Flamma Amoris escrita por Karla Vieira


Capítulo 13
Perdida


Notas iniciais do capítulo

Boa noite gente! Vocês vão me desculpar pela demorinha, né? É que a gincana do colégio começou e eu tenho que ficar lá o dia inteiro, e chego morta de cansaço! Acaba sábado essa coisa toda... E minha equipe está perdendo. Tristeza. Enfim, cá estou com um capítulo para vocês. Espero que gostem, está pequeno, mas achei... "Normal".



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Marie Jean POV – Noite de 04 de Abril


Era quase meia noite e eu não conseguia pregar os olhos. Havia alguma coisa dentro de mim que me instigava a voltar ao porão. Eu precisava voltar ao porão. Essa necessidade é estranha, é forte. Não consigo evitá-la mais. E eu precisava retornar lá sozinha.

Bufei, levantando-me da cama. Troquei de roupa, coloquei um casaco (a noite estava fria, novamente) e peguei a lanterna que deixei na cômoda. Saí silenciosamente do quarto e agradeci que não havia ninguém acordado. Andei pela casa, quase as cegas – tinha decidido não ligar a lanterna até chegar na rua – e enfim achei a porta da sala. Assim que cruzei a porta, fechando-a e levando a chave comigo, liguei a lanterna e fui caminhando até as ruínas da casa. Uma coruja piava em algum lugar próximo, e, fora os meus passos e minha respiração, era o único barulho que eu ouvia.

Circundei a casa e achei o porão. Abri-o e entrei, acendendo o interruptor, e fechando as portas em seguida. Assim que parei diante das estantes, tive uma ideia. Pareceu-me absurda no começo, mas eu estava sozinha; não havia ninguém para ver e rir da minha ideia. Respirei fundo, fechando os olhos. Canalizei o pensamento para que, se houvesse algo deixado pela minha mãe para mim, eu soubesse o que era. Senti um pequeno formigamento na mão e abri os olhos.

Haviam duas coisas, naquele cômodo, que estavam brilhando com uma fraca luz amarelada. Um livro, e um pequeno baú. Aproximei-me do livro, e peguei-o. Assim que o toquei, a luz se apagou. Sentei no divã e o abri. Era um livro sobre os caçadores. Folheando-o, vi que haviam algumas anotações nos rodapés, nos lados, com a caligrafia dela. Algumas eram palavras soltas como “mentiras”, “traição”, “enganar”. Outras eram sobrenomes: “McCartney” “Fletcher” “O’Conell” “Collins” “Cooper”. Junto com essas, havia outro, porém estava mais apagado. Só consegui discernir um W.

Continuei virando as páginas, até que encontrei uma com um título peculiar.


Quando o Lobo se Apaixona pelo Cordeiro”.


Comecei a ler, e falava dos raríssimos casos em que um caçador se apaixonou pela bruxa ou bruxo que devia matar. A grande maioria terminava em morte para ambos, e não havia detalhes sobre como a morte ocorreu, fora a descrição “lenta, dolorosa e horrenda”. Uns poucos terminavam “bem”: um dos dois sobrevivia. Geralmente, o caçador, que escolheu a própria vida.


“Apenas uma vez o lobo e o cordeiro ficaram juntos: quando as almas em questão eram almas destinadas. Os dois geraram uma única criança, que levou no sangue a magia antiga, passando de geração em geração. Esta única criança seria o primeiro da linhagem Lookwood – uma das mais poderosas linhagens. As únicas que se assemelham a ela são a Williams e a O’Conell.”


E abaixo deste parágrafo, no final da folha, uma única frase escrita com a caligrafia dela.


“Toda alma tem a sua alma destinada: Flamma Amoris”.


