O rosto de Travis teimava aparecer em sua mente lá pelas três da manhã e logo após isso cenas dele beijando Miranda manchavam suas calmas noites.

O cachorro do vizinho começou a latir descontroladamente e aquilo a alertou. As Gardner não tinham animais de estimação porque a Sra. Gardner era alérgica, mas o cachorro da casa da frente insistia em proteger a casa delas, mesmo que de longe.

Katie se levantou e abriu a janela, colocando metade do corpo para fora e viu alguém estatelado perto de sua horta de legumes. Sem pensar muito, ela fechou a janela e correu para o andar debaixo, pulando os degraus com maestria.

Ao chegar no gramado, ela acelerou pois reconheceu que o corpo retorcido era de Travis Stoll.

— Travis! — ela o pegou pelos ombros em desespero, balançando-o com força. Ela virou o rosto dele para cima e percebeu com tom de surpresa que os olhos dele estavam abertos e que ele respirava. — Mas o que… Qual o seu problema?

O rapaz virou os olhos para cima e deu um pequeno sorriso quando seus olhos se encontraram. Por apresentar um ar meio desfocado, ela desconfiou que ele tinha bebido além da conta.

— Katherine… Eu… — ele deu uma risada estranha que parecia um soluço e ao mesmo tempo um gemido. — Sou o maior babaca, não é?

— Por favor, não fique deitado em cima do meu tempero verde para dizer coisas óbvias — ela pediu, mas mesmo tendo se esforçado suas palavras não soaram tão ácidas quanto ela queria.

Travis estendeu sua mão mas logo em seguida deixou ela cair em cima de sua barriga, apertando os dedos em volta do tecido da camiseta.

— Eu terminei com a sua irmã — ele segredou, fechando os olhos. — Eu terminei com Miranda.

Katie ficou em silêncio, tentando processar aquela informação corretamente. Deveria ficar feliz por isso? Ela gostava dele, sim, ainda continuava apaixonada por aquele idiota, mas Miranda era sua irmã que nesse momento deveria estar arrasada com o término.

Ela tentou buscar palavras amigas para dizer, tais como “tudo vai ficar bem” ou quem sabe até um singelo “eu sinto muito” mesmo que fosse ser uma mentira.

— Você não sabe o que dizer não é? — ele questionou e suas palavras se enrolavam umas nas outras. — Talvez porquê esteja feliz com isso. Então, me deixe fazer você sorrir de verdade agora. Eu terminei com ela por sua causa.

Katherine piscou meio desnorteada, sem saber o que dizer. Aquilo era uma declaração? Ou ele só estava dizendo que preferia ter a amizade dela do que o amor de sua irmã? Ela chegou a conclusão de que podia ser qualquer um dos dois, ou qualquer outro motivo, então não devia contar vitória, não ainda.

Travis se sentou ao lado dela e a olhou diretamente nos olhos, os lábios abrindo em um sorriso. Antes mesmo que ela pudesse retribuir o sorriso ou expor qualquer reação, ele revirou os olhos e caiu inerte no colo dela, com o rosto afundado na grama.

— Droga, Travis! — Katie exclamou, puxando o corpo dele para cima, envolvendo os ombros dele com seu braço. O cabelo dele exalava um forte cheiro de bebida barata que a deixou um pouco nauseada.

Com um pouco de dificuldade ela o arrastou até a porta da casa dele e o sentou em uma cadeira em sua varanda. Ele tinha uma expressão serena enquanto ela saia, olhando para ele até até deixar seu quintal.

***

— Katherine Gardner, você é a nossa melhor chance.

Katie tentou absorver as ultimas palavras que o diretor da Goode havia falado, mas elas simplesmente lhe pareciam muito estranhas.

Naquela manhã de sexta-feira Katie havia sido chamada na sala do diretor, o Sr. Brunner, para tratar de um assunto do interesse dela. Ela realmente chegou a pensar que finalmente eles haviam aceitado promover o seu projeto de implantar um sistema vegetariano na cantina, mas não era isso.

Na verdade, era algo bem inusitado para ela.

Aparentemente eles iriam lançar um projeto onde os alunos do ultimo ano iriam palestrar para os alunos das turmas iniciais sobre as dificuldades da adolescência. Eles estavam escolhendo os melhores alunos do terceiro ano, e lá estava o nome de Katherine Gardner incluído.

— É algo inovador e estamos apostando todas as nossas fichas nisso — o Sr. Brunner informou sorridente. — Temos alguns nomes já selecionados além do seu. Vamos ver os nomes… Sim, Nicholas Di Angelo, Tyson Jackson, Will Solace, Zoe Nightshade, Travis Stoll…

— Travis Stoll? — ela perguntou surpresa. Ela até podia gostar de Travis, mas ela sabia muito bem quanto um mais um é dois que ele não era muito inteligente e que ele provavelmente não saberia dizer quanto é um mais um.

O Sr. Brunner suspirou e olhou para ela com sua melhor expressão de “eu entendo você perfeitamente”.

