The Fallout escrita por Jules, Marina Temporal


Capítulo 1
Oh, Catastrophe!


Notas iniciais do capítulo

Bom gente, aqui vai o primeiro capítulo. Ele está meio grande, mas é mais por ser o primeiro mesmo e termos que dar uma introdução geral para a história. Mas realmente esperamos que gostem. Os personagens são 100% originais, e para as duas principais tentamos dar personalidades completamente opostas, então não se incomodem pelo conformismo extremo de uma e o drama extremo de outra.
Os capítulos serão narrados cada um por uma das gêmeas, em uma ordem onde irá Skylar, Scarlet, Skylar, Scarlet e assim vai...
Esperamos que gostem!
Tenham uma boa leitura! :)



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Skylar

-Puta merda, Skylar! Se eu perder o voo eu juro que te mato!

-Ok, ok, tô indo...

Foram meus resmungos mentirosos para Scarlet assim que fui despertada de manhã. Veja bem, eu não sei vocês, mas eu não sou exatamente o tipo de pessoa que costuma acordar bem ao som de Backstreet Boys, rebolando e perguntando se é sensual ou original. Em primeiro lugar: Boy Bands não são originais. Em segundo lugar: Eu realmente preciso comentar quanto a sensualidade? Não sei bem que merda minha irmã tinha na cabeça, mas ela achava super engraçado acordar dançando com sua calcinha escrito “gostosa” na bunda e sair rebolando pelo quarto como se a escova de cabelo fosse o microfone da maior casa de shows do planeta. Quem era a plateia? Eu com sono. Se eu gostava? Tinha vontade de arrancar os ouvidos. Sejamos sinceras... Minha irmã não sabe cantar.

Dei um salto da cama enquanto caminhava ao meu armário –ou o que era antes –para pegar minha mala encostada sobre ela. Scarlet e eu tínhamos um voo em breve e minha irmã, como sempre com sua mania de perfeição não queria se atrasar por um milésimo de segundo, mesmo que no fundo eu soubesse que sua animação para a mudança era zero. Ah sim! Estamos nos mudando. Na verdade não é nada tão grande, deixe-me explicar bem a situação: Scarlet e eu temos uma família fodida.

Tudo começou com um amor adolescente e gêmeas indesejadas. “Seu pai e eu nos amávamos, não tem nada a ver com indesejadas” essa é a merda que a sociedade joga sobre você. Amor? Mito. Sexo? Agora sim estão entendendo onde eu quero chegar. Isso se chama jovens sem noção que não conhecem pílulas anticoncepcionais e camisinha... Mas tudo bem! Por causa desse “descuido” Callie e eu existimos e por essa razão passamos o inferno que passamos hoje. Nossos pais se separaram há alguns anos quando nossa mãe começou com bebidas e algumas drogas leves como o crack... Brincadeira. Foi maldade brincar com isso. Eu quis dizer, drogas leves como a heroína. Ok, talvez não tão leves. Mamãe foi para a rehab como Amy Winehouse, papai foi em busca dos seus sonhos e as filhas ficaram com a avó, única pessoa com cabeça e noção do que é criar um filho... Não que tenha feito um bom trabalho com minha mãe, mas em fim, nada curaria meu gênio piadista e tão bem humorado –em intenções erradas –de encarar a vida.

Agora vovó estava falida e estava sendo enfiada em um asilo. Callie e eu estávamos indo morar com papai e bem... Papai, -diferente dos caras da sua idade que quando atingem a crise da meia idade compram carros novos, ou então aprendem a surfar, ou então pintam o cabelo –arranjou uma mulher de vinte e dois anos que na realidade tem idade suficiente para ser nossa irmã mais velha. Mas são detalhes! Somos uma família linda e maravilhosa e o futuro que nos aguarda é o melhor... A não ser que olhe pelo lado pessimista –realista –de Scarlet.

-Eu estou falando sério, menina! Desça com suas coisas!

-Está me ameaçando com um sapato?

Ergui uma sobrancelha olhando descrente para minha irmã que pulava pelo corredor tentando se arrumar. Naquele momento ela me apontava seu sapato pink da PRADA como uma ameaça. Ui, arma letal. Balancei a cabeça negativamente enquanto entrava em minhas confortáveis boas Uggie –que minha irmã abominava –e arrumava minha bata em meu corpo enquanto descia para tomar café. Eu, diferente de minha irmã, tinha necessidades humanas e necessitava de alimentos. Para ela as coisas não eram tão simples assim, mas novamente, podemos falar disso mais tarde.