Continuei folheando o livro, e encontrei outras anotações aparentemente desconexas. Deixei o livro acima do divã e fui pegar o pequeno baú que ainda brilhava. Levando-o na mão, já sem brilhar, sentei novamente no divã e o abri. Dentro dele, havia um pequeno medalhão, e um maço de papéis semelhante a um pequeno bloco de anotações, antigo. Olhei atentamente o medalhão, que tinha a forma circular, com um brasão gravado nele – duas espadas em chamas se cruzando. Aparentemente, era de prata e ouro, e bem antigo. Deixei o medalhão em cima do livro e peguei com cuidado o bloco de anotações amarelado. A caligrafia não era de minha mãe. Reconheci como a de meu avô, James.


Grande perigo se aproxima de minha família. Não sei ao certo o quê, mas sei que afetará as gerações a partir dos meus netos. Sei que envolve um caçador, um de meus netos e almas destinadas. Se for o que eu penso, estão fadados a um destino cruel.”


O medalhão carrega consigo agora um grande peso para quem usá-lo. Grande poder traz grandes responsabilidades e perigos. O medalhão possui grande poder.”


As anotações de meu avô eram vagas, misteriosas e preocupantes. Nada mais havia no bloco de anotações ou no baú, mas sei que em algum lugar naquele porão deve haver algo que explique tudo aquilo. Por enquanto, manterei isso comigo, seguro e escondido, em segredo. Acho que somente eu devo saber disso. Pelo menos, por enquanto.

Quantas coisas haveria sobre mim, sobre minha família que eu desconhecia? Quantos segredos, quantas mentiras e omissões? Quanta coisa eu ainda tinha que saber, descobrir? Com quanta coisa eu haveria de lidar, ainda?

O pior de tudo: eu estou sozinha.

E agora, me sinto perdida.

Perdida nos destroços da minha antiga vida ilusória e omissória, uma vida em que eu achava ser uma garota normal, um ser humano normal. Eu era feliz e não sabia. Eu tinha tudo o que eu precisava, e não sabia. Agora, me falta, me entristece, me confunde e me perde. Eu podia ter meus irmãos, podia ter meus amigos. Podia ter Ethan. Mas eu, no fundo – ou não tão no fundo – preferiria que nada tivesse mudado. Preferiria continuar sendo apenas... Eu. Por que, agora, eu não sei nem ao menos quem sou.

Qualquer um poderia dizer que não, eu não estou sozinha, porque tenho, principalmente, Ethan comigo. Por mais que ele consiga me entender, ele não me entende por completo, e sempre parece ter algum segredo, escondendo-o de mim. Por mais que eu esteja apaixonada por ele, e esteja junto dele, eu ainda não consigo abrir-me completamente com ele. Eu não consigo me abrir para ninguém.

Suspirei, levantando-me do divã, carregando comigo o livro e o pequeno baú, já com o medalhão e o bloco de anotações dentro. Subi as escadas, abrindo a porta, e virando-me para trás, com o pensamento focado no interruptor, que se apagou. Saí de dentro do porão, fechando as portas e sentindo o vento frio contra meu corpo. Tranquei-as e acendi a lanterna, caminhando novamente para casa. Agradeci infinitamente quando adentrei no conforto da casa de tia Denise, e entrei no meu quarto. Abri o guarda-roupa e coloquei o livro e o baú lá no fundo, bem escondido.

Depois disso, deitei em minha cama e dormi profundamente, livre de sonhos ruins.


Ethan Williams POV – Madrugada de 05 de Abril.


Vi que Marie Jean havia voltado ao porão, sozinha, e voltado com algo em mãos, e esperei até que a luz de seu quarto se apagasse para que eu pudesse trabalhar. Andrew e Fred me ajudariam, já que o feitiço que eu iria fazer demoraria muito se eu fizesse sozinho. Eram muitos detalhes. Nenhum dos dois eram bruxos, o que significava que o peso do feitiço cairia todo sobre mim, somente, e eu estaria morto de cansaço quando terminasse. Eu poderia até desmaiar. Mas o feitiço era necessário.

