Eu não gostava daquela situação. Nem um pouco.

Estávamos na casa dos Denali á quase duas semanas, e nada de Laurent.

Tentávamos a todo custo contatá-lo, Irina estava ficando louca de preocupação, e era possível cortar com uma faca de pão a tensão presente na casa.

Eu estava na varanda, encostada no batente da porta de correr, olhando para as estrelas.

 O que eu mais gostava no Alasca? O céu limpo.

Eleazar se moveu de onde estava parado na sala, ao lado de Carmen, desde ontem e veio em minha direção. Eu não me movi.

— Podemos conversar? – Ele perguntou, e eu movi minimamente minha cabeça, somente para olhá-lo.

— Depende do assunto.

Ele riu e baixou a cabeça, logo me olhando de volta.

— Eu só estou curioso sobre você. – ele sorriu gentilmente, eu respirei fundo, ciente de que havia mais ouvidos atentos naquela sala do que eu desejaria, mas ao mesmo tempo, ciente de que Eleazar poderia me dar as respostas de que eu precisava.

— Podemos conversar lá fora? Quero andar na neve.

Ele assentiu e nós saímos pela varanda mesmo, andamos até que a casa já não era mais visível, e ele finalmente resolveu falar.

— Você tem um dom formidável, Isabella.

— Bella. – corrigi automaticamente. Ele assentiu. – Mas eu tenho mais de um dom, vários na verdade.

Ele sacudiu a cabeça.

— Não, estes você adquiriu em consequência do seu dom. Estou falando do que nasceu com você.

Eu o olhei curiosamente, e ele sorriu pacientemente.

— O seu dom, Bella, é clonar dons. – disse simplesmente.

Bem, Sherlock, agora me conte algo novo.

— Sim, eu já havia... uh, percebido isso. – tentei não ofendê-lo. – Achei que você poderia me ajudar a descobrir mais sobre isso. Quantos dons eu já acumulei, quantos ainda posso ter. Esse tipo de coisa.

Eleazar suspirou, olhando para frente.

— Eu nunca conheci ninguém como você Bella, me desculpe, mas não posso ajudá-la. Consigo enxergar em você muitos dons, inclusive o meu próprio, mas é complicado precisar. Você terá de lembrar com quantos vampiros dotados de dons você já cruzou na vida, e fazer uma média. – brincou, e eu ri junto com ele.

— Obrigada, de qualquer forma. – sorri, mas Eleazar ficou sério de repente.

— Mas tome cuidado. – ele avisou. – Não sei se Carlisle lhe contou, mas estive com os Volturi por muitos anos, e sei que no segundo em que Aro souber da sua existência, irá querer você na guarda.

Eu suspirei, olhando para meus próprios pés.

— Obrigada pelo aviso, Eleazar. Mas Jasper e eu já tivemos problemas com os Volturi. Conseguimos escapar e bem, preciso dizer que foi lá onde consegui boa parte de meus dons. Estamos nos escondendo deles há quase 70 anos, e sei que Aro quer que eu me junte a eles. Mas no momento, os Volturi são nossos menores problemas, eles não fazem ideia da onde estamos.

Eleazar assentiu, mas me olhou novamente com seus olhos dourados alarmados.

— Só tome cuidado, criança. Os Volturi podem atacar quando menos se espera. Aro adora o efeito surpresa. Mantenha-se sempre vigilante.

Eu assenti, e nós voltamos a caminhar em direção a casa.

Assim que entramos, meus olhos procuraram instantaneamente os de Jasper. Ele fechou os olhos e os abriu de novo demoradamente. Nada de novo, pelo jeito.

Dessa vez, me sentei em uma poltrona na enorme sala, e foquei meus olhos no fogo crepitante da lareira inútil. Edward estava em outra poltrona, do outro lado da sala ampla e bem decorada em tons de bege dos Denali, ele intercalava entre ler um livro que repousava em seu colo e encarar o fogo, como eu. Tanya se mantinha parada, encostada em uma parede á dez passos de Edward.

Era como se ela o estivesse protegendo, me desafiando á chegar perto para que pudesse me atacar.

Bem, não prenda a respiração, piranha.

