Saga Sillentya: Espelho do Destino escrita por Sunshine girl


Capítulo 7
VI - O Informante


Notas iniciais do capítulo

E enfim eu retorno, pois é, (sob algumas ameaças de morte... rsrsrsrsrsrsrs...) eu resolvi que traria esse capítulo!

E foi o que eu mais gostei de escrever até agora nessa fase, espero que gostem tanto quanto eu...

Boa leitura!



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Capítulo VI – O Informante

“Quando você chorou, eu enxuguei todas as suas lágrimas,

Quando você gritou, eu lutei contra todos os seus medos,

E segurei a sua mão por todos estes anos,

Mas você ainda tem tudo de mim”.

(Evanescence – My Immortal)

Rolei no colchão, agitada, tentando, inutilmente, desfazer a cena sombria, o cenário desolador que se desenrolava em minha mente. Eu tinha consciência de que era apenas um sonho, um sonho muito tolo, mas mesmo assim, foi impossível para eu impedir que aquela sensação tenebrosa aflorasse dentro de mim, criando raízes dentro de meu corpo e crescendo como uma erva daninha.

Minha respiração era lenta e suave, meus batimentos ritmados ecoavam em meus ouvidos, misturando-se ao silêncio mortal daquele campo de batalha enegrecido e obscurecido pelas trevas noturnas.

Nuvens medonhas, de um cinza-escuro e grotesco dominavam o céu, conferindo-lhe um clima ainda mais medonho e amedrontador. Acima delas, clarões propagavam-se como explosões de luzes e sons perturbadores.

A ventania fustigava o que restara das árvores, chicoteando seus galhos nus e vergastando meus cabelos em meus olhos, obscurecendo minha visão, já atordoada. Apoiei minhas mãos no que um dia fora uma calçada de concreto, de uma rua apinhada e barulhenta; uma rua de Roma.

Levantei-me, observando melhor que tipo de lugar era aquele. Havia muitos escombros, estruturas e esqueletos do que um dia já foram arranha-céus imensos. Pedaços de vidraçaria estavam espalhados pelo asfalto rachado, e muitos carros jaziam, enferrujados, a lataria amassada e decadente no meio-fio. Mas completamente vazios.

O assobiar fino do vento ainda ecoava em meus ouvidos. De fato, o cenário era desesperador, como uma era pós-apocalíptica, uma era de trevas e sofrimento, de lágrimas e ranger de dentes; um possível fim para a humanidade.

Observei, horrorizada, as construções decadentes, o asfalto rachado, o céu tempestuoso, os carros abandonados, e então, muito que deliberadamente... Sorri.

Não sei o que de fato havia mudado ali, não fora o cenário, não fora o caos e a destruição presentes, mas a minha própria perspectiva, o meu próprio eu havia sido alterado. Girei o tronco, tombando minha face para o lado para que pudesse vislumbrá-lo uma última vez.

E o contemplei, de costas para mim, os cabelos negros como a meia-noite eram violentamente chicoteados pelo vento. Os punhos estavam cerrados, os músculos enrijeciam sob a camisa, e ele observava, para além do horizonte seus olhos lançavam-se.

Caminhei até ele de forma confiante, ignorando todo o resto ao meu redor. Eu podia sentir que havia algo a mais dentro de mim, uma nova energia, pulsando, queimando em meu seio como uma chama eterna e inextinguível, alimentando minha fúria, preparando-me para a guerra que se iniciaria ali, naquele campo de batalha devastado.

Ele virou-se para mim, sua face tombando lentamente, seus olhos procurando pelos meus, desesperados e aflitos. Postei-me ao seu lado, encarado-o incisivamente, procurando gravar cada detalhe tão cuidadosamente esculpido de seu semblante glorioso.

Uma luz explodiu acima de nós dois, mas eu não temi. Sabia que, de uma forma ou de outra, tudo terminaria ali, naquele campo de batalha. Meus batimentos eram compassados, batendo no mesmo ritmo do coração dele, uma dança que somente eles poderiam partilhar, uma linguagem silenciosa de dois amantes que procuram dizer as palavras finais para uma possível despedida.

Levei minha mão, lentamente, até a dele, entrelaçando nossos dedos, sua resposta veio no mesmo segundo, apertando minha mão na sua. O mero contato de nossas peles deixava-me arrepiada. Não era apenas a transferência de calor de um corpo a outro, era... Outra coisa que eu não saberia explicar. Sabia somente que, de alguma forma mágica e desconhecida, estávamos conectados como jamais estivemos, como nenhum outro casal de amantes jamais se conectara.

Éramos um.

Nossos olhos ainda se prendiam um ao outro, nossos olhares eram cativos de nossos próprios sentimentos, completamente expostos ali. Observei o que os olhos dele transmitiam para mim naquele momento. Amor, paixão, desejo, zelo, carinho, fidelidade, companheirismo... O misto dessas sensações tão poderosas, provindas dele, explodiam dentro de mim, aquecendo o sangue em minhas veias.

E ainda de mãos dadas, relutantes em permitir que nossos olhares se desencontrassem, nós tombamos nossos semblantes para o horizonte negro e perverso. E preparamo-nos para a batalha de nossas vidas.

Aidan e eu preparamo-nos para a guerra que se iniciara bem ali...

Despertei de sobressalto, ofegante, os olhos arregalados, os lábios escancarados. Olhei em derredor, constatando que estava em meu quarto, pegara no sono enquanto lia uma história para Damien, mas que tipo de sonho foi aquele?

Fora algo tão... intenso. Tão fogoso. Eu jamais havia tido um sonho com tamanha nitidez e intensidade, parecia algo tão real. Eu podia até mesmo sentir o toque de Aidan em minha pele. Arregacei a manga de minha blusa, minha pele ainda estava arrepiada.

Tentei acalmar meus batimentos, recuperar meu fôlego, mas não era fácil. Aquela sensação ainda predominava em meu interior. O modo como eu sentira aquela conexão com Aidan, como se pelo mero toque de nossas mãos nós nos fundíssemos em um ser apenas. Como se nos tornássemos apenas uma entidade, e o vazio logo me dominou, lembrando-me de sua ausência em minha vida há tantos meses.

