Saga Sillentya: Espelho do Destino escrita por Sunshine girl


Capítulo 17
XVI - A Sentença Final


Notas iniciais do capítulo

Mals pela demora, mas eu tava com muita preguiça mesmo...

Enfim, espero que gostem do capítulo e não me matem no final!

Boa leitura!!!



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Capítulo XVI – A Sentença Final

“Ó, você se importa?

Eu ainda sinto por você.

Ó, tão consciente!

De que o que deveria estar perdido está bem ali”.

“Eu temo que nunca, nunca encontrarei outra pessoa como você,

Sei que a minha maior dor ainda está por vir,

Nós nos encontraremos na escuridão?

Meu amor há tanto tempo perdido...”.

(Nightwish – Long Lost Love)

O sol mal havia nascido e todos já se reuniam no grande salão. Figuras em mantos vermelhos chegavam a todo momento, posicionavam-se, acomodavam-se em cada canto do espaçoso salão, assumindo seus postos como estátuas indiferentes de mármore.

Respirei fundo. Aquela sensação esmagadora somente se agravava conforme a hora se aproximava.

Eu sabia o que tinha que fazer. Eu sabia o que precisaria ser feito. Meu sacrifício.

Mal pregara os olhos na noite passada, atravessando a madrugada completamente insone e consciente de que o futuro de Aidan estava em minhas mãos.

Eu me encontrava ao lado de Ellian, em um dos cantos do imenso salão, tendo a Benjamin de meu outro, e isso me deixava alarmada.

Os dedos de Ellian envolviam meu braço, prontos para me afastar dali caso algo acontecesse.

Mas eu tinha certeza de que ele não tentaria nada, não com tantas testemunhas.

Crystal encarava-me com seus olhos oblíquos e traiçoeiros, do outro lado do salão, fazendo-me baixar a fronte e aguardar pelo fim daquele pesadelo.

Aidan foi um dos últimos a entrar, escoltado por um esquadrão de lutadores, nem mesmo os pesados grilhões haviam sido retirados de seus pulsos.

Assim que ele entrou em meu campo de visão, eu tive mais certeza ainda de que estava tomando a decisão certa. Seus olhos procuraram aflitos pelos meus, certificando-se de que eu estava bem, preocupados pelo meu bem-estar ali dentro.

Assenti para ele, enquanto Aidan era conduzido até os sete tronos elegantes posicionados um ao lado do outro.

E as sete ilustres figuras que os ocupavam entraram segundos depois, cessando os murmúrios, instaurando o temor e o silêncio.

Tão pouco eles se assentaram – os rostos máscaras indiferentes e muito bem compostas –, seus olhares acusatórios e indignados foram todos direcionados a Aidan.

O esquadrão dispersou-se, mas dois sujeitos permaneceram ao lado dele a fim de evitar que ele se envolvesse em uma confusão, ou tentasse alguma coisa.

Mas eu estava convicta de que Aidan não confrontaria as Tristezas novamente. Ele aceitaria seu destino, seja qual fosse, e eu deveria me assegurar de que o destino que ele queria para si naquele momento, não fosse concretizado.

Ducian fora claro, eu só deveria agir no momento certo, na hora ideal. Minha intervenção mudaria o veredicto, meu sacrifício salvaria a vida dele.

Contentei-me apenas em vislumbrar suas costas, e mesmo ali ele mostrava-se imponente, destemido, um guerreiro diante de seu exército inimigo e que mesmo assim não vacila, não demonstra medo.

Diante das sete e impetuosas figuras, Aidan demonstrava toda a sua ousadia, encarando-os, peitando-os.

Ducian encontrava-se no meio deles, era o mais sereno de todos, talvez porque soubesse que podia contar comigo para salvar a vida de seu amado filho da fúria das outras seis Tristezas.

Ainda vi os olhos de Crystal estreitarem-se pela mesma preocupação que a minha, ao ver o homem que ambas amávamos bem ali, a mercê de todos. De repente ela moveu-se e desapareceu de minha vista, juntamente de Benjamin.

Tentei ignorar esse fato, Ellian estava ao meu lado, ele me socorreria se eu precisasse.

Uma das figuras levantou-se, o que eu reconheci como sendo Hui Ling, porém, agora ele não se encontrava sozinho, tinha uma figura esguia bem ao seu lado, uma jovem com os mesmos traços orientais, a pele tão clara quanto porcelana e o cabelo negro estava preso em um coque elegante na cabeça. Percebi tarde demais que todas as Tristezas estavam acompanhadas, Crystal ao lado de uma linda mulher de cabelos avermelhados e Benjamin ao lado de um homem de pele bronzeada. Seus pupilos e futuros sucessores, concluí.

