Essência escrita por AnaMM


Capítulo 20
Amigos?


Notas iniciais do capítulo

Anaaaa! Por que demorou? C'est la vie.
Anaaaa! Tem lidinho? Tem!
Anaaaa! Litor já acabou? Já!
Anaaaa! Litor terminou? Litor inicia uma jornada diferente, agora como amigos acima de tudo.
Quer entender melhor? Ó nóis aqui outra vez!

https://www.youtube.com/watch?v=q7pXzEgYX0Y achei que serviria pro capítulo inteiro, pra lidinho e pra litor. Pra fins e recomeços. Fins que se tornam reencontros, reencontros de fins marcados e fins de reencontros esperados. Ai, que poético! Vem comigo nesse capítulo, que eu explico.



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– E você simplesmente deixa? – Gil cobrou abismado.

– Que? – Vitor perguntou confuso. Andava pensando em tanta coisa...

– Cara, o Dinho acabou de escalar a janela da tua namorada e você aí, de braços cruzados!

– Ah, sim. – Vitor enfim compreendeu onde o amigo queria chegar. – Um desrespeito, mesmo.

– Só isso? – O guitarrista estranhou. – Cara, não é à toa que você tá levando tanto chifre!

– Ah, é... – Retomou desconsertado. – Uma hora eles vão literalmente quebrar a cara!

– E você vai ficar esperando?

– Você quer que eu faça o que? Proíba pra dar mais ibope? – Desconversou.

– Você é o namorado dela!

– Exatamente. Eu sou o namorado, não ele.

– Ok, então... Você que sabe. – Gil concluiu confuso. Estava perdendo alguma coisa, ou Vitor era assim, mesmo? Sem ação?

–x-

– Eu já tava com saudade. – Lia suspirou nos braços do ex.

– A gente se viu hoje.

– É, eu sei. – A roqueira riu.

– Lia, Lia... Você virou uma romântica incurável. Depois eu que sou brega!

– Influência sua, não vá tirando o seu da reta.

– Acho que foi influência do outro, lá. Fez você sentir mais a minha falta.

– Para! O Vitor é um cara legal...

– Ah, sim, ele é um amor. – Respondeu debochado. – Um querido! – Completou com voz afetada. – Me viu escalando a janela da namorada e até agora não veio me matar. Um fofo!

– Para! – A garota o repreendeu aos risos. – Ele me fez bem.

– Imagino, não deve ter nem encostado em você!

– Bom, isso não é tão distante da realidade...

– Então. Mas eu não subi aqui pra falar dele.

– Acho bom. – A roqueira sorriu.

– Onde a gente tava, mesmo?

– Espera. – Parou o rosto de Dinho. Passos soavam no corredor. – Você acha que o meu pai nos ouviu?

– Ele já teria entrado.

– Verdade...

– Como foi com ele?

– Dinho, você não escalou a minha janela pra falar sobre o meu pai, né?

– Eu só quero saber o que ele disse.

– Desde quando você se importa com o que o seu Lorenzo fala?

– Desde que eu decidi pedir a sua mão em casamento a ele. – Zombou.

– Dinho... – Repreendeu o ex.

– Um dia, um dia...

– Você acha mesmo?

– Claro!

– Não fui só eu que mudei...

– Só por você.

– Será mesmo?

– Se você está duvidando que a gente dure até lá porque espera que eu erre de novo, pode esquecer.

– Eu pensei que a gente tivesse um acordo. – Comentou desconsertada. – Isso duraria por agora, até você voltar pros Estados Unidos.

– Falando assim, parece que você não quer mais nada comigo.

– Não é verdade, é claro que não é, ou eu não estaria deliberadamente traindo o um namorado.

– Certo, o namorado... Então você tá se divertindo comigo até que eu vá embora e você continue o relacionamento confiável com aquele veado enrustido.

Lia percebeu que o garoto agora falava sério ao vê-lo se afastar até o balcão. Caminhou até ele, tomando seu tempo para escolher bem as palavras.

– Dinho... – Esperou uma resposta. Percebeu que Vitor os observava de baixo. “Amava-o” tanto que sequer se importava com o que o motoqueiro estava testemunhando. Afinal, havia se tornado tão insensível quanto culpara Adriano de ser. Levou as mãos às costas do garoto. – Eu quero ficar com você, eu só acho que você tem uma família em outro país e que não é justo que você largue tudo por mim.