Esfreguei os olhos meticulosamente e só então dou por falta de Damien. Ele não estava mais ali. Procurei por sua figura por todo o quarto, mas não o encontrei; o livro também havia sumido.

- Damien? – chamei-o, mas não houve resposta alguma, apenas o silêncio perturbador.

Lancei minhas pernas para fora da cama, calcei os sapatos e penteei um pouco meus cabelos, correndo até a porta e a abrindo. Deparei-me com o longo e estreito corredor, mas sem sinal de Damien novamente.

Fechei a porta atrás de mim, caminhando em passos curtos e demorados, cheguei até a escadaria, apoiando minhas mãos no corrimão da escada. Estaquei, não sabia o que fazer, muito menos para onde ir.

Vislumbrei uma figura abrir uma das portas no primeiro andar, e não me contive em lançar-se em sua direção, achando que fosse Christian ou talvez Stella, mas gelei dos pés à cabeça quando vi que se tratava de Madelina.

Ela fitou-me cautelosamente, estreitando os olhos negros, parou com as mãos nos quadris e estava prestes a me contornar e ignorar quando eu a detive, chamei-lhe, detendo-a em seu trajeto.

- Madelina, por acaso você viu o Christian ou o Damien por aí?

Ela petrificou, como se tivesse enraizado no carpete, contei mentalmente até vinte e um antes que a respiração dela estabilizasse e ela girasse o tronco, muito que lentamente, para mim, depois deu de ombros, como se a resposta de minha pergunta não lhe interessasse ou não fosse da sua conta.

- Não, eu não os vi.

Devolvi seu olhar frio como gelo na mesma intensidade, não me importava em lhe parecer grosseira ou mal educada. Ah que se dane! Ela havia deixado muito claro que eu não era bem-vinda ali, então por que deveria ser educada com ela também?

Competimos com nossos olhares homicidas por mais alguns segundos, até que eu recuei, dando de ombros, já estava me retirando dali quando ouvi a voz dela novamente:

- Se eu fosse você, Agatha, não ficaria perambulando pela mansão, principalmente hoje.

Tornei a fitar seus olhos oblíquos, não conseguindo discernir o que exatamente estava ocultado ali. Imediatamente senti um bolo em minha garganta, uma apunhalada na boca de meu estômago que o retorceu, e minhas mãos de repente ficaram frias e pegajosas. O que estava havendo comigo?

- Por que... disse isso?

Madelina ajeitou seus cachos enormes, e embora seus lábios estivessem cerrados e comprimidos um contra o outro, vi a alegria em seus olhos ao responder-me.

- Lucius tem visita.

Dei de ombros, ignorando o sarcasmo quase ácido que havia em sua voz e retirei-me dali, decidindo que continuaria a procurar por Damien. Vasculhei os jardins, a biblioteca (eu esperançava que ele tivesse ido devolver o livro), cada quarto da espaçosa ala leste da mansão.

Mas não encontrei nada.

Estava a ponto de desistir, e cansada de vagar feito um fantasma pela mansão, quando desabei em uma cadeira acolchoada, escondendo o rosto nas mãos. Os efeitos daquele sonho de outrora ainda eram evidentes sobre meu corpo, e mais tarde, agora pouco, quando Madelina tentou me intimidar, eu podia quase jurar...

Não. Interrompi esse pensamento antes que pudesse completá-lo. Não queria ter de ouvir as baboseiras que minha mente supunha, era impossível, inconcebível, inadmissível, era... Suspirei. Era ridículo.

Repousei o queixo nas mãos, desolada. E assim permaneci, imersa em meus próprios pensamentos, até que senti duas mãozinhas pequenas cobrirem meus olhos, o calor de um corpo miúdo atingiu em cheio minhas costas, e uma voz infantil sussurrou em meu ouvido.

- Adivinha quem é?

Soltei uma curta risada, adentrando em seu joguinho. Toquei suas mãos, mordendo os lábios a fim de não rir mais.

- Deixei-me ver... Será o Christian?

Damien meneou a cabeça para o lado, podia quase sentir que seu sorriso brincalhão aumentara.

- Hmmmmm... Seria o Ramon então?

- Hmmm, Hmmm... – ele negou novamente.

- Talvez seja o Daisuke... É você, Daisuke?

Damien soltou uma risadinha e negou novamente. Reprimi  o desejo de rir, e então, sem o menor aviso, agarrei os braços de Damien, puxando-o para meus braços e enchi-lhe de cócegas.

- Então talvez seja o Damien! – exclamei, beliscando de leve sua barriga, fazendo-o rir ainda mais, então, cessei a brincadeira e lancei-lhe um olhar de advertência e censura – Onde estava? Procurei por você por toda a mansão!

O sorriso nos lábios de Damien desapareceu e um suave rubor aqueceu as maçãs de seu rosto. Ele fez um biquinho e encarou-me, quase como se pedisse desculpas.

- Desculpe, estava conversando com o moço lá em cima...

- Que moço? – perguntei-lhe, um estranho sentimento apoderava-se de mim, uma sensação... Sufocante.

Damien endireitou-se em meu colo, apontando com o dedo para a escadaria que levava a ala oeste da mansão, a ala proibida a mim, e provavelmente, a Damien também. A ala por onde os informantes de Lucius circulavam, Mediadores que se arriscavam para trazer informações cruciais de Sillentya até Ephemera, as duas grandes e eternas rivais.

Coloquei Damien no chão, não conseguindo desgrudar meus olhos daquela escadaria. Uma idéia formava-se em minha mente, uma idéia muito, muito insana e arriscada.

- Você sabe quem ele era, Damien? – perguntei-lhe, ainda com os olhos vidrados ali.

- Não, nunca perguntei o nome dele, mas ele é legal, e grande! – exclamou Damien, lançando os braços para cima para indicar a altura do suposto informante.

Estranhamente, meu coração acelerou em meu peito, bombeando o sangue por minhas veias a toda velocidade. Minhas pernas fraquejaram, trêmulas, mal suportando o peso de meu corpo.

