Meu Vampiro De Estimação escrita por Eica


Capítulo 2
Chama do anseio




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Eric chegou na casa assim que saiu do trabalho e pegou a bolsa de sangue com seu colega, deixando o carro estacionado em frente da propriedade. Procurou pelo vampiro e encontrou-o num dos quartos do primeiro piso.

- Sébastien?

Estava deitado na cama. As mãos sobre o abdômen e os olhos fechados.

- Vim trazer...

Desistiu de dizer. Tirou a bolsa de sangue da mochila e a deixou sobre um aparador ao lado da porta. Foi embora. Chegou à escola de Caio. Estacionou em frente da calçada. O jovenzinho encontrou-o entre a penca de carros e entrou no automóvel.

- Tudo bem?

- Tudo.

Eric ligou o carro e começaram a andar.

- Foi ver o vampiro?

- O nome dele é Sébastien.

- Não consigo vê-lo como gente mesmo já tendo sido gente.

- Ele continua sendo gente, só que... Está morto.

- É exatamente esse o problema. Ele está morto, mas anda e fala. Não é natural.

- Deixa te perguntar uma coisa: como se pega livros na Biblioteca Municipal?

- Tem que ter carteirinha. Eu tenho... Por que? O que vai pegar?

- Eu pensei numas enciclopédias. Para o Sébastien. Não podemos deixá-lo na ignorância.

Caio indignou-se:

- É a ignorância dele que nos mantém vivos. Se ele ficar esperto, vai saber que temos mentido pra ele.

- Ele não vai aprender mais de duzentos anos de história em três dias, e é bem capaz de enlouquecer durante o processo. Aos poucos nós o ensinamos. Tudo bem?

- Tudo bem. - respondeu o menor, a contragosto.

No sábado, os irmãos entraram no casarão. Caio não gostava mais de ir lá, pois o vampiro agora tinha liberdade para andar por ela e nunca se sabia onde poderiam encontrá-lo. Hoje xeretaram a cozinha. Eric perguntou como funcionava o enorme fogão a lenha. Sébastien disse que não sabia. Enquanto o mais velho observava o fogão com bastante curiosidade, Caio aproximou-se. Puxou de leve a manga de sua camiseta.

- Eric, - sussurrou. - ele está olhando pra mim.

O rapaz olhou para o vampiro, que estava sentado numa das cadeiras da mesa.

- Está olhando para os seus tênis.

E de fato estava.

Eric virou-se de costas e correu os olhos para a cozinha.

- É... Vamos ter que alugar um caminhão para tirar os móveis.

- Tirar? Que vai tirar? - indagou Sébastien.

- Vamos vender os móveis.

- Vend... Vendre... Vender?

- Sim. Vender. Trocar os móveis por dinheiro.

- Não, não vendre quelque chose.

- O que vamos fazer com móveis velhos? Temos que desocupar a casa.

- São meus. Não mexerá em nada.

- Eram seus há duzentos anos. Agora são nossos.

Naquele instante, o vampiro levantou-se da cadeira e parou em frente a Eric. Encarou-o gravemente:

- É muito insolente, menino.

Eric apenas ergueu as sobrancelhas e pediu ao irmão que o seguisse. Analisaram os móveis dos outros cômodos. Sébastien os observou de longe. Incomodou-se quando ambos espirraram no ar líquidos que cheiravam a perfume de mulher. Para ele foi o cúmulo.

- Se ao menos pudéssemos abrir as janelas... Esse cheiro sumiria... - comentou Eric, referindo-se ao cheiro de guardado que a casa exalava.

Um pouco mais tarde, compraram marmita e almoçaram na cozinha da casa. Deixaram uma das janelas aberta e, por conta da claridade, Sébastien espreitou-os atrás da porta. A luz o incomodava.

- Estou curioso... - começou Eric, após engolir um delicioso pedaço de filé de frango à milanesa. - Você só toma sangue? Não sente fome de outras coisas?

- Não.

- Mas cheiro de comida é bom para você?

