O Rei Negro escrita por Oráculo Contador de Histórias


Capítulo 16
Efeitos




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—Quando chegou?

—Assim que você partiu, querido. O selo é legítimo.

Yliel tinha em mãos um envelope com um selo dourado, onde no meio havia uma flor em relevo. Seus olhos azuis vagaram em algumas direções, como se estivesse receoso demais para abrir. Por outro lado, sentia as mãos da rainha massageando seus ombros, combatendo toda a tensão que sobre eles pairava. Sentado na beira de uma enorme cama coberta por lençóis brancos, o rei moveu a cabeça para o lado, tentando enxergar de esguelha sua esposa ajoelhada sobre um macio colchão.

—Essa não veio de Otto. Aliás, há muito tempo ele e Walther não tentam criar vínculos conosco desde que eu lhes fiz aquela proposta. Bom, que seja. – e rompeu o selo, desdobrando a aba e revelando uma carta no interior. Ao retirá-la, deixou visível para que Erilla, já repousando o queixo em seu ombro, pudesse ler também.

“Prezado rei Yliel Luyah,

Venho por meio desta solicitar uma audiência formal com sua majestade, no intuito de tratarmos sobre um assunto de extrema importância que é de interesse coletivo. É com preocupação que o informo a respeito de um recente ataque da Escuridão do Sul contra o Escudo do Mundo, todavia, penso ser pertinente entramos em detalhes pessoalmente. Espero encarecidamente que atenda ao meu pedido, pois independentemente das diferenças históricas entre os nossos reinos, temos um inimigo em comum e não sabemos até quando conseguiremos resistir a ele.

Esperando que estejam todos bem,

Merlin, Regente de Calendria.”

Houve um instante de silêncio no enorme quarto do casal Luyah. A luz do dia atravessava o vão das janelas abertas e uma brisa leve sacudia as cortinas.

—Por que agora? – indagou o rei incomodado – Nesses vinte anos, Merlin não moveu um único dedo para estreitar nossos laços. Então Gabriel finalmente aparece e o regente de Calendria se manifesta?

—Acha que ele sabe?

—Ele com certeza sabe, Erilla. – respondeu convicto – Nas cordilheiras, Gabriel me revelou tudo que passou nas mãos do capitão Decarlo e do seu mandante, lorde Walther Di Blanco. Este falou a respeito de uma visão, mas confesso que estou confuso sobre isso. Como pode alguém em Calendria ter previsto a chegada dele?

A rainha desceu da cama, puxou uma confortável cadeira sem necessariamente tocá-la, apenas gesticulando com a mão e por fim sentou-se.

—Nymira concedeu a mim o dom de profetizar, assim como fez aos meus antepassados. Não consigo imaginar algum humano com essa mesma capacidade.

—Exato! Mas aconteceu, eles sabiam sobre o garoto e isso é inquietante! Nós precisamos de informações! Minha rainha, tente entender. Merlin está fazendo um movimento ao mesmo tempo em que temos seu maior inimigo conosco.

—Lady Yeshi também sabe, afinal, foi ela quem enviou os humanos para Aurora.

—Nós dois sabemos que ela jamais entregaria Gabriel a Calendria. – seus olhos azuis buscavam respostas em várias direções, até por fim encontrarem os verdes de sua amada – O que aconteceu na floresta?

—Nosso filho interceptou os humanos. Porém, quando soube que Ada era uma escrava emberlana, ficou irado e quase executou Heler com uma flecha. Felizmente, consegui impedi-lo. – contou com uma expressão preocupada – É óbvio que Ada não foi trazida como escrava, mas sim libertada dos seus senhores em Calendria. Porém, não gosto desse ódio que ferve no coração de Sael.

Yliel suspirou.

—Conversarei com ele a respeito disso. Muitas coisas estão acontecendo ao mesmo tempo. Precisamos agir e rápido!

—Deixe que o regente venha. – aconselhou Erilla, para a surpresa do rei.

—Mas o nosso amigo está aqui!

—Podemos escondê-lo.

