Heirs of the Light escrita por Blue


Capítulo 2
I


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Espero que os poucos que leram o prólogo tenham gostado. Sei que não é muito esclarecedor, mas tentarei iluminar quaisquer dúvidas nesse capitulo.
Espero que gostem.
Enjoy!!



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Naquela manhã, dentro de um pequeno chalé localizado em um vilarejo pitoresco no interior da Inglaterra, uma jovem bruxa vivia com sua mãe. A menina acordava de um sonho estranho, com o suor fazendo seu cabelo dourado grudar em sua testa, seu gato preto Salem ronronava em seu colo, tentando acalmá-la, ou talvez tentando prosseguir com seu sono duramente interrompido pelo salto de sua dona. Quem era aquela mulher? Profecia? Guerra? E o que diabos era uma projeção astral? Eram os pensamentos que serpenteavam os pensamentos da loira enquanto repassava as imagens em sua mente, acariciando a cabeça do felino em seus braços.  

Em algum momento, a menina chutou as cobertas para longe e iniciou sua rotina matinal no único banheiro da casa. Um longo banho quente foi o que precisava para esquecer seus pensamentos ruidosos e se lembrasse que logo estaria em Hogwarts, explodindo sua mente em animação. Estava com saudades de seus amigos e do seu quarto no castelo milenar. Depois de se arrumar com um suéter confortável, jeans e tênis - roupas trouxas que a tornariam imperceptível no meio da multidão da estação - ela se dirigiu a cozinha, lá sua mãe a esperava. 

A mãe de Charlotte era extremamente parecida com a menina, talvez com um rosto menos fino e mais anguloso, repleto de marcas de expressão que ganhou com o tempo. Seus cabelos loiros e olhos castanhos esverdeados eram iguais, além do sorriso de covinhas. Sorriso esse que Charlotte se diferenciava ao apresentar os dois dentes de frente ligeiramente maiores que os demais, a deixando com dentinhos de coelho. Violet Black se encontrava com um longo jornal flutuando em sua frente, os olhos encobertos por óculos de grau quadrados passeavam rapidamente pelas letras miúdas e em suas mãos pálidas exibia uma xícara de chá.  

— Bom dia. — a mais nova cumprimentou a mãe com um beijo no rosto.  

— Bom dia, querida. — ela deu um sorriso tranquilo ao desviar os olhos alongados do jornal.  

Enquanto Charlotte arrumava sua xícara de chá com leite, ela observava a mais velha, que distraidamente mexia em seu cordão enquanto lia. O cordão continha um anel dourado simples, que saiu do seu anelar esquerdo em uma noite chuvosa de 1981. O pai de Charlotte havia sido acusado de matar inúmeros trouxas, o amigo e delatado James e Lily Potter. Um dia antes desse acontecimento, a casa em que moravam havia sido incendiada por Comensais da Morte, os separando antes que toda a tragédia se desenrolasse. Por anos a fio, sua mãe acreditou que Sirius era um assassino frio e cruel, mas mesmo que fugissem a vida inteira de pessoas cruéis - por vezes passando anos em vilarejos trouxas com sua amiga de longa data, Marlene McKinnon - ela nunca deixou de usar sua aliança, ou ao menos retornou ao seu nome de solteira. Charlotte sabia que o sobrenome de irmão de sua mãe ainda pulsava dolorosamente em sua mente. Potter. James foi um ótimo irmão mais velho, que, pelo que Violet contava, mesmo quando ela descobriu ser adotada, ele nunca saiu do seu lado; mesmo que isso significasse seguir o seu desejo de nunca levar sua descoberta aos seus pais. Ela sabia também que sua mãe sentia uma culpa profunda por nunca ter conhecido seu sobrinho, Harry Potter, mas ela também nunca o quis colocar em perigo. E temia que o garoto a odiasse por nunca ter aparecido. 

—Preparada para o seu quarto ano? — Violet perguntou, interrompendo seus pensamentos que foram longe demais. 

—Claro... —ela comeu um bolinho — Por que não estaria? — perguntou com a boca meio cheia, arrancando um olhar de reprovação da mãe. 

—Não sei... O quarto ano costuma ser emocionante. —ela riu baixinho depois de desfazer a carranca, como se curtisse uma piada interna, deixando a loira mais nova confusa. — Já está com suas coisas prontas? — perguntou enquanto se levantava e Charlotte assentiu levemente ao indicar seu malão arrumado ao pé da porta. — Bom. Assim que terminar vamos sair. 

