- Escute, ruivinha, eu sei que você é mais uma que não resistiu aos encantos do “Capitão Jack Sparrow”. – Angélica revirou os olhos, imitando-o. – Mas eu e Jack estamos prometidos. Nós nos amamos.

     Brooke piscou, ainda com os olhos embaçados por ter acabado de acordar. Os cachos de Angélica roçavam incomodamente em seu rosto, e então percebeu que a mulher estava sobre ela.

- Opa, opa, opa... – a garota se encolheu na cama, escapando dos braços de Angélica. – Primeiro: o meu nome é Brooke; muito prazer. Segundo: que história é essa de você e Jack estarem prometidos?

- Nós nos amamos. – repetiu a morena.

- Ele não parecia te amar tanto assim ontem. – a ruiva sorriu maliciosamente, vendo Angélica ficar vermelha.

- E-Ele... – ela baixou os olhos, sem graça. – Ok, talvez ele não... Veja, eu preciso completar a minha vingança.

- Vingança? – Brooke ergueu uma sobrancelha.

- Ele matou o meu pai. – explicou.

- E o seu pai seria...

- Edward Teach. – ela ergueu o queixo, falando com orgulho demais para alguém que já tinha morrido.

- O Barba Negra. – Brooke assentiu, como se compreendesse, mesmo não sabendo porcaria nenhuma. – E por que você... com aquele boneco...

- Sim, é um boneco vodu de Jack, feito pelo meu pai.

- E você pretende ameaçá-lo com aquele... troço... para chegar a...

- Ilha dos Condenados.

- Para conseguir a imortalidade.

     Angélica franziu a testa e pensou por um momento, com os lábios entreabertos.

- Sim. – ela balançou a cabeça. – De certa forma.

- O que quer dizer?

- Nada. – a morena juntou as mãos, esfregando-as nervosamente. – Foi ótimo ter essa conversa com você.

- Espera. – Brooke agarrou o braço da mulher antes que ela saísse da cabine. – Angélica, você pretende matar o Jack?

     Angélica ficou em silêncio novamente, olhando-a. Os olhos azuis daquela garota, tão diferentes, a olhavam com determinação.

- Sim. – disse ela, sem saber se havia dito a verdade ou não, e saiu da cabine.

     Brooke piscou, fitando os lençóis da cama de Jack, onde havia um ou dois pingos de sangue, do dia anterior. Pensou nas ultimas duas noites em que dormiram juntos, e no que ela estava se metendo.

     Jack nunca fora homem de uma mulher só. Brooke sabia muito bem e Angélica era a prova viva disso.

     Suspirou, e então viu algo brilhar sob uma das pontas do travesseiro. Jack havia deixado a pedra ali.

     Para ela.

     Olhou para fora da cabine, mordendo o lábio, e revirou os olhos.

     Tudo bem, ele nunca fora mesmo com a cara de Angélica.

     Ela iria recuperar aquele boneco. De algum jeito.

***

     Jack estava apoiado sobre o leme, entediado, e sorriu ao olhar para a bússola. Com a Rapiat agora com Brooke, ela voltara a funcionar, mas a intervenção de Angélica os fizera sair – e muito – da rota correta.

     Ainda se xingava mentalmente por ter trazido aquela coisa a bordo quando sentiu seu braço formigar. Imaginou que fosse a morena novamente com aquele maldito boneco vodu, mas não teve tempo de terminar o pensamento antes de ser “puxado” pelo braço, e seus pés se arrastaram ruidosamente pelo chão.

     O pirata franziu a testa, olhando para Barbossa. Este se limitou a rir, apontando com a cabeça para o convés.

     Angélica e Brooke discutiam escandalosamente, cada uma puxando um braço do pequeno boneco vodu. Enquanto cada uma puxava, Jack era arrastado para lá e para cá, batendo em tudo o que havia no seu caminho.

- Com... licença... senhoritas... mas vocês... podem... fazer o... favor... de parar... de... puxar... essa... COISA?! – tentou dizer o capitão, parecendo andar em ziguezague no convés.

- Não me atrapalhe, Brooke! – rugiu Angélica para a ruiva, puxando o boneco com mais força.

     Jack gritou, agarrando-se a amurada do navio ao ser quase arremessado ao mar, quando Angélica puxou. Aparentemente, as duas mulheres estavam totalmente alheias a sua presença.

