Era Uma Vez... Uma Ilusão escrita por Landgraf Hulse


Capítulo 6
5. Ninguém é realmente perfeito... tirando nossa família, claro. Nós somos perfeitos.




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Era como o encontro de dois oceanos, porém, enquanto um era azul e profundo, o outro era azul e gélido. Dois oceanos, um quente e outro frio, contudo eram dois sentimentos iguais... corando violentamente, a princesa soltou a mão do marquês e abaixou a cabeça. Os oceanos foram separados. A primeira reação de Richard foi abrir a boca e tentar falar algo, mas, ao lembrar que havia um público, ele desistiu.

Os outros três irmãos Bristol também deram um passo para frente e fizeram uma mesura a princesa, uma ação que ela assentiu em reconhecimento. Richard tentou novamente encontrar os olhos dela, mas a princesa parecia fugir dele de tão difícil que estava sendo.

— E-espero que sua viagem tenha sido agradável. — Ouvindo a própria voz rouca, Richard apertou fortemente os punhos. Por que tanta dificuldade assim para falar com ela!? Mesmo de cabeça baixa, a princesa assentiu. — Ficamos preocupados quando chegou a notícia de que seu navio havia pego uma tempestade.

— Já passou, Sua Alteza Sereníssima, isso que importa. — A voz dela estava séria e formal. Ele estendeu a mão ao rosto da princesa, mas parou assim que... ela o encarou sorrindo. — Eu cheguei em Londres, então todas as adversidades passadas valeram a pena.

Embora continuasse a encará-lo, as bochechas da princesa novamente ficaram vermelhas, fazendo Richard perceber o que estava fazendo. Corando violentamente, o marquês abaixou a mão.

— Aprecio seu pensamento positivo. — Ele sorriu tensamente e os dois ficaram em silêncio. Foi Robert, e seu limpar de garganta, que fez Richard despertar. O marquês apontou aos irmãos. — Creio que meus dois irmãos caçulas já tenham se tornado conhecidos a sua pessoa.

— São dois jovenzinhos muito agradáveis. — Agradáveis!? Robert!? Richard levou uma mão à boca e riu divertido. A princesa encarou confusamente o noivo. — Perdão, mas eu falei algo errado?

— Certamente que não, minha princesa. — Tentando conter-se, o marquês respondeu. Cathrine ainda estava confusa, então, respirando fundo, Richard apontou para a irmã restante. — Esta é Anne, a irmã seguinte a mim, assim como a senhora desta casa.

Dando novamente um passo para frente, ficando praticamente ao lado dele, Anne encarou fixamente a futura cunhada e fez uma simples mesura. Mesmo estando na simples condição de espectador, Richard sentiu a tensão daquele momento, da mesma forma que percebeu o olhar analisador da irmã na princesa. Pobre Cathrine, iria sofrer tanto nas mãos de Anne, a menos, claro, que...

— Estou encantada, Sua Alteza. — O cumprimento de Anne frio, insincero. Definitivamente, uma pobrezinha, Richard encarou com pena a assustada Cathrine. — Seja bem-vinda a nossa real família imperial.

— Já consigo me sentir inclusa nela, profundamente inclusa. — Havia muito medo nessas palavras. A princesa, porém, percebendo o olhar do marquês, voltou-se para trás. — Que corte mais grande, sinto-me como na presença de reis.

Como se fosse o sinal esperado, todos os espectadores fizeram uma rápida mesura e começaram a se aproximar da princesa. Por um momento Richard achou tê-la visto voltar para trás, assustada, porém, antes que ele pudesse ir para junto da noiva, Anne acrescentou:

— Oh, querida, somos quase tão grandes quanto reis. — Cathrine, cujo olhos estavam arregalados, encarou com horror os quatro irmãos. — Nem mesmo George III possui tanto sangue imperial quanto nós.