- Common deixaria de ser?

- Se você comer comida... O que acontece?

- Não me serve de nada.

Continuaram comendo. De vez em quando Caio erguia os olhos para ver se o vampiro continuava no lugar onde deveria continuar. Quando seus olhos se cruzavam, tratava de abaixar os olhos imediatamente.

- Essa ville é barulhenta.

- São os carros. - explicou Eric, pois ele só conseguia ouvir o som dos carros. - São como... Carruagens, só que sem cavalos.

Sébastien riu:

- Les carruagens precisam de cavalos. Ou de escravos qui as empurrem.

- Mas nos dias de hoje as carruagens não precisam de cavalos. Elas andam sozinhas. Quero dizer, precisam de motor e combustível para funcionar.

- O que você diz é impossível.

- Não é, não. Eu te mostraria meu carro se não fosse dia. Mas eu tenho um carro. Você vai ver. Depois eu mostro.

Como Caio quis ir embora cedo, Eric não teve tempo de mostrar o carro. No final de semana seguinte, Eric levou um mapa da cidade para Sébastien. O vampiro sentou num dos sofás da primeira sala e examinou o papel que lhe foi dado.

- Esta casa está aqui. - disse Eric, indicando a localização no mapa com o dedo. - A casa onde moramos fica aqui, nesta rua. A cidade já tem mais de quinhentos mil habitantes.

- Tudo isso? - indagou o vampiro.

Observou mais um pouco.

- Preciso de escravos.

Eric e Caio se entreolharam.

- O que?

- Se ficarei nesta casa, vou querer escravos para trabalhar na plantação.

Os irmãos se olharam novamente.

- A escravatura foi abolida em 1888. - disse Caio, em tom baixo.

- O que?

Quando o vampiro compreendeu totalmente, ficou revoltado:

- Quem vai trabalhar na plantação de sucre? Na produção de aguardante?

- Só o que restou da sua propriedade foi a casa. - informou Eric. - Não há nenhuma plantação lá fora.

- O que? Que absurdo! O que fizeram com nossas terras?

Sébastien pôs-se de pé e caminhou pela sala.

- O que aconteceu com essa colônia? Saiam daqui! Deixem-me em paz!

Caio, que estava sentado no outro sofá com Eric, pegou na mão do irmão e levantou-se. Eric levantou depois dele. Sébastien ficou ainda mais perturbado. Tapou os ouvidos.

- Esses barulhos... Façam parar. Façam parar!!

- Não estamos fazendo nada. - disse Eric. - Se acalme. Queremos te ajudar.

- Só posso estar morto. - recuou o vampiro, encostando-se a parede. - Só posso estar no inferno. Vocês me enfeitiçaram! Deixem-me em paz!

Para surpresa dos irmãos, o vampiro verteu lágrimas.

- Mãe... Por que fez isso comigo?

Havia desespero em sua voz.

- Eu fui un bon filho...

Caio apertou o pulso esquerdo de Eric, enquanto sentia pena da criatura. Naquele instante, ela olhou para os dois.

- Deixem-me em paz, demônios!

Eric deu um passo para frente. Ia dar outro, mas Caio segurou-o.

- Não queremos te fazer mal.

- Tanto barulho... Tanta confusão... - disse Sébastien, entre soluços.

Eric conseguiu livrar-se da mão insistente de Caio. E andou até o vampiro. Estendeu a mão e tocou no seu braço.

- Está tudo bem. Pare de chorar. Logo você não terá mais medo. E você sabe, sabe que não somos demônios. Somos seus descendentes. Descendentes da sua família.