Descendo as escadas usando suas roupas da moda e com os cabelos dourados volumosos, Scarlet desfilou até mim, olhando-me horrorizada por minha escolha de vestuário, abri um sorriso enquanto levava uma colherada de Danoninho até meus lábios. O que? Eu ia crescer saudável e fortinha!  Callie revirou os olhos e balançou a cabeça negativamente diante do meu desastre.

-Eu tento, eu juro que tento. –Suspirou minha irmã levando a mão ao rosto. –Mas você insiste em usar essas coisas! Não tinha jogado fora?

-Dei sorte de encontra-las antes do caminhão do lixo passar. –Olhei de canto para ela, séria. –Obrigada por isso, aliás.

-Eu estava te salvando!

-Pelo amor de Deus, Callie! São confortáveis.

-Conforto é o inimigo da beleza.

-Estamos indo ver o papai, caramba! Não conhecer a rainha!

-Mas nunca se sabe o que podemos ver no meio do caminho!

Rebateu minha irmã indignada enquanto levava as mãos até a cintura. Ergui uma sobrancelha, assim como ela balançando a cabeça negativamente,

-Mande os cumprimentos ao rei por mim.

-Mandarei.

Piscou enquanto fazia uma reverência, tive que dar risada. Callie se sentou na mesa enquanto balançava os sapatos de salto sobre o chão. Estreitei os olhos irritada com o barulho chato que fazia.

-Preparada para conhecer ela?

-Por que diz “ela” como se fosse uma doença contagiosa?

Perguntei levando outra colherada a minha boca, Callie me observou indignada.

-Porque ela não é algo bom!

-Por que não diz o nome dela?

-Porque não é digna de nome. –Empinou o nariz. -É só mais uma.

-A mãe dela achou ela digna de um nome. –Estreitei os olhos. –E o nome dela é...

-Não ouse!

-Eu vou falar... –Provoquei, Callie revirou os olhos. –Ellen!

-Oh! Eu mandei calar a boca!

-Oh meu Deus! A abominável, Ellen!

Levei a mão ao rosto fingindo uma cara de espanto, saí correndo pela cozinha, coisa que fez minha irmã balançar a cabeça em desaprovação. Enquanto estava eu em meus passos descuidados e distraídos, Callie colocou os pés na minha frente fazendo-me tropeçar. Olhei feio para ela enquanto evitava de quebrar os dentes no chão.

-Não acredito que está ok com tudo isso. –Suspirou. –A mudança de escola, de cidade.

-Eu odeio esse lugar. –Dei de ombros com naturalidade. –E você tem o dom de fazer das mínimas coisas, coisas enormes. Não acho que mudar será uma grande coisa.

-Mas e nossos amigos?

-Nossos amigos?

-Meus amigos.

Revirou os olhos. Sim, outra coisa que devo comentar sobre minha irmã. Quando tratei de extremos opostos ali no início, eu não me referia apenas ao nosso gosto musical, de moda e ao fato de Callie ser a loira gostosa dos cabelos dourados até os ombros e eu ser a garota que está sempre pálida demais. Eu me refiro também a comportamento e como somos diante de uma cena social, ou seja: Callie é aquela que tem milhões de amigos, festas legais e um namorado gostoso babaca. Eu sou a garota com seus poucos amigos e que gosta de desenhar e tocar violoncelo. Sim, sim... Sou a “estranha”, mesmo não recebendo esse apelido. Na verdade sou eu que gosto de me chamar assim. Gostando ou não, Callie e eu somos muito parecidas por esse lance de gêmeas e tudo mais, mas o máximo que posso mudar eu tento. Meus cabelos, ao contrário dos dela, são longos até a cintura e com cortes retos e de um liso sem graça, meu cabelo também puxa mais para o branco do que para o dourado, o que me coloca no requisito novamente da garota que está sempre pálida demais. Mas esse não é o “x” da questão agora. Para mim, me mudar significava ir para uma nova escola onde nada mudaria, eu não tinha nada a conquistar... O que era realmente importante estava indo comigo e era suficiente. Para Callie? Estava tudo ficando aqui. Amigos, festas e namorado troféu. Então nem preciso comentar quem estava com crise naquele momento.

-Seus amigos vão sobreviver.