O marquês deu à irmã um olhar duro, que foi respondido simplesmente com um dar de ombros. Anne não poderia ao menos fingir que gostou da princesa? Ela conseguia fazer isso muito bem com alguns outros. Voltando-se novamente à noiva, Richard a encontrou praticamente envolta por cortesãos. Uma visão de fazer sentir pena, então ele caminhou para junto dela...

Antes, porém, que o marquês pudesse se distanciar muito, Anne agarrou fortemente o braço dele, parando-o. Richard franziu o cenho e encarou a irmã.

— Algum problema?

— Eu que faço essa pergunta: algum problema? Você encontrou algum problema nela? — Na princesa? Richard fitou a irmã e depois a noiva. Não havia nada de errado em Cathrine. Embora tímida, ela mostrou-se digna, honrada e submissa, não havia problema. — Deslize, erro, descortesia ou qualquer outra coisa do tipo?

— A princesa não mostrou erro algum. — Já irritando-se com essa insistência, Richard respondeu. — Ela foi perfeita.

— Aí está, ela foi perfeita! — O marquês franziu o cenho, desde quando isso era um problema? Anne apertou o braço do irmão e explicou: — Ninguém é realmente perfeito, Richard, nem mesmo uma princesa, tirando nossa família, claro. Nós somos perfeitos.

Não foi o suficiente para Richard desfazer o franzir, muito pelo contrário, o marquês fez Anne soltar o braço dele e afastou-se em direção a noiva. A princesa Cathrine estava praticamente sozinha com os cortesãos, de vez em quando ela olhava em direção aos Bristol, sorrindo, de fato, mas um sorriso que suplicava por socorro. Ela parecia até desgostar dessa atenção... curioso...

Não demorou muito e Anne, Robert e Mary também foram para perto do irmão e da futura cunhada, bastou isso para as conversas focarem nos Bristol, fazendo com que a princesa fosse quase suplantada em atenção. Com essa dominação foi mais fácil tomar o controle das conversas, e mais fácil ainda encerrá-las. Logo todos os cinco estavam cruzando um dos corredores de Hampton Court, Richard e Cathrine estavam na frente, bem como de braços dados.

— Peço perdão pela falha, minha princesa. Eu não deveria ter deixado isso acontecer. — Cortando o frágil silêncio instaurado, Richard falou negando para si mesmo. A princesa piscou sem entender do que ele falava. — Acabamos deixando-a sozinha com a corte, não deveríamos ter feito isso. Foi um erro meu.

— Oh, meu príncipe está falando disso? — Poderia ser outra coisa? Richard assentiu veemente, enquanto a princesa negou. — Não existe... problema algum.

Não? Cathrine estava longe de parecer certa disso. Os olhos dele continuaram a encará-la, tanto que a princesa corou e voltou-se para frente. O silêncio voltou a reinar, mas por pouco tempo:

— Claro que não existe problema! Estão apenas curiosos, logo passa... Ouch! — Atrás do casal, fazendo ambos franzir o cenho ao escutar a exclamação, Anne pisou fortemente no pé de Robert. — Digo, logo esse excesso de atenção acaba.

— Não fique tão preocupada assim com tudo isso, Cathrine. Como eu disse antes, logo você se acostumará com tudo. — Muito gentilmente, Mary acrescentou. A princesa sorriu, embora continuasse a olhar para frente. — Estou certa, Anne?

— Absolutamente, afinal, não existe outra opção a não ser esta. — Tão conveniente. Richard encarou a irmã e negou. Anne não esboçou reação alguma, isto é, não até Robert pisar na cauda do vestido dela, fazendo-a quase cair para trás. — Robert! Se você fizer isso novamente eu picoto seu cabelo!

Robert afastou-se das irmãs com a raivosa fala de Anne, ela tinha sangue nos olhos! Não conseguindo aguentar, Richard começou a rir divertido deles, sendo rapidamente seguido por Mary. Porém, surpreendentemente, a princesa Cathrine também começou a rir. Foi o suficiente para Robert deixar as irmãs e pegar o braço solto da futura cunhada.