Aquela sensação desesperadora ainda me assolava, retirando todas as minhas forças, roubando todo o meu fôlego. E mesmo assim, mesmo sendo consumida por essa estranha sensação, eu não contive a minha ânsia, a minha necessidade quase insana de subir aquelas escadas e descobrir quem de fato estava lá...

Engoli em seco, minha garganta fechava, meus lábios estavam secos, minha respiração descompassada.

- Damien, fique aqui, tudo bem?

Não esperei por sua resposta, feito um robô, caminhei rumo a escadaria que me levaria a aquela ala proibida da mansão. Subi, degrau por degrau, ainda trêmula e com o coração na garganta.

O que estava havendo comigo? Parecia até que uma força exterior estava me puxando para aquela parte da mansão, uma força invisível e muito, muito poderosa.

Mal pude contemplar a decoração daquela ala, as novas pinturas, as novas esculturas de artistas contemporâneos desconhecidos, mas a mesma tapeçaria fina e elegante revestindo as paredes, o mesmo carpete grosso capaz de abafar o som de meus passos recobrindo todo o assoalho de madeira do extenso corredor.

Sentia-me cada vez mais tonta conforme me aproximava da porta ao final do longo corredor. Uma estreita porta de madeira entalhada, pintada de branco, assim como todo o restante.

Àquela altura, as paredes já giravam ao meu redor, como se estivessem dançando sob meus olhos atordoados. Um zunido irritante toldava meus ouvidos, era impossível escutar algo além de meus batimentos descompassados, ou minha respiração irregular.

Mas mesmo assim, mesmo sendo acometida por tamanha força aterradora e misteriosa, eu continuei avançando, continuei prosseguindo, passo por passo, um de cada vez, até que estagnei em frente à porta tão temida.

Imediatamente, as paredes pararam com sua dança e com seus rodopios. O som de meus batimentos ainda reverberava em meu seio, o caos instaurava-se dentro de mim, uma cacofonia perturbadora, uma estranha sensação de déjà vu consumia-me.

Vi-me suando frio ao levar a mão, trêmula e hesitante, até a maçaneta dourada e reluzente. E muito que lentamente, silenciosamente, eu a girei, empurrando a porta pesada e adentrando ao silêncio mortal que envolvia todo aquele suntuoso e pequeno gabinete.

Adentrei, um pouco mais recomposta, meus batimentos não explodiam mais em meu ouvidos, e minha respiração estabilizava-se lentamente. Fechei a porta atrás de mim, eu sabia que o que estava fazendo era errado, mas aquela força estranha ainda me puxava para aquele lugar, como uma névoa fina e brilhante que toldava meus sentidos, toldava minha razão e conseqüentemente também o meu juízo.

Observei, minuciosamente, a mobília daquele cômodo, que não consistia em mais do que algumas cadeiras de madeira avermelhada, com assento acolchoado, elegantemente sobrepostas a tapeçaria fina, de frente umas para as outras.

Havia uma mesa de centro, uma lareira de alvenaria, onde a lenha crepitava sob as chamas bruxuleantes e alaranjadas do fogo. Um grande quadro estava pendurado sobre ela, retratando uma Roma mais antiga, mais clássica.

Também havia uma estante em um dos cantos, abarrotada de livros e mais livros. Uma escrivaninha muito elegante no canto oposto, a cadeira atrás dela, vaga. Cortinas grossas de um veludo escuro recobriam as janelas, impedindo a passagem de qualquer tipo de iluminação provinda do exterior.

Sem pensar, avancei pelo cômodo, caminhando em direção à lareira, sentindo as ondas de calor chocarem-se contra o meu corpo, colorindo as maçãs de meu rosto com um vermelho suave e ardendo em meus olhos.

Tombei minha face para trás, observando a obra de arte em seus mínimos detalhes, e arqueei uma de minhas sobrancelhas, parecia algum tipo de convenção de intelectuais, todos engomados e vestidos em suas camisas cheias de frufrus.

Elevei um de meus braços, tocando a tela com a ponta de meus dedos, sentido a textura áspera da tinta a óleo. Deslizei o dedo, abismada, com a paisagem retratada no quadro, tinha uma assinatura indistinta e quase ilegível no canto inferior direito da tela gigante.

Baixei meus olhos para as chamas dançantes da lareira, observando a forma como a lenha era consumida suavemente por elas. Um calor sutil ainda aquecia minhas pálpebras. Estivera enganada; não tinha nada demais ali. Nada que valesse a pena.

Suspirei, derrotada, e irritada comigo mesma por criar tão vãs esperanças. Christian estivera certo, eu tinha esperança de vê-lo, mais uma vez. Eu apenas não... compreendia. Podia quase jurar que aquela força que me chamara ali fosse Aidan. Que loucura. Bufei. Por que raios ele estaria aqui, nesta sala? Era loucura, era sandice.

Eu devia estar enlouquecendo, de fato, ou ainda era vítima daquele sonho de mais cedo, tão intenso, tão nítido, tão real que eu podia quase tocá-lo. Mas era apenas isso, um sonho. Eu precisava aceitar esse fato.

Mordi o lábio inferior, cerrando os olhos e baixei a cabeça, refreando aquela avalanche de emoções e sentimentos negativos que sempre me atingiam quando eu me lembrava de Aidan. De quando nós tivemos de ser separados um do outro. Já se passara tantos meses, e tudo que ainda me resta são as lembranças de nossos momentos partilhados, nossos únicos e perfeitos momentos, momentos estes, que me foram roubados quando ele partiu sem olhar para trás.

Eu precisava aceitar. Precisava... aprender a lidar com essa dor, com esse vazio deixado por sua ausência. E talvez, devesse aceitar o fato de que jamais nos veríamos outra vez. Eu aceitei esse destino miserável, escolhi viver nosso amor porquanto ele durasse. Porquanto o destino não nos separasse. Eu... aceitei...