Aos poucos Sébastien acalmou-se e pediu aos meninos que abrissem a porta. Assim que ele a atravessou, olhou para o céu. Estava cheio de estrelas. E a lua estava pálida e encantadora, como sempre foi. Quando Sébastien olhou para além do muro do terreno, viu luzes que nunca antes havia visto, e sentiu medo. Eram muitas luzes. Barulhos estranhos. Tudo isso foi demais para ele. Tanto, que voltou a chorar. Desta vez, porém, em silêncio. Eric e Caio observaram-no da porta. Entreolharam-se. Quando fez que ia em sua direção, Caio tentou parar o irmão, mas este disse que estava tudo bem. Caminhou até o vampiro, parou em sua frente e, após encará-lo, deu-lhe um abraço. A criatura ficou tão surpresa quanto o rapaz em frente da porta. Mas por alguma razão, seu sentimento de solidão esvaiu-se.

No início da semana, Eric regressou a casa e deu-se com Sébastien deitado no sofá da segunda sala. Seu olhar estava distante. O rapaz sentou na mesinha de centro de frente para o sofá. Deixou a bolsa de sangue sobre ela, ao seu lado.

- Nossos pais também morreram. Eles adoeceram... Agora Caio e eu vivemos sozinhos. Só nós dois... Ele está terminando a escola. É o último ano dele agora. Trabalho num lugar onde se vendem remédios. Uma farmácia.

O vampiro continuou parado.

- Por que não nos matou quando teve a chance?

- O sangue... O sangue de vocês. Posso sentir o cheiro. É igual ao de minha famille... Prometi a minha mãe que não faria mal a ninguém de nossa famille.

- Ela sabia que você era vampiro?... Foi ela quem te colocou na urna, não foi?

Ele não respondeu.

- Já que somos uma família, temos que nos ajudar e confiar um no outro. Eu confio em você.

Sébastien sorriu de súbito.

- Você é muito corajoso.

- Acredite. Eu quero te ajudar. Não sabe o quanto é complicado conseguir sangue.

O vampiro sentou, apoiou as mãos nos joelhos e aproximou o rosto do de Eric. Olhou-o nos olhos. Em seguida, tocou a ponta do nariz na bochecha do jovem e levou-o até a curva de seu pescoço.

- Preciso de divertimento.

- O que quer que eu faça?

- Tire a roupa.

Eric levantou de um pulo da mesa.

- O que? De jeito nenhum!

- Então traga-me alguém! Faz dias que fico olhando para as paredes sem ter o que fazer. Não tenho nenhum escravo para açoitar. Sabe o quanto é difícil?

- Acha divertido açoitar os outros?

- Sim, muito.

- Meu Deus! Você não vale nada.

Sébastien levantou-se. Agarrou o pulso de Eric e disse:

- Traga-me alguém ou será você mesmo!

Rapidamente, Eric usou a luz de seu celular para afugentar o vampiro. Sébastien afastou-se dele, esfregando as mãos nos olhos. Aliviou-se pela luz não lhe ter cegado.

- Não vou transar com um morto. Está maluco? - retrucou Eric, com o coração aceleradíssimo.

Assim que passou seu medo, Sébastien cruzou os braços e fitou o jovem.

- Ficar aqui é entediante.

- Por que não limpa a casa?

O vampiro deu uma gargalhada.

- Onde está seu irmão?

- Em casa.

- Por que não veio?

- Ele não quis.

- Por que?

- Você o assusta.

Eric recolheu sua mochila do chão, colocou-a sobre o ombro e completou:

- Da próxima vez que ele vier, SE ele vier, seja menos... Ameaçador.

Os livros que Eric queria levar ao vampiro foram pegos por Caio na Biblioteca Municipal. Só puderam pegar dois. Mostraram as enciclopédias na manhã de sábado. Sébastien sentou-se na cadeira do escritório e colocou os livros sobre a mesa. Folheou um deles.

- Consegue entender o que está escrito? - perguntou Eric.

- Algumas coisas.

- Há mais cinco ou seis enciclopédias iguais a essas duas...

- O que é isso? Uma pintura? - perguntou Sébastien, indicando uma figura na página 11.

- Uma foto.

- O que é foto?

- Você já vai aprender. Comece a ler.