-Mas eu não! –Exclamou minha irmã. –Como posso saber como é a nova escola? Se tem pessoas legais como eu! E o que eu faço com o Brandon?

-Mas que merda o Brandon tem a ver com tudo isso?

Perguntei curiosa enquanto colocava o pote de Danoninho no lixo. O queixo de Scarlet foi ao chão.

-Hm... Talvez pelo fato de ele ser meu namorado?

-Callie, por favor. –Revirei os olhos enquanto soltava um suspiro cansado. –Brandon é um babaca que ainda acredita na teoria de que 2+2=3 e só porque vocês ficaram algumas vezes embaixo da arquibancada, não quer dizer que ele é seu namorado. Ele mal sabe o alfabeto inteiro! E que raio é “sensalegal”? Você realmente sai com um cara desses e me pergunta o que fazer com ele? Eu te digo o que fazer com ele: Coloque-o em uma creche para crianças especiais.

-Brandon é especial!

-Acho que não entendeu o tipo de especialidade a qual me refiro.

-Não, Skylar! Ele é especial para mim!

Revirou os olhos como adorava fazer. Balancei a cabeça negativamente enquanto puxava a alça da minha mala, caminhando em passos lentos em direção a sala. Dei uma última olhada em volta soltando um curto suspiro. Bem... Acho que era um adeus para a nossa antiga casa.

-Pegue suas coisas, Callie. O taxi chegou.

-Tudo bem...

Suspirou minha irmã enquanto pulava da mesa e andava rebolando até a sala do lado onde havia deixado suas cinco mil oitocentas e quarenta e duas malas de mão. Balancei a cabeça negativamente enquanto a observava com um sorriso, peguei minha mala a puxando para perto de mim, mas por um momento algo me pareceu faltar. Meus olhos bateram na parede e assim que fiz, foram atraídos para a imagem que estava lá desde sempre. Eu, Callie e vovó, sorrindo para a câmera enquanto ela nos girava no gira-gira. Callie passou por mim em direção a porta enquanto colocava suas coisas no taxi. Gritou de lá ao perceber que não estava a acompanhando.

-Está pronta?

Abri minha mala rapidamente e agarrei da parede o retrato, o colocando em minhas coisas. Fechei-a rapidamente enquanto me colocava de pé novamente e abria um sorriso para minha irmã batendo o pé impaciente ao lado do taxi que provavelmente já rodava o taxímetro. Pisquei.

-Pronta.

***

O ar em Londres era completamente diferente do ar em qualquer outro lugar. Não sei porque, mas acho que a terra da rainha tinha um encanto a mais, algo como o clima frio e como ele caía bem em mim. Nunca gostei do calor, eu sempre preferi temperaturas mais baixas, e o fato de sairmos do avião quase congelando pelas roupas sem mangas que usávamos, fez o local ganhar alguns pontos positivos.

A viagem foi bem tranquila, no geral. As coisas costumeiras como bebês chorando, barulho de turbina e o som aterrorizante das rodas sendo recolhidas. Depois aquela maldita altura e o tempo que demoramos para pousar. Já estávamos em solo e eu me sentia mais tranquila do que imaginava. Quanto a Callie, eu não poderia dizer o mesmo. Desde que saímos de casa até o momento em que as portas do avião se fecharam, a garota não largou seu celular, sofrendo em silêncio em mensagens de texto com as amigas. Durante o voo, bateu os pés, mãos e tudo o que conseguiu para não ficar parada. Sempre tentava começar um assunto sobre Ellen que eu fazia questão de cortar. Ok, papai estava namorando uma garota de vinte e dois anos... E? Se ele estava feliz era o que importava para mim... A não ser que ela tivesse dezesseis assim como eu e Scarlet, aí sim as coisas ficariam feias. Nesse caso a mulher era maior de idade, ele era maior de idade e se queria uma namoradinha troféu, não seria eu quem iria interferir. Callie era bem do tipo que arranjava namorados troféus, portanto deveria ser a última pessoa a reclamar. Mas como sempre, pessoas que falam mal das outras nunca olham para o próprio umbigo.