– Eu não vim só por você. – Respondeu sério.

– Eu sei, eu sei. Você tem amigos aqui, certo. De qualquer modo, a gente tinha concordado nisso, não tinha? Você ia voltar pros Estados Unidos e a gente teria aproveitado esse tempo de agora.

– Você fala tudo tão mecanicamente...

– Foi como eu aprendi a falar. – E desejou que Dinho não insistisse no assunto.

– Desde quando?

– Desde... Desde sempre.

Olharam-se por alguns instantes. Instantes de eternidade, talvez. Uma fração de segundos sem final.

– Eu sei que eu errei muito com você. – Adriano quebrou o silêncio, levando as mãos ao rosto de Lia. – E você era a última pessoa do mundo que eu queria ferir, e, provavelmente, seja melhor que você trate isso que a gente tá vivendo agora de forma tão prática. Nunca se sabe até onde se pode confiar no ex filho da puta, não é?

Lia tentou interrompê-lo, dizer que não era de todo verdade.

– Ei, eu sei. Eu sei que você tá sendo realista, que tá aproveitando o tempo que a gente tem até a minha viagem, que tem razão em achar que não vá durar para sempre. Poucos primeiros namoros são também os últimos, e que bom que não são. Se a gente não tivesse terminado, quem sabe como a gente estaria hoje? Mas de uma coisa eu tenho certeza: eu te amo agora, Lia Martins, e quero estar com você para o resto da vida nesse exato momento. E eu sei que as nossas vidas podem dar muitas voltas, e vão dar, mas algo me diz que a gente ainda vai se reencontrar depois daqui, que a minha partida naquele avião não vai ser um último adeus. E eu, Adriano Costa, pretendo, daqui a muitos anos, de preferência, me casar com você, e só com você. É assim que eu vejo o meu mundo hoje. Era assim que eu via o meu mundo ano passado, e é assim que eu espero presenciar o meu mundo daqui a uns anos, quando a gente voltar a se encontrar. Pode ser nesse ano, ou daqui a uma década. Você significa mais que um simples namoro adolescente pra mim, pode ter certeza disso.

Lia discretamente secou uma lágrima. Dinho riu.

– É, por mais que você esconda, sempre foi uma romântica.

– E você, um romântico enrustido. Depois fala do Vitor.

Adriano riu mais uma vez antes de beijá-la. Adorava quando Lia quebrava seus momentos de romântico cafona e salvava a cena. Era perfeita até nisso.

– Quando você vai terminar com aquele cara, hein? Você não gosta dele nem o suficiente para plano B!

– Talvez amanhã, talvez quando você for embora, talvez quando a gente se reencontrar. Não te interessa, você vai me deixar aqui...

Dinho sorriu.

– Nessa você me pegou.

Lia riu. Era melhor assim, sem promessas de um Dinho exagerado que provavelmente não as cumpriria.

–x-

– Fiquei sabendo que a noite foi boa. – Fatinha comentou com a roqueira à entrada do colégio.

– O Dinho sabe ser discreto... – Lia zombou.

– O Dinho... Fazida... Então, quando você vai botar um ponto final nesse namoro mais do que acabado com o Vitinho?

– Fatinha, isso é problema meu. Como ele tava ontem? Foi ele que te contou sobre eu e o Dinho?

– Foi. O Vitor não é tão vítima quanto você imagina, Lia, ele só não quer aceitar, e eu acho que você faria muito bem a ele se cortasse esse relacionamento de uma vez.

– O que você quer dizer com isso? – Indagou confusa.

– Eu quero dizer, Lia, que você influencia o Vitor a cometer os mesmos erros que você sempre comete.

– Como assim? Fatinha, dá pra falar português, por favor? Se é pra se meter na minha vida, melhor que eu entenda o porquê.

– Olha, o que eu posso dizer é que o Vitor está se envolvendo com alguém e não quer admitir pra si mesmo, que nem você fazia.

– Ah, é? – Definitivamente não o amava. A informação mais lhe divertiu que incomodou. – E quem é ela? É a Luana? É alguma outra peguete do Sal? É você?

– Não é ela.

– O que? Você quer dizer que...? Então ele tá apaixonado pelo Dinho?!