— É louca, minha princesa, isso que ela é: uma louca mental. — O jovem Kendal até mesmo passou uma mão pelo cabelo, ondulações que quase chegavam nos ombros. Richard riu e negou ao irmão. — Onde já se viu, seria isso possível, eu de cabelo curto? Como Richard? Louca!

— Seria confuso, de fato, mesmo que o cabelo do marquês seja mais claro. — Mas havia muitas diferenças entre eles. Richard tinha a típica aparência Tudor-Habsburg: frágil e quase doentia. Já Robert tinha vigor e força, embora também houvesse alguma fragilidade. — De qualquer forma, devo confessar que não estou muito habituada com multidões.

— É pode uma princesa não estar acostumada com multidões? — Richard comentou risinho, era uma ideia tão tola... porém, ao perceber o tenso sorriso que havia no rosto de Cathrine, ele ficou sério.

— É algo possível sim, meu príncipe. — Como? O marquês fitou os irmãos e depois a noiva. Ela queria dizer que... a princesa engoliu em seco. — Principalmente... considerando que eu nunca fui formalmente apresentada à corte.

Foi o suficiente! Richard parou imediatamente a encarou com os olhos arregalados Anne, Robert e Mary. Todos os três tinham a mesma surpresa dele. Ninguém tinha avisado isso antes, ou melhor, como ninguém avisou isso antes!?

— Nunca foi apresentada?... como assim você nunca foi apresentada a corte dinamarquesa!? — Altamente, fazendo todos eles fecharem dolorosamente os olhos, Anne perguntou descrente. A princesa assentiu. — Mas você é sobrinha do rei! Seu primo é o príncipe regente! Seu pai já foi príncipe regente! Como nunca foi apresentada!?

— Esses últimos anos não foram nada felizes. Muitas mortes, e Christiansborg... — Foi praticamente um pedido de desculpas. Richard tentou apertar a mão de Cathrine, mas ela continuou: — O rei está louco e o príncipe regente nunca gostou muito da minha família.

Parecia realmente mais uma desculpa que um esclarecimento. Foi impossível para Richard não negar, enquanto Anne negou mais horrorizada ainda. Que terrível! Principalmente para a segunda mais velha.

— Vejo então que não serei apenas eu a apresentada a corte ano que vem, mas a marquesa também. — Nesse momento, com a dura ordem de Anne, a princesa Cathrine agarrou fortemente o braço de Richard, quase fazendo doer nele. Ele sentia pena, mas... — Para onde estamos indo mesmo?

Novamente todos eles pararam, mas dessa vez para encará-lo, afinal era o marquês que estava liderando. Entretanto, Richard piscou confusamente.

— Para onde estamos indo, você pergunta... oh, mas que situação engraçada. — Ele havia esquecido o destino. Anne, Robert e Mary direcionaram ao irmão olhares negativos. Pegando a mão de Cathrine, Richard falou ainda indeciso: — Creio que seja a... galeria.

A galeria?... sim, era a galeria! Todos eles voltaram então a andar em silêncio pelo corredor. Havia algo para ver na galeria. Entretanto, quando eles estavam prestes a virar no corredor, Mary falou:

— Você achará nossa galeria bastante... familiar. — Em todos os sentidos possíveis.

*****

Carlton House, Londres

Ao passar pelos portões e cruzar o pátio principal, uma berlinda fechada, assim como decorada com um brasão real, parou no pórtico da Carlton House. Um lacaio, usando uma libré real, imediatamente desceu de seu lugar e abriu a porta da carruagem...

No interior da casa, observando o próprio reflexo por um dos grandes espelhos da magnífica primeira antecâmara de Carlton House, o príncipe de Gales desconhecia a atual presença de convidados, embora não desconhecesse sua vinda. Ele, porém, não estava sozinho na sala.

