DUAS SEMANAS DEPOIS:

O grupo de amigos estava reunido na sorveteria. A conversa era animada, ou o mais animada que poderia ser em respeito a Lia.

Os jovens haviam acabado de sair do Quadrante e discutiam sobre a aula da professora Isabela, que havia passado um trabalho em grupo para fazer.

– A gente podia falar sobre os padrões de beleza. – sugeriu Ju.

A professora havia escolhido os grupos, e como Lia achava: era a pior coisa que já havia lhe acontecido. Lia, Vitor, Ju e Gabriel. Quatro adolescentes sem qualquer ideia sobre o que falar.

Vitor não tinha do que reclamar, diferente de Lia. Seu grupo era de alguma maneira, bom. Poderia passar um tempo com a garota que gostava, e um dos garotos mais inteligentes – ou talvez o mais. – da turma estava no grupo e, apesar de não gostar dele, isso era bom. Ele poderia deixar tudo para o garoto fazer e não haveria problema algum.

– É, ai a gente põem você para representar a beleza feminina, ah, Ju, se toca. – retrucou Lia e voltou sua atenção ao sorvete de limão que tomava.

– É, porque você que não vai ser, né Lia?! – rebateu Ju e os garotos riram.

– Por que não fazemos então sobre as manifestações? – indagou Vitor. Era uma ideia de fato interessante e bem mais próxima da realidade deles do que padrões de beleza internacionais.

– Ainda prefiro a ideia da Ju. – exclamou Gabriel. – Poderíamos tentar quebrar essa ideia de “beleza”.

– Como se só a nossa fala tivesse força. – comentou Lia

– E como se isso fosse mudar algo. – disse Ju.

– Foi isso que eu quis dizer, criatura. – bufou Lia se voltando para a amiga.

– Criatura... Isso me lembra o Félix da novela. – disse um Gabriel pensativo. Mas como Orelha costuma brincar, a voz do garoto era tão devagar e mole que parecia que ele estava sempre pensando. Ou com sono, que seja.

– Olha, não é que o Gabriel assiste novela. – brincou Vitor arrancando risos das garotas e deixando Gabriel com raiva.

– Gente, vamos voltar para o trabalho então? – pediu Ju ao parar de rir. – Afinal, qual vai ser o nosso tema?

– Voto por padrões de beleza. – murmurou Gabriel.

– Eu também. – exclamou Ju sorridente.

– Por mim, tanto faz. – disse Lia.

– Então, a menos que o Vitor tenha uma ideia melhor... – começou Ju e todos olharam para o motoqueiro que apenas deu de ombros. – Padrões de beleza acaba de ganhar.

– A gente podia dar um nome melhor para isso, então. – se pronunciou Vitor. – Como por exemplo “A falsa beleza”.

– Boa ideia. Pode ser também “A magia da maquiagem”. – disse Ju, animada.

– Melhor, melhor. – Gabriel exclamou levantando a cabeça. – “A magia do photoshop”

Ju assentiu sorridente e tanto ela quanto Gabriel começaram a conversar animadamente sobre como poderiam apresentar o trabalho. Lia apenas olhava para aquilo indignada, como eles podiam gostar tanto de fazer um trabalho?

– Podíamos colocar o nome de “Ditadura da beleza”. – sugeriu Vitor e todos olharam para ele. Gabriel tinha uma expressão indecifrável e Ju parecia querer perguntar – ou berrar, talvez. – “Você está louco?”. Lia por sinal era a única que não estava com nenhuma careta, ela, diferente dos outros dois, parecia ter gostado da ideia.

– Calma, é só uma ideia. – murmurou Vitor e deu de ombros como se não se importasse com que o que os outro acharam.

– Ainda prefiro “A magia do photoshop”. – rosnou Gabriel e Ju concordou com a cabeça.

– Eu gostei. – disse Lia chamando a atenção para si. – É uma coisa simples e bem mais realista. Porque com esse nome podemos falar também sobre as pessoas que tem bulimia, anorexia e que caem nesse mundo na tentativa de se encaixar, ou porque não conseguem estar dentro dos padrões.

– Ih, a Lia virou poeta. – exclamou Ju depois de um minuto em silêncio. Todos riram, mas por fim concordaram que era o melhor nome para o trabalho.

– Acho que agora seria uma boa hora para começarmos a anotar nossas ideias. – comentou Gabriel.

– Isso. Vitor, você tem um caderno? – perguntou Lia ao ver que ele era o único que não havia deixado a mochila na escola.

– Pega aí. – respondeu ele lhe passando a mochila.

Se tem uma coisa que Vitor vai se arrepender pelo resto da vida, é ter deixado Lia mexer na sua mochila.

A garota abriu a mochila enquanto ainda conversava com os amigos sobre o trabalho da professora Isabela. Pegou o primeiro caderno que viu, depois viu o estojo dele e se lembrou que não tinha nenhuma caneta, então teria que pegar pelo menos um lápis, certo?

Sua mão foi em direção ao estojo, que acabou escorregando para o fundo da mochila. Na tentativa de achar o objeto, Lia começou a vasculhar a bolsa de Vitor. Ela nem sequer olhava, já que o escuro dentro da bolsa não a permitia enxergar.

Até que apertou um saco com algumas coisas dentro. Ela puxou o saquinho para poder ver o que era e se surpreendeu ao ver pequenas coisas brancas.

– Vitor, desde quando você coleciona borrachas? – ela se viu perguntando, fazendo o garoto parar de falar com os outros imediatamente e olhar em sua direção.

Ele entra em pânico.

– Não são borrachas. – responde puxando a mochila e com a outra mão colocando o caderno dentro da mesma.

Lia viu o motoqueiro se levantar rapidamente e sumir de suas vistas, foi ai que ela entendeu tudo. Não eram borrachas, mas sim drogas.