Abri meus olhos novamente, observando as chamas que consumiam a lenha na lareira. E preparei-me para ir embora dali, porém, antes mesmo que pudesse girar o corpo e encaminhar-me até a porta, a maçaneta tremulou e alguém abriu a porta em um rompante, escancarando-a, e depois a fechando atrás de si.

Ótimo, agora eu havia sido pega em flagrante! Suspirei, vasculhando minha mente atrás de uma desculpa convincente, mas nem mesmo tive a chance de terminar meus pensamentos, pois, ao ouvir aquela voz novamente, ao ouvi-la proferir o meu nome... Eu perdi o fio da meada, eu esqueci-me de todo o resto, e não havia mais nada ao meu redor, não existia mais nada. Era apenas eu e aquela voz, outra vez.

A mesma voz, que, por tantas vezes, dissera que me amava, chamara por meu nome, uma voz que tantas vezes remeteu-me a uma tristeza imensurável, uma solidão infinita e um passado sombrio e amargurado.

A mesma voz que eu ouvia nos meus mais distantes e nebulosos sonhos, a mesma voz que habitara meus pensamentos durante todos esses meses. A voz tão baixa, aveludada, controlada, que me parecera tantas vezes com a voz de um arcanjo celestial.

Era a voz que eu esperara ouvir por tantas vezes. A voz que me chamava do além, que me trouxe de volta do mundo dos mortos, quando eu mesma quis desistir de minha vida meses atrás naquele acidente de carro. A mesma voz que me jurou amor eterno e fidelidade, e em um dia nebuloso e fatídico, disse-me adeus para sempre.

Aquela era a voz que eu pedira tantas vezes aos céus para ouvir mais uma vez. Aquela era a voz que acalmava meus batimentos, atenuava minhas dores e trazia-me tanta felicidade. Imaginação ou não, somente de ouvi-la, todas as minhas feridas fechavam-se, o meu oceano de solidão dissolvia-se, o meu mundo solitário ruía, e eu era liberta de meu cárcere.

Era como ver o sol mais uma vez, depois de anos sentenciada a escuridão eterna. Era como chegar à primavera, depois de meses confinada ao inverno rigoroso. Era como receber a dádiva da chuva após longos meses de estiagem. Era a terra seca sendo agraciada pelas gotas do orvalho. Era o encontro da lua com o oceano, após longas horas de espera. Era o quebrar suave das ondas na areia da praia. Era todo o meu mundo recuperando o seu brilho genuíno, o seu sol particular, e o brilho das estrelas cintilando no meu céu negro.

E tudo isso veio apenas com o som daquela voz...

- Agatha?

Fechei meus olhos, desfrutando o máximo que podia daquela sensação maravilhosa, a sensação de flutuar acima das nuvens, de estar completa novamente. Delírio, devaneio, que diferença fazia? Aquela voz ecoava em meus ouvidos, doce, macia, com o toque de realidade que eu sempre almejei.

Meu coração transbordou em meu peito, não suportando tamanha satisfação. Eu sentia-me um recipiente cheio até o bico, transbordando felicidade e amor. Sim, porque pela primeira vez em meses, a chama de meu amor por Aidan, até então sufocada por todos os meus temores, todas as minhas dores, e por minha imensa solidão, queimava novamente, com o furor e a intensidade de outrora.

Talvez até mais.

Sorri, respirando aos arquejos, completamente sem fôlego. E quando eu pensava que tudo isso fosse terminar, que toda essa onda de paz e felicidade fosse chegar ao seu fim, a voz atingiu-me novamente, e eu me senti viva mais uma vez, senti-me eu mesma. A Agatha que eu aprendi a ser, a Agatha que ria por qualquer motivo, sorria para o nada, e ficava a contemplar a beleza até mesmo em sua maior insignificância.

- Agatha, é você?

Não contive a minha alegria, não controlei meus atos, apenas sei que o fiz. Girei o tronco, abruptamente, os olhos esperançando por vislumbrarem aquela loucura, aquela fantasia tão real, esperando que a qualquer momento esse devaneio maravilhoso cessasse e levasse com ele toda essa paz, toda essa felicidade que eu estava sentindo.

Mas isso não aconteceu.

E no lugar da paz e da tranqüilidade, houve apenas o choque, a incredulidade, a surpresa, o espanto, a perplexidade, que me dominou eficientemente em pouco mais de um segundo, espalhando-se por meu corpo, anestesiando-me até o ponto de eu não mais senti-lo, não sentir meu coração, e por pouco, muito pouco, eu não fui ao chão ali mesmo.

Porque não era sonho. Eu não estava delirando, não estava devaneando, não estava imaginando. Era real. Ele estava bem diante de mim. A mesma perplexidade estampada em seu rosto glorioso.

Escancarei meus lábios, apenas a tempo de sussurrar aquele nome, o nome daquele quem eu amaria por toda a minha vida.

- Aidan...

Levei a mão aos lábios, arfando loucamente, eu não conseguia respirar com eficácia, parecia que nem mesmo me lembrava como respirar corretamente. Mas que importância tinha esse fato agora? Aidan estava ali, Aidan estava diante de mim!

Observei com meus olhos incrédulos e desesperados, todos os seus traços, tão perfeitamente compostos. Os traços que tanto me fizeram falta, que sempre me assombraram em meus sonhos mais perturbadores, os mesmos traços que o tornavam único para mim.

Os cabelos negros como a meia-noite, caindo até seus ombros, lisos, a pele tão suavemente bronzeada e macia sob meus dedos, o nariz reto e clássico, as maçãs do rosto altas e esculpidas, o queixo másculo, os lábios carnudos e convidativos, com uma curvatura perfeita no lábio superior. Aqueles lábios, que por tantas e tantas vezes, buscaram com desespero e aflição pelos meus. Os ombros largos, os braços fortes que sempre me enlaçavam, trazendo-me para perto de si, as mãos grandes de dedos longos que sempre seguravam nas minhas, aquecendo meu corpo com seu toque firme e confiante. O seu peito largo, no qual eu me refugiei tantas vezes, as pernas longas.