— Sua presença lá realmente é necessária, Georgie? — Abraçando-o por trás, Frances Villiers, a condessa de Jersey e atual amante do príncipe de Gales, perguntou carente. Sem receber uma resposta, ela então sussurrou: — Ando me sentindo tão sozinha esses dias, seria maravilhoso ter uma companhia.

— Com certeza alguma das suas filhas casadas ficaria muito feliz com uma visita. Certamente Lord Jersey também ficaria. — George riu consigo mesmo e negou, irritando assim a amante. Lady Jersey franziu o cenho. — Oh, querida Frances, não fique assim, sabe como sou necessário em St. James hoje.

— E como eu fico nessa história? Apodrecendo sozinha!? — Dando as costas ao amante, Lady Jersey perguntou irritada ao afastar-se dele.

Permanecendo um momento em silêncio, George analisou uma última vez o próprio reflexo no espelho, arrumou a faixa da Jarreteira e, revirando os olhos, aproximou-se da condessa com um sorriso acalentador.

— Jamais, minha querida, eu nunca permitiria isso. — Pegando nos ombros dela, George tentou explicar, mas Lady Jersey afastou-se novamente. Parecia uma brincadeira com a paciência dele.

— Mas não parece! Deveria eu voltar para Middleton Park? — A voz de Frances saiu chorosa, como o desejado. Novamente o príncipe de Gales aproximou-se, fazendo ela ser mais dura. — Ou só depois da católica voltar!?

A expressão do príncipe de Gales ficou profundamente afetada, a simples menção de Maria Fitzherbert poderia ter um grande poder sobre ele, tanto que o herdeiro avançou com rapidez em direção a amante. Por um momento parecia até que Lady Jersey estava em perigo, mas antes de qualquer coisa acontecer, o príncipe a abraçou amorosamente.

— Isso nunca acontecerá, você sempre estará comigo. Não vivo sem você. — A condessa sorriu satisfeita com as palavras. Revirando os olhos, George aproximou-se do ouvido dela. — Mais tarde, após a festa, será a nossa vez de festejar.

— Eu...

— Pensava que a corte era um local de elegância e cortesia, mesmo a sua, querido irmão. — Interrompendo Lady Jersey, o príncipe William, o duque de Clarence, entrou sem escrúpulo algum na antecâmara. Imediatamente os amantes endureceram o rosto. — Será que estou enganado? De você eu não duvido nada.

— Por que você está aqui, William? Eu chamei Sophia, não você! — Parecia a resposta de uma criança mimada. Clarence, porém, não respondeu, deixando George muito irritado. — Onde está Sophia!?

— Sophia está esperando na carruagem. — Aproximando-se de George com uma anormal calma, o duque respondeu e sorriu divertido. — Ou você acha que eu deixaria nossa anjinha ocupar o mesmo ambiente que a sua vadia? Sophia não merece tal humilhação.

Parando em frente ao príncipe de Gales, o duque de Clarence encarou o irmão, que fez o mesmo. Um desafio ao tamanho da voz de cada um. Enquanto isso, Lady Jersey observava a cena com um certo desgosto, a intriga sempre interessava a ela, de fato, mas não agora.

— Creio que vou me preparar para mais tarde, com licença. — Fazendo uma simples mesura aos príncipes, a condessa afastou-se, mas não sem antes dizer: — Não fui convidada para o casamento, mas a festa é outra coisa.

Não houve resposta de lado algum, apenas o herdeiro assentiu e o duque sorriu tolamente, como lhe era normal. Quando a condessa saiu da sala, ambos os irmãos voltaram a se encarar fixamente, novamente um desafio.

— Uma vagabunda de primeira qualidade, nunca me cansarei de dizer, George. — E a boca de William tão suja quanto o Tâmisa. O duque riu irônico. — Tão boa que até conseguiu separar você e Caroline, não que fosse um casamento forte, claro.

