- Ah! Draffy! Você está linda!

- Valeu – falei me admirando no espelho. Glister parecia emocionada atrás de mim, enfiada num vestido rose de cetim.

Ela havia conseguido me arrumar um vestido de noiva em menos de 12 horas. Absurdo, eu sei.

Brian tirava fotos de mim compulsivamente.

- Não acredito que vou filmar um casamento do Keith Richards! – ele cantarolava.

- Meu casamento com o Keith Richards – retruquei.

- Tanto faz – ele deu os ombros.

- Falta quanto? – perguntei a Glister ansiosa.

- Pouco – ela sorriu encorajadora.

Íamos nos casar em plena praça principal, no meio de Roma sob o olhar atento de pelo menos centenas de italianos curiosos.

Eu roia minha unhas, batia os pés, calçados em sapatilhas brancas lustrosas. Meu vestido aquela hora já me pinicava, o véu já irritava e a maquiagem borrava.

- Falta muito?

- Não, acho que...

Glister foi interrompida por um Izzy histérico que colocava a cabeça na porta.

- Ele chegou! – anunciou quase sapateando de felicidade.

- Amém! – joguei meus braços para o alto e pegando a calda do vestido.

Eu já disse que Glister havia escolhido o vestido? Isso explica o fato dele ser escandalosamente exagerado.

- Vamos logo! – Izzy pediu – Eu vou acompanhar você até o altar!

É, Duff havia ganhado o posto de padrinho, e Izzy o de acompanhante da noiva.

‘Todos são importantes, vamos dividir as tarefas’ Keith disse, deixando Duff e Izzy com bico.

Meu estomago revirava. Izzy me puxava pela praça ao som da marcha nupcial.

Eu podia vislumbrar Axl num banco mais a frente, com um casaco de pele enorme. Super discreto. Ao seu lado, Steven segurava uma almofadinha vermelha, trazendo as alianças. Duff sorria segurando Glister pelo braço, que chorava compulsivamente, como se fosse o meu enterro. Slash olhava com desgosto a cena.

E mais a frente, Keith, vestido a rigor me esperava sorrindo. Brian filmava tudo animado.

As pessoas olhavam interessadas o evento. Mulheres acenavam das janelas, freiras comentavam entre si, motoristas buzinavam... Parecia que a cidade inteira havia parado por isso.

Eu sorria nervosamente. A cada passo, eu ficava mais apreensiva.

Francamente, eu ia me casar! Eu tinha menos de vinte anos e ia casar com um coroa de quarenta e qualquer coisa.

Qual era o meu problema?

Senti meu estomago revirar e um calafrio percorreu meu corpo quando eu fui entregada por Izzy a Keith, que segurou minha mão com delicadeza.

- Você está linda – elogiou num sussurro discreto.

- Erm... Hum... Valeu... – falei num fio de voz.

Eu ia vomitar. Se eu não tirasse aquele maldito vestido eu ia vomitar.

Isso é o que dá se afogar em todo tipo de queijo diferente para controlar a ansiedade.

Engoli seco e tentei transparecer calma e controle.

Ora, a quem eu queria enganar? Eu sou a pessoa menos calma e menos controlada daqui! Até Axl estava mais sossegado que eu. O encarei furiosamente. Ele pareceu confuso.

Eu ia pirar.

Soltei o ar lentamente e voltei minha atenção para o padre, que me olhava estranhamente.

- Estamos reunidos aqui, para celebrarmos a união entre essas duas almas...

Discretamente desafrouxei um pouco do corpete creme. Meus pulmões de fumante agradeceram.

Olhei o padre. Como ele falava. E falava. E cuspia. E gesticulava.

Me deixava pior ainda. A essa altura eu soprava impaciente o véu de perto do meu nariz.

- Algum problema senhorita Draffy? – o reverendo perguntou.

Me virei bruscamente.

- Eu? Nada não. Continua aí, padre.

Ele franziu o cenho, irritado.