— Chave de portal? – a mais nova perguntou bebendo de sua xícara.  

— Hoje vamos da maneira trouxa, não quero chamar atenção. — Violet desviou seus olhos, fechando o jornal. Charlotte percorreu seus olhos pela mãe, reparando em seu sobretudo preto, seus cabelos ondulados presos em um rabo de cavalo na altura da nuca e uma maleta preta ao lado de seus pés. Um vislumbre de um olhar determinado não passou batido pela Black. 

— O que você vai fazer? — a pergunta direta da mais nova arrancou uma risada sem humor de Violet. 

— Engano meu achar que você não descobriria. — ela riu sob o olhar sério da filha. — Eu pensei sobre o que me disse nas férias. 

As palavras da mulher despertaram as lembranças de seus últimos dias. Elas discutiram quase todos os dias até o dia que cansaram e se renderam a não tocar mais no assunto. No ano letivo passado, Charlotte havia feito a coisa mais imprudente de sua vida: Tirar a prova sobre a inocência de seu pai. Pessoalmente. Seu terceiro ano foi emocionante em vários aspectos, desde sua repentina amizade com os grifinórios Harry, Rony e Hermione – que diga-se de passagem não terminou bem — até seu encontro com seu pai. Ela havia pesquisado muito nos diários de sua mãe sobre as passagens secretas de Hogwarts ou sobre qualquer furo na história. A casa dos gritos foi sua última tentativa num dia longe da lua cheia em que decidiu enfrentar a passagem do Salgueiro Lutador. O encontro de pai e filha não foi exatamente emocionante, mas foi explicativo. Ele não a via desde que era um bebê. E ela nunca o tinha conhecido. Mas, durante as aulas eles se conheceram, ela o visitava com frequência e ele contava sua história. Ela não sabia bem o porquê, mas apesar de astuta e desconfiada, ela confiou no homem. Mas, as coisas não terminaram bem, ele havia sido preso e escapou novamente. Estava por aí. E ela por sua vez contou para sua mãe sobre o que fizera. Imprudente. Irresponsável. Ingênua. Maluca. Foi o que Violet esperneava ao saber onde sua filha tinha se metido. Por mais que seu coração quisesse acreditar, Charlotte sabia que era muito mais complicado para sua mãe. Então foi uma surpresa ao escutar suas palavras. Ela acreditava nela, e iria fazer alguma coisa. Ou talvez tenha falado com Lupin. 

— Nem o Ministério da Magia o achou. — a menina murmurou receosa.  

— Eu conheço Sirius mais o que o Ministério. — ela deu um sorriso astuto arrancando uma risada incrédula da mais nova, sentindo a felicidade se alastrar pelo seu corpo. 

As duas foram de táxi até a Estação, em minutos haviam passado pela pilastra e se encontravam em frente ao Expresso Hogwarts, uma imponente locomotiva vermelha já esperava os alunos soltando grandes quantidades de fumaça. Salem dormia na sua caixinha de transporte tranquilamente, ao contrário de suas donas. Elas não tocaram no assunto Sirius desde que saíram de casa, por questões de segurança. Então, os pensamentos da mais nova se direcionaram para o que a mãe havia dito sobre seu quarto ano. 

— O que vai acontecer esse ano de tão emocionante? —perguntou. 

—Quando descobrir me mande uma carta. —seus olhos cintilaram em divertimento enquanto direcionava a filha para a entrada. 

—Ei, isso não é justo! 

—A vida não é justa. —deu dois tapinhas nas costas fazendo a menina bufar. Nesse momento o apito soou. —Já é hora de ir. — elas trocaram um olhar significativo antes de se despedirem com um abraço apertado, esperando que transmitisse a mensagem. Ambas tinham que se cuidar. Charlotte por seu quarto ano emocionante e Violet por sua busca por Sirius. 

Assim que Charlotte entrou na locomotiva, ela começou a procurar pelos seus amigos, que provavelmente estavam em um vagão perto das guloseimas. Samantha e Brenna eram suas amigas desde seu primeiro dia em Hogwarts, as três tinham a mesma idade, mas Samantha era da Lufa-Lufa e Brenna, assim como ela, era da sonserina. Luke, por sua vez, a conhecia desde sempre. Ele fora criado por Marlene McKinnon, uma amiga da Ordem da Fênix de sua mãe. Ela o havia encontrado em sua porta durante a guerra, e desde então eles são uma família. Os dois sempre fizeram parte do seu cotidiano, com Luke sendo o seu mais fiel amigo, um irmão de longa data. Mas, que foram separados por alguns momentos, já que além de ser mais velho, havia sido selecionado para a casa dos corajosos. Antes que pudesse chegar aos seus amigos, Charlotte trombou com um trio de alunos pelo corredor. 