— Eu já estava com Frances antes do casamento, você sabe, assim como sabe que foi ela mesma que me coagiu a aceitar essa tortura. — Dando as costas ao irmão, George respondeu secamente. Porém ele parou e lembrou: — Mande Sophia entrar, Charlotte quer muito vê-la.

— Ah, então este é o seu objetivo: usar Sophia como babá. Nossa irmã tem mais o que fazer. — Ou talvez não... William respirou fundo e tentou parecer mais sério. — Por que você não deixa de ser um pau no cu e traz Caroline…?

— Por que você não cuida da sua vida e deixa a minha em paz!? — Voltando-se novamente ao irmão, o príncipe de Gales respondeu duramente. Clarence não tremeu, porém ele não esperava pela pergunta seguinte: — Foram eles que mandaram você, não foi?

Os olhos do duque arregalaram. Então George realmente já estava acostumado com esses apelos. Não disseram que seria assim, embora fosse bem previsível. William negou, suspirou e encarou o irmão mais velho.

— Queremos apenas o bem da pequena Charlotte. Lady Jersey é uma influência...

— Lady Jersey é, como você diz, uma vadia, e a presença dela está começando a ficar terrível. — Era revelações. O rei e a rainha iriam achar isso bem... curioso. Porém, inerentemente ao que o irmão pensava, o herdeiro sorriu consigo mesmo. — Quero novas aventuras.

— Do que você fala exatamente? — Quais seriam essas novas aventuras...? O sorriso que George deu já dizia tudo! William negou e passou fortemente a mão no rosto. — Você é um pau no cu, George!

— Talvez, e você é um idiota. A questão é que vou voltar para Maria, ou tentar pelo menos. — As tentativas já haviam começado, na verdade, desde o verão o príncipe escrevia para Maria Fitzherbert. — Charlotte irá sobreviver, agora, por favor, chame Sophia.

Nenhuma palavra saiu da boca de Clarence, ele estava terrivelmente surpreso com essa informação do irmão. Porém ele ainda conseguiu sinalizar para algum criado chamar a princesa Sophia. Uma merda! Essa situação era uma merda!

*****

Qual seria a palavra, a mais abrangente possível, que definiria a galeria dos Tudor-Habsburg em Hampton Court? Vaidade? Ostentação? Soberba?... Pretensão? Cathrine queria muito saber a resposta, mas estava sendo bastante difícil descobrir. Todos os sinônimos dessas palavras pareciam definir este lugar.

Normalmente toda a realeza tinha orgulho da sua história, da sua própria imagem, mas os Tudor-Habsburg pareciam ter levado esse orgulho para um outro nível. Assim que eles entraram na galeria, após alguns desastres que ela queria esquecer, Cathrine arregalou os olhos em espanto. O lugar estava repleto de pinturas mostrando a família. Rostos, rostos e mais rostos, muitos sorrisos também, mas... se não estivesse agarrada fortemente a Richard, Cathrine teria paralisado.

— ... o marquês William e Catherine da Áustria trouxeram algumas dessas pinturas de Viena, como pode ver... — Ao passarem por duas pinturas mostrando um casal imperial do século XVII, Richard continuou sua explicação. — Muitas outras, porém, na verdade a maioria, foram feitas na própria Inglaterra...

— Por isso algumas são tão... pastéis. — Bem no momento que Robert falou, eles passaram na frente da pintura de três jovens, cujo olhar de uma poderia congelar o mediterrâneo inteiro. Frias, essa seria a melhor palavra para descrevê-las.

Por quê? Cathrine não estava entendendo, qual o motivo de trazerem ela aqui?... Por que a princesa Anne estava sempre encarando-a? Talvez eles estivessem querendo mostrar como os Tudor-Habsburg eram belos e perfeitos. Uma realeza gloriosa, rica e cheia de atributos... ela mordeu os lábios com esse pensamento e negou discretamente. Parecia mais intimidação... por quê!?