- Muito bem. Antes de concluir a cerimônia, e entregar as alianças... – nesse momento ele se vira para um Steven hiperativo que mordia o lábio de excitação e dava pulinhos com a almofada em mãos - Preciso ter certeza se ninguém mais tem algo contra esse casamento. Se temos alguém aqui que não é a favor dessa união, que fale agora, ou cale-se para sempre!

Encarei ao meu redor e parei meu olhar em Slash. Meu inconsciente queria que ele levante-se a bunda daquele banco, e me seqüestrasse e me levasse para um lugar onde noivas não são obrigadas a usar corpetes.

O infeliz nem demonstrou reação.

- Alguém? – o padre tentou mais uma vez. Ninguém se proclamou. – Sendo assim, que...

- Espera! – a voz de uma mulher ecoou.

Todos os olhares se voltaram para ela.

Loira, alta, graciosa. Tinha um forte sotaque inglês, embora mantivesse a elegância parisiense.

O que? Viajar enriquece. Observei os trejeitos das pessoas quando passei por esses paises.

Ela veio marchando impetuosamente. Senti Keith soltar minha mão.

E na mão da fulana, tinha um papel que ela fazia questão de apontar para nós.

- Quem vem lá? – o padre perguntou.

- Anita – ela respondeu como se bastasse – A esposa legal do senhor Richards!

...

Você já sentiu vontade de desaparecer da face da terra? Então, eu meu desejo atual é sumir. Evaporar.

Anita me olhava como se eu fosse uma espécie de golpista. Keith tremia. Os convidados se cochichavam. O padre bufava impaciente. E Glister parecia a ponto de entrar numa das suas tão comuns crises psicóticas.

- O que você quer, Anita? – Keith perguntou com a voz grossa e falha.

- Quero te processar. – ela disse – Por poligamia.

- O que? Como assim?

- Isso mesmo que o senhor ouviu. PO-LI-GA-MI-A! – ela enfatizou cada sílaba – Caso não saiba, não está legalmente divorciado de mim.

- Como não? Eu assinei a porra dos papéis!

- Verdade. Mas apenas você assinou. Eu não.

Glister se intrometeu.

- Escuta aqui, sua recalcada! A única errada aqui é você! Que tipo de vadia não assina os papéis de divorcio e...

- Da licença... grávida. Mas a conversa aqui é reta.

- Sua... – Glister fez menção para partir pra cima dela, mas Duff a segurou.

- É o seguinte – Anita limpou a garganta para dizer em alto e bom som – Enquanto você não me aceitar me pagar a pensão direitinho eu me recuso a assinar os papéis do divorcio. Simples assim.

- Que pensão, Anita? A que eu pago já está dentro dos valores propostos!

- Mas não é o suficiente – ela retrucou – E você sabe disso. E então, aceita minha oferta ou quer passar uns anos em cana por poligamia?

Eu observava tudo sem reação.

Aquele dia era para ser o melhor da minha vida. E havia se tornado um pesadelo.

Descubro que meu noivo é um caloteiro e bígamo, a ‘esposa’ dele acha que eu sou algum tipo de cachorra dada e o melhor. Roma inteira assiste a esse show de camarote.

Sem chance que eu ia ficar ali sem fazer nada. Decidir fazer o que eu faço de melhor. Fugir.

Puxei minha aliança de noivado do dedo e atirei ao pé de Keith.

- Me desculpe – falei bruscamente – Mas não dá. Pelo menos para mim não dá.

Encarei Anita, pasma com minha reação.

- Obrigada – falei num tom de falso agradecimento – Por tornar isso aqui inesquecível. Eu queria mesmo, que o dia do meu casamento virasse um tribunal. Sou eternamente agradecida por você fazer do meu dia especial, o dia para sua vingança. Mas foi em vão. Não pode mais processar ele. Eu estou caindo fora.

Dito isso, segurei a cauda imensa do vestido, e sai o mais dignamente possível pela praça.

Todos tinham suas atenções para mim. A noiva revoltada.

Atirei meu buquê na primeira lata de lixo que encontrei.