—Perdão... —começou a pedir desculpas. Mas, parou quando encontrou conhecidos olhos verdes. Harry Potter. E o restante do trio atrás do garoto.  —Potter. — ela cumprimentou, sentindo uma mágoa antiga em seu íntimo, prendendo seus lábios numa linha tensa. 

—Black. —ele respondeu também sério, com os olhos repletos de memórias que a Black lembrava vez ou outra antes de dormir. 

“Harry Potter e Hermione Granger. Ambos estavam subindo as escadas do andar de cima da Casa dos Gritos, enquanto Charlotte os seguia sorrateiramente em seu formato de animaga. Seu pai estava lá, ela o viu pegar Rony, mais recentemente ele havia contado sobre o rato dos Weasley, então ela logo entendeu o porquê ele arrastava o ruivo pelo lugar. Apesar dos seus esforços, nunca tinha conseguido pôr as mãos no roedor para ajudar seu pai. Então agora tinha que intervir, eles não iam estragar a volta do meu pai para casa por não saberem no que estavam se metendo. 
—Charlotte? — exclamou Hermione ao ver a loira surgir atrás dos dois, já no cômodo onde Rony se encontrava. — O que está fazendo aqui? 

— Eu vi o que aconteceu. Aqui é perigoso, vamos embora. — ela balbuciou ao procurar pelo pai no cômodo, Hermione a olhou com os olhos repletos de desconfiança. Ela explicaria mais tarde, mas não agora.  
—Esconda-se! Ele provavelmente quer te pegar também. —sussurrou Rony e ela o olhou, fazendo uma cara de confusão ensaiada, enquanto sentia seu estômago afundar. 
—Quem? 
—Ele é o cão... Ele é um Animago...  
Charlotte fechou os olhos com força quando ouvi o barulho da porta se fechando. Ela olhou em direção ao pai, e seus olhos cintilaram, trocando um olhar repleto de insegurança por parte dela e determinação por ele, mas ele não disse nada. Apesar dos seus olhos também transmitissem um pedido de desculpas implícito. 
— Expelliarmus! — ele disse com voz rouca, apontando a varinha para Hermione e Harry. 
As varinhas saíram voando de suas mãos e ele as recolheu. Então se aproximou. Seus olhos estavam fixos em Potter. 
— Achei que você viria ajudar seu amigo. Seu pai teria feito o mesmo por mim. Foi muita coragem não correr à procura de um professor. Vai tornar as coisas muito mais fáceis... — ódio perpassou pelos olhos de Harry, ele avançou, mas Granger o segurou. Charlotte estava paralisada, temendo que qualquer movimento piorasse as coisas. 
— Não, Harry! — exclamou Hermione num sussurro petrificado 
— Se você quiser matar Harry, terá que nos matar também! — disse o Weasley mais novo impetuosamente, apertando o braço da loira para se apoiar, o rosto contorcido em dor. A loira o ajudou a se sentar de novo, esperando que ele não forçasse seu ferimento. 
— Deite-se — Sirius disse brandamente a Rony. — Você vai piorar a fratura nessa perna.  
— Você me ouviu? — o ruivo respondeu com a voz fraca. — Você vai ter que matar os quatro!  
— Só vai haver uma morte aqui hoje à noite — o Black mais velho respondeu, e seu sorriso se alargou, causando arrepios na loira. 
— Por quê? — perguntou Harry com veemência, tentando se desvencilhar. — Você não se importou com isso da última vez, não foi mesmo? Não se importou de matar aqueles trouxas todos para atingir Pettigrew... Que foi que houve, amoleceu em Azkaban? — a loira arregalou os olhos esverdeados vendo que eles haviam entendido tudo errado. 