De alguma forma ela teria os ofendido? Alguma ação ruim? Cathrine não sabia, e estavam com muito medo. E ainda havia a princesa Anne, que, muito diferentemente dos outros que ao menos pareciam querer fazê-la sentir-se bem-vinda, mostrava-se terrivelmente superior e arrogante. Parecia até estar querendo provar algo, melhor ainda, tentando construir algo.

— ... essa é nossa avó, a marquesa Elizabeth. — Sendo despertada dos pensamentos pela voz de Richard, Cathrine percebeu então que eles haviam parado em frente a pintura de uma mulher, aparentemente em 1770, sentada abaixo de uma árvore. — Ela não era bonita? Uma plebeia pelo nascimento, de fato, mas muito bela.

— Ela era linda... Richard. — Ao falar o nome dele, a princesa corou, mas continuou encarando-o. O marquês sorriu e abriu a boca...

— A beleza da corte da rainha Charlotte, realmente. Mas a marquesa Elizabeth não era apenas bela, ela era real. — Anne comentou sorrindo presunçosamente. O rosto de Cathrine voltou ao normal, e um nasceste sorriso nela morreu. — Nossa avó possuía todas as principais características para ser uma perfeita princesa. Ela era honrada, bondosa e uma companheira capaz. Certamente a melhor das consortes de Bristol.

Foi um comentário tão rígido esse, parecia estar sendo direcionado diretamente para ela. A princesa dinamarquesa encarou novamente a pintura da bela marquesa.

— Eu não concordo com a sua opinião, Anne. — Indo para o lado dela, quase fazendo Cathrine fechar os olhos assustada, o príncipe Robert falou indiferentemente ao analisar a pintura. — Vovó era perfeita, isso é fato, mas acho que o príncipe Frederik foi o melhor consorte. Ele nos deu Niedersieg, afinal.

— Creio que Anne esteja se referindo à consorte mulher, Robert. — Mary respondeu em tom doce, embora um tanto irônico.

— E eu generalizando. — Ainda indiferente, Robert respondeu.

Não chegava a ser uma discussão, mas era perceptível que havia alguma provocação. Cathrine encarou um momento Richard, que sorriu e deu os ombros. Então era sempre assim... mas que situação.

— Certamente podemos aprender muitas coisas de todos os consortes anteriores. — Richard voltou a tomar a palavra e apontou para frente, eles deveriam continuar. — Todos tinham qualidades e defeitos que tornam-se ensinamentos. Algo que devemos seguir.

Então como Cathrine seria? Ela não trouxe riqueza, e muito menos mais influência. Ela era apenas a segunda Oldenburg a casar com um Tudor-Habsburg, uma "carta repetida". De forma alguma havia nela perfeição, beleza impressionante ou opiniões fortes. Cathrine conhecia-se o suficiente para saber que não se interessava por arte, ciências, moda ou alta sociedade, bastava apenas os livros e ter uma vida "normal".

Mas essas mulheres, as princesas Tudor-Habsburg, nada pareciam ter de normal, em nada se pareciam com Cathrine... Santo Cristo! A princesa arregalou os olhos e apertou com força o braço do marquês. Ela seria apresentada a corte real britânica! Iria transitar pela alta sociedade britânica! Jesus Cristo, seria um terrível desastre! Já era possível até ver!

Porém o que a princesa não percebeu é que ela estava sendo observada atentamente pelos Bristol, ou melhor, Cathrine até percebeu, mas já era tarde. Todos estavam encarando-a, como se ela fosse muito estranha.

— Algum problema? — Foi a única coisa que saiu da boca dela, antes de corar e fitar o chão.

— Nós é que deveríamos fazer essa pergunta. Algum problema? — Jesus Cristo! O comentário, embora não tão frio, de Anne fez Cathrine ficar ainda mais vermelha. — Você estava...

— Parecia até que estava tendo uma visão. Foi terrível! — Terrível!? Cathrine arregalou mais ainda os olhos e encarou Robert, que tinha uma expressão... dramática? — Seus olhos estavam fechados, e com muita força, sua respiração estava terrivelmente pesada.