Argh, ditados humanos inúteis.

O tempo passou e nenhum de nós se mexeu, Jasper encostado ao lado da lareira, Esme e Carlisle sentados no sofá de dois lugares. Loira um e dois – Também conhecidas por Kate e Irina, embora eu não pudesse me importar menos. – haviam saído para caçar com Alice, e Carmen estava abraçada á Eleazar contra outra parede.

Ah, como eu odiava monotonia.

“Sangue. Carmim e cremoso descendo pelo pescoço de uma garota desacordada, ele fluía para fora de sua jugular como se estivesse se oferecendo para que eu o sugasse. Eu cheguei mais perto...”

— Inferno Jasper, vai caçar infeliz! – gritei com ele, pois seus pensamentos estavam fazendo minha garganta arder. Só que, diferente do Sr.Eu-nunca-me-canço-de-caçar, minha situação não era tão critica. Ainda sim, não havia nada mais desconfortável no mundo do que aquilo. Emmett tossiu para encobrir a risada.

Jasper me olhou, seus olhos cor de ônix culpados. Rolei meus olhos e foquei meu olhar na lareira de novo. Ele passou rapidamente por mim, me dando um beijo na testa, então saiu.

O sol se pôs, e logo nasceu novamente, eu começava a sentir que ficaria naquela posição para sempre, então me levantei e fui até o banheiro, tomar um banho. Rosalie fizera Emmett ir a Forks buscar roupas para ela no dia em que chegamos, pois vira que ficaríamos por um tempo. Aproveitei e mandei Jasper junto, por isso eu tinha roupas limpas e podia tomar banho tranquila, sem ter que me preocupar em pedir roupas emprestadas a umas das loiras.

Não que elas sejam ao todo ruim, Irina quase me dava pena, de tão iludida que era, mas Kate era até legal.

Prefiro me abstrair de comentários sobre Tanya.

Enquanto eu me secava, minha atenção foi automaticamente sugada para os pensamentos de alguém;

“... e o shampoo de morangos de sempre- Edward, pare de ser um depravado. Por Deus, Bella está com Jasper agora. Eu não posso simplesmente pensar esse tipo de coisa e –Argh, Tanya seriamente irrita. Como eu posso educadamente dizer a ela pra me deixar em paz? Inferno, porque não consigo manter uma linha de pensamento? Oh, Droga, e se ela estiver lendo meus pensamentos? Oh Edward, Bella não perderia tempo lendo os pensamentos de um idiota apaixonado. Ela não te quer mais, supere isso. É, como se fosse fácil esquecer a mulher da sua vida. Ou melhor, existência. Mas ela vai voltar a-Merda, Tanya não conhece o conceito de espaço pessoal?”

O toque do meu celular me puxou de volta a minha própria cabeça, era somente uma mensagem da operadora e eu quase esmaguei o pequeno aparelho entre meus dedos por me tirar da mente de Edward. Ele estava pensando em mim.

Ele ainda me amava afinal.

Que diabos você esta pensando Isabella Marie Swan?!

Swan? Desde quando eu me refiro a mim mesma como Swan? Faz anos que uso Whitlock até mesmo em minha própria cabeça.

Argh, eu odiava o nó em que meus pensamentos haviam se transformado.

Me vesti rapidamente com a primeira roupa que vi na frente e desci correndo as escadas, passando rapidamente por Carmen e saindo pela porta dos fundos.

Não havia modo no inferno de olhar para a cara de Edward agora.

Eu corri em minha maior velocidade por alguns minutos, desligando minha mente de qualquer coisa em volta.

Eu estava no meio do nada, há minha volta só haviam montanhas e neve. Muita neve.

Respirei fundo e me sentei, bem onde estava em pé. Então fechei os olhos e me joguei para trás, afundando na neve fofa e que pra mim, não era nada gelada. Eu devo ter ficado ali por algo como dois dias, totalmente parada. Mas a Bella aqui nunca pode ter paz por algum tempo.