Agora estávamos pegando nossas bagagens e não demorou muito até ver o rosto divertido e jovial do nosso pai, que abriu os braços assim que nos viu. Ah sim, papai sempre foi muito bonito. Ele leciona como professor em uma faculdade –creio eu que é Harvard –e sempre chamou a atenção de todas as alunas. Não me surpreenderia se ele tinha conhecido Ellen quando dava aulas. A garota deve ter tirado várias notas A, mas isso não vem ao caso! Papai assim como eu e Callie tem cabelos loiros e divertidos olhos cinzentos. Em seu rosto quase não vemos rugas do tempo, e por correr como sempre adorou, papai está sempre em ótima forma. Vamos combinar! Quarenta e três anos não é assim tão velho! Não é como se já tivesse acabado sua vida!

O sorriso era grandioso e pela primeira vez no ano senti que alguém estava realmente feliz em me ver. Callie e eu nos jogamos em seus braços dando um forte abraço no loiro, apertando-o com força, afinal, havia um tempo em que não o víamos.

-Olá, meninas!

-Papai!

-O senhor está ótimo!

Exclamamos emocionadas. Pude ver a alegria nos olhos de Callie ao perceber que nosso pai havia vindo sozinho. O sorriso em seu rosto se alargou, enquanto papai passava a mão em nossos cabelos e dava um beijo em cada uma das testas. Deu uma risadinha.

-Uau como estão lindas! Acho que devo começar a me preocupar.

Brincou enquanto segurava ambos dos queixos olhando-nos bem. Callie e eu abrimos sorrisos exagerados, fazendo-o rir mais. Trocamos olhares alegres.

-E como continuam parecidas! As filhas mais lindas do mundo.

-Acho que esse é o papo de todos os pais!

Brinquei lhe dando um empurrãozinho, papai deu risada abraçando-me mais forte. Correspondi olhando para a tatuagem em seu braço que tanto adorava. O sorriso em meu rosto se alargou. E estava pronta! Papai adorava um videogame chamado God Of War –que nós sempre jogávamos juntos quando eu ia para Londres o visitar –e no mês passado resolveu começar a fazer uma tatuagem do Kratos, o personagem principal desse videogame. O cara é foda, todo musculoso e com altas armas nas mãos... Realmente um desenho interessante. Como era um grande cenário, ele estava demorando semanas para o terminar de pintar e finalmente estava pronto! E lindo! Olhei animada para meu pai vendo nosso personagem preferido estampado em seu braço. Sim, sou uma menina e meu personagem preferido saiu de um videogame de luta e sexo.

-Uau! Ficou maravilhosa, pai!

Exclamei me referindo ao desenho. Papai deu risada enquanto levantava a manga de sua camisa para eu poder vê-lo melhor. Sorriu.

-Viu só?

-Não acredito! –Minha irmã exclamou olhando horrorizada para nós. Papai e eu franzimos um cenho, confusos. –O que fez com o seu corpo? Abominável!

-Abominável? –Papai riu do exagero de minha irmã, lhe dando um abraço. Callie torceu o nariz. –Realmente senti saudade de vocês. Isso é tudo o que trouxeram?

Perguntou apontando para as malas ao nosso lado. Assentimos enquanto ele se abaixava nos ajudando com elas enquanto caminhávamos em direção ao estacionamento. Sabe, eu sempre me dei melhor com meu pai do que com qualquer outra pessoa, e olhando bem agora, talvez eu estivesse um pouco animada com a mudança. Digo, poderia ser interessante! Morar em uma casa onde não tem problema fazer barulho, em um bairro legal, com nosso pai que era de longe uma das pessoas mais divertidas do mundo... Seria –como costuma dizer Callie –Top.

Papai apertou o botão na chave abrindo sua Land Rover e abriu o porta-malas colocando as coisas ali dentro. Tivemos que apertar bastante as coisas para tudo de Callie caber, mas depois de um certo esforço, conseguimos. Papai sorriu enquanto eu e minha irmã disputávamos quem ia na frente. Dessa vez fui eu que venci, dando a ela o controle sobre o rádio. Essa era sempre nosso acordo já que Callie abominava minhas músicas.

-Então, papai... –Sorriu minha irmã do banco de trás enquanto escolhia mais uma de suas Boy Bands. –E Ellen?