- Aidan Satoya, dê um passo à frente.

Os Mediadores que o flanqueavam moveram-se, um deles abriu as algemas pesadas de ferro que cativavam seus pulsos, e retirou-as para o meu alívio. Era tão bom vê-lo livre novamente, livre da opressão.

Entreabri os lábios enquanto o via esfregar meticulosamente os pulsos, deviam estar feridos pelos grilhões. Eu queria tanto abraçá-lo, correr até ele e apertá-lo em meus braços. Mas esse era um sonho impossível para mim, pelo menos naquele momento.

Aidan logo se aproximou dos sete tronos, mesmo àquela distância eu podia ver a tensão enrijecendo seus músculos, comprimindo-os contra o tecido de sua camisa, e abruptamente, meu coração acelerou ao vê-lo tão perto de seus possíveis carrascos.

O homem assentou-se novamente, e então foi a vez de outro homem – que acompanhava Benjamin – manifestar-se.

- Aidan, você nega as acusações de traição em último grau e conspiração com o inimigo?

O homem de olhos escuros e pele morena descansou o queixo em sua mão, aguardando pela resposta do réu. Meus batimentos reverberavam em meus ouvidos, acelerados, descompassados.

Sentia-me engasgar e sufocar lentamente, pelo menos até que Aidan dirigiu-se a ele, baixando sua fronte e abafando sua voz:

- Não, eu não nego.

Murmúrios e sussurros tomaram todo o local, e logo foram aquietados pelas Sete Tristezas.

- Então, não nega o fato de ter se envolvido com a garota, filha de Stefano e neta de Frederich?

Mais uma vez, a resposta dele me deixou sem qualquer reação.

- Não.

Os olhos escuros do homem estreitaram-se de leve, estranhei o fato de que Ducian ainda não havia se pronunciado.

- Está ciente das conseqüências de seus atos, Aidan? – ele perguntou, intimidador, e mesmo que a pergunta não estivesse direcionada a mim, sentia-me como ele, obrigada a responder cada uma delas.

- Sim. – respondeu ele, e presumi que tentava por um fim em toda aquela palhaçada de uma vez por todas.

- Então, devo chegar à conclusão de que você conhecia todos os riscos e a provável e possível punição que o aguardava, estou certo?

A voz dele era monótona, sem vida, quase como ele quisesse que tudo aquilo terminasse o mais depressa possível. Que eles simplesmente evadissem a parte formal e prosseguissem com seu castigo.

Naquele momento eu tive a certeza de que Aidan não se defenderia, não lutaria por sua vida.

E tudo por minha causa. Tudo porque ele planejava levar a culpa por absolutamente tudo.

- Sim, eu conhecia.

Os olhos estreitados do homem de repente estavam irônicos.

- E mesmo assim levou esse ato repugnante adiante?

Para o meu alívio, Ducian resolveu intervir, colocando-se de pé e pronunciando-se pela primeira vez desde que o julgamento começara. Mostrando todo o seu poder, e porque ele era a mais influente de todas as Tristezas.

- Devo relembrá-lo, Gustav, de que o ato em si não foi consumado. Portanto, vossa sagrada lei continua intacta.

- Meras formalidades nesse caso, Ducian. – retrucou, abanando suas mãos em pleno ar, como se demonstrasse tédio.

Os olhos de Ducian, a máscara impecável que naquele momento cobria seu rosto, nada me sugeriam, nada me remetiam.

- Nesse caso não são, não. A menina continua tão pura quanto no dia em que foi concebida e trazida por sua mãe humana a este mundo. Portanto, não houve qualquer tipo de violação nesse quesito.

O homem sacudiu a sua cabeça morena, ele claramente havia perdido a batalha para Ducian, as demais Tristezas o apoiavam, e a derrota selou seus lábios.

Foi a vez de outra pessoa manifestar-se e assumir o interrogatório, uma mulher de cabelo louro-claro e olhos tão azuis que era impossível decifrá-los.

- Aidan, há quanto tempo você vem contatando Lucius, e quando o primeiro encontro foi marcado?

Aidan respondeu a ela sem hesitar nem vacilar:

- Foi há pouco mais de dois meses, poucos dias depois de retornar de minha missão no nordeste do continente americano.

Ela gesticulou com os dedos magros, seu cabelo cintilava sob as chamas das velas nos candelabros.

- Você se refere à missão na qual conheceu essa jovem – ela apontou para mim, fazendo-me encolher, enquanto sentia o peso de tantos olhares sobre mim –, e à mesma missão na qual fracassou em deter um desertor de iniciar o ritual do Wayeb, previsto como os cinco dias sem nome do calendário Maia?