—De Merlin? A aura dele pode cobrir bem mais do que este palácio. Enquanto transita por Aurora, certamente vasculharia e dada a instabilidade na alma de Gabriel, nossas chances de sucesso caem drasticamente. Além do mais, uma viagem até Calendria está fora de questão.

—Jamais iria sugerir isso. – sorriu, segurando as mãos dele – Eu sei que você não suportaria ver os absurdos que lá acontecem. Mas negar um diálogo com ele é o mesmo que expor Aurora ao risco de uma guerra. Nas atuais circunstâncias, não temos aliados e eles por outro lado...

—Eu sei... E não quero conduzir nosso povo a um massacre. – em seu rosto, era visível o desgaste devido ao peso de ser rei naquelas circunstâncias. E diante de sua esposa, sentiu-se à vontade para revelar esse lado mais vulnerável – Erilla... Escreva por mim, eu te peço. Envie um pardal-negro o mais rápido possível. Diga a Merlin que será recebido em Aurora. Enquanto isso, pensarei sobre o que fazer a respeito do nosso amigo.

A rainha puxou as mãos do rei e beijou uma por uma, oferecendo-lhe um sorriso amoroso.

—Farei agora mesmo.

O sol já estava se pondo quando Yliel encontrou seu filho perambulando pelos jardins do palácio e não foi difícil notar uma expressão de frustração em seu rosto, algo que beirava a revolta. Então passou o braço pelos seus ombros e o puxou para si de um jeito fraterno, sorrindo e dizendo em tom descontraído:

—Ainda bem que o vento soprou aquela flecha.

Sael se sentiu realmente incomodado e se desvencilhou do pai, o encarando sem esconder o que estava sentindo.

—Por que estamos recebendo calendrinos aqui? Por que a mamãe fica protegendo essa gente?

—Eu entendo o que está sentindo, meu filho. Diante de tudo o que aconteceu e ainda acontece, podemos acabar estranhando que eles estejam conosco. Porém, Heler e Nicolas não são pessoas ruins.

—Como o senhor pode ter tanta certeza? O irmão dela espancava a Ada! – protestou o príncipe.

Yliel se sentou no gramado e deu palmadinhas no espaço ao lado, convidando seu filho a fazer o mesmo. Embora relutante, este acabou atendendo.

—Heler livrou Ada do irmão com a ajuda de Nicolas, até onde sei. Além do mais, se eles fossem realmente pessoas ruins, a coisa menos inteligente a se fazer seria adentrar Aurora.

—Bom, isso sim... – concordou a contragosto.

—Não deixe que o ódio domine seu coração e cegue seus olhos. Você é um filho tão esforçado, dedicado e que me faz sentir tanto orgulho. Sei que a causa dos nossos amigos emberlanos é tão importante para você quanto é para mim, todavia, devemos agir com cautela. Qualquer decisão precipitada pode colocar em risco não só a nossa segurança, como também de todo o povo. – nesse momento, o rei acabou deixando escapar um suspiro de insatisfação.

Sael, que já não tinha aquela expressão amarrada de momentos atrás, notou algo de errado com o pai e imediatamente perguntou:

—O que foi, pai? Parece insatisfeito com alguma coisa.

—Ah, bom, é que... – forçou um meio sorriso e então deu de ombros – Recebi uma carta do regente de Calendria. Ele virá a Aurora tratar de algo comigo.

—Algo? Espera, o grande mago virá até aqui? – indagou perplexo.

—Sim. Segundo o que diz na carta, Merlin quer debater a respeito de um recente ataque da Escuridão do Sul. Pareceu muito interessado em estreitar laços conosco. – embora dissesse isso, era óbvio seu tom de incredulidade.

—Ele sabe, não é?

—Tenho certeza que sim. Gabriel não foi atacado pelo humano das duas espadas por acaso. Walther Di Blanco está por trás disso e desconfio que o regente esteja muito bem informado.

—Mas pai, Gabriel está aqui! – disse Sael cheio de estranheza – Se Merlin vier, vai acha-lo e será o fim!

—Não vou permitir que o encontre. – afirmou em meio a um sorriso típico de alguém que já sabe exatamente o que fazer.