Mais uma vez vomitou o nome da garota, como se estivesse se referindo a uma doença contagiosa. Tive de revirar os olhos mais uma vez. Mas é claro que ela tocaria nesse assunto, estava até demorando para falar sobre a abominável Ellen, com sua idade abominável e aparência abominável de uma mulher de vinte e dois anos. Tudo abominável para Callie, assim como minhas músicas e as tatuagens do papai. Quer saber? Scarlet é igual a nossa mãe. Sempre reclamando de tudo e todos, se achando a última bolacha do último pacote do universo e vendo tudo como seres inferiores a si. Eu amava minha irmã e tudo mais, mas não posso negar o fato de eu ser cem por cento meu pai. Sempre adorei as coisas mais animadas, nunca me importei com bagunça e tenho um bom gosto musical. Nada de Boy Band. Acho que nesses extremos havíamos herdade os gênios peculiares de cada um dos nossos pais. Eu realmente esperava que minha irmã não se entregasse as drogas e eu não começasse a sair procurando por garotos vinte anos mais novos do que eu, mas fora isso...

-Ellen está ótima querida. Eu queria realmente falar sobre ela com vocês.

-Hm... Mas já terminaram? –Apressou-se Scarlet, fingindo-se triste. –Durou tão pouco...

-Terminar? –Papai olhou pelo espelho para minha irmã com os olhos divertidos. –Não, querida, nós não terminamos.

-Ah...

Resmungou Callie mal humorada enquanto se afundava no banco, tentei ao máximo segurar a risada. Papai franziu a testa olhando para o rádio que tocava mais uma vez as malditas perguntas que me faziam querer arrancar os cabelos. Sou original? Eu sou o único? Sou sensual? Puta merda! Eu nunca iria entender o que se passa pela cabeça desses cantores. Papai torceu o nariz.

-Mas o que é isso?

-Isso é música, pai.

Respondeu Callie com o nariz em pé. Balancei a cabeça negativamente.

-Isso é o que ela chama de música.

Respondi, fazendo papai dar risada. Senti suas mãos alisando meu cabelo como ele costumava fazer quando dirigia.

-Anda escutando muito rock, filha? Como andam os desenhos, aliás?

-O rock nunca vai me abandonar. –Garanti dando uma leve risada enquanto via minha irmã revirar os olhos. –Os desenhos vão bem, na verdade. Tive uma exposição um dia desses no colégio. Vovó adorou e tudo mais...

-Ah sim, e sua avó? Como está?

-No asilo. –Respondi dando de ombros. –Mas disso você já sabe.

-Eu quis dizer de saúde.

Riu papai. Callie soltou um suspiro enquanto mudava sua música para mais uma da mesma banda.

-Ela vai bem, pai.

-Pai. Onde estamos?

Callie interrompeu nosso diálogo para só então eu perceber que realmente não conhecia o caminho que estávamos fazendo. Callie e eu já estivemos várias e várias vezes na casa do nosso pai em Londres, mas aquele caminho eu tinha certeza que era novo... Ou então não estávamos indo para a mesma casa. Coisa que se confirmou assim que o carro parou em frente a uma casa um pouco maior que a antiga, em pintura branca, flores na parte da frente e perfeitamente arrumadinha. Meu queixo caiu. Mas o que? O sorriso no rosto do meu pai fez meu estômago se embrulhar. Aquela casa era tão... Arrumadinha. Nunca se parecia com a casa de um homem que mora sozinho, e foi aí que o pânico me atacou.

-Hm... Pai. Tem algo que queira nos contar?

Perguntei, papai não me respondeu, apenas manteve o sorriso bobo no rosto e olhou para a casa como se fosse a melhor coisa desde Metallica. Estacionou o carro cuidadosamente enquanto nos olhava contente. Eu poderia dizer que estava até mesmo radiante.

-Meninas, por que não vão entrando? Eu levo suas coisas.

Meus olhos acompanharam o gramado em direção ao canteiro de flores enquanto examinava rapidamente a casa. Sabe aquele tipo de vizinhança onde os vizinhos dão bom dia todas as manhãs quando saem para regar suas flores coloridas, ou então aquele tipo de rua em que podemos andar em qualquer momento do dia ou da noite sem ter uma arma apontada para a sua cabeça? O tipo de vizinhança para onde um casal geralmente se muda ao ter um bebê? Era exatamente onde eu estava. Mas o que havia acontecido com o flete do papai na avenida principal? O que havia acontecido com toda a bagunça? Aquela casa não era muito diferente da casa em que eu morava com minha avó.

