Afrodite – 10 de Março

As rosas vermelhas e inebriantes eram as únicas companhias dignas naquele dia. Em outro dez de março, oito anos antes, o mundo foi agraciado com seu nascimento. Sim, o mundo, pois Afrodite seria um Cavaleiro de Ouro e defenderia a paz mundial de forma memorável.

Uma nuvem de mistério e fascinação envolvia o belo aspirante a Cavaleiro. A única certeza que todos possuíam era de que a beleza de Afrodite ia muito além das medidas de beleza de qualquer outra pessoa. Era diferente, andrógina e encantadora. Alguns falavam até que não era um menino de fato, mas sim uma menina. Seu nome era Afrodite? Não, não poderia ser seu nome verdadeiro. Ora, se era tão lindo, não devia ser muito forte... É claro que era forte, tanto que seria um Cavaleiro de Ouro. E os rumores continuavam...

Bando de ignorantes. Definitivamente, só as rosas, tão silenciosas e belas quanto ele mesmo, mereciam sua companhia. A beleza isola as pessoas. Afrodite não gostava de dividir com mais ninguém aquele dia, nem mesmo com os demais aprendizes.

– Você parece mesmo uma garotinha, sabia? – perguntou o futuro Cavaleiro de Câncer com deboche, interrompendo aquele momento particular.

Afrodite riu sem emoção:

– Contemple! – exclamou imperioso, lançando uma rosa contra o garoto, causando-lhe um corte superficial no braço.

– SEU-! – o canceriano rosnou, irritado tanto com a audácia do outro quanto consigo mesmo por não ter visto o movimento rápido o bastante para se desviar.

– Não subestime minha beleza.

O italiano bufou, louco para acertar aquele rostinho bonito e parti-lo em pedaços. Então balançou a cabeça e sorriu sarcástico, de uma forma que parecia muito estranha na face de alguém de nove anos:

– De acordo – apanhou a rosa fincada no chão e a destruiu, jogando as pétalas para cima do pisciano. – Vou lhe dar um crédito por ter conseguido me acertar. Parabéns, belezinha!

O pisciano revirou os olhos enquanto via o companheiro se afastar. Aquele "parabéns" soou tão ambíguo. Será que ele sabia que aquele dia era seu aniversário ou era só uma felicitação por ter conseguido acertá-lo mesmo? Nunca saberia.

Afrodite voltou-se para as flores. Tinha muito orgulho de sua aparência e gostava de se cuidar, embora não precisasse fazer nenhum esforço para manter a suntuosa aparência. Mesmo quando acordava, todo desalinhado, era gracioso. Depois, com os cabelos úmidos e a pele corada pelo banho, era a mais maravilhosa das visões.

E, além de tudo, era forte, é claro. Poder e vitória iam para os que possuíssem beleza afinal. Os Cavaleiros de Ouro eram poderosos porque eram todos belos, Afrodite acreditava nisso. Seria um Cavaleiro respeitado e temível. A beleza era a verdadeira força que, por sua vez, era a justiça, não é?

Nada mais natural, portanto, que poucos anos depois Afrodite ficasse do lado do Grande Mestre, do lado da justiça. Seria um traidor por isso? Se o Mestre era poderoso o bastante para manter a paz no mundo... Que importava se fosse supostamente mau? O que era o mau? Desde que pudesse pacificar estava tudo certo. Ideais não venciam lutas. Só o Cavaleiro de Câncer parecia entender de certa forma.

– Cumpriu sua missão na Ilha de Andrômeda?

Afrodite desviou a atenção que sempre dedicava às rosas e olhou para trás num movimento encantador. As ondas perfeitas de seus cabelos cor de ouro balançaram levemente, alguns fios caindo sobre seu rosto harmonioso.

– É óbvio que sim, Câncer – respondeu, semicerrando os olhos muito azuis, fitando o outro Cavaleiro através dos cílios compridos com um olhar vazio.

Máscara da Morte abriu seu famigerado sorriso sarcástico.

Afrodite suspirou. Máscara podia até entender seu ponto de vista, em termos, mas era detestável com suas insinuações de que eles eram "especiais". Tudo que o pisciano queria era proteger a paz, não dominar o mundo. E daí se precisasse matar algumas pessoas para isso, companheiros de batalha de outrora? Mataria mesmo.

O Cavaleiro de Cefeu, por exemplo, se recusava a obedecer às ordens do Grande Mestre. Era um rebelde. Não houve remorsos por parte de Afrodite, pelo contrário. Sentiu-se orgulhoso por cumprir seu papel tão bem.

E agora uma pobre criatura, um Cavaleiro de Bronze incapaz de entender alguma coisa sobre si, ousava enfrentá-lo e acusá-lo de estar errado. Pois bem, que viesse. Mesmo que fosse um tolo, para Afrodite era sempre bonito ver alguém usar toda a força e dar tudo de si pelo que julgava certo, afinal.

Fim