 — Harry... — ela tentou segurar em seu braço, mas seus olhos turvos pelo ódio se voltaram para ela. 
— Ele matou minha mãe e meu pai! — bradou Harry arrancando o braço da loira bruscamente, olhando para as mãos da loira com quase... nojo. E então a mente da loira nublou, percebendo que todos os movimentos hesitantes do moreno com ela tinham um motivo além da timidez. Mesmo que ela nunca tenha feito nada, Charlotte Black sempre seria uma Black. Filha de um assassino, de uma família repleta de comensais da morte, uma integrante da casa Sonserina. Nunca seria o suficiente.  
Num impulso o puxou de volta e levou sua varinha em sua direção. 
— Mas o que... 
— Não se mexa. — falou firme, como nunca em sua vida. Seu pai assistia a cena com os olhos arregalados.  
— Por quê? — ele sussurrou, seus olhos brilhando em confusão. 
— Oras, porque ele é meu pai, Potter. — Charlotte respondeu acidamente. 
— Eu achei que ele estava atrás de você também — o menino sussurrou fraco. 
— Ele não precisou vir atrás de mim. Eu fui ao seu encontro. 
—Mesmo com tudo que ele fez? —perguntou e ela riu. 
—Eu não sou sua amiga, Potter. Não te devo nada. Ele é meu pai e você deveria acreditar menos em boatos.  
— Bem, eu também não te devo nada, Black. — respondeu frio. Hermione havia aproveitado distração e chutado uma das varinhas que estava no chão para Harry, passando despercebido para a loira, que concentrava seus pensamentos no de óculos. O seu pai por sua vez estava atento a filha, sentindo a culpa o inundar, também não percebeu. 
— Estupefaça!  — Harry gritou ao pegar sua varinha, antes que a loira pudesse revidar. 
Ela foi jogada em direção a parede, algumas coisas caíram em sua cabeça e outras quebraram, e em meio a uma dor alucinante sua visão se embaçou e o escuro tomou sua mente.” 

—Vamos embora, Harry. — sussurrou Hermione. Patético. Charlotte manteve o queixo em pé enquanto abria espaço para eles passarem, não perdendo os movimentos tensos do trio. 

Por instinto a loira levou a mão a cicatriz fina que permanecia bem no topo de sua cabeça. Mais tarde naquele dia ela acordou na enfermaria com os três conversando animadamente no leito ao lado. Eles pediram desculpas, parecendo envergonhados. Mas, algo naquele dia quebrou entre eles, e então nunca mais tocaram no assunto. Charlotte ainda nutria a forte mágoa de por causa deles, o seu pai ter sido preso, aumentando a distância entre ela e a oportunidade de ter sua família completa. 

—Finalmente! —exclamou seu melhor amigo, Luke McKinnon, ao ver a loira abrindo a porta do vagão. 

—Sei que vocês estavam esperando a minha ilustre presença, mas sabe como é a vida de uma pessoa amada...  —gesticulou fingindo descaso, arrancando risadas dos seus amigos. Ela abriu a caixa de transporte de Salem, deixando que o felino se enroscasse nas pernas dos amigos.   

Luke estava sentado displicentemente em um dos bancos, com as longas pernas jogadas para cima. Seus cachos escuros eram penteados para cima, e combinavam harmonicamente com sua pele negra. Seus olhos cor de mel brilhavam travessamente assim como seu sorriso de lado. Seu rosto simétrico e anguloso era repleto por cicatrizes finas, exceto por uma que se destacava; era funda e comprida, ia desde sua sobrancelha até a bochecha esquerda, e era estreita o suficiente para fazer parte do seu charme. Ele era alto, forte e incrivelmente engraçado, sendo amado por boa parte de Hogwarts, seja por admirarem sua posição de artilheiro no quadribol, seja por admirarem sua simpatia ou beleza. 

No banco direito, encostada na janela, Samantha Favreau, ou Sam para os mais íntimos, levava seus olhos grandes, redondos, como de uma corça, de um tom azul cristalino para a amiga. Os cabelos claros estavam cortados até a altura do busto, com uma franjinha sobre as sobrancelhas, a deixando com um ar juvenil. Assim como Charlotte, Sam era baixa, mas com um corpo com mais rechonchudo e com mais curvas.  

Ao seu lado, Brenna Murphy exibia um sorriso tranquilo. A menina tinha o mesmo tom de pele e cabelo que Luke, mas diferenciava em todo o resto, desde o seu sorriso bem mais contido, os olhos escuros alongados, os cabelos trançados e longos, até o corpo esguio. Seu temperamento era calculado, tímido e astuto como uma boa sonserina; mas sabia ser divertida.  

— Chispa. — a loira murmurou ao se aproximar do espaço em que Luke colocava as pernas. Ele encolheu com o leve tapa que levou, arrancando uma risada das meninas. — Como foi a viagem? 