Arfei, como eles poderiam ter tomado conhecimento disso?

- Sim, eu me refiro à ela.

Novamente o salão foi tomado pelos murmúrios. As Tristezas pronunciaram-se, exigindo silêncio.

- Aidan, você compreende que seu fracasso na missão pode estar relacionado a aquela jovem. Seu envolvimento com ela prejudicou o seu desempenho como caçador.

Dessa vez, a voz de Aidan subiu algumas oitavas, alterando-se, enquanto ele abandonava a fachada serena e assumia outra um pouco mais hostil.

- Não, ela não teve nada a ver com isso. Se falhei, o erro foi inteiramente meu. Agatha não teve nada com isso.

 A mulher de cabelos claros arqueou uma de suas delicadas sobrancelhas, pondo em dúvida o argumento que Aidan tentava desesperadamente manter.

- Talvez a garota tenha contribuído, mesmo que indiretamente para seu fracasso. Mas, isso é irrelevante, por ora. Continue, Aidan, conte-nos o motivo de ter procurado Lucius e Ephemera.

Aidan pareceu relaxar assim que as acusações pesaram todas sobre ele mais uma vez. Como ele podia estar tão aliviado enquanto assumia a culpa por tudo? E somente para me livrar do foco da fúria das Tristezas.

- Estava temeroso de que Sillentya descobrisse a respeito de Agatha, não queira de forma alguma que vocês a encontrassem, então cheguei à conclusão de que deveria colaborar para que Lucius vencesse essa guerra e não Sillentya.

Uma figura levantou-se de seu trono, parecendo-me extremamente ofendida e ultrajada. Ducian nem mesmo se moveu para acudir o filho.

- Então, quer dizer que você se aliou aos nossos inimigos somente para proteger a garota?

- Sim, essa foi a minha única motivação.

Um homem que se mantivera calado até aquele momento pronunciou-se pela primeira vez, estreitando seus olhos amendoados.

- E que tipo de informações você passou a Lucius? Como se davam esses encontros?

Aidan respondeu, sem hesitar:

- Em Ephemera. E passei todo o tipo de informação que interceptava. Tudo o que poderia ser útil a Lucius e aos demais Elementais.

O mesmo homem entrelaçou seus dedos, pensativo.

- Aidan, gostaria de lhe fazer uma proposta.

Ducian e eu não encaramos com bons olhos as palavras daquele sujeito. Talvez porque ele estivesse interferindo em nossos planos. Mesmo assim, todos ouviram suas palavras, atentamente. Ansiosos por saber o que aquele estranho estava tramando.

- Gostaria de negociar a redução de sua punição, e para isso basta que você entregue a posição exata de Lucius e quantos Elementais estão com ele nesse exato momento.

Meus olhos arregalaram-se por reflexo. Aidan poderia ser salvo, sem o meu sacrifício, mas para isso ele teria que entregar todos os meus semelhantes. Não, ele não podia aceitar aquela proposta!

Meu coração acelerou em meu peito, instintivamente, esperando pela resposta de Aidan, e rezando para que ele não aceitasse. Mas aquele sujeito não parecia disposto a perder aquele seu trunfo e fez questão de pressionar Aidan:

- Pense bem, caçador, estou lhe oferecendo uma chance única. Basta que entregue Lucius e seus aliados, e então, você está livre.

Ducian estava tão tenso quanto eu, seus dedos cravavam-se no braço do trono, e ele fazia menção em se levantar e calar aquele homem atrevido que ousara interferir em seus planos, mas o próprio Aidan foi quem respondeu a ele, acalmando tanto a mim quanto a Ducian.

- Não, não entregarei Lucius. Façam o que quiserem comigo, mas vocês não tirarão mais vidas inocentes através de mim. Acabou-se o tempo em que eu os servia com lealdade e devoção, e acreditava que eliminando os descendentes de Vírsico estava construindo um mundo melhor, porque a verdade é que não estava.

Aidan direcionou os seus olhos para todos os que estavam presentes ali, discursando com todos eles, tentando dissuadi-los, comovê-los. Mas não era tão simples assim.

- Eu precisei testemunhar por mim mesmo, ver o quanto os Elementais sofreram com tantos anos de opressão e perseguição para ter meus olhos abertos...

De repente, seu semblante tombava para trás, seus olhos procuravam pelo meu semblante e eu derreti sob aquele olhar tão terno e preocupado.

- Eu precisei ver de perto o sofrimento deles, a história repleta de tragédias e perdas que cada um deles carrega para ver o quão errado estava. Essa guerra não é necessária, muito menos correta. – encerrou ele, tornando a discursar para todos os Mediadores ali.

