A missão escrita por camibsva


Capítulo 5
Terra firme




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Mesmo o laranja das chamas desfaleciam, foscas, sob meu olhar preocupado. Simas Finnigan e Dino Thomas se esforçavam para regar este jardim murcho, chamado Salão Principal. Todos nós, rosas esperando chuva, sol, a essência de alguma juventude que parecia ser arrancada de nós — em progressivos atentados, a cada roxo, gota, pingo de violência derramado — matavam algo. Tentavam dilacerar nossos símbolos, enquanto massacravam nossos corpos. Todo quadribol, toda taça das casas, clube de duelos, mesmo a reunião de Slughorn, nada permaneceu o mesmo.  

Perdi a conta de quantas vezes titubeei sob aquela mesa. Dúvidas que não terminavam — se minha mãe estava bem, se a Ordem da Fênix tinha progresso, — e que ecoavam, livres, pelo ar. Fé inabalável? Piada que pensassem isso de mim. Também piada Zabini me chamar de imaculada. Naquela doçura arrogante, eu não sei se ele realmente acreditava no que dizia. É certo que, como as chamas do salão, certas ventanias quase me apagavam, mas jamais me extinguiam. Afinal, eu precisava continuar indo e me manter acreditando. A questão era até quando. 

“Sinceramente.” Logo pela manhã, Gina Weasley acordava exausta. “Minerva e os garotos estão fazendo o possível para salvar os livros, mas até onde sabemos é bem possível que queiram fazer uma revista total. Se isso acontecer, estamos perdidos”. 

Tudo que é subversivo à Voldemort merecia destruição. A literatura trouxa ou simpática simplesmente estava sendo erradicada da escola e, provavelmente, do resto do mundo. Também não me impressionava a pressão cada vez mais forte sobre os alunos, com ameaças constantes de revistas. Se decidissem tomar meus pertences de enfermagem, se encontrassem a coleção de moedas que Finnigan tanto gosta, quantas memórias e histórias seriam desperdiçadas? Destruir o simbólico. E quem sabe, destruir as cobaias e a missão. 

“Angelou,” — Gina Weasley pegava em meu ombro, como se adivinhasse meu súbito medo, e sorria como um fantasma de boas intenções. — “Vamos dar um jeito. Você sabe que eles estão por aí tentando, e nós também precisamos continuar. É só tomarmos cuidado. Zabini, por exemplo. Anda conversando demais com você, não é?”  

“Não é desse jeito. Não confio nada a ele”. — Weasley fez sinal. Quis que eu prosseguisse. — “Ele tem marcas como as minhas. Avery tatuou o meu nome nele”.  

"Certeza de que não se trata de um truque para...?” 

“Certeza que foi real, Pomfrey checou”. 

“Merlim, pois isso torna tudo mais difícil. Complicado acreditar que ele permaneceria em punição por meses sendo que até agora não conseguiu se quer uma informação. Mas ainda mais difícil acreditar que aquele garoto simplesmente se apiedou e se arrependeu por sua causa. Parece até sinopse de romance barato.” — Weasley apertou o olhar para mim. Um sugador. — “Me fala. O que ele quer de você?” 

"Nada, não deixa nada claro”. 

“Nada?” 

“Não é como se não tivesse tentado me afastar. Ele insiste”. 

“Ele é agradável?” 

Assenti com a cabeça.  

“Bom, pelo menos isso”. — Gina Weasley tampou o rosto. — “Não dá mais para aguentar comensal chato no pé, não é mesmo?” 

Gina Weasley acrescentou mais algumas hipóteses, enquanto mordia um pedaço de pão. Disse que logo Zabini sentiria o peso das contravenções e voltaria a delinquir feito uma criança arrependida. Estávamos falando do imperador verde, afinal. O garoto que, de alguma forma, parecia seguir meus rastros pela escola.  

Começava a ser proposital. Proposital e inútil, claro. O que ele desejava, afinal, que fosse extrair informações ou destruir a missão, não obteria. Seguia suportando suas investidas, como uma rocha resistente ao mar revolto, feito os olhos de Zabini. Duas ondas cinzentas que tentavam afogar todo trabalho de resistência. 

“Subversiva? É assim que punem as garotas, escrevendo coisas no punho delas?”  

Certo dia, Zabini ofereceu-se para carregar meus livros até a sala comum, depois de uma cansativa aula de poções. Subimos as escadas em caracol. Atrás, os colegas de Zabini olharam, curiosos.  

“Subversiva e cristã. Uma combinação e tanto”.  

“Todos nós sabemos o preço a pagar.”  

“Cristo sabia”.  

“Exato”.  

“E mesmo assim permaneceu no caminho de dor.” — Zabini abraçou os livros com força, para evitar que caíssem. — “Como você”. 

“Todos que estão escalados de alguma forma continuaram neste caminho, Zabini”. 

“Está me incluindo na contagem?” — ele deu um riso. Mistura entre sarcasmo e lamento. — “Sei que não confia em mim, Angelou, e eu também costumo pensar com franqueza: e se o espírito que entrou em Judas também tomar a mim?”.  

“Cristão?”  

“Não confunda. A coisa humana que me chama atenção. Esses mitos, no fundo, são coisas dos trouxas, não são?”.  

“Claro, coisas dos não-majis que precisam de mitos para suportarem a vida. Eu sei onde você quer chegar, Zabini, bem antes que ouse arriscar sair".  

“Isso não é verdade, Angelou. Acho que os não-majis são interessantes, e por isso me irrito com as aulas de Avery.” 

“Você só pode estar de brincadeira”.  

“Não estou”. 

“Está bom. Daqui posso levar meus livros”.  

“Preste atenção, você está exausta.” 

“Todos nós estamos, Zabini.” — Tomei os livros de seu colo. — “Só pare de dizer essas coisas como se realmente as sentisse.”   

Ele repetiu meu nome, mas eu encontrei terra firme. Subi as escadas sem olhar para trás. 


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