– Que? Dinho? Você bebeu, Lia? – Fatinha estranhou. – Ou você acha que o Dinho...? Não, o Dinho é louco por você!

– Não, não, é que o Dinho tem certeza de que o Vitor é gay.

– Ah, mas isso qualquer um de fora percebe, o Dinho provavelmente falou por falar. Não, o cara é meu vizinho.

– Então ele é mesmo gay? Você tem certeza? Como você sabe? Você viu? Será que eu traumatizei ele? Então por isso ele concordou em manter a fachada...

– Sim, foi por isso. Ele não é tão frouxo a ponto de segurar um relacionamento morto pra nada. Olha, eu não devia estar te contando isso, mas é pro bem dele. O Vitor precisa se aceitar. O Ricardão já deu um ultimato nele, e daqui a pouco vocês dois vão ser um casal de velhos infelizes sem sexo, nem amor.

– Calma, Maria de Fátima! – Lia gargalhou, ainda nervosa com a novidade. – Eu vou falar com ele, ok? E a gente não era tão sem graça assim.

– Ah, jura? Quantas vezes vocês transaram? Uma, papai e mamãe?

– Droga.

– E você nem suspeitava?

– É, faz sentido...

E de fato fazia. Todos os beijos insossos, as fugas de Vitor quando a namorada tentava aprofundar as coisas, os olhares pálidos, os abraços amigáveis demais, a insistência do garoto em manter um relacionamento no qual nenhum dos dois acreditava... Devia ter percebido antes. Era profissional em esconder o que sentia, como não notara? Dinho morreria ao saber disso. Era ridículo, àquela altura, acreditar que o relacionamento com Vitor lhe fosse competição, mas agora saberia o que Lia tinha certeza desde o início. Era um namoro de fachada. Era um estepe, até que a roqueira e Vitor encontrassem aqueles que os completassem, ou reencontrassem aqueles que já os completavam. Achava que, no caso de Vitor, seria Luana. Luana... Pensava que Vitor sentia algo pela ex...

E agora Vitor a entendia. Como ela, não pretendera beijá-lo, não pretendera se apaixonar. Talvez aproximar-se de Ricardão fosse visto por ele como um erro, um erro que o obrigara a remar contra a maré, a encarar quem era de verdade, como Lia enfrentara seus próprios fantasmas por e com Dinho no ano anterior e agora os reencontrava. Talvez por isso Vitor a compreendera, talvez por isso concordara. Estavam no mesmo barco, ilhados por incertezas, sem saber se a âncora era segura, ou se os barcos os deixariam abandonados de vez, sem rota de fuga, sem volta. E uma vez que pegassem os barcos, teriam destino incerto. Não poderiam adivinhar se a viagem seria turbulenta ou calma, nem o tamanho das ondas. Sua ilha rosa, sua ilha de relacionamento seguro e prático, por mais limitada que fosse, devia ser preservada, para que a ela voltassem quando as grandes ondas os acertassem, quando os barcos virassem e os deixassem jogados na água fria, sem horizontes. Ainda saberiam que, se voltassem àquela árvore que viam ao longe, voltariam ao vazio, voltariam a uma existência pálida, mas existiriam. Estariam em terra firme. E então ambos se deram as mãos e se agarraram à ilha. Não eram covardes, mas precavidos. Haviam sofrido demais em seus poucos anos de vida para se arriscarem em alto mar. Agora precisavam testar novamente a ilha, pesar suas prioridades. Estavam apaixonados por outras pessoas, e por aqueles que haviam encarcerado dentro de si, com medo de que, exposto, se ferisse. Precisavam voltar a viver, precisavam enfrentar.

Lia o procurou tão logo a manhã acabara. Gil ainda tivera tempo de cobrar da amiga, de saber como tivera coragem... Gil... Suas intenções eram sempre boas.

– Depois a gente conversa, cara, eu tenho que encontrar o Vitor.

– Vai falar o que? Ele viu tudo, Lia.

– Gil... Depois! – Repetiu impaciente.

Detestava deixá-lo sem explicações, mas era preciso. Se Gil ainda não sabia, não seria a roqueira a informar-lhe acerca da sexualidade do motoqueiro.

–x-

– Eu te procurei no intervalo, mas acho que não seria o melhor lugar pra tocar no assunto...