- Aidan... – sussurrei, completamente dominada pela fascinação. Ele estava se arriscando para defender a minha raça, defender os meus semelhantes e tentar provar o quão cruéis e impetuosas as Sete Tristezas haviam sido em todos esses séculos de dor e sofrimento para o meu povo.

Tornei meus olhos para os sete tronos e para as sete figuras que se assentavam sobre eles, vendo o sujeito que agora pouco ainda propunha uma barganha para Aidan, relaxar em seu trono, nada abalado por sua recusa.

A verdade estava clara para mim, se não fosse através de Aidan, eles encontrariam outra maneira de destruir Ephemera.

- Devo supor que nada o fará mudar de opinião a respeito disso, que pena, você poderia ter salvado sua vida, Aidan.

Ele baixou o semblante sereno, talvez no fundo fosse o que ele mais desejasse: ver-se livre daquele fardo de uma vez por todas, eu podia visualizar o menino que presenciara os horrores da guerra há 147 anos atrás bem ali, desejando a liberdade, almejando por ela.

Mesmo que essa liberdade viesse apenas através de sua morte...

Então, finalmente, foi a vez de Lorde Ducian se pronunciar. Levantando-se de forma elegante e direcionando todo o cinismo de seu olhar para mim, ele caminhou tranqüilamente até a figura de Aidan, colocando-se à sua frente.

Como um pai observa o seu filho, como um artista observa a sua escultura, a sua obra-prima, Ducian o observava naquele momento.

De certa forma, eu podia ver o quanto Aidan era importante para ele, e podia até mesmo pensar que de fato ele o amava, como um pai ama seu filho, como um pai devota tudo de si nele, seus sonhos, seus planos.

Mas os sonhos de Ducian eram negros, seus planos sombrios. E nada mais.

Deliberadamente, Ducian levou uma de suas mãos até o ombro de Aidan, usando de todo os eu talento para encenar e finalmente se pronunciou:

- Meu filho, meu amado filho! Quando o escolhi dentre tantos outros humanos para ser meu sucessor, pensei que tivesse feito a escolha certa, a primeira em séculos de minha existência. Todos aqui presentes são testemunhas de meu afeto e de minha admiração por ti, e mesmo assim, mesmo tendo o criado como meu próprio filho, mesmo tendo lhe acolhido, educado, treinado noite após noite, dia após dia para que se tornasse no predador perfeito, você vira as suas costas para mim e me apunhala dessa maneira.

“Quando seu irmão o fez, eu até mesmo compreendi, afinal, aquele ingrato jamais demonstrou o mínimo de afeto por mim, o mínimo de gratidão, mas você, meu filho, você eu não posso aceitar”.

- É tão difícil assim aceitar que eu tenha me voltado contra você, Ducian, ou seria por que você perdeu o seu amado e obediente cãozinho?

Ducian cerrou os olhos azuis e desviou o rosto como se tivesse acabado de ser esbofeteado por Aidan. Por que ele gostava de sustentar aquela auréola em cima de sua cabeça? Ninguém acreditava em uma única palavra que saía de sua boca, mas todos engoliam o seu cinismo. Todos tinham que engolir, a não ser Aidan que agora o desafiava pela primeira vez.

- Ainda faz esse tipo de julgamento a respeito de mim. – vociferou ele, enojado – Bastardo! Ancora ne pentirete!

Era a primeira vez que via Ducian perder a sua compostura, ou pelo menos, fingia perder.

- Não, Ducian, eu não me arrependo de mais nada que não seja ter lhe confrontado antes. – murmurou Aidan, calmamente, fazendo com que o pai adotivo estreite os olhos e então, sorria, muito que discretamente.

Claro que ele sorria, sabia que logo, logo teria Aidan em suas mãos novamente. O que ele não sabia era que Lucius estava a caminho e o tiraria daqui, meu único consolo.

- Dêem prosseguimento ao julgamento. – murmurou Ducian, sem esboçar emoção alguma.

O interrogatório seguiu-se após isso, Aidan respondia tranqüila e convictamente a cada pergunta, sempre atraindo os holofotes sobre si, sempre encontrando algum jeito de me tirar do olhar cauteloso e desconfiado das Tristezas.

Foram horas difíceis e atribuladas para mim.

Por saber que estava chegando a hora de interferir.

Por saber que minha vida estava por um fio.

Por saber que não havia qualquer esperança para mim...

- Nós, as Sete Tristezas, agora nos recolheremos para deliberar o futuro do réu em questão e decidir o veredicto. Dentro de uma hora e meia, retornaremos ao julgamento para anunciar sua punição e então, executá-la. – anunciou uma das sete figuras em vermelho assentadas sobre o trono.