— Incrível! — ele exclamou se levantando num pulo, descrevendo como foi estar na Copa Mundial de Quadribol com exatidão. Lottie sabia que Marlene havia lutado para conseguir os ingressos para os dois, e mesmo não gostando do esporte, ela se alegrava ao ver o amigo contar de forma tão adorável. Mas, ao lembrar de Marlene, ela também lembrou que teria que conversar com Luke sobre um assunto delicado. Ela dispensou os pensamentos por hora, mesmo que seu estômago se afundasse. — E então Krum... — Luke continuou a falar não percebendo o olhar de preocupação da amiga. 

ᛋ 

Em algum momento, depois de conversarem sobre inúmeros assuntos, Samantha e Luke adormeceram encostados na janela e Brenna lia um livro com atenção. Os dois primeiros eram os mais questionadores, para a sorte de Charlotte. 

—Ei, vou comprar umas tortinhas de abóbora, ok? —perguntou baixinho para não acordar os amigos. Brenna assentiu levemente em resposta, enquanto Charlotte se levantava com um sorriso ligeiro e apertava um bilhete posto magicamente em suas mãos, as palavras ali quase pulsando.  

“Me encontre no nosso vagão.” 

A letra do autor do bilhete era alongada e elegante, não precisando de assinatura para a loira reconhecer. O vagão citado no bilhete era o menos frequentado por ficar perto de mais do início da locomotiva. Ou seja, longe da saída, longe das guloseimas e longe do banheiro. Não era viável para ninguém, então era perfeito para os dois.  

Charlotte abriu a porta do vagão, ficando surpresa por não encontrar ninguém. Mas, antes que pudesse questionar braços longos rodearam sua cintura, e um beijo suave foi depositado em seu pescoço, causando cócegas.  

—Está cheirosa. —sussurrou Cedrico em seu ouvido. Sua voz era suave, e continha uma sombra de riso, tão conhecida por Lottie.  

—E com saudades — respondeu sorrindo e com o coração retumbando no peito.  Cedrico encaixou os dedos indicador e médio no passador da calça de Lottie e a rodopiou, fazendo com que ela apoiasse as mãos em seu peito.  

Não perdendo tempo, o garoto a puxou para um beijo repleto de saudades, entrelaçando os dedos de uma mão nos longos cabelos da loira e a outra apertava a sua cintura. Os dois pombinhos se conhecessem desde que Charlotte ingresou na escola, mas um ano antes foi que quando se aproximaram. A princípio como amigos, apresentado por Luke, que se viam quando ela não estava perto do seu grupo de amigos ou do trio de ouro. Se apaixonaram como alguém adormece, rápido e sem perceber. Quando a loira se deu conta que estava apaixonada pelo amigo popular, ela se afastou. Apenas para que ele se aproximasse mais. E quando viram, davam o primeiro beijo na sala precisa, lugar que fora o refúgio dos dois desde que ele apresentara o local para ela.  O menino era como uma espécie de refúgio quando ainda não contara sobre seu pai para os amigos, com ele não havia peso em ser perfeita. Ao menos achava que era assim.  

Agora eles se sentavam em um dos bancos da cabine, a loira se aconchegava no peito do mais velho enquanto ele acariciava os cabelos da menina distraidamente, curtindo a presença um do outro.  

—E então ele pegou o pomo... —ele continuou contando sobre a copa.  

—E para a surpresa de todos, Irlanda ganhara mesmo com Krum pegando o pomo. —ela recitou como se tivesse assistido o jogo pessoalmente. Cedrico parou de acariciar seus cabelos e inclinou a cabeça para olhar o rosto da namorada, com os olhos brilhando em confusão. 

—Como...? 

— Luke. —ela deu de ombros, se arrependendo imediatamente ao sentir o corpo dele tenso embaixo de si. O assunto Luke ainda era sensível para Cedrico, considerando que eles são amigos, e se ele descobrisse sobre os dois, ele provavelmente veria Diggory com outros olhos.  

 — Você sabe que se eu contasse primeiro, ele não levaria tão a mal assim... Né? — ela sussurrou com medo de que ele fosse sair correndo ou algo assim.  

— Lottie, não existe nenhuma possibilidade de Luke levar isso na boa. —ele indicou ela deitada em seu peito uma risada sem humor. A menina sentiu seu rosto ruborizar e não mais tocou no assunto.  