A porta da frente se abriu, e com os cabelos castanhos presos em um coque e os divertidos olhos verdes sem marcas de expressão, saiu Ellen, sorridente e dócil como sempre, com o ar jovial –de uma garota de vinte e dois anos –aparentando ainda mais feliz do que nunca. Me deu um abraço mesmo não tendo muita intimidade comigo. Fez o mesmo com Scarlet que quase caiu de costas. Sabe, se eu não estivesse um pouco surpresa também, a expressão da minha irmã seria mortalmente cômica e me faria gargalhar para sempre. Parecia que havia visto um fantasma! Um fantasma não. Havia visto A abominável Ellen. De abominável Ellen não tinha nada, mas é claro que eu não falaria isso para Callie.

-Scarlet! Skylar! Como estão bonitas!

-Obrigada, Ellen! Posso dizer o mesmo de você!

Sorri enquanto tudo o que minha irmã fazia era torcer o nariz. Ai, ai... Eu poderia realmente viver bem com aquela expressão em sua face toda vez que Ellen viesse falar conosco. Papai saiu do carro carregando as malas e abriu um sorriso ao ver que estávamos conversando com sua namorada e não a apedrejando. Soltou nossas coisas no chão enquanto caminhava em nossa direção, passando um braço sobre os ombros de Ellen e lhe dando um beijo na testa. Ellen retribuiu com um sorriso dócil.

-Meninas... Nós temos novidades.

-Isso eu percebi.

Resmungou Scarlet ainda estupefata olhando o espaço em volta. Minha expressão naquele momento era de alguém em um elevador fazendo de tudo para não gargalhar de alguma pessoa que acabou de entrar.

-Bem... –Papai ignorou minha irmã enquanto continuava a falar. –Ellen e eu vamos nos casar. E resolvemos que é a hora de nos mudarmos para morarmos juntos.

Eu não consegui segurar uma gargalhada ao ver o queixo de minha irmã cair, fazendo papai me observar com uma expressão confusa. Ah sim! Scarlet estava amando aquilo! Balancei a cabeça negativamente para papai enquanto dava um abraço nele e um em Ellen, coisa que a fez dar risada. Olhei para eles com um sorriso enorme no rosto, feliz, mas como de alguém que conta uma piada. Umedeci os lábios.

-Meus parabéns! Isso é ótimo!

-Obrigado, filha. –Sorriu papai enquanto me dava um beijo na testa. Olhou para Callie que tinha a boca aberta em choque, e apenas um dos olhos piscando. –Callie?

-Eu... Vou entrar.

Praticamente rugiu irritada enquanto caminhava em passos pesados em direção a casa. Papai olhou para Ellen com uma expressão de “desculpe”, Ellen deu de ombros ainda com seu sorrisinho, Papai passou um dos braços em meu ombro enquanto me dava um beijo no topo da cabeça.

-Acho que você pode entrar para escolher o seu quarto também. Temos três vagos.

-Ok.

Concordei sem crise enquanto pegava minha mala principal deixando papai me ajudar com as outras enquanto adentrava a casa em direção ao andar de cima. Por dentro, ela não era diferente de por fora. A mobília estava toda arrumadinha, com uma lareira na sala e vários quadros na parede, com fotos de Ellen, meu pai e até umas minhas e de Callie. Era como se já morássemos lá há algum tempo e isso era legal. Subi as escadas até entrar em um quarto com carpete e quase caí de costas. Perfeito. Acho que nunca tive um quarto daquele tamanho. Ele estava completamente vazio, apenas tinha uma cama na lateral esquerda e um pequeno armário na direita. Eu não havia trazido a mobília da minha outra casa para enchê-lo, então provavelmente eu teria de me virar com o quase nada que ali tinha. Corri até a parede, onde vi uma porta de escorregar para o lado, e ao abrir dei de cara com um enorme banheiro de duas pias. Do outro lado do banheiro, de frente para a minha porta de escorregar havia outra igualzinha que em questão de segundos foi escorregada por Scarlet que deu de cara comigo. Revirou os olhos.

-Ótimo. Vamos dividir um banheiro?

-Tem outro quarto se quiser. –Retruquei sorridente. –Já escolhi o meu.

-Infelizmente eu gostei desse também. –Callie deu de ombros. –Acho que vamos dividir o banheiro.

-Ok.

Aceitei numa boa enquanto colocava minha mala no chão prestes a desfaze-la. Eu tinha que admitir: Agora eu estava animada com a mudança. Callie passou pela porta do banheiro adentrando meu quarto, sentando-se na cama com colcha branca que deixava o quarto branco igualmente sem graça. A única coisa diferente que havia ali era que uma das paredes –a parede da janela –estava pintada em uma cor vermelho sangue, e era exatamente isso que havia chamado a minha atenção.