- Por tudo que é mais sagrado, Angélica! – berrou Jack, exasperado. – Nós fizemos um acordo!

- Eu tenho a minha honra, Sparrow. Quem não está seguindo o acordo é essa aí!

- Eu não me lembro de ter feito acordo nenhum com você, madame. – disse Brooke, sorrindo, e puxou o boneco de novo, derrubando Jack de vez.

- Ora, vamos lá senhoritas – Jack sorriu do melhor jeito que pôde. – Esqueçam isso antes que vocês me quebrem alguma coisa...

     Angélica bufou e puxou a espada, passando a lâmina por baixo da roupa do boneco e puxando-o para si. Brooke rosnou de raiva, mas Jack tocou seu ombro e piscou para ela.

- Eu levo esta cobra até a ilha, ela me devolve o boneco. – disse ele, suspirando. – Foi esse o acordo.

- E como sabe que ela vai cumpri-lo? – indagou a ruiva, erguendo uma sobrancelha.

- Ora... Eu sou o Capitão Jack Sparrow. – ele sorriu. – Savvy?

     A garota revirou os olhos.

- Não aconteceu mais nada... depois de seu estranho e repentino “quase-motim”? – perguntou Jack, encostando as costas da garota na amurada e colocando os dois braços ao redor dela, para impedi-la de fugir.

- Não. – disse ela, corando. – Desculpe por aquilo.

- Sem problemas. – Jack sorriu, aproximando seu rosto do dela. – Eu já disse que adoro mulheres bravas...

     Brooke afastou o pirata com um tapa no ombro antes que este a beijasse. Fora o fato de morrer de vergonha de fazer coisas daquele tipo na frente da tripulação – principalmente de Barbossa, que falava e agia como se fosse seu pai -, a ex/atual-namorada de Jack também estava ali.

     E também, eles não tinham nada. Foram tomados pela luxúria uma ou duas vezes, mas não havia nenhum sentimento envolvido.

     A ruiva suspirou e olhou para o boneco na mão de Angélica. Esta também parecia bem satisfeita por ter a vida da pirata na palma da mão – literalmente.

     Não sabia por que estava se sentindo tão melancólica. Os piratas não eram famosos pelo seu senso de união...

- Hã... Capitão? Quer dizer, capitães? – chamou Gibbs, olhando para algo além da proa. – Aquilo por acaso é...

- Sim, mestre Gibbs. – Barbossa riu, parecendo entusiasmado. – Aquilo é um navio pirata.

     Jack, Brooke e Angélica, que até então soltavam faíscas entre si, olharam ao mesmo tempo para onde Gibbs apontava, e arregalaram os olhos também ao mesmo tempo.

- Não é o Holandês, é? – Brooke ergueu uma sobrancelha.

- Não. – Jack colocou a língua para fora. – Não é tão feio.

- Aquele é o... – Angélica franziu a testa. – Aquele é o Grave of the Sea.

     Jack fez uma careta e deu as costas às duas garotas, dirigindo-se a cabine.

- Vai se esconder, Jack? – provocou Angélica, rindo.

     O capitão parou, virando apenas metade do corpo para olhá-la.

- Não. – disse ele depois de um momento. – É claro que não. Eu ia só...

     Um grito coletivo interrompeu Jack, que olhou assustado para o navio que se aproximava. Este deu a impressão de que bateria de frente com o Pearl, mas então ele desviou, bem pouco, fazendo com que a distância entre eles fosse de pouco mais de um passo.

     A tripulação do Pearl olhou curiosa quando alguém pulou no convés, e puxaram as espadas, preparados para a batalha. A pessoa, porém, ergueu uma mão, e Barbossa chegou a achar esta delicada demais para um pirata.

     Mas não disse nada. Analisando bem, o invasor do navio tinha braços e pernas musculosos, bastante masculinos, usava uma calça preta desbotada, uma camisa verde-escura larga e um grande casaco preto, cheio de fivelas. Um grande chapéu preto de três pontas, também preto, lhe cobria o rosto.

- Eu lhe devia dizer “bem vindo”, mas na verdade você não é. – disse Barbossa, apontando-lhe a espada. – O que quer no meu navio?

     Jack deu um empurrão no capitão mais velho, com o ombro, quase derrubando Barbossa, e então sorriu para o invasor.

- Perdoe este marujo idiota, ele tomou muito sol na cabeça. – Jack sorriu com superioridade. – Eu sou o capitão deste navio.