A bolha de tranquilidade foi estourada, então poucos minutos do último comentário dele, eles se levantaram para se ajeitarem e saírem do local. Lottie sentia falta dos meses em que era fácil estar com ele. Agora a maioria de suas conversas e encontros durante as férias terminavam com um dos dois irritados. Claro que resolviam em seguida, mas era desgastante. Principalmente para um relacionamento que se mantinha em segredo.  

—Olha, —ela começou atraindo um olhar curioso do outro, que se preparava para sair primeiro do compartimento em que estavam. — Em algum momento a gente vai ter que contar para as pessoas, Ced. Talvez Luke seja um problema no início, mas ele vai entender. Ele não é meu pai nem nada... 

—Charlotte. —ele interrompeu com o cenho franzido. — Por favor, não vamos discutir isso de novo. Eu já disse que a nossa privacidade é o que mais importa no momento.  — ela engoliu em seco com a resposta do mais velho, desejando que nunca tivesse começado a falar. 

—Tudo bem. — ela respondeu, sentindo os olhos arderem. Ela poderia ser patética demais para contradizê-lo, mas não o suficiente para chorar em sua frente. Ele suspirou e depositou um selinho demorado nos lábios da loira, e antes que saísse ele a olhou profundamente, quase como se quisesse falar alguma coisa, mas as palavras que saíram de sua boca foram: 

—Se cuida. 

Se cuida. Depois de tudo era isso que ele diria? Foi o que a loira pensou ao bufar e se jogou no banco, esperando alguns minutos ante de colocar o uniforme que havia trazido consigo, se vestindo vagarosamente para que os minutos de espaço entre a saída dos dois passassem vagarosamente. Durante seu caminho até o próprio vagão, a menina lembrou da sua desculpa e parou na moça das guloseimas para fazer o seu pedido. 

— Quatro tortinhas de abóbora, por favor. — pediu, tirando os galeões do bolso. Enquanto a senhora pegava seu pedido, ela viu que Harry parava no corredor com os olhos voltados para Cho Chang, sua boca abria ligeiramente e parecia estar vidrado. A menina saiu com as amigas e seus olhos cor de esmeralda se voltaram para a loira, sentindo seu rosto se avermelhar quando viu que a garota o olhava com uma sombra de riso. 

— Sutil. — ela murmurou pegando seu pedido, vendo que ele revirou os olhos em resposta, mas com uma ameaça de um sorriso nos lábios.  

—Demorou. —reclamou Luke assim que Charlotte entrou na cabine, mas ela não respondeu, apenas distribuiu os doces antes de se sentar emburrada.  

Eles se entreolharam confusos, mas não se sentiram confiantes para perguntar o que quer que tenha acontecido com a loira, que agora tinha tomado o lugar do amigo e olhava para a paisagem passando rapidamente na janela da locomotiva.  

— Eu só tive que ir ao banheiro. — ela murmurou ainda sentindo os olhos dos amigos, eles desviaram ao mesmo tempo, irritantemente sincronizados, arrancando um suspiro irritado da loira. 

Durante o restante do trajeto eles embarcaram em uma discussão sobre quem seria o novo professor de defesa contra as artes das trevas, mas Lottie se manteve em silêncio ainda absorvendo o começo do que poderia ter sido mais uma discussão entre ela e Cedrico. De certa forma ele estava certo, afinal ela prezava pela sua privacidade, e a filha de um “assassino” fugido de Azkaban namorando com um dos rapazes mais populares da escola com sua família extremamente respeitada não ia ser uma informação que passaria batido.  

Contudo, uma parte dela, que queria profundamente ignorar, dizia que sim, era uma situação complicada, mas era para ser uma coisa que deveriam enfrentar juntos. Afinal, não eles não devem satisfação a ninguém. Além disso, doía na garota cada vez que mentia para os seus amigos; ela gostaria de poder compartilhar essa parte da sua vida com eles, suas angústias, seus medos, sua felicidade. E bem no fundo do seu âmago, ela também questionava o fato dele simplesmente decidir como as coisas vão funcionar no relacionamento, se é que ela poderia chamar assim. 

Pouco tempo se passou quando sentiu a brisa fresca entrando pela janela acompanhada de algumas gotículas de água, e ao ver a estação ao longe, ela fechou a janela, já se preparando para se levantar. Quando a locomotiva finalmente parou, ela se levantou ajeitando a saia do uniforme e acompanhada dos seus amigos foi pegar o malão.  