-Como pode estar tão tranquila com tudo isso?

Perguntou indignada depois de me observar por um tempo. Olhei para ela completamente distraída.

-Hein?

-Esse negócio do papai se casar com a Ellen. Ela vai entrar para a família. Vamos ter uma mãe com quase a nossa idade?

-Ela não tem quase nossa idade.

Revirei os olhos. Callie me observou com o queixo caído.

-São seis anos de diferença!

-Callie. –Fechei os olhos enquanto respirava lentamente. –Ela não é nossa mãe. Nossa mãe é aquela drogada que está presa na reabilitação há alguns anos, então pare de crise. Ellen é uma mulher que o papai arranjou e que está feliz com ela. Aceite.

-Feliz com uma mulher de vinte e dois anos!

-Eu sei a idade dela.

Revirei os olhos. Callie cruzou os braços, batendo o pé, completamente inquieta.

-Eu não sei você, mas eu vou dar um gelo nela e no papai.

-É, é... –Dei de ombros fazendo um gesto com a mão. –Faça isso.

-Ótimo.

Empinou o nariz enquanto os barulhos de passos se aproximavam de onde estávamos. Logo pude ver nosso pai sorridente, olhando-nos parado da porta. Sabe... Eu acho que ele estava realmente feliz em termos ido morar com ele, pelo menos agora que ele tinha uma casa onde cabíamos todos nós. Ele sempre dizia que Callie e eu só morávamos com nossa avó porque por hora ele não tinha uma situação financeira muito boa e não poderia nos dar uma vida como merecíamos. As coisas pareceram mudar.

-Fico feliz que estejam aqui.

Falou simplesmente enquanto Callie se levantava da cama de nariz empinado e saía pela porta do banheiro em direção ao seu quarto. Revirei os olhos com a cena, enquanto fechava minha mala e me sentava na cama no canto do quarto vazio. Sorri.

-Eu também.

-Eu resolvi deixar a decoração por conta de vocês. –Papai deu de ombros se referindo ao local onde eu estava. –Não sei bem como anda o gosto das duas... Tão diferentes.

-Vou poder decorar esse lugar?

Perguntei surpresa. Papai assentiu.

-Vai sim. A escola paga melhor agora. Já me ajustei bem no meu novo cargo, um salário muito bom, aliás. Agora que temos uma casa só nossa o mínimo que posso é lhe dar um quarto bacana. Ellen levará você e sua irmã para uma loja amanhã.

-Uau... –Sorri completamente contente. –Vamos adorar.

Papai soltou um suspiro enquanto caminhava lentamente em minha direção, sentando-se na cama ao meu lado. Abriu um sorrisinho observando-me delicadamente, lhe dei mais um abraço para matar as saudades.

-Sei que Scarlet não está aceitando bem o relacionamento com Ellen, sei que você entende mais do que ela. Então obrigado. E como Ellen levará vocês amanhã...

-Vou falar para ela ser gentil.

Garanti me referindo à Scarlet. Papai assentiu agradecido enquanto me dava um beijo na testa, caminhou mais uma vez em direção a porta.

-Ellen está terminando o jantar. Mandou perguntar o que sua irmã gosta de comer.

-Um tomate.

Respondi dando de ombros. Papai estreitou os olhos curiosos.

-Ela não parou com essa bobeira? –Balancei a cabeça negativamente, o vi suspirar. –Tudo bem, outro problema que iremos tratar. Desçam logo mais, falarei para ela fazer massa.

-Ok.

Respondi sorridente enquanto o via sumir no corredor. Caminhei até a janela enquanto olhava para fora a rua tranquila do bairro e as casas com luzes acesas naquele fim de tarde. Não pude esconder o sorriso em meu rosto. Aquela mudança de início me pareceu como qualquer outra, mas eu estava animada com ela. Não pelo colégio, não pela casa, mas sim pela sensação de que algo maior me esperava. O quão vago isso poderia soar? Bem, muito, na verdade... Mas eu sabia que estava perto de me surpreender e talvez viver algo que nunca imaginei passar em minha vida. Pelo menos não por hora. Talvez eu fosse conhecer um mito.


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Notas finais do capítulo

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