Já era noite, mas o movimento na cidade ainda não tinha diminuído. Vários elfos transitavam de um lado a outro e um deles, mais apressado, acabou esbarrando em Heler.

—Desculpe, senhorita! Você está bem? – indagou o indivíduo esguio, de cabelos negros e olhos num tom de mel. Obviamente, esse elfo também possuía uma beleza notável, muito embora sua expressão de urgência lhe tirasse o encanto.

—Não foi nada. – sorriu a garota e logo cada um seguiu seu caminho.

—Não estou vendo Sylie ou o senhor Nicolas. – disse Gabriel esticando o pescoço em várias direções – Para onde disseram que iriam mesmo?

—Certamente estarão na Casa Cinzenta, um dos melhores lugares para se usufruir de alquimia. – respondeu a princesa Leeta – Fica por ali, na terceira rua antes da ponte, mas não se preocupem. O que acham de comermos algo enquanto esperamos?

Gabriel, Heler e Ada concordaram, então animada, a princesa elfa os levou até uma das escadarias espiraladas abraçadas a uma grande árvore. O rapaz notou que os degraus de pedra não estavam conectados ao tronco e, ao invés disso, simplesmente flutuavam. Foi estranho pisar no primeiro degrau, teve a sensação de que ia cair, o que não aconteceu, afinal a pedra sequer se moveu. Um emaranhado de cipós se formava a medida em que subiam, criando um belo e seguro corrimão. Ada subiu mais devagar, completamente encantada com tudo o que estava vendo, fossem as casas e sua arquitetura única ou toda a esplendorosa e resplandecente Floresta Lazúli.

—Conheço esse olhar. É realmente incrível, né? – perguntou Gabriel.

Ela ficou surpresa com a interação dele, mas não tardou a sorrir e responder:

—Mais do que meras palavras poderiam descrever.

Ao notar a conversa de ambos, que agora estavam parados no meio da escadaria, Heler sorriu e continuou a seguir uma distraída Leeta.

—Tem razão... – fez uma pausa para suspirar, então encarou a mulher com um ar de culpa que não pôde disfarçar – Meras palavras jamais conseguiriam expressar certas coisas. E eu nunca vou encontrar algo que possa dizer... Que seja suficiente para explicar o quanto eu não queria que nada disso tivesse acontecido com o seu povo. É patético, eu sei, tentar me justificar diante de alguém que sofreu tanto.

—Heler me contou que você tinha um rosto diferente, o que acabou se provando verdade. Mas sabe como eu percebi que você é o nosso rei? – diante do questionamento, ele negou com a cabeça e sustentou o olhar dela – Porque pela primeira vez desde o dia em que fui capturada e vendida como escrava, meu coração voltou a ficar em paz. O nosso vigia finalmente retornou.

—Por que me chamam de vigia?

—Meus pais te chamavam assim. Não sei o real significado, mas para mim, representa a proteção de todo o mal que cerca nosso povo. – sorriu ao responder.

—Sabe o paradeiro dos seus pais? – perquiriu ele.

Ada negou com a cabeça, agora mais triste.

—Vamos descobrir o que aconteceu, eu prometo. – disse transbordando seriedade em seus olhos.

—Já tem problemas demais para ainda se preocupar comigo, meu rei. Não preci-

—É muito fácil eu falar que sinto muito por tudo o que aconteceu. – interrompeu Gabriel – Isso tem que ser demonstrado em ações, Ada. Posso não ter o poder que meu outro eu tinha, mas farei todo o possível para te ajudar. – se precipitou, trazendo em suas mãos a mão direita da mulher – Se os seus pais estiverem vivos, e eu espero que estejam, vamos encontra-los.

Ela o abraçou chorosa e ele correspondeu com um ar de determinação queimando sobre a face. Instantes mais tarde, eles se juntaram a Leeta e Heler em uma mesa de pedra com quatro pratos de uma goma branca dobrada pela metade, umedecida e coberta de coco.

—Desculpem a demora. – sorriu ele ao se sentar perto da princesa elfa. Em seguida, conferiu seu prato e franziu o cenho na mesma hora – Isso é...