—Ei, está tudo bem? —o sotaque francês de Sam interrompeu os questionamentos internos da Black, que a olhou nos olhos depois de algum tempo. Os olhos da francesa a encaravam de volta quase como se pudessem ler a amiga. Por causa da chuva sua franja úmida estava grudando na testa a deixando com um semblante inocente, mas se tem algo que não é inocente são os olhos grandes azuis e questionadores de Samantha. 

—Mais ou menos. — Charlotte olhou para baixo, gesto que foi refletido pela lufana. —Lembra do cara misterioso? —ela assentiu. —Acho que me meti numa situação complicada demais por manter isso em segredo. —suspirou sentindo os olhos arderem pela segunda vez no dia. 

—Lottie. —ela chamou. —Se ele gostar realmente de você, vocês vão conseguir superar isso. —ela fez um carinho no ombro da amiga. 

—Mas e se ele não gostar? —perguntou com medo da resposta da pergunta que ela mesma formulou. 

— Então, o que acham que vai rolar esse ano para precisarmos de um traje a rigor? — Luke interrompeu as duas, acompanhado de Brenna e Samantha engoliu sua possível resposta. 

— Um baile? — Lottie chutou a primeira coisa que passou por sua cabeça. 

— Ok, mas o que levaria Hogwarts a dar um baile? — Brenna perguntou e Luke abriu um sorriso largo. 

— Talvez seja algo sobre a Copa.  

— Não. — as três meninas responderam ao mesmo tempo arrancando um muxoxo do menino. 

Eles continuaram discutindo sobre as possíveis possibilidades até acharem uma carruagem, e quanto mais se aproximavam do castelo, mais Charlotte sentia seu peito se enchendo de satisfação. Os relâmpagos riscaram o céu no momento em que a carruagem parou diante das enormes portas de entrada de carvalho, a que se chegava por um lance de degraus de pedra. As pessoas que tinham tomado as carruagens anteriores já subiam correndo os degraus para entrar no castelo; por fim tomaram coragem e correram também, rapidamente chegaram ao cavernoso saguão de entrada iluminado por archotes, com sua magnífica escadaria de mármore. Lá Charlotte e Sam avistaram Pirraça ao longe provavelmente tramando sua próxima artimanha, então rumaram na frente ao Salão Principal evitando qualquer tipo de confusão, deixando os outros dois para trás. 

O Salão Principal tinha o aspecto esplêndido de sempre, decorado para a festa de abertura do ano letivo. Pratos e taças de ouro refulgiam à luz de centenas e centenas de velas que flutuavam no ar sobre as mesas. As quatro mesas longas das Casas estavam cheias de alunos que falavam sem parar; no fundo do salão, os professores e outros funcionários sentavam-se a uma quinta mesa, de frente para os estudantes. Estava muito mais quente ali. Lottie e Sam se separaram para irem para suas respectivas mesas; ao longe Brenna, Luke, Harry, Hermione e Rony entravam absolutamente encharcados e rabugentos. Assim que Brenna se sentou, Lottie a olhou com uma das sobrancelhas arqueadas questionando silenciosamente seu estado. 

—Pirraça. —murmurou rabugenta e a loira riu baixo. — Espero que andem depressa com a seleção. Estou faminta. —ela continuou resmungando, apoiando o queixo na  esquerda. Lottie concordou com um murmurar. 

As palavras mal tinham saído da de tranças e as portas do Salão Principal se abriram. A Professora Minerva encabeçava uma longa fila de alunos do primeiro ano até o centro do salão. Se Brenna estava encharcada, seu estado nem se comparava ao desses garotos. Eles pareciam ter feito a travessia do lago a nado em lugar de fazê-la de barco. Todos estavam tomados por tremores. Professora Minerva agora colocava um banquinho de três pernas diante dos novos alunos e, em cima o chapéu seletor. Por um instante, fez-se silêncio. Em seguida um rasgo junto à aba se escancarou como uma boca, e o chapéu começou a cantar.  

Charlotte normalmente gostava dessa parte, todo ano ele modificava sua canção e era divertido observar as diferenças; a vida de um chapéu que é usado apenas uma vez por ano não deve ser muito divertida. Mas, a apreciação da menina foi interrompida quando piscou por um momento. Quando abriu os olhos o grande salão estava mais escuro que o normal e tudo acontecia em câmera lenta, todos os movimentos de todas as pessoas estavam reduzidos, menos os da menina. Ela sentiu seu coração bater em seus ouvidos, quase pulando de susto ao escutar as badaladas de um relógio ao fundo. A loira procurou pelo som ao redor do ambiente, mas tudo que via eram as pessoas se mexendo com lentidão. Quando as batidas pararam, a voz de uma mulher interrompeu o silêncio, cantando uma música suave. 

