;MATTHEW SHADOWS;

            As férias de verão se iniciariam dali uma semana e eu estava ansioso. Não tinha certeza se alguém da banda sairia da cidade, por isso não sabia como iríamos ensaiar e tudo o mais. Eu tinha me concentrado em planejar a primeira semana de férias toda, mas havia perco parte da minha ultima noite fazendo aquelas tabelas para Jimmy. Eu não estava arrependido por aquilo, não mesmo, nem depois de tudo que ele havia me dito. Jimmy sofria compulsão de distúrbios da raiva, ele não conseguia manter-se no controle da própria fúria. E eu admirava aquilo. Acho que o fato dele explodir fácil, fazia você entender parte do que ele pensava. Sempre que Jimmy explodia, ele falava tudo, exatamente tudo que lhe vinha a cabeça, todos seus pensamentos reunidos em uma única fala. E ele não mentia nessa hora.

            Me sentei no sofá e fiquei observando a lareira cheia de cinzas recordando da noite em que todos estavam sendo aquecidos pelo calor das chamas de um fogo que ali havia existido. Todos rindo. Felizes. Quando acolhi Val em meus braços e beijei sua testa me lembrando de que o amor que eu sentia por ela era o único que já senti. Eu havia conhecido Val na oitava série, e me lembro de como ela me irritava por ser amiga de todos. Hoje eu era apaixonado pelo quesito amizade, amava ser amigo de todos, mas antes não. Antes fazer amizade era algo terrivelmente chato pra mim. Ela sentou-se ao meu lado no laboratório de Biologia e com aqueles olhos castanhos lindos ela sorriu pra mim e disse:

- Olha eu sou ótima em Biologia, não precisa fazer nada se não quiser. A propósito me chamo Valary. – Outro sorriso nasceu em seu rosto, e naquele segundo me perguntei por que uma garota tão bonita estava sorrindo pra mim. – qual é seu nome?

- Matthew. – Falei desanimado, ela assentiu.

- Deus, você pinta as unhas? – Perguntou ela sem esconder o choque inicial em sua expressão. Movi as mãos a fim de escondê-las, mas eu realmente pintava as unhas. Eu gostava, e não tinha nada contra. Meus ídolos do Rock também o faziam, e eu nunca achei problema algum em pintá-las. O pior é que eu nunca me sentia incomodado com o que os outros pensavam, isso explica o fato de eu pintar as unhas de preto para ir ao colégio, mas naquele segundo em que sua expressão estava aterrorizada eu me perguntei se um dia arrumaria uma namorada que gostasse de mim como eu era.

- Sim. – Respondi pensando que eu poderia correr até o professor e dizer que era impossível fazer par o ano inteiro com ela. Com qualquer pessoa, menos com ela.

- Calma, eu não falei isso pra te retrair... – Ela sorriu, e tomou a liberdade de pegar minhas mãos. – é que caramba... Foi você mesmo que pintou? Nunca vi um homem ter tanta coordenação.

- Fui eu sim. – Falei, e minhas palavras pareceram sem coerência pra mim.

- Olha, eu quem pintei as minhas. – Valary soltou meus dedos, e seu toque macio e quente me abandonou. Ela estendeu a mão sobre a mesa e se inclinou pra mim. – horríveis eu sei.

- Não estão... Tão ruins. – Respondi olhando suas unhas. Eu realmente não tinha talento pra pintar unhas, mas parecia que ela as tinha pintado no escuro.

- Generosidade da sua parte. – Ela deu de ombros. – acho que você não quer ficar falando sobre unhas... Se sente uma garota?

- Conversando com outra garota sobre como pintar unhas. Sim me sinto. – O professor começou a entregar-nos a ficha técnica, onde iríamos anotar o procedimento da aula.

- Gosta de falar sobre o que? Você não parece o tipo de cara que joga xadrez... Muito menos o cara que joga futebol.

- Eu jogo futebol. – Falei me sentindo um estranho. – e gosto.

- Uau. – Ela ficou boquiaberta. – sei lá, com essas unhas pretas... Você parece aqueles caras Punks, que dão murro na cara de outros menores.

- Também faço isso. – Não era bem verdade. Não naquela época, eu era o menor que apanhava, mas dali dois anos eu quem batia...

- Engraçado. Você já escutou Iron Maiden? Tipo tem uma música deles que...

- Você já escutou Iron? – Perguntei chocado, agora interessado no assunto. – não acredito.

- Claro que sim. Fui no ultimo show deles que teve aqui. – Ela sorriu docemente.

- E... Por que?

            Ela riu.

- Por que eu gosto?

- Puta merda. – Falei inconscientemente. – não acredito mesmo. Você tem cara de quem...

- Dança Britney Spears de saia curta com calcinha fio dental. – Ela deu de ombros. – eu sei. É a imagem que eu passo...

- Mude a imagem então. – Falei notando que o professor estava escrevendo algo no quadro.

- Não tem como. Eu danço com as lideres de torcida, sou amiga de um bocado das meninas. É essa imagem que uma líder de torcida passa... – Disse-me ela, sua voz baixando.

- Que dança Britney Spears com calcinha fio dental e saia curta, comendo alcaçuz. – Falei fazendo-a rir, e enfim em meu rosto nasceu um sorriso.

- Exatamente. – Ela começou a escrever algo no verso da folha, acho que as anotações da lousa. – e eu gosto das minhas amigas lideres de torcida, não seria capaz de abandonar isso só por causa da minha imagem.

- Corte o cabelo. – Falei instintivamente. Os cabelos dela eram loiros dourados e longos, de certa forma não combinava muito com seu rosto.

- Cortar? – O horror cruzou seus olhos.

- Pintá-lo? – Tentei melhorar o que havia dito. O professor começou a falar e ela não voltou a falar comigo até o fim da aula. Aquele tinha sido o dia em que eu conheci, de verdade, Valary Dinebeto. Fiquei fissurado pela maneira como ela era natural, não precisava me esforçar para gostar dela. E eu não consegui. Não fui capaz, de desviar o olhar de seu rosto durante a aula inteira de Biologia. Passei a gostar mais de Biologia depois daquele dia, confesso.

- No que esta pensando? – Mamãe apareceu na sala me encarando.

- Sobre quando conheci Val. – Admiti.

- Por isso esse olhar todo bobo e apaixonadinho. – Ela riu.

- Eu acho que quero me casar com ela. – Falei de repente. – sabe mãe ela é tudo... Tudo pra mim.

- Amor eu sei disso, mas você é muito jovem pra casar não acha?

            Isso me fez rir.

- Não mãe. Não quero me casar agora. Só que eu quero me casar com ela. Com mais ninguém. Só com ela.

- Bonito da sua parte. – Ela se levantou. – venha comer Matt.

- Já vou mãe. – Me inclinei para tirar o celular do bolso, fiquei encarando a foto do plano de fundo por um longo tempo. Val estava rindo, com a mão estendi em direção à câmera. Ela era linda, e me pertencia. E eu nunca teria imaginado que hoje eu a amaria tanto. Não teria imaginado isso, não naquele dia, durante aquela aula de Biologia.

            Claro, não posso me esquecer que no dia seguinte àquela aula de Biologia, Valary apareceu com o cabelo descolorido. Um loiro claro, que deixou todos em choque.

            Ah, ela cortou as madeixas também. Em um repicado suave. E havia ficado linda.

            Agora ela parecia uma fã de Iron.

            Mesmo.