Sébastien quis pular algumas páginas, mas Eric achou que o melhor era ler tudo, da primeira até a última. Foi uma tarefa difícil. O vampiro não conhecia muitas palavras que estavam escritas ali. Fez muitas perguntas. Perguntas que exigiam mais uma dúzia de explicações que, por sua vez, exigiam outras dúzias de explicações. Passou todo o resto da manhã e toda a tarde lendo. Quando Eric e Caio retornaram, o rapaz mais velho passou-lhe um caderno em espiral e uma caneta preta. O vampiro examinou o caderno e folheou-o.

- Essas folhas estão riscadas.

Caio deu um risinho. Sébastien encarou-o seriamente.

- São linhas. - ensinou Eric. - Para você escrever em cima. Olhe. Do jeito que eu estou fazendo.

Eric escreveu a frase: “Para escrever desse jeito” na primeira linha.

- Viu só? É para você. Estamos dando este caderno para o caso de você querer fazer alguma anotação. Se tiver alguma dúvida, pode escrever aí no caderno.

Os irmãos foram embora ao anoitecer. Naquele mesmo mês, durante um jantar na casa dos meninos, Caio tocou num assunto que, até aquele momento, Eric não havia dado atenção:

- Ele tem dentes muito feios. E o bafo dele é horrível.

- Verdade! Dar banho em vampiro é fácil, mas isso... Acha que devemos dar um trato nos dentes dele?

- Você já começou a educá-lo para viver em sociedade. Se quer que ele seja um de nós, vai ter que fazer isso, ué. Também, do jeito que os dentes estão podres... Vão acabar caindo. Não, não, deixe que caiam todos. Assim ele não morde ninguém.

Eric deu risada:

- Um vampiro banguela! O primeiro da história. Mas seria judiação, não acha? Deixar banguela um cara bonito como ele... Não me olhe assim. Você tem olhos para ver que ele é bonito.

- É. Ele é bonito.

Eric lembrou-se da ousadia de Sébastien em querer deitar com ele. A lembrança passou quando Caio perguntou:

- O que vamos fazer com ele? Não dá para alimentá-lo a vida inteira. Ele não terá uma vida normal. Tudo o que quiser fazer, terá de ser feito de noite. Ele não tem documentos, não tem nada.

- Ele vai ter que ficar naquela casa.

- Então não vamos mais vendê-la? Nem ao terreno?

- Não sei. Vamos ver o que acontece primeiro.

No dia seguinte, Eric retornou ao casarão na Avenida Itavuvu para, como sempre, deixar uma bolsa de sangue ao vampiro. Encontrou Sébastien no escritório, consultando as enciclopédias. O vampiro olhou para o jovem, em seguida, continuou consultando os livros. Eric tirou a bolsa de sangue da mochila e um pequeno espelho. Parou em frente da mesa onde o vampiro estava.

- Olhe para meus dentes.

- Que?

- Olhe, veja meus dentes. Agora olhe os seus.

Após mostrar seus dentes, Eric passou o espelho ao vampiro que, discretamente, olhou para os próprios dentes no reflexo.

- Viu alguma diferença?

- Não.

- Como não? Os meus são branquinhos e os seus estão amarelados. Quase podres.

- O que quer dizer?

- Existe um certo tipo de pessoa, que cuida dos dentes das outras. Chama-se dentista...

- Não.

- Nem ouviu tudo.

- Minha resposta é não.

Eric fitou Sébastien por um tempo até colocar o espelho de volta na mochila. Virou-se de costas para ele:

- É uma pena que não queira cuidar dos dentes. Estava pensando em te dar muitos beijos se aceitasse se cuidar.

O vampiro ergueu os olhos para ele no mesmo instante.

- Você não é o único fedelho nessa terra desgraçada.

O rapaz voltou-se para ele e retrucou:

- Não, não sou, mas nenhum fedelho, por mais desesperado que esteja, vai aceitar um beijo de uma boca como a sua. Como não consegue enxergar que seus dentes estão podres?

Sébastien levantou-se. Caminhou em direção ao rapaz, que precisou recuar a cada passo que ele dava. Acabou sendo encurralado.