E os olhos... Os olhos tão profundos, um oceano interminável e acastanhado. Seu olhar, tão intenso, tão confiante, dono de tantos segredos e tantos mistérios. O mesmo olhar que sempre roubava meu fôlego, fazia me perder em suas íris. Um olhar tão caloroso, tão cálido, abrasador e penetrante. Aqueles eram os mesmos olhos que atravessavam minha carne e olhavam diretamente para a minha alma. Era o olhar que por tantas vezes eu recebera de sua parte, o olhar que sempre me fazia questionar o que de fato se passava por sua cabeça. O que exatamente seu coração sentia naquele momento.

Era o olhar cheio de ternura, cheio de paixão, o olhar que me transmitia o quanto ele me amava, o quão intensos e verdadeiros eram os seus sentimentos por mim.

E aqueles olhos, agora, observavam-me com a mesma perplexidade, a mesma incredulidade, como se ele também não pudesse acreditar que eu estava diante dele. Mas eu estava, e ele estava...

As forças implacáveis do destino finalmente haviam nos reunido. Finalmente estávamos face a face, frente a frente, e nossos caminhos entrelaçavam-se mais uma vez, assim como nossas almas, sedentas pela companhia um do outro.

Então, por que eu ainda hesitava?

Deixei de lado toda a minha incredulidade, todas as minhas dúvidas e incertezas a respeito daquele nosso reencontro e lancei-me em sua direção, percorrendo a pouca distância que nos separava naquele momento, aquela distância que nos separara por tanto tempo, por intermináveis dias, agora havia sido encurtada, e nos permitia estar nos braços um do outro, mais uma vez.

Choquei-me violentamente contra seu corpo, e ele oscilou, não entendendo de imediato o fato de que eu estava ali, envolvendo seu pescoço com meus braços, escondendo minha face em seu ombro esquerdo e derramando-me em lágrimas, agarrando o tecido de sua camisa entre meus dedos, certificando-me de que ele era mesmo real, de que ele estava ali, preso no cerco quase sufocante de meus braços.

Eu soluçava, eu gemia, eu agarrava-me cada vez mais ao corpo quente dele, despejando todas as minhas dores, todas as minhas mágoas, livrando-me e libertando-me de todas elas, substituindo-as por todo o meu amor por ele.

E só então Aidan se deu conta de que eu também era real, e não uma miragem. Seus braços envolveram-me, trazendo-me para mais perto dele, apertando-me contra seu corpo até que não houvesse o menor espaço entre nós dois. Ele beijou meus cabelos, inspirou várias vezes em minha pele, e depois se rendeu, ocultando sua face entre as mechas de meus cabelos e a pele de meu pescoço, ainda apertando minha cintura e minhas costas com suas mãos.

Respirei seu cheiro também, seu cheiro que sempre me acalentava nas horas mais difíceis, nas horas mais conturbadas.

Sorri, completamente extasiada, sentindo que tudo havia perdido a sua importância, tudo havia perdido o seu brilho, tudo era absolutamente irrelevante, quando eu estava nos braços de Aidan. Roma, Ephemera, a guerra violenta que poderia nos separar algum dia.

Recostei minha face em seu ombro novamente, ofegante, aguardando que meus batimentos desacelerassem e minha respiração estabilizasse, quando senti que ele afastou-me um pouco, pegou meu rosto entre suas mãos, prendendo meus olhos nos seus. Nossos rostos estavam a centímetros, quanto tempo demoraria para que nos rendessemos à paixão avassaladora que agora inflamava em meu peito como uma grande e devastadora combustão?

Mesmo assim, ele susteve meu olhar, respirando rapidamente em meus lábios.

- Como você pode estar aqui? – ele perguntou, semicerrando os olhos – Eu... Eu simplesmente não consigo entender, Agatha... Eu pensei que... pensei que você estivesse em South Hooksett, ainda!

Aidan cerrou os olhos, confuso e um pouco perturbado, só então notei que ele falava consigo mesmo e não comigo.

- Não consigo entender, até poucas semanas atrás não senti sua presença aqui, mas agora... – ele abriu os olhos abruptamente, trazendo meu rosto para mais perto do seu, de modo que nossos narizes roçavam um no outro, encostando nossas testas uma a outra – Agora, eu simplesmente não consegui me conter... Quando... Quando senti que você estava aqui, nessa mansão... Mas como? Eu não... Não consigo compreender!

Levei minhas mãos até as suas, retirando-as de meu rosto, somente para poder envolver o rosto dele com elas, forcei-o a me encarar, tínhamos tanto a conversar, mas meu corpo ainda implorava pelo dele, pelo calor que emanava tão suavemente, e ainda assim, aquecia-me como uma fornalha.

- Aidan, está tudo bem... – sussurrei, afagando sua face – É uma longa história que tenho para lhe contar, mas primeiro, diga-me, por favor, o que você está fazendo aqui? Você não devia estar aqui, devia estar em Nápoles...

Aidan baixou seus olhos, e não houve resposta de sua parte. Eu estava deixando algo crucial passar, mas não conseguia pensar com clareza com tamanho alvoroço agitando todo o meu interior.

Abruptamente, e sem o menor aviso, ele desvencilhou-me de mim, contornando-me, dando-me as costas, esquivando de minhas perguntas, como ele sempre evadia quando adentrávamos em algum assunto do qual ele não queria falar.

Percebi que seria exatamente como antes, ele se fecharia comigo antes que eu pudesse adentrar mais as suas muralhas. Aidan virou-se para mim, os olhos cautelosos e hesitantes, quando por fim ele respondeu-me, seus olhos ainda não alcançavam os meus:

- Depois que voltei, eu não tinha muita certeza do que fazer, Agatha. Estava enlouquecendo com o fato de que Ducian poderia descobrir sobre você e tirá-la de mim. Eu... não suportaria se algo acontecesse a você, então, tomei uma decisão.

Seus olhos foram tomados de um sentimento estranho, e desconhecido por mim. Seria... culpa ou amargura? Ele estava remoendo algo em sua mente, eu só tinha certeza disso.

- Que decisão você tomou? – eu o instiguei, avançando alguns passos em sua direção, tomando cuidado para não alarmá-lo antes que ele decidisse se fechar novamente.