— O treinador ficou furioso quando soube que nenhum de seus meninos fora escolhido para participar do projeto — ele explicou com um ar entediado. — E ele começou a falar algo sobre desmerecer seus atletas. O nome de Travis Stoll foi escolhido aleatoriamente através de um sorteio de pedaços de papel na sala da secretária. Acredite em mim, teríamos escolhido outra pessoa.

O Sr. Brunner continuou a explicar outros detalhes, tais como o tema de cada palestra — que seria da escolha dos alunos — e que eles seriam divididos em dupla para facilitar o processo de criação de artigo e apresentação para os alunos do primeiro ano.

— E em troca é claro, se aceitarem participar, vocês ganharão algo em troca — ele informou. — Carta de recomendação para alguma faculdade, indicação para estágio ou trabalho voluntário, algo deste tipo.

Katherine sorriu. Primeiramente ela não quis participar daquilo, afinal não gostava muito de falar em público, mas se pudesse ganhar algo em troca então ela podia fazer esse sacrifício.

— Como por exemplo, implantar meu projeto vegetariano? — ela indagou esperançosa. O Sr. Brunner apertou a ponte de seu nariz entre o indicador e o polegar e assentiu com ar de derrota. Ela bateu palmas animada. — Excelente, então estou dentro!

Tudo por uma folha de alface na refeição de cada dia!

***

Na hora do intervalo ela mal pode conter seu sorriso quando localizou Travis conversando animadamente com Juníper, Groover e Thalia em sua mesa.

— Desistiu de sentar com os atletas, campeão? — ela perguntou, se sentando de frente para ele.

Travis ergueu uma sobrancelha para ela e deu um sorriso torto. Ele parecia tão a vontade com seus amigos que ela quis lhe beijar ali mesmo.

— Aparentemente somos mais convidativos — Groover respondeu, dando uma risada. — Ele estava nos contando agora que você e ele foram chamados para o projeto do Sr. Brunner?

— Eu aceitei participar porque ele prometeu que iria me fazer uma carta de recomendação bem elaborada para a liga de futebol da Yale — Travis informou todo orgulhoso. — E você, disse sim?

Katie confirmou e contou sobre a aprovação do Sr. Brunner para o projeto vegetariano. Groover, Juníper e Thalia comemoraram em jubilo uma vez que o projeto era idealizado pelos quatro e bateram palmas quando ela informou que eles teriam carta branca para atuar nele.

— Bem, eu não estou nesse projeto estranho de comer mato — Travis começou e Thalia jogou sua caixa vazia de suco nele. — Ei! Mas estou feliz que você poderá ter a sua chance de mostrar a todos seu lado hippie com a ajuda de seu grupo hippie.

Katie e os outros três jogaram suas rodelas de tomate nele aos risos enquanto Travis tentava se defender com seu capacete do time. Era a primeira vez que ela se sentia feliz por alguém chama-la de hippie.

***

Mais tarde, depois de deixarem Thalia em sua casa na volta da escola, Travis e Katie continuaram seu caminho juntos.

— Miranda não está muito brava, não é mesmo? — ele indagou, balançando os braços de modo exagerado para chamar a atenção dela.

— Não o bastante. Logo ela irá se recuperar, eu acredito — Katie murmurou, segurando o braço dele para que ele parasse.

Timidamente, ela deslizou os dedos através do braço dele até alcançar sua mão. Ela engoliu em seco e reunindo toda a sua coragem, ela entrelaçou seus dedos com os dele.

Meu Deus, meu Deus, estou segurando a mão de Travis Stoll!

Ela não olhou para ele, mas o sentiu apertar sua mão gentilmente e aquilo aqueceu seu coração de uma forma maravilhosa.

— Katie, eu preciso saber… — ele começou, a voz hesitante. Ela segurou a respiração. — Você se lembra do que eu disse ontem? Eu disse algo… Sério?

Eu terminei com ela por sua causa, ela lembrou das palavras dele. É claro ele estava bêbado naquele momento então não se lembrava de nada do que havia dito.

Eles estavam, então, em frente de suas casas. Katie soltou a mão dele e lhe lançou um pequeno sorriso.

— Não, você só me pediu desculpas e depois murmúrios — ela mentiu, desviando o olhar. — Parecia uma nova língua, na verdade. Eu preciso ir agora, nos vemos por aí!

Ela foi se afastando em direção a casa de porta verde mas parou quando ouviu ele chamar seu nome.

— Você vai estar ocupada mais tarde? — ele perguntou, coçando a nuca.

— Mais ou menos. Terei que ir na casa do meu pai levar algumas coisas para minha mãe — ela respondeu, dando de ombros. Sua mãe agora vivia tentando usa-la como uma ponte para seu pai.

— Ah, entendi… — ele murmurou, parecendo um pouco decepcionado, mas logo em seguida esboçando um largo sorriso. — Posso te ligar mais tarde? Antes de você dormir? Só para… Dar um boa noite?

Katherine concordou, dando uma risada e se afastando. Travis estava muito estranho e ela suspeitou que algo estava muito errado naquela situação...