- Irá cumprir com a sua palavra se eu aceitar que me pede?

- Sim. - disse o rapaz, fazendo um esforço danado para encará-lo, já que a boca de Sébastien não cheirava a Listerine.

- Um beijo... E o que mais?

- Só um beijo, e mais nada.

Sébastien ficou sério.

- Então dê-me o seu irmão.

- Nunca!

- Ou você ou ele. Fim de assunto. Pode sair. - terminou, indo até a mesa.

- A casa é minha. Vou embora quando eu quiser.

- A casa é minha.

- Minha.

- Minha!

Num movimento rápido, Sébastien pegou Eric pelo braço e levou-o para fora do escritório.

- Se preza por sua castidade, aconselho-o a sair desta casa se não quiser que eu te parta ao meio!

Após seu aviso, o vampiro bateu a porta na cara de Eric, e ainda gritou, lá do escritório:

- Não quero sentir seu cheiro na casa!

A sexta-feira subsequente foi confusa, mas Eric tinha quase certeza de que não teria dor de cabeça. Caio precisou faltar da escola para ajudar o irmão que teve uma ideia muito absurda. Foram para o casarão onde Sébastien já os esperava na sala. Caio estava muito nervoso. Se algo desse errado, tanto eles quanto o vampiro correriam sério risco. Tentou confiar na segurança do irmão e fez o que ele pediu. Deram sonífero à criatura. Surpreendentemente, ela capotou logo em seguida.

- Acha que está fingindo? - indagou Caio, incerto.

- Não, não acho que esteja. Vem, me ajuda a carregá-lo.

Eric pegou o vampiro pelos braços e Caio segurou suas pernas. Tiraram-no de cima do sofá e começaram a levá-lo para o hall.

- É muito pesado.

- Não pare, Caio. Não sei quanto tempo o sonífero vai fazer efeito. Lembre-se que ele é um vampiro.

- Acha que não sei? Como não me lembrar disso?

Fecharam a porta do casarão e tiveram dificuldade para colocar a criatura dentro do carro. Deixaram-no no banco de trás. Caio abriu o portão para o irmão passar e, juntos, foram ao dentista mais próximo.

- Isso é loucura. É loucura. - soltou Caio, mais nervoso ainda.

A todo o momento virava o rosto para fitar o vampiro, que continuava quietinho no seu lugar. Eric estacionou o carro numa das vagas da clínica. Pediu ao irmão que esperasse um momento. Caio não gostou nada, nada de ter que ficar sozinho no carro com o vampiro, porém, Eric não demorou muito. Novamente, carregaram Sébastien, agora para fora do carro. Como era tarde (o sol já havia sumido), a clínica felizmente estava vazia. A atendente olhou para os três com bastante curiosidade e também receio. Afinal, era a primeira vez que via alguém ser trazido à clínica daquela forma.

- Ele tem medo de médicos. - explicou Eric, rindo.

A atendente indicou a sala da doutora. Conseguiram deitar a criatura na cadeira reclinável. A doutora Cristiane também achou a situação muito estranha. Perguntou por que da urgência em atendê-lo naquela hora do dia.

- Como eu disse a você ao telefone, - começou Eric, ao lado da cadeira. Caio também estava ao seu lado, olhando fixamente para o vampiro desmaiado. - meu primo tem medo de médicos. Meu tio morreu recentemente e agora o Sébastien está morando com a gente, né, Caio? Nós o drogamos para que não tivesse um ataque de pânico ou mesmo um ataque de fúria. Ele é...

- Esquizofrênico! - respondeu Caio.

- Isso! Ele tem esquizofrenia.

- Meu Deus! - exclamou a doutora. - Coitado.

- É. Nós queremos cuidar direitinho dele já que nossos tios nunca fizeram isso.

- Quantos anos ele tem?

Eric e Caio se entreolharam. Fitaram o vampiro para tentar adivinhar a idade que aparentava ter.

- Vinte...

- E sete. - completou Caio.