Depois, eles já se retiravam, seguindo em uma formação perfeitamente disciplinada até uma das portas duplas nos fundos do grandioso salão, desaparecendo de nossas vistas em poucos segundos.

O silêncio já não mais existia. Muitas outras figuras retiravam-se também, apenas eu permanecia ali, assistindo enquanto Aidan era acorrentado mais uma vez.

Não contive meus impulsos, simplesmente saí de perto de Ellian – minha única proteção ali dentro no momento – e corri até ele, ignorando os olhares confusos dos dois Mediadores que o escoltavam.

Assim que me encontrei em seus braços, assim que o envolvi em um abraço sufocante, tudo pareceu aquietar-se. Tudo parecia perder sua importância.

Aidan devolveu meu abraço, o máximo que pôde, já que seus pulsos estavam acorrentados por pesadas algemas de ferro, unidas por uma grossa corrente.

Seus lábios encontraram o alto de minha cabeça e eu cerrei meus olhos, ainda mais certa de que estava tomando a decisão correta, a única talvez que já tenha tomado em minha vida.

- Estou com tanto medo... – sussurrei, apertando meu rosto contra seu peito.

- Eu sei, mas não precisa se preocupar, tudo dará certo no fim para você.

Afastei-me dele, chocada e ofendida. A vida dele não importava mais que a minha? Afinal, o que a minha mera existência significava perto da sua?

- Como pode pensar dessa maneira?

Aidan afagou meu rosto, lançando-me um olhar tão terno quanto repreensivo.

- É só o que importa para mim, você, Agatha.

Engoli o desejo insanamente grande de chorar que naquele momento me consumia. E relutei em me separar dele quando um dos Mediadores que o escoltava agarrou meu braço, puxando-me para longe dele.

Então, Ellian aparecera em meu socorro mais uma vez, repousando sua mão no ombro do sujeito e assentindo para ele:

- Está tudo bem, Carlos, eu vigio esses dois.

Primeiro ele estreitou os olhos, claramente desconfiando das intenções de Ellian, mas depois deu de ombros e deu meia-volta, deixando nós três ali, no meio do salão que ainda esvaziava pouco a pouco.

Tornei minha atenção para Aidan, vendo-o olhar Ellian de maneira estranha, toquei seu rosto, como que para tranqüilizá-lo.

- Está tudo bem – sussurrei, abafando minha voz ao máximo –, Ellian é de confiança. Ele é um informante, Aidan.

Mesmo que Aidan mantivesse toda a sua atenção focada em Ellian, depois de ouvir minhas palavras, ele relaxou um pouco, mas não antes de lançar um olhar cheio de segredos para ele, um que tudo dizia sem nem mesmo que ele precisasse proferir as palavras: um pedido silencioso para que Ellian cuidasse de mim.

Ambos assentiram discretamente e Aidan finalmente tornou a me fitar. Quando seus olhos encontraram os meus novamente estavam cheios de uma aflição inimaginável.

Eu queria tanto dizer a ele que tudo ficaria bem... Pelo menos para ele.

Que em breve, ele estaria livre. Lucius viria buscá-lo. Talvez, fosse tudo o que eu pudesse fazer por ele naquele momento, acalmar seu coração e sua alma.

- Aidan, Lucius está a caminho. Ellian o contatou e contou sobre a situação, eles estão vindo...

Aidan buscou o semblante de Ellian como para que confirmar. Quando ele assentiu, o brilho da esperança preencheu seus olhos castanhos.

- Se isso é verdade – começou ele, envolvendo minhas mãos –, então ele virá buscá-la.

Errado, pensei. Mas disfarcei, assentindo. Aidan não poderia nem mesmo suspeitar do que eu e Ducian estávamos planejando.

Ele sorriu um pouco, tomado pela ideia de que em aproximadamente um dia e meio Lucius estaria aqui, só que não para me salvar, pois já seria tarde demais para mim, mas Aidan poderia ser salvo.

Isso era tudo o que me motivava, o que me consolava naquele inferno.

Abracei-o uma última vez, e não relutei quando Ellian puxou-me para que pudessem levar Aidan para sabe-se lá aonde.

Uma hora e meia de espera...

Uma hora e meia de agonia e tormento para mim...

Assentei-me um pouco, estava tão tonta. Ellian trouxera-me um pouco de água, mas eu nem mesmo conseguia bebê-la. Tudo era nebuloso e negro naquele momento.

O futuro de Aidan, o meu futuro, nossos destinos, Lucius e Ephemera, o rumo que essa guerra tomaria.

Faltavam poucos minutos para que o prazo estipulado pelas Sete Tristezas terminasse, e eu me sentia cada vez mais debilitada e baqueada a cada maldito segundo que se arrastava.

