Pov Nick

Embora o sono e o cansaço estivessem tentando me dominar, eu não fechava os olhos. Deviam ser umas cinco da manhã, o que significava que eu não dormia a vinte e cinco horas. O que eu mais queria era fechar os olhos, mas eu não podia descansar nem por um minuto. Tinha que ficar sempre alerta. Já tinha tentado me distrair, olhando o caderno de anotações, fazendo desenhos, mas já tinha me entediado.

Observei Kath enquanto ela dormia. Parecia tão calma e serena, diferentemente de quando acordada... Esses dias têm acabado com ela. Mas imagino que eu também esteja bem ruinzinho. Olheiras horríveis, um galo na testa, a perna toda ralada...

Ouvi um barulho lá fora. Como algo se movendo, pisando levemente na terra. Prendi a respiração na hora e fiquei imóvel. Depois de um tempo, esse "algo" se afastou. Ainda bem, pois se esse "algo" entrasse na caverna, não daria para fugir.

Continuei minha vigilância. Apenas ouvindo os animais da noite. Faltavam poucas horas para o amanhecer, portanto os tordos já davam sinais de vida. Eles cantavam desde umas quatro da manhã. Nada muito alto, mas com o silêncio total, como eu me encontrava agora, dava para escutar até as batidas de meu coração e as batidas do coração da Kath. Dava para escutar cada um dos muitos tordos nas árvores vizinhas.

Então, aconteceu uma coisa bizarra. Vi as folhas farfalharem, como se uma súbita e forte rajada de vento estivesse passado. E então eu ouvi. Ou melhor, não ouvi. O canto dos tordos tinha parado. Houve um momento de silêncio e então um tordo emitiu um som agudo e alto, como um sinal. Eu já vi isso antes... Nos Jogos! Aerodeslizador!!!

Eu percebi o que esse aviso significava um centésimo de segundo antes de ver as luzes no chão, como se procurassem algo. Então eu entrei em desespero.

- Levanta!! Levanta!! Temos que ir Kath, levanta!! Eles nos acharam! Ela estava desnorteada. Embriagada por causa do sono. A sacudi mais forte, enquanto levantava e a puxava junto. Tínhamos que sair daqui. A luz chegava cada vez mais perto.

- Corra!!! Corra!!! - Gritei. Ela ainda não estava 100 % acordada, e por isso tropeçava nos próprios pés enquanto corria. Depois de um minuto mais ou menos ela pareceu percerber o que estava acontecendo, pois estava com uma expressão bem assustada.

Começamos a correr a toda velocidade. Como simplesmente saímos da caverna, deixamos tudo lá. Nossas roupas, nossas armas, nossa comida... Só estávamos com a roupa do corpo. Eu olhava para trás apenas para ver a luz e o aerodeslizador na nossa cola. A luz estava quase na Kath, pois ela estava mais para trás. Diminuí a velocidade para pegar sua mão e a puxar para ela ir mais rápido. Ajudou um pouco.

Entramos em uma parte mais fechada da floresta. Não sei se isso foi bom ou ruim, pois ao mesmo tempo que a mata fechada nos escondia, mais e mais folhas, galhos e raízes apareciam na nossa frente, nos machucando e nos fazendo tropeçar. Estávamos em uma parte desconhecida da floresta, o que dificultava mais ainda. Bati a cabeça fortemente em um galho. O corte, acima do olho direito começou a sangrar e a dor na cabeça foi horrível. Fiquei tonto na hora, e a cabeça latejava. Mas continuei a correr. É, não foi a melhor ideia entrar nessa parte da floresta.

Kath tropeçou num tronco. Ela tentou pular, mas ele era muito alto. Ela caiu feio, e só parou quando bateu em uma árvore. Por pouco não bateu a cabeça em uma pedra. Parei, ofegante, para ajudá-la a se levantar, mas a perna dela estava bastante aroxeada e num ângulo meio estranho. Ela quebrou ou torceu a perna. Acho que quebrou mesmo. Oh deuses. O que eu ia fazar? A luz chegava cada vez mais rápido. Quando a pus em pé, ela deu um grito agudo e agoniado. Não conseguiria correr. Provavelmente nem andar. Tomei uma atitude desesperada. Botei ela nas costas. Mal aguentava seu peso, estava quase caindo, mas comecei a correr. Não que ela fosse gorda, pelo contrário. Era eu que era fraco.

O suor escorria pelo meu rosto, o corte acima de meu olho direito ainda sangrava e não tinha nada para estancar o sangue. Minha cabeça estava quase explodindo, eu não aguentaria mais muito tempo. Kath soltava gemidos de dor atrás de mim, mas eu mal ouvia. Tentava pensar em outra coisa, mas era quase impossível.

O aerodeslizador continuava avançando silenciosamente. Ele estava a mais ou menos dois metros de nós. Resolvi virar a esquerda bruscamente, o que ajudou a despistar o aerodeslizador, mas me fez cair de joelhos no chão. Para me levantar foi um sacrifício. Quando finalmente consegui levantar, sentia como se meu joelho estivesse em chamas.A luz continuava em frente, mas eu sabia que logo eles perceberiam que fomos para a esquerda

Senti a terra tremer atrás de mim, quando olhei para trás havia uma cratera fumegante no chão. De longe o aerodeslizador jogava bolas de canhão em chamas em nós. Eles haviam nos localizado. Malditos sejam.

Uma bola de fogo caiu a seis metros à direita, o que me fez involuntáriamente ir para a esquerda a toda velocidade. Foi meu grande erro.

Uma bola de canhão caiu três metros a frente de nós, e com o impacto fomos lançando para trás com toda força. Dois, três metros se passaram e quando atingimos o chão, foi um para o lado e o outro para o outro lado. Bati as costas no chão, o ar quase se foi de meu corpo, e eu fiquei lá só arquejando, tentando respirar. Kaethe caiu num monte de folhas, que amaciaram a queda, pelo menos.

Vi a luz chegando muito perto de Kath, enquanto ela levantava com um grito fino. Levantei, com muita força de vontade, e corri até ela. Vi o aerodeslizador no alto, parado no ar. Quando cheguei até ela, cambaleando um pouco, ela me empurrou com força. Provavelmente, a única força que lhe restava. Caí em um buraco, com folhas em volta, e bati a cabeça novamente. Quase fiquei inconsiente, mas sabia que Kath estava em perigo e tinha que ajudá-la. Mas quando tentei levantar, não consegui.

A última imagem que vi foi a luz chegando em Kath, o aerodeslizador lançando uma rede, envolvendo-a enquanto ela soltava um grito e subindo com ela.

- Kath! Não! Nãão!! - Tentei gritar, mas as palavras não saíram da minha boca. Saiu apenas um gemido baixo. Tentei novamente levantar, mas, novamente, não consegui.

Foi exatamente igual ao sonho, ou melhor, pesadelo, que se repetia todas as noites. E com esse pensamento, eu perdi a consciência.