É Segredo escrita por Phallas
"Não é coincidência demais o amor da sua vida aparecer justo na sua vida?"
- A dona da história (filme)
Sinto cada fibra do meu corpo se desprender das demais. Como se eu fosse mergulhada completamente em uma banheira de gelo e meu corpo todo ficasse instantaneamente inerte.
Ainda estou com o livro na mão, e não tenho coragem de levantar a cabeça, por isso centro meu olhar nas letras impressas nas páginas.
Ouço algumas meninas lá atrás comentando, cochichando, ofegando de surpresa. Decido parar de bancar a infantil e ergo a cabeça. Eu sei o que me espera, mas mesmo assim, quando o vejo, meu coração parece querer pular do meu peito, e percebo que esse tempo todo eu senti saudades dele. Por que ele me fez tanta falta? Eu nem mesmo o conheço. O garoto em questão está perfeito, o cabelo desarrumado, os olhos azuis hipnotizantes sobressaindo. Ele está vestido com suas próprias roupas, com aquela desculpa do 'não-tenho-uniforme', o que é muito bom, porque a camisa colada destaca os músculos, de modo que eu sei que não sou a única a perder o ritmo da respiração.
Senhora Nichols o manda sentar em uma cadeira no fundo, junto da janela, e as garotas lá de trás dão gritinhos abafados quando ele passa perto delas. Respiro fundo e tento não me importar com isso.
A professora não pergunta o nome dele. Se perguntou, não ouvi porque estava muito ocupada tentando não enfartar, o que, a essa altura, está muito difícil. Eu olho para o lugar onde ele está sentado e vejo que ele me encara. Ficando corada, viro para o quadro.
Trinta torturantes minutos depois, o sinal toca, a professora sai de sala e noventa por cento da população feminina da sala se levanta de um salto e se dirige à carteira do novato, oferencendo a ele ajuda nos estudos, um lanche na cantina ou um tour pelo colégio. Ofertas que, vejo inevitável e assumidamente satisfeita, ele recusa.
Quero entrar no banheiro mais próximo. Sim, porque não é possível que aquele menino queira aparecer no banheiro feminino também.
- Bell, você está ficando verde - Tensy comenta.
É bom ter o apoio das amigas na hora do pânico.
Arrasto-a para a cantina desesperadamente como se eu estivesse fugindo de alguma coisa. Espera. Eu realmente estou fugindo.
- O que está acontecendo? - Tensy se solta de mim e fala, em um tom de voz alto demais.
- Você não viu quem era aquele menino? - sussurro.
- Vi. O irmão mais novo do Zac Efron. - ela responde.
- E...? - falo, gesticulando com a mão boa.
- O menino que deixou minha melhor amiga apaixonada por ele. - ela suspira.
Eu tentaria negar, se soubesse como fazer isso.
Tensy pede ao atendente da cantina um suco de melancia para ela e um de laranja para mim, como ela sempre pede. O garoto que atende anda fazendo nossos pedidos com muita má vontade, desde que ele e Tensy andaram saindo e ela deu um fora nele pouquíssimo tempo depois. Acho que ele já deve ter superado um pouco isso, mas, de qualquer maneira, deixo sempre bem claro para ele qual é o suco da Tensy, para que, se ele resolver cuspir no suco como vingança, que seja no dela, e não no meu.
Ele coloca nossos refrescos no balcão e vai atender outras meninas, sem dizer uma palavra.
- Mas diz aí - Tensy chama minha atenção - qual é o problema?
- Problema do quê? - tento me situar.
- O problema daquele gato vir estudar aqui? Não era isso que você queria desde, tipo assim, séculos atrás?
- Era. Quer dizer, não. Eu queria me encontrar de novo com ele, não estudar com ele.
- Mas qual a diferença? - Tensy fala, aumentando em algumas notas sua voz, o que mostra que ela está perdendo a paciência.
Não posso dizer a ela qual é a porcaria da diferença. Não posso dizer a ela que tenho segredos que ela nem desconfia. Foram os poucos que consegui guardar para mim, mas, em uma noite meio mal explicada e borrada da minha memória, acabei ficando bêbada e falando todos eles para o menino mais lindo que eu já vi. Se eu pudesse deixar um conselho para minhas netas, seria o de que nunca façam isso enquanto viverem, ou quiserem ter uma vida legal.
Tento me acalmar e pensar que o que eu disser agora pode influenciar muito na minha vida daqui para frente. São muitas confissões, muitos segredos, muitas explicações.