- Bem, espero poder ajudá-lo. Vamos ver.

A doutora aproximou-se do homem adormecido, abriu sua boca e examinou seus dentes.

- Os dentes estão... Ele nunca...

- Nunca escovou os dentes. - explicou Eric. - Nem nunca foi ao dentista.

- É... - continuou a doutora, perplexa. - Nunca vi uma boca dessas num moço tão jovem. E esses dentes pontudos? Como...

- Ele os serrou.

Quando ela ergueu o rosto para fitar Eric, este fez um gesto de que o “primo” era um louco.

- Acha que tem como deixar seus dentes saudáveis?

- Sim, mas vai levar um tempo. Talvez algumas semanas. Alguns dentes estão podres. Terei que remover esses dentes e colocar próteses. Uma restauração e clareamento serão suficientes.

O vampiro foi levado para o casarão e deixado no sofá.

- Quando ele vai acordar?

- Não sei... Acho que dei muito sonífero.

Sébastien acordou somente no dia subsequente sentindo-se muito estranho. Quando Eric apareceu, quis saber o que haviam feito com ele. Ficou bastante furioso, mas o jovem explicou que era necessário para que seus dentes voltassem a ser saudáveis. Durante quinze dias seguidos, o vampiro foi posto para dormir e levado à clínica para tratar dos dentes. O último procedimento que fizeram em seus dentes foi o clareamento. Numa noite de sexta-feira, o vampiro voltou para casa com um novo sorriso.

- Por que manteve as presas dele? - indagou Caio.

- Não tenha dúvidas de que ele vai precisar.

Na outra manhã, assim que acordou, Sébastien foi para o banheiro e olhou-se no espelho. Ainda sentia-se zonzo e esquisito. Quando olhou para os dentes, levou um susto. Estavam branquinhos. Limpos, como nunca antes estiveram. Os irmãos voltaram ao casarão para ver como a criatura estava se sentindo. Caio permaneceu na sala, pois não quis chegar perto. Eric achou o vampiro naquele quarto que parecia ser seu preferido.

- Você já viu? - indagou Eric, entrando no aposento. - Gostou? Não está bem melhor?

Sébastien permaneceu sentado na beirada da cama. Num instante, porém, numa velocidade impressionante, este trancou a porta, agarrou o rapaz e o beijou com fúria. Eric tentou soltar-se, mas, Santo Deus! O vampiro era muito forte. Era como se cem mãos o agarrassem, impedindo-o de se mexer. O jovem ficou um tanto desesperado, mas logo o desespero transformou-se numa assustadora excitação. Seus beijos foram quentes, gostosos e sensuais. Intensos e arrebatadores. No entanto, Eric não estava disposto a levar isto adiante.

- Me solte! - gritou Eric, enquanto a boca do vampiro molhava a curva de seu pescoço.

O rapaz não conseguiu pegar o celular do bolso da calça e nada próximo a ele poderia servir de arma para ferir a criatura. Houve, no entanto, uma oportunidade para fugir. No momento em que Sébastien jogou-o sobre a cama, Eric conseguiu pular para fora dela, recolher um atiçador que estava ao lado da lareira e perfurar o peito do vampiro com ele. Assim que o sangue começou a escorrer pela ferida, Eric recuou alguns passos, assombrado.

O vampiro pareceu não sentir nenhuma dor. Olhou para o atiçador que estava a uns dez centímetros do seu coração. Com a mão esquerda, puxou o ferro sem nenhuma hesitação. Eric não conseguiu olhar e tapou os ouvidos para não ouvir o som da carne se mexendo.

- Isso era desnecessário. - disse o vampiro, jogando o atiçador no chão.

- Eu disse que não queria. Você me obrigou.

- Você teria feito. E vai fazer se continuar na minha frente. Saia. Vá embora e leve seu irmão com você. SAIA!

Eric saiu correndo do quarto. Sébastien, com toda calma do mundo, sentou na cama e olhou para o buraco em seu peito. Fez uma careta de desagrado.


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