Quando Ellian rebocou-me consigo para o salão novamente, eu não resisti. Sabia que precisava agir, e rápido se quisesse salvar a vida de Aidan.

Quando retornamos, todas as figuras já assumiam suas respectivas posições, Aidan era trazido até diante dos sete tronos – ainda desocupados – novamente, Benjamin portava nos lábios um sorriso vitorioso enquanto que Crystal encontrava-se abalada demais, assim como eu, por saber exatamente o que esperar do veredicto das Sete Tristezas.

E quando eles finalmente retornaram, a formação perfeita e disciplinada encaminhando-se tranqüilamente até seus tronos luxuosos, assentavam-se tranqüilamente, e cessavam todos os murmurinhos presentes ali, percebi que Ducian portava nas mãos um pergaminho, congelei instantaneamente, criando raízes onde estava, incapaz até mesmo de respirar.

Dessa vez, as algemas não foram retiradas dos pulsos de Aidan, e apenas Ducian levantou-se, abriu o pergaminho e leu seu conteúdo, fazendo meu coração acelerar em meu peito:

- Por violar as sagradas e incontestáveis leis que regem a sociedade de Sillentya, por se aliar ao inimigo e levar informações preciosas até ele, rebelar-se contra seus superiores e atentar contra a vida de seus próprios semelhantes, nós, as Sete Tristezas, concluímos que o réu, Aidan Satoya, é culpado de todas as acusações anteriormente citadas e deverá ser executado. Assim, a lei deverá ser aplicada de forma justa.

Baixei os olhos, abalada demais. Agora sim, estava sem saída. Sentia-me tão tonta, e ainda assim podia captar a tensão que havia se instaurado naquele salão. Todos cochichavam entre si, murmuravam algo inteligível, e o olhar agoniado de Crystal fora a única coisa que eu conseguira captar, antes que uma nova escolta cercasse Aidan, que nada esboçava, nada dissera sobre o seu veredicto.

Minhas mãos tremiam, meu corpo convulsionava. A boca de meu estômago retorcia-se, revirando-o pelo avesso, deixando-me ainda mais baqueada. Minha respiração estava pesada, meus pulmões comprimiam-se por mais ar, e mesmo assim, eu sufocava.

Como se estivesse afundando em areia movediça, lentamente e sem qualquer chance de salvação.

Mas essa era a minha escolha, não era? Sacrificar minha vida por ele era a minha única chance de recompensá-lo por todo mal que lhe fiz, salvar sua alma, seu corpo, sua vida, era minha forma de redenção.

Nada mais importava para mim.

Sustentei meu olhar, vendo Aidan já ser conduzido para a execução. De acordo com Ducian, ele seria asfixiado até a morte, ou seu pescoço seria quebrado primeiro. Um dos vários métodos de tortura e execução utilizados em Sillentya para punir seus traidores através dos séculos.

Um método primitivo e ultrapassado, mas que mesmo assim, roubaria meu amado de mim.

Vi quando os lutadores o cercaram, atentos para o caso dele resistir. Ducian observava a tudo, imóvel.

E quando um deles aproximou-se contendo uma coleira pesada de ferro nas mãos, eu realmente me desesperei. Mas ainda não era a hora!

Segurando em seus ombros, eles o forçaram a se ajoelhar no piso, enquanto um dos Mediadores encaixava o colar em seu pescoço e prendia seu fecho.

Assisti, aterrorizada, enquanto vagarosamente o carrasco apertava a coleira, já dificultando sua respiração, utilizando-se de um mecanismo ele pressionava o colar de ferro contra seu pescoço cada vez mais.

Vi que àquela altura, ele nem mesmo conseguia respirar mais.

Havia chegado a hora.

Enfim...

Para o meu suplício, para o meu eterno tormento, a hora de salvar a vida de Aidan havia chegado.

Sem pensar duas vezes, sem hesitar ou vacilar, saí do lado de Ellian, lançando-me em direção às Sete Tristezas, vendo o sorriso vitorioso nos lábios de Ducian.

Estaquei, vendo seus olhares serem todos direcionados a mim, e ainda com a respiração entrecortada, o coração na mão, e a alma retalhada, eu selei meu destino, de uma vez por todas:

- Parem! – berrei, espalmando minhas mãos, tombando a face para cada rosto presente naquele salão, vendo o terror e a incredulidade estampada nos olhos de Ellian, reuni forças mais uma vez e novamente, clamei pela vida de Aidan – Parem, não podem matá-lo!

Atuando como o mais talentoso dos atores, Ducian elevou uma de suas mãos para o carrasco, pedindo para cessar a punição, e Aidan respirou novamente, para o meu alívio.