—Véu de Neve. – completou Leeta sorridente, como quem apresenta uma nova comida favorita a alguém.

—Não... Isso é... – ele apanhou a goma e mordeu um pedaço – Hum... Foi o que pensei. Tapioca de coco.

—O que? – estranhou ela e sua reação foi replicada no rosto de Heler e Ada – É verdade, tem coco, mas o que seria uma tapioca?

Ele caiu na gargalhada e ganhou cutucões dos dois lados, tanto de Leeta, quanto de Heler:

—Responde logo, idiota! Para de rir! Eu vou te bater!

—Está debochando de nós? Espero que saiba, você é o único homem aqui. – advertiu a elfa de olhos semicerrados.

—Calma... Tá, eu explico. – tomou fôlego – Tapioca é uma comida típica do meu mundo, servida de diversas maneiras. Uma das mais populares é a de coco, como essa que estamos comendo.

—Seu mundo se parece muito com o nosso? – indagou Ada, que já tinha devorado a metade.

—Em algumas coisas sim, em muitas não. Olha, o que é aquilo? – apontou em uma direção e todas olharam, enquanto ele arrancava com as mãos um pedaço do lanche de Leeta – Ah, me enganei, pensei ter visto um tigre voando.

—Tigres não voam. – explicava a elfa que olhou para o seu prato e, em seguida, encarou o rapaz e viu suas bochechas muito cheias – Meu véu de tapioca... Espera, não! Meu... Argh! Ora, seu! – começou a socar o braço dele, mas estava usando a força de uma leve brisa.

—Eu trancaria ele uma semana nas masmorras, princesa. – sugeriu Heler com uma cara de quem quer colocar lenha na fogueira.

—Talvez não seja uma ideia ruim, sabe...

—O que? Espeua, non vale. – disse de boca cheia – Non pod abusar só porque é uma pincesa. Ada, me ajuda!

Mas a mulher apenas ria de maneira espontânea, algo que Heler notou e sorriu satisfeita.

Minutos mais tarde, Nicolas e Sylie se juntaram ao grupo na rua principal. O homem trazia três grandes sacolas de pano completamente cheias e Gabriel achou por bem levar uma delas para ajudá-lo, notando que estava pesada.

—Olha, senhora Sylie, o que tem aqui dentro? – indagou o rapaz de cenho franzido enquanto tentava decidir em qual mão a alça doeria menos.

—Ingredientes, frascos de elixires, um conjunto novo de panelas, talheres e...

Levou quase um minuto para a elfa de cabelos dourados resumir tudo, ao passo em que ele se arrependeu de perguntar. Quando olhou para Nicolas, viu que estava se fazendo de forte, mas algumas gotas de suor escorriam pelo seu rosto de expressões rígidas.

—É muita gentileza a de vocês me ajudarem com isso. – disse Sylie em um tom gentil – Geralmente eu levaria umas três pessoas comigo.

—Nem imagino o porquê. – ironizou Nicolas, mas ela não percebeu.

—Trabalhando de graça. Quem diria, hein, senhor Nicolas! – provocou Heler, dando um tapa forte no braço dele e quase o derrubando.

—Sua pirralha... – rosnou, a fuzilando com o olhar e lhe arrancando risos por isso.

Assim que dobraram a última esquina da cidade que os conduziria ao palácio, Leeta notou um grupo de três elfas paradas na porta de uma casa. Elas cochichavam, davam sorrisinhos e olhavam descaradamente para Gabriel. Instantaneamente, sua aura emanou, seus cabelos e os de todos pareciam terem se libertado da gravidade e todas as sacolas ficaram incrivelmente leves, algo que tanto o rapaz, quanto o mercador estranharam. Ao perceber isso, Sylie se precipitou e sussurrou no ouvido da princesa:

—Está com ciúme...

—Não estou com ciúme! – replicou num rosnado baixinho.

—Sempre que saía com seu pai e uma elfa o olhava diferente, você fazia tudo ir pelos ares. Quem é agora? – olhou para trás onde estava o garoto, então avistou o grupo de elfas não muito distante – Ah, entendi.