- Eu... – ele hesitou, sacudiu a cabeça e não continuou.

Aidan tombou sua face para a lareira, seus olhos observando as chamas dançantes, ele apertou os dedos nas têmporas, e por fim respondeu-me:

- Eu sou um informante de Lucius, Agatha. Estou espionando Ducian e trazendo informações até Ephemera.

- Então era isso... – sussurrei, percebendo o quão tola eu havia sido, estava óbvio agora. O único motivo que poderia trazer Aidan até aqui seria o fato de que ele, agora, é um dos informantes de Lucius. Um espião.

Lancei-me em sua direção, em um ato impensado e inconseqüente, peguei seu rosto entre minhas mãos, meus olhos ardiam, suplicantes e aflitos nos dele, terrivelmente indiferentes.

- Você não podia ter feito isso! Não vê? Se Ducian descobrir que você o está espionando e trazendo informações até aqui... Aidan, ele não vai poupá-lo! Ele te matará! E eu... Eu não vou suportar se eles fizerem algo com você...

E encerrei meu discurso, as lágrimas já transbordavam de minha face. Aidan não me disse nada, apenas me puxou para si, envolvendo-me novamente com o calor de seu corpo. Deixei-me levar, abafando meu choro em sua camisa.

Prendi o tecido entre meus dedos, desejando que naquele momento nós nunca tivéssemos nos separado. Porque agora, não somente eu, mas Aidan também seria castigado se descobrissem sua traição. Eles não o poupariam e essa idéia deixava-me aflita e desesperada.

- Você não devia ter feito isso... – sussurrei, a voz ainda chorosa, os olhos ardendo pelas lágrimas – Não podia ter feito isso...

Seus lábios encontraram meus cabelos novamente, e ele os afagou suavemente, delicadamente, acalentando-me.

- Não conseguiria conviver comigo mesmo se algo lhe acontecesse...

Apertei mais o meu rosto contra o seu ombro, sendo dominada e corroída por minha agonia. Meu Deus... Como podia dizer toda a verdade a ele? Eu precisava, precisava encontrar forças para lhe contar, não importava como...

- Se Ducian soubesse sobre você, eu jamais me perdoaria...

- Ele já sabe, Aidan. – eu o cortei em sua frase, sentindo que ele enrijeceu no mesmo instante, seus braços quase se tornaram sufocantes ao meu redor. Lutei para me libertar de seu abraço e fitá-lo nos olhos, o choque emoldurava suas feições – Aidan, tem algo que eu preciso lhe contar... Eu preciso que você saiba tudo o que acontece nesses meses... Eu... – sacudi a cabeça, reordenando a confusão catastrófica que agora eram meus pensamentos – Aidan, você precisa saber quem me trouxe para cá...

Ele ouviu atentamente cada palavra que eu disse, mas seus olhos observavam meus lábios enquanto eu lhe falava, e então percebi, que ele não podia mais lutar contra a paixão, a força irresistível e magnética que nos atraía um para o outro. Ele afagou com as costas da mão toda a lateral de meu rosto, enxugando minhas lágrimas com a ponta de seus dedos.

Esqueci-me do que devia lhe contar e deixei-me levar por aquela sensação desesperadora que gritava dentro de mim para ceder a ele, cair em seus braços e então, de lá nunca mais sair.

Sua mão envolveu minha face e puxou-a até a sua, levantando-me na ponta dos pés e mesmo assim, ele precisou curvar sua face até a minha, para que o encontro tão esperado de nossos lábios acontecesse.

E quando de fato isso aconteceu, foi como se nós nunca tivéssemos sido separados, como se ele nunca tivesse me deixado naquela floresta sombria. Foi apenas um mero roçar, mas que não deixou de transmitir toda a intensidade de seus sentimentos por mim, da exata forma como eu me recordava.

Perdi a conta de quantas vezes exatamente ele encostou seus lábios aos meus e depois recuou, olhando em meus olhos em cada uma delas, fitando-me demoradamente, como se quisesse obter a certeza de que era o que eu queria.

Mas nunca houve a menor hesitação em meus olhos, nunca houve o menor sinal de vacilo. E ele logo tomou meus lábios para si, de forma arrebatadora e avassaladora, causando um verdadeiro alvoroço dentro de mim.

Ele separou meus lábios cuidadosamente, e em seguida, seu hálito preenchera todos os pensamentos, como uma névoa que me ocultava de toda a verdade e levava-me até outra realidade, outro mundo, uma dimensão paralela e mágica. Beijou-me lenta e delicadamente, ainda assim, eu podia notar ao fundo, o seu desespero, toda a saudade que aquela separação nos causara.

Reagi. Enlacei-o pelo pescoço, prendendo-me ao seu corpo, deixando que suas mãos repousassem em minha cintura delicadamente e depois, sustentassem todo o peso do meu corpo. E quando dei por mim, ele já me pegava em seus braços, conduzindo-nos até o pequeno sofá de dois lugares, com as pernas de madeira avermelhada.

Aidan prendeu-me em seu corpo, depois me acomodou em seu colo, seus olhos não deixaram os meus por nenhum segundo, sempre sérios, misteriosos e profundos, queimando-me como uma fogueira da qual eu sabia que não poderia escapar.

Era o olhar pelo qual eu ansiara todos esses meses, era o olhar que eu estava acostumada a receber de sua parte, o mesmo olhar que penetrava meu corpo somente para admirar minha alma.  O olhar que eu tanto sentira falta. E lá estava ele, olhando-me daquela forma novamente.

Levei uma de minhas mãos até seu rosto, acompanhando as linhas suaves de seu rosto, entrelacei alguns fios de seu cabelo em meus dedos e então sorri, completamente abobalhada.

- Senti tanto sua falta... – sussurrei, curvando-me para depositar um beijo carinhoso em seus lábios carnudos.

Ele não sorriu, mas a exultação cintilava em seus olhos castanhos, e no fundo eu sabia, ele também sentira a minha. As chamas da lareira refletiam centelhas alaranjadas em seus olhos castanhos-escuros, mas em nada se comparavam ao olhar cálido e apaixonado que Aidan lançava para mim.