Com os olhos ardendo pelas lágrimas, fitei cada rosto cuidadosamente esculpido, cada figura elegantemente assentada ali, diante de mim e mais uma vez, avancei por aquele caminho tortuoso e atribulado, caminho de dor, sofrimento e lágrimas que jamais param de verter.

- Não podem puni-lo!

- E por quê não? – perguntou-me a mulher de cabelo louro-claro, estreitando seus olhos azuis – Aidan é culpado, ele conhecia nossas leis quando decidiu se aliar ao inimigo!

- Seria bom ouvir o que a menina tem a dizer, Olívia, só desta vez. – interveio Ducian a meu favor. Não o agradeci por isso. Como poderia?

Lançando o mais cínico de seus olhares, Ducian instigou-me a continuar com a farsa:

- Diga, criança, o que você tem a partilhar conosco?

Tentei acalmar meus batimentos, estabilizar minha respiração ofegante, e reunir mais forças para acabar com aquilo de uma vez por todas. Mas a voz de Aidan atrapalhou-me, tirou-me toda a concentração, e as palavras fugiram todas de mim.

- Agatha, não... – suplicou ele, aterrorizado, já compreendendo o que eu estava prestes a fazer.

- Perdoe-me... – sussurrei para ele, vendo seu rosto ser dominado pelo pânico, e então, voltei a me dirigir às Sete Tristezas – Vocês não podem aplicar a punição máxima em Aidan. – murmurei, mais decidida do que nunca a salvá-lo.

 - E por quê, jovem criança? – questionou Ducian, entrelaçando seus dedos, satisfeito.

Baixei os olhos, hesitando. Cerrei os punhos e despejei o discurso que ensaiara há tantas horas:

- Porque Aidan não é culpado de nada. Porque eu o forcei a traí-los, eu o instiguei a se aliar a Lucius e se tornar um de seus informantes...

Respirei fundo, puxando o máximo de oxigênio que conseguia, ainda assim, a sensação sufocante não apaziguava, não diminuía.

- Porque eu seduzi Aidan e o obriguei a se voltar contra todos vocês. Ele não planejou nada, mas eu sim.

- Não! – Aidan berrou – É mentira! Ela não teve nada a ver com isso... Ela...

Um dos lutadores que o cercava calou-o, socando-lhe o abdome, fazendo-o perder o fôlego.

- Isso é verdade, menina? – indagou a mesma mulher loira, Olívia era seu nome.

Assenti silenciosamente, ciente de ter acabado de pular do precipício. Ciente de estar sem saída, sem qualquer chance de salvação.

- Nesse caso – começou Gustav, o mentor de Benjamin – a punição já não é mais válida, muito menos justa. Ducian, o que faremos agora?

A chama da vitória ainda dançava nos olhos gelados do ancião, que não se esforçou para disfarçá-la ao se levantar de sua cadeira e alterar seu olhar maligno entre mim e Aidan. Afinal, ele havia conseguido.

Ele havia vencido no fim.

E mesmo assim, quando sua voz ecoou em meus ouvidos, ela nunca me trouxe tanto alívio, tanta paz, apenas por saber que Aidan seria liberto daquele sufoco.

- Nesse caso, devemos aplicar sabiamente nossa justiça. Se Aidan não foi o mentor por trás dessa traição, e sim essa menina, então não há dúvidas de que ambos devem ser castigados.

- E que tipo de castigo você sugere, Ducian? – questionou Hui Ling, impaciente e desejando acabar logo com toda aquela palhaçada.

O ancião cerrou seus olhos azuis e brilhantes tranqüilamente, apenas fingindo ponderar. É claro que ele sabia o que faria. Ele havia planejado isso desde o principio, desde que soube de nosso amor, meu e de Aidan.

- Pensem bem, meus caros, se essa menina já foi capaz de manipular e cegar a um de nossos mais leais e fiéis servos, ainda com seus poderes suprimidos pelo selo, quero que imaginem do que ela será capaz se algum dia conseguir despertá-los.

“Essa menina, agora, passou a ser a nossa maior ameaça diante de meus olhos cansados e experientes”.

“Não há dúvida de que Aidan foi um tolo por se deixar levar por seus encantos e por sua aparente ingenuidade, mas nós devemos permitir que uma criatura tão traiçoeira quanto essa continue a contaminar os corações de nossos caçadores? Isso é o que lhes pergunto agora”.

As demais Tristezas entreolharam-se, compreendendo as palavras de Ducian. Agora, eu era a maior ameaça diante de seus olhos. Havia corrompido o coração de Aidan, havia o arrastado até o lado inimigo, e deveria ser eliminada custe o que custasse.