—Não entendeu nada, Sylie! – murmurou incisiva, quando claramente queria gritar – Eu só quero mandar todas elas voando para o lago!

—Ah, menina, se controle! Ele nem sequer percebeu.

—Por isso mesmo! O farei antes que seja tarde!

—Então realmente é isso... – confirmou a elfa triunfante.

—Sylie!!!

Heler e Ada tentavam amarrar seus cabelos, enquanto Nicolas e Gabriel se entreolhavam sem entender nada.

—Tá usando magia, pirralho?

—O que? Não! Acha que se eu conseguisse fazer isso, não teria feito desde o início? – respondeu o rapaz ainda confuso. Quando olhou para frente e viu Leeta com seus cabelos brancos esvoaçando lentamente, entendeu menos ainda o porquê daquilo – Que estranho...

Cerca de duas horas mais tarde, o silêncio e a calmaria pairavam no palácio real, bem como as luzes azuis da árvore tinham se atenuado. Os portões estavam fechados, mas dois guardas elfos em armaduras de bronze rondavam pelo lado de fora. Já era madrugada e ninguém perambulava pelos extensos corredores ou sobre as belas escadarias.

Em seu quarto, despejado de qualquer jeito sobre a cama, um adormecido Gabriel se jogava de um lado para o outro, bagunçando todos os lençóis. Algo em seus sonhos o estava atormentando a tal ponto que gotas de suor começavam a escorrer pela maçã do rosto.

Sobre as águas escuras do mar e acima das nuvens, por onde quer que olhasse, só conseguia enxergar uma interminável cortina de trevas, como se pudesse ver perfeitamente dia e noite divididos. Não estava no controle e aos poucos ia se aproximando daquele lugar terrível, até ficar a cerca de cinco centímetros. Todavia, nem assim conseguia enxergar o interior daquilo, exceto por alguns relâmpagos arroxeados, como se estivesse assistindo ao início de uma assustadora tempestade.

Ele acordou assustado e viu dois olhos azuis que encaravam de muito perto. Foi como sair de um pesadelo e mergulhar num sonho, pois ali estava Leeta, sentada sobre a cama e o observando com preocupação.

—Era horrível? – perguntou ela.

—Ficou tão óbvio? – disse com um pequeno sorriso.

—Mais do que imagina. Foi ele?

—Não... Dessa vez não. – suspirou ao passo em que se colocou sentado sobre o colchão – Uma parede de sombras sem fim no meio do mar. Acho que é o que vocês chamam de Escuridão do Sul.

—E... – sua preocupação se acentuava – Você entrou nela?

—Fiquei bem pertinho, mas não cheguei a entrar. Eu não conseguia controlar isso, sabe? Só o que pude ver foram clarões arroxeados.

Embora tentasse esconder, havia medo em seus olhos e a princesa elfa não deixou isso passar desapercebido, segurando em seu rosto com ambas as mãos para encará-lo diretamente. O toque das mãos dela era realmente muito suave, mas acima de tudo, Leeta parecia ter o dom de tirá-lo da escuridão e dispersar quaisquer sentimentos ruins que sondassem seu coração. E ela fazia isso com muita facilidade.

—Tem algo que você não está me contando? Sabe que pode se abrir comigo.

Ele respirou fundo e tirou as mãos dela do seu rosto, porém não as soltou.

—Eu tenho visto ele, mas essas imagens nunca são totalmente claras, exceto por aqueles olhos vermelhos de ira. Parecem dois lagos de lava, ardendo como se só conhecesse o ódio. Só que na noite passada, foi diferente. – respirou fundo – Ele falou diretamente comigo. Disse que se eu quisesse ceder o controle do meu corpo, ele aceitaria, mas que isso resultaria em inundar Eastgreen em sangue e desespero.

Ela o observava com ainda mais preocupação, percebendo que a cada palavra dita, as mãos dele iam ficando mais trêmulas.