Por um momento ela realmente ficou preocupada, mas bastou olhar para os outros e essa preocupação passou. Richard, Anne e Mary negaram para ela.

— Robert está exagerando, não fique preocupada. Ele é terrível, ama infernizar nossas vidas. — Com o comentário risonho de Mary, Richard e Anne riram, embora Robert tenha arrogantemente virado o rosto. Porém logo a princesa mais jovem ficou séria. — Mas falando sério agora, você está bem, Cathrine?

— É apenas a ansiedade agindo em mim, o casamento é um marco na vida de toda mulher. — Um laço que apenas a morte poderia desfazer. Cathrine fitou Richard, que a encarou de volta... eles iriam casar logo... ambos coraram violentamente, então a princesa virou o rosto e apontou: — E quem é essa? É tão bela e perfeita quanto uma rosa.

Foi a primeira pintura que ela viu e aparentemente a mais importante também. Era uma mulher, com o característico cabelo loiro alaranjado dos Tudor-Habsburg, ela vestia rosa e branco, assim como tinha um belo sorriso no rosto. Certamente era a mulher mais bela que Cathrine havia visto, mesmo sendo apenas uma pintura. Impressionante! A princesa, porém, ao voltar-se aos Bristol, encontrou todos eles encarando a pintura com emoção.

Bastou isso para Cathrine descobrir quem era essa mulher.

— É mamãe, quem mais poderia ser?... é o meu quadro favorito dela. — Richard até tentou mostrar alguma alegria, mas foi impossível. Novamente a princesa fitou a pintura. A quase lendária marquesa Katherine, a mulher mais bela de sua época... quanto peso. — Vamos ver o seu novo quarto? Está um pouco longe, mas acho que você vai gostar.

Que mudança brusca, Cathrine fitou assustada os outros, mas nenhum deles parecia disposto a concordar com ela. Tudo bem então, Cathrine também nem sempre queria falar sobre a própria mãe.

Não demorou muito, pelo menos não para Cathrine, e logo o grupo chegou aos aposentos da marquesa de Bristol. A primeira parte dos aposentos, a antecâmara, não parecia ser muito ruim, era espaçosa, confortável e ricamente decorada, mas foi o quarto que assustou a princesa. Apesar de muito espaçoso, era da marquesa, afinal de contas, havia muito vermelho no local, além de estar terrivelmente empoeirado.

— Nossa avó foi a última pessoa a ocupar esse quarto. Depois que o marquês Alfred morreu, ela mudou-se daqui, e mamãe recusou-se a ocupá-lo. — Mesmo com Richard falando, Cathrine continuava a analisar o local com cuidado e... uma expressão receosa. — Como pode ver, a marquesa Elizabeth queria realmente provar que era realeza.

Certamente queria, tudo nesse quarto remetia ao vermelho usado pela realeza, parecia até os aposentos de um cardeal católico. Desde as paredes, passando pelos estofados até os tapetes e coberta, tudo era vermelho, apenas as cortinas e o dossel da cama tinham cores mais claras.

— Você poderá redecorar como desejar, menos a cor das paredes, claro. — Pelo menos era um quarto iluminado. Cathrine tentou sorrir para Anne e aproximou-se da cama. — É do seu agrado?

— Eu agradeço pelo arranjo. — Não foi uma resposta. Sob o atento olhar dos Bristol, a princesa sentou na cama e sorriu. — É condizente com a minha nova posição, então está perfeito.

Foi o bastante para fazê-los sorrir, ou assentir no caso de Anne. O silêncio tomou então de conta do quarto, um silêncio tão profundo que tornava-se desconfortável. Com um suspiro distraído, Cathrine voltou a observar os aposentos, seria uma ótima forma de distrair-se. Ela teria um grande a fazer neste lugar... e falando em trabalho, a princesa fitou os Bristol e abriu a boca...

