Mestre do Poço dos Desejos escrita por Sorima


Capítulo 6
Bianca


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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No dia seguinte, ainda de madrugada, nos vestimos com roupas e botas de caminhada, na mochila levávamos um lanchinho, água, o mapa, lanterna e primeiros socorros.

— Vai querer um desses também? – Pedro chamou minha atenção para um bastão de caminhada.

Inevitavelmente me imaginei andando igual o Gandalf com seu cajado. Era quase irresistível...

— Não, valeu. Vou deixar para brincar de maga quando voltarmos.

Pedro arqueou uma sobrancelha e deu de ombros com um sorriso no rosto.

— Você é quem sabe.

Tomamos um café da manhã reforçado, mas que ainda nos deixava leves para fazer trilha. Depois de arrumar tudo finalmente fomos para a borda da mata indicada no mapa que Pedro segurava nas mãos.

— Pronta? – o rapaz me perguntou sério, ao que respondi com um aceno de cabeça.

Então pegou seu bastão de caminhada e entrou na trilha. Abafei a risada que saiu pelos meus lábios, se Pedro usasse um manto e tivesse uma barba grande...

Entretanto, logo minha mente ficou completamente imersa na caminhada, nos sons e cheiros que chegavam até mim, no esforço que minha musculatura empregava a cada passo. A trilha tinha alguns obstáculos naturais, além do chão irregular e às vezes escorregadio, se não tomássemos cuidado tropeçaríamos em alguma raiz ou pedra.

Por esses motivos eu mantinha minha cabeça baixa para ver onde eu podia colocar meu pé. E por isso eu acabei trombando com Pedro que tinha parado de caminhar.

— Opa!

— Ah, desculpa! – falei um pouco ofegante.

— Tudo certo. Você está bem? – perguntou preocupado.

— Acho que me concentrei demais em não cair, acabei prendendo a respiração.

Ele franziu a testa.

— Tenta ver a trilha a frente, assim a sua mente se prepara e seu corpo se adapta a caminhada. E você também consegue ver mais do que só o caminho – Pedro concluiu abrindo o mapa de novo.

— O que houve? Estamos no caminho certo?

— Parece que sim. Nós vamos contornar o morro que tem aqui na frente, atravessar uma ponte e... atravessar uma gruta. Só quero ter certeza que não estamos indo para um ponto diferente – falou tirando uma bússola do bolso.

— Você realmente sabe explorar! – comentei.

— Acho que perdi o jeito, faz alguns anos que não faço isso...

Ele olhou para a direção que deveríamos ir, fechou o mapa e guardou a bússola. Seguimos em frente, e eu tentei seguir seu conselho. Acabou que pude admirar a forma fluída que Pedro parecia deslizar pela trilha. E como ele era ágil. 

Depois disso acabei me distraindo com as plantas ao redor e alguns pássaros nos galhos altos das árvores. Era um mundo verde maravilhoso. Vez ou outra eu encontrava algumas flores pelo caminho. 

Por recomendação de Pedro, nas poucas vezes que paramos para beber água eu tomava goles pequenos, assim a água durava mais e ajudava a controlar a sede. Como eu costumava tomar mais líquido de uma vez só, pelas aulas de canto, foi um hábito novo um tanto desafiador.

O sol já estava começando a parecer quente nas nossas cabeças quando começamos a ouvir o barulho de água.

— Finalmente... – murmurei, antes de perguntar em voz alta, curiosa – De onde vêm este rio?

— De uma cachoeira que tem a nascente nesse morro.  A água é bem limpa aqui.

— Uma cachoeira! – faziam anos que eu não entrava em uma cachoeira, desde que eu era criança.

— Podemos ir lá depois se você quiser. Eu vou gostar de ir lá conhecer também.

— Beleza – concordei já ansiosa com o passeio.

Mas primeiro teríamos que passar pela ponte, que me fez engolir em seco quando a vi. Ela se resumia a três cordas cruzando o largo afluente, uma corda para apoiar os pés e duas para as mãos. Todas fixadas nas árvores que margeavam o rio.

— Ai, meu Deus... – gemi, olhando a distância que teríamos que percorrer suspensos.

Pedro se adiantou para olhar os nós das cordas.

— Parece que quem amarrou isso daqui fez um bom trabalho. E as cordas ainda estão em boas condições. Parecem novas... – falou depois de uma rápida análise.

— Humm – respondi com a boca seca.

— Bianca, você tá bem? – ele questionou depois de ver a minha cara, que eu não fazia ideia de como parecia estar.

— A qual conceito de ‘bem’ que você se refere?

— Parece meio pálida, e assustada. Quer comer antes da gente atravessar?

Talvez a comida não ficasse no estômago se eu comesse alguma coisa.

— Não – minha voz soou trêmula.

Pedro olhava pra mim confuso, então olhou para a “ponte” e sua expressão pareceu clarear. Ele agitou o cabeço com a mão, sem jeito.

— Se quiser a gente encontra uma forma diferente de atravessar. Certeza que os vizinhos emprestam um barquinho de pesca e remos para a gente.

Era uma possibilidade, mas aí teríamos que voltar depois. Respirei fundo e fechei os olhos. Era agora ao nunca.

— Vamos atravessar isso logo. Da água eu não passo.

Ele olhou de testa franzida para o rio com algumas rochas aparecendo na superfície, mas não falou nada além de:

— Certo.

Olhe para frente, para o seu objetivo, não olhe para baixo, Bianca.

Repeti o mantra algumas vezes na minha mente enquanto colocava os pés e mãos nas cordas grossas daquele lado do rio, as minhas mãos já frias e suadas. Dei passos hesitantes para frente e tinha consciência de que já estava acima do rio quando ouvi Pedro atrás de mim:

— É igual na trilha, Bianca, olhe para frente e confie no seu corpo.

— Tá... – respondi num suspiro.

Continuei andando trêmula até o meio do rio, a imagem de mim caindo nas rochas abaixo me deixando cada vez mais tensa.

— Você está indo bem, continue! – Pedro me incitou atrás de mim; parecia meio longe demais.

Olhei para trás assustada. Ele ainda estava na margem. Minha boca entreabriu de pavor e em meio a um gemido de medo as lágrimas começaram a se acumular nos olhos. Ele me deixou ali sozinha! Solucei me agarrando com mais força nas cortas, as lágrimas escorrendo.

— Bianca, respira! Você está indo bem! Você já foi até aí sozinha! – Parei atenta, aquela não era a voz de Pedro. Aquela voz era um eco na minha mente, era a voz da minha tia Rosa, de quando eu ainda era pequena.

Fechei os olhos com força e engoli os soluços me concentrando em respirar até que me acalmasse. Quando senti minha musculatura relaxando me vi andando em uma passarela, igual a uma modelo; confiante; poderosa; leve. Dei outro passo à frente. Eu estava arrasando ali, e mais um passo. Ganhei confiança.

Dei vários passos seguidos, as mãos praticamente escorregando nas cordas laterais. Então chutei alguma coisa dura e arregalei os olhos. Havia uma árvore na minha frente. Joguei meus braços ao redor dela, abraçando-a com força enquanto as lágrimas saiam.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo programado para lançar dia 18/01/2014



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