—Depois ele sumiu. E... Quando isso aconteceu... – estava ofegante e não se deu conta de que já estava com os olhos arregalados – Eu vi escuridão e senti uma presença muito forte, como se me sondasse. Eu ouvi gritos, ouvi vozes de mulheres, de crianças, como se cantassem algo. Era horrível, melancólico, como se a felicidade nunca mais fosse existir. Tinham... Monstros... E também... – sem se dar conta, estava chorando e tremendo bastante – Pessoas mortas... Enforcadas... Crianças também... Eu não conseguia fazer nada, eu congelei... Nunca senti tanto medo na minha vida, Leeta. O que era aquilo? Quem seria capaz de fazer algo tão diabólico?

Ela o abraçou forte e fez carinho em seus cabelos, não se importando de que as lágrimas também descessem pelos seus olhos azuis.

—Calma... Você não está sozinho... Calma...

—Eu sei... Eu sei, desculpa. – disse se afastando para observá-la – E não poderia pedir mais do que a vida já tem me dado. Obrigado de verdade, Leeta. A melhor coisa que me aconteceu desde que cheguei neste mundo foi ter te encontrado naquele lago.

—Isso só prova que eu estava certa em desobedecer a meus pais e a Sylie. – confessou com um meio sorriso.

—Só não deixa a Sylie escutar isso, ela com certeza ficaria brava.

—Tanto que me puxaria pela orelha por todo o palácio. Acredite, tenho experiência. – fez uma carinha triste, então começou a rir baixinho.

Gabriel a observava com um sorriso bobo, até que Leeta notou e seu riso foi convertido num olhar fixo. Não estava tímida e não teve dificuldade em retribuir aquele olhar, nem tampouco a carícia que recebeu dele na pele alva do seu rosto. Aos poucos, viu a distância entre seus lábios se reduzir, até que finalmente o beijou. Ele a trouxe para si, não encontrando nenhuma resistência e suas mãos dominaram completamente a cintura da elfa, determinando que ela deitasse. Ouviu-se um pequeno ruído das sandálias de Leeta despencando no chão, pois seus pés agora estavam envolvidos com os dele, o tendo sobre si. Os lábios do rapaz se aventuravam na derme do pescoço até a orelha, onde ele lhe mordia o lóbulo de uma forma que a fazia arrepiar e arfar.

Quando veio o segundo beijo, foi repleto de intensidade, de vontade, como se ambos precisassem dos lábios um do outro para respirar, uma necessidade irrefreável. Toda dor e trevas que outrora atormentavam Gabriel, agora sequer pareciam ter existido. Para ele, completamente entregue, a tendo para si também completamente entregue, só existia aquela cama, aquele momento, pois o tempo perdeu seu significado e seu coração finalmente entendeu algo que não adiantava disfarçar, era poderoso demais para ser ignorado. Leeta o queria e isso ficou claro a cada vez que o puxava, que o mordia e o arranhava, que arfava ao sentir suas mãos libertando seu corpo do vestido azul celeste e perpassando por cada uma de suas curvas, muito das vezes a apertando. Sentia a boca dele se apoderando dos seus seios, a inebriando de tal maneira que arqueou o corpo para cima, completamente a mercê. Foi então que as mãos da princesa elfa deram uma ordem clara para que as vestes do rapaz saíssem do caminho, gesto esse que não encontrou obstáculos, mas cooperação. Gabriel sentiu como se suas roupas possuíssem vida própria e desejassem abandoná-lo, então apenas permitiu de maneira sutil, sem, no entanto, se afastar de Leeta, sem deixar de senti-la, de apreciar o quanto estava quente e ao mesmo tempo arrepiada.

Seus corpos se tornaram apenas um. Eles estavam unidos, se sentiam completos e não queriam se distanciar mais do que o necessário, imersos em uma intensa dança de idas e vindas, onde os braços dele se sustentavam sobre o colchão e as pernas dela lhe agarravam com força, puxando e soltando, só para puxar ainda mais forte de novo e de novo. Então Leeta ficou por cima, apoiou as mãos sobre o peito de Gabriel e se moveu repleta de graciosidade. Eles se olhavam, às vezes sorriam e noutras, simplesmente conversavam sem dizer uma única palavra. Não era necessário e ambos sabiam, porque unidos e completando-se um ao outro, seus pensamentos eram exatamente os mesmos e seus corações, um único coração.

 

 

 


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