- N-nenhuma. Eu acho que só estou nervosa, só isso. - falo, com a voz ficando aguda, denunciando a mentira deslavada que acabei de atirar para cima da minha melhor amiga.
- Me-ni-nas. - Helaina Meggeni felizmente nos interrompe, acompanhada por Hannah Proffer - Vocês viram aquele deus que entrou na nossa série? É o cara mais perfeito que eu já vi na minha vida. Tá todo mundo comentando, fazendo apostas de quem vai ficar com ele primeiro. Vou entrar também, vocês vão?
- Nem que me paguem por isso. - respondo, mau-humorada.
- Não vamos, não - Tensy diz, e manda a elas um sorriso de desculpas pela minha rispidez.
- Essa é uma das razões. - digo a Tensy, quando elas vão embora. Não gaguejo nessa, porque é verdade. Desde trinta segundos atrás, quando percebi isso.
Ela levanta as sobrancelhas douradas, incrédula:
- Ciúme?
- É. - falo. Embora eu esteja ficando meio desconfortável, tento fazer uma voz firme.
- Elas vão descobrir que ele é seu, Bell.
- Ele não é meu. Eu não sei nem o nome dele. - afirmo, e sou tomada de repente pela verdade das palavras. Eu sempre soube disso, mas fico triste em ouví-las em voz alta.
Tenho vontade de expor para Tensy que ele é ex-namorado de Blake Carmichael, mas desisto porque sei que ela vai me chamar de ridícula. E é o que eu sou mesmo, mas dane-se. Ninguém mais aqui contou todos os segredos a um desconhecido, ou contou?
- Você não precisa saber o nome dele - Tensy me tira de meus pensamentos - você já ficou com ele. Está na frente de todas essas meninas aqui.
Ela aponta com a cabeça um grupo de garotas desesperadas e escandalosas que tentavam escrever algo em um papel. Deve ser a aposta que Helaina comentou.
Percebo a verdade das palavras dela também, e me sinto mais animada.
Tensy olha para trás e diz baixinho:
- É melhor eu ir. - ela passa por mim, e me manda uma piscadinha.
Então percebo o por quê da saída repentina dela. Um pouco mais à frente, ele (o ele que temi tanto), está caminhando na minha direção.
Me pergunto se devo correr ou só ignorá-lo. Não tenho tempo de pensar, porque estou me mexendo tanto que a minha chave de casa cai do meu bolso.
- Merda. - falo, em um tom de voz muito baixo. O suco de laranja está na minha mão boa, de modo que não posso mexer o outro braço.
- Precisa de ajuda? - ouço a voz familiar que sonhei em ouvir tem muito tempo. Antes que eu respondesse qualquer coisa, ele já havia recuperado a minha chave, e colocado-a no balcão. Coloquei meu suco em cima da bancada também, incapaz de dizer uma palavra.
- Grande jogo, o de sábado. - ele puxa assunto.
Encaro-o com meus olhos se arregalando um pouco.
- Nós perdemos. - digo, calmamente.
- Sim, perderam, mas é irrelevante. - viro o rosto quando sinto seus olhos em mim. - Vocês jogaram muito bem, se me permite dizer. E isso - ele aponta meu braço machucado - é prova do que eu disse. Ganhar do West High é difícil, mas vocês chegaram perto.
Isso seria algum tipo de comparação entre mim e Blake? O que ele pensa que está fazendo?
- Eu sei disso melhor do que ninguém - a irritação está evidente na minha voz agora. - Queremos ganhar do West High tem um ano. E ganharíamos, se não fosse pela vaca da Blake.
Ele levanta as sobrancelhas:
- Blake Carmichael? - ele pergunta, inocentemente, como se não soubesse.
- É. - respondo e, quando percebo, já estou despejando tudo para cima dele. - Ela é idiota, ridícula, patética, uma completa vadia. Ela se acha superior a todas as outras, mas tudo é muito diferente do que ela pensa. Por mim, ela pode pegar todo o dinheiro da família dela e engolir. Família, aliás, que deve ser nojenta igual a ela.
Paro de falar para respirar e percebo que ele não gostou muito de eu ter falado mal da ex-namorada dele.
- Ahn... - é tudo o que ele fala, e pondero se eu fui sincera demais de novo.
- A propósito, qual é o seu nome? E por que você está aqui? - pergunto, para mudar de assunto.
Ele sorri. Os dentes brancos reluzem na minha direção. Ele pisca um olho brilhante para mim.
- Isso é segredo. - ele responde, e vai embora.
Não quer ver anúncios?
Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!
Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!