     O invasor sorriu, apontando o mosquete na testa de Jack.

- Ah, então é com você mesmo que eu quero falar.

     O pirata piscou, lançando-lhe um sorriso amarelo enquanto olhava vesgo para o cano da arma apontada para ele.

- Eu devo ter falado errado. Na verdade sou o subcapitão. O capitão é ele. – ele apontou para Barbossa, que revirou os olhos.

     O homem suspirou, deixando aparecer lábios extremamente vermelhos ao levantar um pouco o rosto.

- Bem, tanto faz. – disse ele em voz baixa. – Estou procurando outra pessoa.

- Quem? – perguntaram os dois capitães ao mesmo tempo.

- Estou a procura da mulher conhecida como Brooke Pepper. E eu sei que ela está a bordo.

     Jack franziu a testa, lançando um olhar para Gibbs por cima do ombro do invasor, que o mestre entendeu imediatamente, levando Angélica e Brooke para o porão silenciosamente.

- Até onde eu sei – Jack caminhou ao redor do homem, parando de costas à entrada do porão. – não é permitido mulheres a bordo, de acordo com o Código.

- Sim. – o homem baixou a cabeça, deixando escapar um sorriso. – Mas... Que se dane o Código!

     Com isso arrancou o chapéu, mostrando que na verdade era uma mulher quando uma cascata de cabelos dourados desceu por suas costas, brilhando sob o sol.

     A mulher então riu dos olhares perplexos que caíram sobre ela.

- Qual é o problema, Jack Sparrow? – ela sorriu, mostrando, sob os lábios vermelhos, fileiras de dentes perfeitamente brancos. – Eu acho que não é a primeira vez que vê uma mulher disfarçada, já que possui uma em seu navio.

- Certamente, não é a primeira vez. – Jack sorriu galanteador. – Vejo que estão aperfeiçoando esta arte, mas ainda não conseguem esconder a beleza natural que algumas possuem.

     Barbossa suspirou, impaciente.

- Não há nenhuma mulher a bordo, senhorita. – disse ele, com uma expressão séria.

- Ah, é mesmo? – a loira ergueu uma sobrancelha e agitou uma mão na direção do Grave. – Então você não se importa se eu der uma olhada...

     Dezenas de homens pularam para o convés do Pearl, fazendo Jack olhar horrorizado para todos aqueles cães infestando seu precioso navio.

- Ah, eu me importo sim. – Jack se segurou para não voar no pescoço da mulher. – Não vão sair pisoteando o Pearl atrás de uma mulher que não está aqui.

     A mulher apontou o sabre para ele, irritada, e Jack revidou. O som das lâminas colidindo ecoou agudo pelo vasto oceano que os cercava.

- E você irá impedir a mim, Catherine Nightray, de fazer alguma coisa? – a mulher sorriu com superioridade.

- Sabe, eu nunca pensei que diria isso. – Jack franziu a testa, despreocupado, forçando a lâmina de sua espada contra a dela. – Mas eu estou realmente me cansando das mulheres que eu ando encontrando. Elas são muito problemáticas, linha-dura, achando que podem sair por aí invadindo navios e espremendo bonecos vodus dos outros... – o pirata ignorou a expressão confusa da mulher quanto a ultima parte. – Isso realmente não é para mulher. Por isso é P-R-O-I-B-I-D-O.

- Machista! – berrou a loira, atacando-o subitamente. Os dois foram ao chão, embolando-se pelo convés, enquanto eram observados pelas duas tripulações, que estavam pasmas.

- Jack Sparrow. – soou uma voz de repente, forte mais ao mesmo tempo feminina.

     Jack ergueu os olhos para Brooke, sorrindo, enquanto a invasora enfiava o cano da arma na cara dele.

- Será que você não fica um minuto sem se atracar com uma mulher?! – a ruiva franziu a testa, analisando a situação. – Qualquer que seja a definição certa da palavra para o que estou vendo agora...

- VOCÊ! – a loira berrou, saindo de cima de Jack e apontando então o sabre para Brooke.

- Eu! – ela abriu os braços, fazendo pose.

- Então você é a pirata que Lord Beckett estava procurando.

- QUEM?! – indagou toda a tripulação do Pearl ao mesmo tempo.

- Não importa. – Catherine Nightray ajeitou os ombros, com os olhos faiscando na direção de Brooke. – Eu vim buscá-la. E vou fazer isso, pode apostar.