– Lia? Olha, se você veio s desculpar por ontem...

– Não. – Interrompeu-o. – A Fatinha veio falar comigo mais cedo... Sobre um lance, aí, que tem acontecido com você...

– A Fatinha? – Perguntou hesitante.

– É...

– E sobre o que ela falou? – Venceu a própria vontade de mudar de assunto.

– Sobre você e um vizinho dela... Um tal de Ricardão?

– O que tem ele?

– Vitor, você sabe o que tem ele. Ou melhor, o que vocês têm. Olha, eu não vim pra te julgar, eu só vim pra gente conversar, mesmo. Você não precisava ter escondido de mim...

– Você falando isso? – Vitor riu.

– Ok, eu sou o pior exemplo. – Juntou-se ao garoto, divertida, ainda que nervosa. – Eu nunca passei por isso, - Zombou. – mas acho que sei como é.

– Eu sabia! Sempre desconfiei de você e da Ju!

– Para! – Lia riu. – O que eu quero dizer é...

– Eu sei, Lia, eu sei. Eu conheço a história toda, esqueceu? De como você passou anos lutando contra o que sentia, de como você voltou a fugir quando ele reapareceu...

– Eu não estou fugindo mais.

– Eu vi. – Debochou.

– E eu cogitando se estaria sendo injusta com você...

– Não é porque eu sou gay que você não me traiu, Lia Martins.

– Como é mesmo? – Lia levou a mão à orelha, fazendo sinal para que o garoto repetisse.

– Você ainda assim me traiu. – Vitor desconversou.

– Não, a outra parte.

– Você já ouviu, está dito.

– Vamos, repete.

– Lia...

– Ok, eu vou primeiro. Eu amo o Dinho! Ele é um idiota, ele me fez sofrer muito e não é confiável, mas eu amo aquele imaturo, metido, cafona e convencido! Agora você.

Vitor hesitou novamente.

– Vamos, você não se sentiu muito melhor quando falou? Você não se sentiu nem um pouco livre? Vamos, Vitor! – Puxou seu braço, insistente.

– Ok, ok! Eu sou... Eu sou um corno!

– Vitor...

– Você faz tanta questão?

– Não, você faz. Vamos, se você falar de uma vez vai ser muito mais fácil pra nós dois. Até pro Dinho, que fica todo inseguro.

– O Dinho? Inseguro com a gente? Aquele idiota, como você diz, tá rindo da minha cara desde que chegou!

– Aí, tá vendo? Se a gente chegar a um acordo, vocês podem até virar amigos!

– Eu? Amigo daquele moleque?

– Você vai ver que ele não é esse monstro que eu falo.

– É... Ele até que é bem bonitinho...

Lia bateu no ombro do namorado, aderindo a uma expressão debochada de incredulidade.

– Olha aqui, ele é meu, você tá me ouvindo?

Vitor riu.

– Sabe que eu acho que a nossa relação tá começando a ficar mais divertida? Não que não fosse boa...

– Era brochante.

– Desculpa...

– Foi nossa culpa, Vitor. Nenhum de nós estava muito interessado.

– Verdade... O que a gente faz agora?

– O que você quer fazer agora?

– Você já está com o Dinho...

– E você está a ponto de perder o Ricardão.

Vitor a encarou confuso.

– Fatinha.

– Ah. Sim, eu estou. – Parou por um momento. – Você contou pra alguém?

– Ninguém sabe. Bom, ninguém soube por mim.

– Ok... A gente pode terminar e não comentar com ninguém...

– Isso eu acho que a gente já fez...

– Ou a gente pode manter a fachada até eu criar coragem.

– Pode, mas o Gil vai desconfiar se a gente não tiver nem brigado.

– O Gil me viu não fazer nada quando o Dinho subiu pro seu quarto ontem.

– O Gil é um empata até pro seu armário? – Lia riu.

– Você não presta!

– Como diria o Dinho, nunca prometi o contrário...

Vitor a abraçou de repente.

– Você como uma namorada foi e é uma ótima amiga, Lia Martins.

– Posso dizer o mesmo. – Sorriu para o agora ex.

Vitor passou a mão por uma mecha que caía sobre o rosto de Lia.

– Obrigado, por tudo. Você me acompanha nessa?

– Pode contar comigo.


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