— Sugiro que você chame suas damas de companhia e prepare-se para o casamento. — Antes, porém, de qualquer palavra sair, Anne interrompeu impaciente. Cathrine franziu o cenho, mas logo percebeu que ela estava certa. — É uma viagem até que boa daqui a St. James.

— Acho que Cathrine iria nos perguntar algo, Anne, você a interrompeu. — A segunda princesa mais velha revirou os olhos ao comentário do irmão. A jovem noiva mordeu os lábios, e mordeu mais ainda ao ser fitada por Richard. — Faça a sua pergunta, não tenha medo.

— Eu... não iria fazer pergunta alguma, meu príncipe. — Cathrine sinalizou que não, embora fosse uma mentira. Naturalmente, Richard não pareceu acreditar muito, então ela mudou de assunto: — Por que nosso casamento será em St. James? Por que não aqui, em Hampton Court?

— Desde 1740 os Tudor-Habsburg casam na Capela Real de St. James, seria impensável para um de nós casar em outro local. — Era então uma questão de tradição. A princesa assentiu a explicação do marquês. — Não importa onde vivamos, seja em Kensington ou alguma das propriedades principais e secundárias, sempre casaremos em St. James.

— Faz algum sentido, desde Christian V os reis dinamarqueses são ungidos em Frederiksborg, menos meu tio. — Porém, ainda havia uma coisa que a princesa queria entender: — O que são propriedades principais e secundárias?

— Residências principais são as que usamos com alguma frequência, o Castelo de Ocenia, Amelian House e Josephean Hall, que usamos quando queremos ver o mar, ou seja, nunca. — Mas que coisa. Cathrine riu levemente da espirituosa explicação de Robert, enquanto os outros apenas negaram sorrindo. — Ah, não podemos esquecer de Goldenhall, o palácio em construção.

— Já as secundárias são as residências que normalmente não usamos, como Tudor House, aqui em Londres; Llanover Park, no País de Gales, e Lancaster House, onde fugimos quando nossos pais... — Quando os pais deles? Recebendo um duro olhar de Richard, Mary calou-se. Cathrine franziu o cenho, curiosa, mas ela não saberia: — Como eu disse antes, quase nunca usamos.

Curioso isso, muito curioso. Após esse comentário da princesa mais jovem, os irmãos Bristol se entreolharam receosos e depois voltaram-se para a princesa, sorrindo como se nada tivesse acontecido.

— Temos também Austen Manor, em Cumberland, e Oldenburg House, também em Londres. — Robert disse Oldenburg House? Esse último nome chamou a atenção da princesa, porém Kendal não percebeu. — São as propriedades que papai deixou para mim, junto com o título de duque de Kendal.

Que interessante, tudo soava tão interessante, mas ao mesmo tempo tão confuso para Cathrine. Como ela se acostumaria com tudo isso? Logo, as damas de companhia foram chamadas, a princesa foi vestida para o casamento e as carruagens da corte dos Bristol saíram de Hampton Court rumo a St. James, onde a legítima corte britânica estava, onde o casamento seria consumado.


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Notas finais do capítulo

* Temos aqui mais um capítulo mostrando um "núcleo paralelo", foi muito gostoso criar essa interação entre o príncipe de Gales e o duque de Clarence, outros membros da família real. Assim como também falar de Lady Jersey, a amante que nesse ponto estava perdendo o lugar. Uma coisa: se fosse um filme ou série, eu colocaria aquela cena deles, Gales e Clarence, conversando bem em frente a pintura da princesa Sophia.

* Carlton House era uma casa grandiosa, era praticamente um palácio, mas sem ter a designação de palácio. É uma pena que foi demolida na segunda metade de 1820. Mas ficam muitas pérolas para nós usarmos.

* Vocês podem ver que eu escrevi bastante aqui, né? Eu não gosta de passar dos 4 mil, por isso mesmo estou sofrendo no romance seguinte a esse...

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