Aidan baixou uma de suas mãos até que ela se encaixasse na base de minhas costas e então, apertou-me contra seu corpo, como se temesse que eu fosse evaporar a qualquer minuto. Talvez, em meu subconsciente, debaixo de tamanha alegria e júbilo, eu também temesse isso.

Acariciei sua face novamente com a ponta dos dedos, assentindo enquanto ele tombava sua cabeça na minha direção, repousando-a ternamente em meu peito, fechei os olhos, envolvendo-o cada vez mais.

- Não sei ao certo como consegui passar tanto tempo longe de você... – sussurrou ele, a tristeza soava presente em sua voz – Foi um verdadeiro inferno para mim.

Aidan afastou-se, abruptamente, seus olhos buscaram pelos meus novamente, demorando-se em meu rosto, seu semblante projetava-se em uma máscara de amargura naquele momento.

- Espero que me perdoe por tê-la abandonado daquela forma... – ele desviou o olhar, irritado, trincando os dentes – Não importava o quanto eu quisesse ficar ao seu lado, eu sabia que se protelasse minha partida por mais alguns dias, Ducian desconfiaria e acabaria encontrando você como conseqüência...

Perdi a fala depois que ele confessou-me aquilo. Eu queria tanto contar tudo, despejar toda a verdade ali mesmo, em seus braços, mas... Suspirei. Isso só aumentaria toda a sua culpa, se ele soubesse que Stevan estava seguindo seus passos e que já alertara seu mentor a respeito de nós dois, Aidan só se culparia ainda mais.

Segurei em seu rosto, trazendo-o para mim novamente, fixei meus olhos nos dele, e fingi um sorriso convincente. Não podia permitir que Aidan soubesse de Stevan ou pior, de Christian, pelo menos por enquanto.

- Isso já passou – murmurei, mas ele não pareceu se convencer muito – Está tudo no passado, e eu jamais o culpei por ter me deixado... Bom, eu sabia que mais cedo ou mais tarde isso aconteceria. Mas eu jamais o culpei por nada. – tentei confortá-lo de alguma forma.

- O que nos leva ao fato de você estar aqui e agora. Diga-me, como Lucius te encontrou?

Dei de ombros, tentando fingir indiferença, mas acho que Aidan não acreditou muito em mim.

- Pode-se chamar de sorte...

Os braços dele enrijeceram ao meu redor, eu podia sentir a tensão emanando de seus músculos. Aidan crispou os lábios e baixou os olhos novamente.

- Agora você sabe de tudo então. – murmurou ele a meia voz, parecendo-me tão... preocupado.

- Sei sobre o selo e sobre o meu pai, quero dizer, a história da família do meu pai. E também... – inspirei, buscando fôlego – Sei sobre a guerra, Aidan.

- Lucius te contou tudo? – questionou-me ele, apertando os olhos acastanhados.

Assenti com a cabeça, mas então tentei mudar o rumo de nossa conversa. Não queria desperdiçar aqueles primeiros momentos ao lado dele em meses novamente com assuntos tão difíceis para mim.

- O que você pretende fazer? – perguntei-lhe, tocando a suave mancha roxa abaixo de suas pálpebras – Quero dizer, o que você realmente pretende fazer? O que Ducian pensa que você está fazendo neste exato momento? É arriscado, você sabe disso.

- Eu não me importo. – murmurou ele, pondo fim ao assunto. Eu não gostava da idéia de vê-lo se arriscar daquela maneira. Mesmo que suas intenções fossem boas, mesmo que ele só desejasse a minha segurança, ao ajudar seus próprios inimigos, eu não gostaria de pensar no que poderia acontecer se tudo aquilo viesse à tona.

- Mas eu sim... – sussurrei, ainda contornando aquela suave coloração escura abaixo de seus olhos – Há quanto tempo você não dorme?

Era fato de que Mediadores não necessitavam de tantas horas de sono quanto um humano, no máximo uma ou duas horas por dia, ou poderiam escolher um único dia da semana e adormecer por cerca de cinco horas que suas forças já estariam revigoradas e em seu auge. Mas, Aidan... Aidan parecia não dormir tranqüilamente há semanas, e aquele seu estado preocupava-me.

Ele tentou sufocar aquele meu sentimento, garantindo-me que estava bem, mas eu sabia, ele estava sobrecarregado, cumprindo suas missões em Sillentya, e também fazendo visitas a esta mansão para trazer informações a Lucius.

- Desde que te deixei não consegui parar de pensar em como você estava, como você estava lidando com a separação, não sei ao certo como cheguei até aqui sem enlouquecer, cogitando cada hipótese, cada opção, e todas elas assustavam-me, Agatha, porque eu não sabia se você estava bem e segura.

- Esqueça isso. – pedi-lhe, mas Aidan não assentiu, então ele continuaria remoendo aquilo. Suspirei, alto demais, e acho que ele entendeu errado minha decepção. Afastou-me de si, libertando-me de seu abraço e levantou-se, estacando de costas para mim. Eu já devia estar acostumada, o passado sempre fora um empecilho quando o assunto era o nosso próprio futuro.

Ignorei seu aparente silêncio, levantando-me também e segurei em seu braço, virando-o para mim novamente. Encontrei seus olhos sombrios, levando minhas mãos até sua face, trazendo-o para perto de mim, até que nossos olhares se encontrassem e tornassem-se em algo tão íntimo e particular, uma linguagem silenciosa, sem palavras, mas que mesmo assim não escondia meus sentimentos por ele.

- Você não teve escolha, mas o que realmente importa é que estamos aqui e agora, juntos novamente.  O passado já não tem mais importância. Por favor, esqueça-o.

Ele compreendeu minhas palavras, compreendeu meus desejos secretos e o que eu mais almejava naquele momento: sua companhia, independentemente do que houve, independentemente do que possa acontecer. Eu estava certa do que precisava e do que queria, e lutaria com unhas e dentes se fosse necessário novamente.