Are you, are you coming to the tree? 
Where they strung up a man they say who murdered three 
Strange things did happen here, no stranger would it be 
If we met at midnight in the hanging tree 

Os aplausos ecoaram pelo Salão Principal. A velocidade havia voltado ao normal, não havia música, badaladas e as cores estavam as mesmas. A Professora Minerva agora desenrolava um grande pergaminho: — Quando eu chamar seu nome, ponha o Chapéu e se sente no banquinho. Quando o chapéu anunciar sua casa, vá se sentar à mesa correspondente. — explicou ela aos alunos do primeiro ano. 

—Lottie? Está tudo bem? —sussurrou Brenna com clara preocupação no olhar. 

—Estou sim. —a loira engoliu em seco e a respondeu dando um meio sorriso para tranquilizá-la.  

Mas antes que a professora pudesse começar a chamar os nomes as luzes se apagaram de repente com um vento gelado que a fez arrepiar a espinha. Mas, diferente do evento anterior, os outros sentiram o mesmo já que todos se encararam apavorados e um garoto primeiranista começou a chorar. Todos os alunos e professores do Salão Principal se viraram ao mesmo tempo em direção a porta que tinha acabado de ser escancarada, as luzes se acenderam novamente e lá uma mulher estava parada. Sua aparência era imponente, negra de olhos tão escuros quanto à noite, seu cabelo extremamente curto tinha a aparência molhada e coloração branca, seu corpo esguio e elegante estava coberto por uma vestimenta que não era exatamente comum, um vestido longo preto e esfarrapado emoldurava suas curvas, com uma abertura na frente onde era possível ver a calça de couro como se estivesse preparada para qualquer tipo de batalha, seus pés calçavam botas de salto médio e grosso e um cinto de três fivelas circundava sua cintura, quase como um corpete. E por cima de tudo uma longa capa preta de viagem a protegia da chuva torrencial que abalava as estruturas do castelo milenar. Ela parecia uma guerreira descrita em algum livro de aventura e seus olhos tinham algo difícil de decifrar, quase como se fosse mais antiga do que pudessem imaginar, mesmo que aparentasse não ter mais de 30 anos. Ela começou a caminhar em direção a mesa dos professores e seus olhos estavam bem focados em Dumbledore, quase como se não se importasse com todos os olhares direcionados a ela, mas seu ligeiro sorriso dizia o contrário. 

Quando chegou até o diretor de Hogwarts a estranha estendeu a mão esquerda e eles apertaram os antebraços num comprimento murmurando palavras que Charlotte não pôde ouvir. Parecia estar fazendo um comunicado enquanto Dumbledore assentia suavemente. Então ele indicou um dos dois lugares vazios, entre o lugar da Professora Minerva e Severo Snape, e ela se sentou pegando para si uma taça de suco de abóbora.  

—Será que ela é a nova professora de Defesa Contra as Artes das Trevas? —cochichou Brenna ainda extasiada.  

—Bem, ela já tem o figurino à altura. —respondeu a loira ainda com os olhos presos na mulher. 

— Gostaria de apresentar a nossa nova professora de Runas Antigas — disse Dumbledore animado. Runas Antigas? — Professora Peverell.  

Todos aplaudiram absolutamente confusos enquanto ela perpassava seus olhos escuros por todo o salão. DCAT faria sentido ser a matéria dela, mas Runas Antigas?  Nem tinham nos comunicado que a Srtª Babbling tinha saído para começar. Charlotte questionava mentalmente enquanto a analisava, a professora Minerva continuou com a seleção dos primeiranistas com um aceno de permissão de Dumbledore e a Srtª  Peverell levava a taça aos lábios pintados de preto. Enquanto a loira pensava sobre a semelhança da mulher com algo no fundo da sua mente que dizia que já a conhecia, os olhos da duas se encontraram a distância. E então como num passe de mágica, Charlotte se lembrou. Ela não conhecia a mulher peculiar, mas já a atinha visto em seus sonhos.  


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Notas finais do capítulo

Um longo capítulo, eu sei.
Revisei esse capítulo várias vezes, mas sempre acontece de algo passar ou ficar confuso; caso haja alguma dúvida, comente, me mande uma mp, dm no twitter/instagram ou o que quer que seja. Ficarei honrada em conversar sobre a história ♥
Espero que tenham gostado!
Xx, Blue.



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