Fiz um pequeno X de alecrim moído ao norte, sul, leste e oeste da casa, enquanto os outros faziam outros pequenos X com lavanda picada ao noroeste, nordeste, sudeste e sudoeste. Sempre olhávamos para as casas vizinhas para certificar-nos que ninguém estava olhando, afinal, pareceria estranho três seres vestidos com roupas escuras, de madrugada, circundando uma casa.

Depois, começamos a colocar fogo nas coisas no chão, enquanto eu ficava ao norte, diante a porta da frente, segurando uma vela.

– O que você está aprontando, Williams? – Uma voz perguntou perto de mim, sobressaltando-me. Virei-me e encontrei Holmes parado no muro de Marie Jean, olhando, vestido como quem acabou de sair da cama e pegou o primeiro casaco que encontrou.

– Algo que não é da sua conta. – Respondi. – Não atrapalha.

– Cuidado com o que você fala, Ethan. – Ele se sentou no muro, olhando-me com escárnio. – Não esqueça que estamos do mesmo lado.

– Porém apenas desta vez.

– Do futuro ninguém sabe. – Disse ele, melodiosamente, sorrindo de canto. – Responder-me o que você está fazendo não vai lhe fazer mal algum.

– Só um feitiço para não atrapalhar a missão, mas você está me atrapalhando e me fazendo perder tempo!

– Está bem, estressadinho. – Disse ele, erguendo as duas mãos, ainda com o tom de deboche que tanto me irritava. – Não vou mais atrapalhar.

– Tudo pronto, Ethan? – Perguntou Andrew, aparecendo da lateral da casa. Assim que viu Holmes, cumprimentou-o com um aceno de cabeça. Andrew não gostava de Holmes tanto quanto eu. Muitos de nós, caçadores de bruxa da ordem, não gostávamos de Holmes.

– Agora sim. Já está tudo aceso? – Perguntei.

– Sim. – Responderam Andrew e Fred em uníssono.

– Ótimo. Vou começar.

Acendi a vela, e olhando para o fogo, comecei a dizer as palavras em latim, baixinho.

Est solidum impedit monitu somnia, manes et spiritus instabant hoc perimeter indiget, hoc obice oritur et prohibet aliqua supernaturalis communicatio...

Comecei a andar ao redor da casa, carregando a vela comigo, ciente de que os três me olhavam – e Holmes ainda com aquele olhar de escárnio. Se meu punho fosse parar acidentalmente em seu rosto, duvido que aquela expressão se manteria. Ainda recitando as palavras, dei uma volta completa ao redor da casa, sentindo minhas mãos formigarem e cada pontinho de alecrim ou lavanda incandescente brilhar em um tom azul claro. Parei diante do norte e apaguei a vela, e cada ponto incandescente ao redor da casa se apagou sozinho. Comecei então a chutar as cinzas, formando um círculo imperfeito pelo perímetro, e dando outra volta por ele. Parei novamente no norte e comecei a recitar as palavras que concluiriam o feitiço, com um vento mais forte de gélido que carregaria as cinzas para longe e construiria por fim a “barreira” que impediria qualquer tipo de contato sobrenatural. Não precisava de mais alertas da mãe de Marie Jean. Provavelmente, eu teria que fazer algo que ela carregasse consigo para impedir esse contato, mas isso eu veria mais tarde.

Terminei o feitiço e senti-me fraco. Eu tremia da cabeça aos pés de fraqueza, e o mundo girou levemente ao meu redor. Eu precisava descansar urgente. Sem dizer nada ao Holmes, voltei para minha casa junto com Fred e Andrew que estavam andando atrás de mim, percebendo meu estado e temendo que eu caísse no chão inconsciente.

Inconsciente eu fiquei assim que entrei no meu quarto e caí na minha cama, sem ao menos trocar de roupa.



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Notas finais do capítulo

E aí o que me dizem?