Envolvi-o em um abraço, afogando de uma vez por todas aquelas dúvidas que o corroíam lentamente. Se ficássemos juntos, se pudéssemos superar os obstáculos que estavam por vir, então tudo ficaria bem. Já enfrentamos empecilhos antes, podemos enfrentá-los novamente. Porque naquele instante, eu podia ter certeza de apenas uma coisa: sobreviveríamos.

Nosso amor já se mostrou capaz de vencer as distâncias, que mesmo com uma dolorosa separação, ele não se abala ou diminuí, se eu tivesse que enfrentar o mundo para viver ao lado dele, que fosse, eu não hesitaria.

Sorri, exultante, quando ele retribuiu meu gesto, afundando seu rosto em meus cabelos, seus braços acalentando-me, exatamente como era, como costumava ser, exatamente como deveria ter sido se não tivéssemos sido separados um do outro.

- Perdoe-me, eu sei que não deveria remoer nosso passado, sei que deveria me alegrar por tê-la aqui, comigo, novamente, e acredite em mim, Agatha, não há nada que me faça desejar mais, que eu queira mais nesse momento do que ter a sua companhia.

Recostei minha face em seu ombro, esquecendo-me de todos os meus temores, se ainda havia a menor hesitação em Aidan, ela agora se esvaía, parecia que eu não seria capaz de conter tamanha felicidade.

- Está tudo enterrado agora... – sussurrei contra o tecido de sua camisa, segurando-o entre meus dedos – Eu quero... Quero recomeçar, mais uma vez, Aidan.

Ele depositou um beijo suave em meu pescoço e tornou a me aninhar em seus braços. Eu estava finalmente vivendo outra vez. Pensei que fosse vagar por aquela terra árida para todo o sempre, enquanto respirasse, até que meus dias se findassem... Mas estava enganada, e pela primeira vez, em meses, eu recebia a dádiva da vida novamente e estava livre de meu inferno particular. Estava com Aidan.

O que mais poderia importar ou me preocupar?

Despertei de meu estado de júbilo e êxtase, ao ouvir a maçaneta da porta ser girada e então, aberta em um rompante. Abri meus olhos – que até então se encontravam cerrados pela felicidade que me dominava – e reconheci cada traço que compunha o semblante dele.

O pânico dominou-me no mesmo instante, meu coração parecia ter congelado em meu peito, não batia. Cada músculo do meu corpo, cada terminação nervosa enrijeceu pelo temor. Aidan notou meu desespero repentino, tombou sua face para a figura que avançava lentamente pelo cômodo, os olhos baixos, um meio sorriso nos lábios e ele também enrijeceu, como se não acreditasse no que via, ou melhor, em quem via.

Seus braços tornaram-se pilastras de concreto ao meu redor, duros como pedra. Porque quem acabara de se juntar a nossa pequena reunião era Christian.

Christian que odiava o irmão, Christian que o havia jurado de morte, Christian que queria obter sua tão sonhada vingança. Christian que era dezenas de vezes mais poderoso que Aidan.

Minha mente esvaziou-se por inteiro, não restara um único pensamento, eles escaparam todos de mim como camundongos fugindo de uma ave de rapina. Estava enlouquecendo com meu desespero, com minha agonia e senti-a se espalhar lentamente por minha corrente sanguínea, devolvendo meus batimentos cardíacos, fazendo-os retornar abrupta e violentamente, bombeando o sangue por todo o meu corpo.

Vi quando, lentamente, Christian sustentou seu olhar, os olhos azuis e brilhantes tornaram-se opacos ao encontrar nossos rostos. Então seu semblante tornou-se lívido, sem cor alguma, sem nenhum traço daquele Christian que eu conhecera meses atrás, sempre relaxado, sempre brincalhão, sempre confiante.

Não, aquele Christian havia ido embora no mesmo momento que viu o semblante de Aidan e seus braços ao meu redor. E agora, em seu lugar, havia um novo Christian, um que me assustava. Um que me fazia congelar da planta dos pés à raiz da cabeça.

Choque, surpresa, descrença, incredulidade, todas essas emoções passaram por seu rosto, até que seus olhos estreitaram-se, ensombreceram, e então veio o misto de novas emoções: fúria, rancor, amargura, raiva e uma sede incontrolável por vingança.

Só então percebi, que ele cerrava os punhos, tensionava seus músculos, partindo para uma batalha de vida e morte, partindo para cima de mim e de Aidan, partindo para matar.


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Notas finais do capítulo

Tudo bem, quinze segundos para surtar: AHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH! AIDAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAANNNNNNNNNNNNN VOOOOLLLLLLTOOOUUUUUUUUUUUUU!!!!!!!!!!!!!

Pronto passou... *pigarro*


Ahhh essa música da Amy Lee ficou perfeita para esse reencontro! Eu já chorei tantas vezes ouvindo essa música... *abafem*


Bom, minha gente, é o seguinte, estou me recuperando da minha crise, como perceberam, até trouxe um MEGA CAPÍTULO GIGANTE DESSA VEZ! rsrsrsrsrsrsrs... Bom, também gostaria de agradecer a todos aqueles que me incentivaram a continuar e aqueles que me ameaçaram de morte também, e não deixaram que eu desistisse!


Todos vocês moram no meu S2 e foi pensando em todos vocês, que eu voltei atrás na minha decisão de abandonar a Saga. Obrigada mesmo, meus amores! Eu ainda não estou 100%, mas já estou um pouco melhorzinha da minha crise!


Conto com vocês para não deixar que minha autoestima chegue lá no zero negativo de novo, ou fique abaixo da camada de petróleo... kkkkkkkkkkkk'


Bom, quando eu terminar o próximo cap. pode deixar que eu retorno aqui (se bem que minhas aulas de noite na facul tão acabando comigo, se bem também que eu estou adorando estudar de noite!) *do contra*


Valeu mesmo, meus anjos!!!


Próximo capítulo, o primeiro embate da fase, Aidan ou Christian, quem será que leva a melhor? Será que a Agatha conseguirá fazer algo para impedir que ambos se matem?


Hmmmmmm... See you!!!

Beijinhos!!!