Mas meus olhos se abriram de repente, meu corpo em alerta pelo perigo iminente. Olhei em volta, já que meus outros instintos já haviam dito que havia alguém escondido por perto. Me pus de pé em um pulo, em posição de defesa, os dentes a mostra. Olhei em volta atentamente e não vi nada, mas minha audição aguçada captou alguém vindo por trás de mim, e eu me virei no segundo em que Edward parou, com as mãos levantadas em rendição, em resposta a meus dentes arreganhados e posição de ataque. Eu relaxei.

— Não me assuste desse jeito, eu podia ter te matado. – rosnei. Ele sorriu sem humor.

— Me faria um favor. – sentou na neve, encarando o horizonte. Eu hesitei, não conseguindo decidir se era seguro ou não sentar ao lado dele. Por fim, decidi que não havia nada que ele pudesse fazer de tão mal.

Me joguei na neve de novo, fechando os olhos.

Ficamos um tempo daquele jeito, nenhum de nós se mexia, mas eu sentia o ar entre nós soltar faíscas. Mas era uma sensação tão boa, que não vi necessidade de sair correndo no momento. Eu estava só... Relaxada, pela primeira vez em um século eu estava verdadeiramente relaxada. Tentei não pensar que aquilo se devia a presença de Edward.

— Acha que Alice vai voltar a ser a mesma de antes, um dia? – perguntei baixinho.

— Não. – respondeu simplesmente. Eu abri meus olhos para observar seu perfil pensativo.

— Obrigada, me sinto muito melhor agora. – disse sarcástica. Ele soltou algo como um riso fraco pelo nariz, e baixou a cabeça para me olhar.

— Queria que eu tivesse mentido?

— Não realmente. – me apoiei em meus cotovelos. Se Edward se inclinasse um pouquinho, nos beijaríamos. Espantei aquele pensamento. – Só queria que a realidade fosse um pouco menos dura.

— Ninguém te contou ainda? A vida não é justa. – ele sorriu, citando o que eu dissera em nossa primeira conversa.

— Acho que já ouvi isso em algum lugar. – o citei também, imitando até mesmo seu tom de voz seco daquele dia. Nos olhamos por alguns segundos, então caímos na risada.

— Achei que não se lembraria. – Ele disse sorrindo, depois de nos recuperarmos. Eu sorri e me sentei, puxando meus joelhos para o peito e os abraçando.

— Eu me lembro de tudo. – baixei os olhos. – da primeira e da última conversa.- meu tom de voz abaixou mais, se tornando triste. Eu respirei fundo e foquei meu olhar na neve em baixo de mim.

— Escuta Bella...

— Eu, realmente, não quero Edward. – levantei meus olhos pra ele, e a dor que vi em seus profundos olhos dourados, provavelmente doeu mais em mim no que nele.

— Não, agora você vai me ouvir. – ele disse, se virando de frente pra mim. – eu passei anos de mais me lamentando por um erro e por uma mentira. Eu preciso saber que você sabe meus motivos, mesmo que não os entenda, mesmo que não me perdoe. Eu preciso te dizer, olhando nos seus olhos o quanto eu te amava naquele dia, e o quanto eu te amo agora que-droga, parece ser tão mais do que antes.

Eu me levantei e fiz menção de ir embora, ele me agarrou pelo braço e me puxou. Eu podia dar um choque nele e fazê-lo me largar. Eu podia expeli-lo com um campo magnético. Eu podia fazê-lo se curvar sobre si mesmo de dor. Mas não fiz, porque no segundo em que nossos olhos se encontraram, todos os meus pensamentos e convicções me escaparam, e eu era a poça de Bella novamente.

— Bella, Edward! – Kate apareceu gritando. Nós viramos para olhá-la, mas ele não soltou meu braço. Ela nos olhou estranho, mas não comentou nada. Somente parou a alguns metros de nós e fez menção de se virar. – Laurent chegou.

Ela correu em direção da casa novamente, e eu olhei para Edward e então para sua mão que apertava meu braço. Ele me soltou, mas algo em seu olhar me dizia que a conversa não terminaria ali.

Eu só queria ter certeza de que seria forte o suficiente da próxima vez, e que não iria fazer o que eu estava prestes a fazer quando Kate nos interrompeu.

Beijá-lo e perdoá-lo.