Todas as Tristezas assentiram, e Aidan ainda tentou reagir, ainda tentou desmentir minhas palavras. Mas já era tarde demais. Eu era a ré. Eu era culpada, indubitavelmente.

Quando Ducian tornou a se assentar, vangloriando-se de seu discurso venenoso no qual havia direcionado os holofotes todos para mim, e tornado-me sua inimiga número um, as Tristezas concordaram com seus argumentos sem nem mesmo questionar se aquilo era verdade ou não.

Não fiquei surpresa por isso, muito menos ofendida. Era tudo o que eu queria, de qualquer forma.

Quando fui arrastada de volta para um dos cantos do salão, enquanto as demais Tristezas ainda ponderavam sobre o que fazer comigo e com Aidan – agora que ele não levava a culpa por tudo sozinho – nem mesmo me importei com a perigosa proximidade de Benjamin de mim.

Nada mais importava para mim.

E finalmente, as sete maiores autoridades ali se pronunciavam novamente, definindo o meu destino, e definindo o novo destino de Aidan.

- Como a punição máxima já não pode ser mais aplicada ao réu, decidimos que ele será castigado severamente, mas não executado. Sua sentença foi redefinida e mudada para setenta açoitadas, Aidan Satoya, conforme mandam as leis que regem nossa sociedade.

“Quanto à garota, ficou claro para nós que ela também representa uma ameaça em questão, e por isso será submetida ao segundo ritual de trancamento, amanhã pela manhã”.

O Mediador fechou o pergaminho, voltando ao seu posto. Eu ainda estava entorpecida demais para entender que o castigo de Aidan seria aplicado agora, na frente de todos, para humilhá-lo ainda mais e mostrar aos demais o que acontecia com traidores.

Só despertei quando os braços de Benjamin envolveram minha cintura e meu pescoço, seu corpo quente encostou-se às minhas costas e seus lábios sussurraram em meu ouvido, seu hálito quente chocou-se contra a pele de meu pescoço:

- Aprecie o espetáculo...

Tornei a fitar Aidan, vendo-o ser conduzido até duas colunas grandes, uma ao lado da outra, que sustentavam o anguloso teto.

Suas algemas foram soltas, mas somente para que ele pudesse ter os pulsos acorrentados às grossas pilastras. De onde estava, eu podia observar tudo. Todos podiam.

E vi quando um dos Mediadores rasgou sua camisa com um único movimento, expondo suas costas, enquanto outro se preparava, tendo um açoite de ferro nas mãos.

Setenta açoitadas. Setentas vezes em que as pontas afiadas do chicote encostar-se-iam em suas costas nuas.

Dessa vez, não contive meu desejo de chorar. Simplesmente cedi enquanto o castigo severo era aplicado.

O Mediador afastou-se, lançou o braço para trás, carregando o chicote consigo e então, açoitou-o pela primeira vez.

As lágrimas escorreram de meus olhos, e eu sobressaltei-me, sentindo a dor que ele sentira. Mordi o lábio inferior, testemunhando açoite após açoite, o quanto Aidan estava suportando. Ele nem mesmo se permitia demonstrar a dor. E mantinha-se ali, suportando cada chibatada, suportando com determinação e coragem cada vez que o chicote encontrava sua carne violentamente.

Segurei o braço de Benjamin, enterrando minhas unhas em seu manto, desejando fechar os olhos e não ver mais nada. Mas, mesmo assim, o som do açoite rasgando sua carne, arrancando-lhe todo o fôlego, deixava-me completamente baqueada e imóvel, como uma estátua.

A tortura ainda estava longe de acabar, para o meu tormento, que agora se estendia diante de mim como um caminho negro, repleto de espinhos e armadilhas.

Eu havia salvado a vida de meu amor, e em troca oferecera a minha alma e o meu corpo.

As provações ainda não haviam terminado, para o meu desgosto.


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Notas finais do capítulo

ù.ú Tadinho do Aidan! Ainnn como eu sou má!!!!

E a Agatha finalmente salvou a vida dele, mas como nem tudo é perfeito, Aidan sofreu com o castigo mesmo assim!

E agora?

Próximo capítulo, o mais triste da fase inteira, preparem os lenços, Aidan estará tão debilitado e fraquinho, Agatha o visitará uma última vez na masmorra para dizer o último adeus ao seu amado!

E... o próximo será o antepenúltimo! Sim, pq então teremos mais 2 capítulos + o epílogo que será especial!

PS: Se tiver algum errinho, mais tarde eu volto pra corrigir, pq digitei demais e agora tô meio tontinha... hehe...

Beijinhos!!!!